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Julgamento do TJUE

No documento A liberdade de expressão e o passado (páginas 86-90)

1. DIREITO AO ESQUECIMENTO COMO LIMITE À

1.2. O direito ao esquecimento como fator restritivo à

1.3.4. Caso Google Spain – Tribunal de Justiça da União

1.3.4.2. Julgamento do TJUE

O acórdão recebeu a seguinte ementa (TJUE, 2014, p. 1):

Dados pessoais – Proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento desses dados –

Diretiva 95/46/CE – Artigos 2o , 4o , 12o e 14o

Âmbito de aplicação material e territorial – Motores de busca na Internet – Tratamento de dados contidos em sítios web – Pesquisa, indexação e armazenamento desses dados – Responsabilidade do operador do motor de busca – Estabelecimento no território de um Estado- Membro – Alcance das obrigações desse operador e dos direitos da pessoa em causa – Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia –

Artigos 7o e 8o.

O julgado (TJUE, 2014, p. 23/25) concluiu que:

1) em relação ao art. 2o, alíneas b) e d)91, a atividade do motor de busca, no caso Google, que consiste em encontrar informações

                                                                                                               

91 Artigo 2º

Definições

Para efeitos da presente directiva, entende-se por:

b) «Tratamento de dados pessoais» («tratamento»), qualquer operação ou conjunto de operações efectuadas sobre dados pessoais, com ou sem meios automatizados, tais como a recolha, registro, organização, conservação, adaptação ou alteração, recuperação, consulta, utilização, comunicação por transmissão, difusão ou qualquer outra forma de colocação à disposição, com comparação ou interconexão, bem como o bloqueio, apagamento ou destruição; d) «Responsável pelo tratamento», a pessoa singular ou colectiva, a autoridade pública, o serviço ou qualquer outro organismo que, individualmente ou em conjunto com outrem, determine as finalidades e os meios de tratamento dos dados pessoais; sempre que as finalidades e os meios do tratamento sejam determinadas por disposições legislativas ou regulamentares nacionais ou comunitárias, o responsável pelo tratamento ou os critérios específicos para a sua nomeação podem ser indicados pelo direito nacional ou comunitário;

publicadas ou inseridas na internet por terceiros, armazená-las, indexá- las e disponibilizá-las aos usuários, deve ser considerada como tratamento de dados pessoais92, cabendo, portanto, a submissão à diretiva e a responsabilização pertinente;

2) em relação ao art. 4o, n. 1, alínea a)93, que o Google Spain, ainda que seja uma filial ou sucursal estabelecida em território espanhol, basicamente, para a comercialização de espaços publicitários, não afasta a aplicação das regras da diretiva para o Google Inc.;

3) com base no art. 12o, alínea b) e 14o, alínea a)94, respectivamente, apagamento e oposição95, foi decidido que há a

                                                                                                                                                                                                                                           

Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

content/PT/TXT/?uri=CELEX:31995L0046. Acesso em 05/06/2014.

92 O conceito de dados pessoais está no artigo 2o , a) «Dados pessoais»,

qualquer informação relativa a uma pessoa singular identificada ou identificável («pessoa em causa»); é considerado identificável todo aquele que possa ser identificado, directa ou indirectamente, nomeadamente por referência a um número de identificação ou a um ou mais elementos específicos da sua identidade física, fisiológica, psíquica, económica, cultural ou social;

93 Artigo 4º

Direito nacional aplicável

1. Cada Estado-membro aplicará as suas disposições nacionais adoptadas por força da presente directiva ao tratamento de dados pessoais quando:

a) O tratamento for efectuado no contexto das actividades de um estabelecimento do responsável pelo tratamento situado no território desse Estado-membro; se o mesmo responsável pelo tratamento estiver estabelecido no território de vários Estados-membros, deverá tomar as medidas necessárias para garantir que cada um desses estabelecimentos cumpra as obrigações

estabelecidas no direito nacional que lhe for aplicável; Disponível em http://eur-

lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/?uri=CELEX:31995L0046. Acesso em 05/06/2014.

