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1. DIREITO AO ESQUECIMENTO COMO LIMITE À

1.2. O direito ao esquecimento como fator restritivo à

1.3.4. Caso Google Spain – Tribunal de Justiça da União

1.3.4.1. Resumo do caso

Em 13/05/2014, a discussão sobre o direito ao esquecimento e a internet alcançou o seu ápice com uma decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia (Grande Seção)84, resultante de provocação feita pela Audiência Nacional da Espanha, após recurso a este órgão jurisdicional interposto pelo Google Spain SL. e Google Inc., sendo recorridos Agência Espanhola de Proteção de Dados - AEPD e Mario Costeja González.85

Em 2010, o advogado espanhol Mario Costeja González apresentou uma reclamação para a AEDP contra La Vanguardia Ediciones SL (responsável pelo jornal de grande tiragem “La Vanguardia”), bem como, contra o Google Spain e Google Inc. A queixa do reclamante decorria do fato de que quando alguém digitava o seu nome no campo de busca do Google, imediatamente, eram indicados os links do jornal citado, com as edições de 19 de janeiro e 9 de março de 199886, em que havia a publicação oficial da venda de imóvel de sua propriedade em hasta pública em virtude de dívidas de seguridade

                                                                                                               

83 Reforça-se, não abrangida nesta tese.

84

Disponível em

http://curia.europa.eu/juris/document/document.jsf?doclang=PT&text=&pageIn dex=1&part=1&mode=req&docid=152065&occ=first&dir=&cid=201752

Acesso em 04/06/2014.

85 Os próximos parágrafos serão desenvolvidos a partir de informações extraídas

da decisão do Tribunal de Justiça da União Europeia, que pode ser acessada no

link disponibilizado na nota anterior.

86 Inicialmente, as edições eram impressas, mas, em data posterior, foram

social. O propósito da reclamação era obter uma ordem para que o jornal alterasse as referidas páginas e, com isto, os seus dados pessoais não mais fossem apresentados, ou que, ao menos, estes dados fossem protegidos mediante ferramentas disponibilizadas pelos motores de busca. Já em relação ao Google, a pretensão concentrava-se na supressão ou ocultação dos seus dados pessoais, para que não fossem mais apresentados na pesquisa e para que ele não estivesse mais conectado às publicações do La Vanguardia, até porque a dívida, da qual resultou o arresto e a hasta pública, foram resolvidas há anos, com a devida quitação, inexistindo pertinência atual para a divulgação de tais informações (TJUE, 2014, p. 7).

A AEPD, ainda em 2010, indeferiu o pedido feito em relação às edições La Vanguardia, em suma, por se tratar de uma informação oficial que foi publicada no jornal por determinação do Ministério do Trabalho e dos Assuntos Sociais. Por outro lado, entendeu exitosa a reclamação em relação ao Google Spain e Google Inc., basicamente, por se submeterem à legislação de proteção de dados, já que a atividade desenvolvida estaria enquadrada como tratamento de dados. Diante disto, a Agência entendeu ser competente para ordenar a retirada de determinadas informações disponibilizadas pelos motores de