94 Artigo 12º

Direito de acesso

Os Estados-membros garantirão às pessoas em causa o direito de obterem do responsável pelo tratamento:

b) Consoante o caso, a rectificação, o apagamento ou o bloqueio dos dados cujo tratamento não cumpra o disposto na presente directiva, nomeadamente devido ao carácter incompleto ou inexacto desses dados;

Artigo 14º

Direito de oposição da pessoa em causa

Os Estados-membros reconhecerão à pessoa em causa o direito de:

a) Pelo menos nos casos referidos nas alíneas e) e f) do artigo 7º, se opor em qualquer altura, por razões preponderantes e legítimas relacionadas com a sua situação particular, a que os dados que lhe digam respeito sejam objecto de

obrigação do motor de busca de suprimir, da lista de resultados, os links para outras páginas da web que tenham sido publicadas por terceiro e que contenham informações pessoais sobre o interessado, ainda que tais publicações sejam lícitas. Neste ponto, no corpo do acórdão, a Corte fez referência, ainda, ao art. 6o , n. 1, alíneas c) a e)96, dispondo que mesmo que tenha ocorrido um tratamento de dados inicialmente lícito, com o tempo, ele pode se tornar incompatível com a diretiva, ocorrendo esta hipótese quando os dados já não forem mais necessários, tendo em vista as finalidades para os quais foram recolhidos ou tratados, e quando não forem (ou deixarem de ser) adequados, pertinentes, relevantes ou quando excessivos levando-se em conta, para tanto, os objetivos da coleta ou o tempo decorrido.97

4) Ainda em relação aos mesmos dispositivos do item 3, combinados aos artigos 7o e 8o da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, o Tribunal julgou que cabe examinar se a pessoa tem o direito de disassociar uma informação do seu nome, e com isto, afastar a

                                                                                                                                                                                                                                           

tratamento, salvo disposição em contrário do direito nacional. Em caso de oposição justificada, o tratamento efectuado pelo responsável deixa de poder

incidir sobre esses dados; Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

content/PT/TXT/?uri=CELEX:31995L0046. Acesso em 05/06/2014.

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Decide com base no apagamento, pois, de alguma maneira, corresponde a “apagar” da lista de resultados. Mas, acredita-se que se deve ao fato de não estar prevista a possibilidade de desindexação na diretiva, o que seria mais apropriado quando se trata de provedores de busca. Este é só um dos problemas da decisão.

96 Artigo 6º

1. Os Estados-membros devem estabelecer que os dados pessoais serão: (…)

c) Adequados, pertinentes e não excessivos relativamente às finalidades para que são recolhidos e para que são tratados posteriormente;

d) Exactos e, se necessário, actualizados; devem ser tomadas todas as medidas razoáveis para assegurar que os dados inexactos ou incompletos, tendo em conta as finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente, sejam apagados ou rectificados;

e) Conservados de forma a permitir a identificação das pessoas em causa apenas durante o período necessário para a prossecução das finalidades para que foram recolhidos ou para que são tratados posteriormente. Os Estados-membros estabelecerão garantias apropriadas para os dados pessoais conservados durante períodos mais longos do que o referido, para fins históricos, estatísticos ou científicos.

97 Mas o que pode ser entendido como relevante, adequado, pertinente? Para

quem? E quando? Será que o «irrelevante» de hoje, não pode ser imprescindível amanhã?

apresentação de uma lista de resultados correspondentes, sem que, no entanto, presuma-se que a existência de registros sobre ela seja causa de um prejuízo. Então, com fundamento nos direitos fundamentais de respeito à vida privada (art. 7o)98 e de proteção dos dados pessoais (art. 8o)99, é possível demandar que a informação não permaneça disponível por meio de uma lista de resultados, prevalecendo tais direitos sobre o interesse econômico do explorador do motor de pesquisa, bem como sobre o interesse do público sobre esta informação. Tal direito, entretanto, não preponderará, diante de razões particulares, como por exemplo o papel desempenhado pela pessoa na vida pública, quando, então, a interferência nos direitos citados será justificada pelo direito de acesso à informação pelo público100. 101

No corpo do acórdão (TJUE, 2014, p. 22/23) e de forma mais específica ao desejo de as pessoas serem “esquecidas” com a fluência do tempo, interessante apontar que Google Spain, Google Inc., e os

                                                                                                               

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Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia - Artigo 7o - Respeito

pela vida privada e familiar - Todas as pessoas têm direito ao respeito pela sua vida privada e familiar, pelo seu domicílio e pelas suas comunicações.

Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

content/PT/TXT/?uri=uriserv:OJ.C_.2012.326.01.0391.01.POR Acesso em 10/10/2014.

99 Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia - Artigo 8o - Proteção de

dados pessoais - 1. Todas as pessoas têm direito à proteção dos dados de caráter pessoal que lhes digam respeito.

2. Esses dados devem ser objeto de um tratamento leal, para fins específicos e com o consentimento da pessoa interessada ou com outro fundamento legítimo previsto por lei. Todas as pessoas têm o direito de aceder aos dados coligidos que lhes digam respeito e de obter a respetiva retificação.

3. O cumprimento destas regras fica sujeito a fiscalização por parte de uma

autoridade independente. Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

content/PT/TXT/?uri=uriserv:OJ.C_.2012.326.01.0391.01.POR Acesso em 10/10/2014.

100 Não está na conclusão do julgado, mas a decisão faz referência (2014, p. 6)

ao art. 9o da Diretiva 95/46/CE, que determina: “Os Estados-Membros

estabelecerão isenções ou derrogações ao disposto no presente capítulo e nos capítulos IV e VI para o tratamento de dados pessoais efetuado para fins exclusivamente jornalísticos ou de expressão artística ou literária, apenas na medida em que sejam necessárias para conciliar o direito à vida privada com as normas que regem a liberdade de expressão.”

101 E, o que é um fim exclusivamente jornalístico? Um blog de opiniões sobre os

fatos da atualidade estaria protegido? Ou apenas a «imprensa» em seu clássico formato estaria tutelada?

governos da Grécia, da Áustria e da Polônia e, ainda, a Comissão Europeia, que também participou do julgamento, sustentaram que a leitura da Diretiva deveria ser no sentido de que não caberia a exclusão da informação pelo fato de a pessoa entender que a informação a prejudica e/ou de desejar que caia no esquecimento, mas sim por ser efetivamente contrária à diretiva ou em virtude de motivos preponderantes e legítimos ligados a uma situação particular. Grécia e Áustria defenderam que o interessado deveria dirigir-se ao editor do site acusado e não ao provedor de pesquisa. Já Mario Costeja González e os Governos da Espanha e da Itália colocaram que pode o interessado opor- se à indexação dos seus dados pessoais pelo motor de busca, quando isto puder prejudicá-lo e quando afetar os direitos fundamentais de proteção de dados pessoais e respeito à vida privada, que, alegam, englobam o “direito a ser esquecido”, os quais devem prevalecer sobre os interesses do operador e, igualmente, sobre o interesse geral de liberdade de informação.

A conclusão, como visto, é identificada, principalmente, nos itens 3 e 4, acima apresentados e, em relação ao caso concreto, a posição do Tribunal (2014, p. 24) é a de que a indicação do Google sobre o anúncio da venda do imóvel por hasta pública do jornal La Vanguardia é um fato sensível da vida privada do requerente Mario Costeja González e como transcorridos 16 anos, há o direito de que tais informações não estejam mais ligadas ao seu nome por meio da lista indicada pelo provedor, até porque inexistente interesse do público, o que deverá ser examinado pelo órgão jurisdicional de reenvio. Mas, a princípio, o interessado solicitante, com base nos artigos 12o , alínea b) e 14o, alínea a), da Diretiva 95/46, pode, portanto, exigir a supressão dos links da lista de resultado apresentado pelo provedor de busca.102

No documento A liberdade de expressão e o passado (páginas 86-90)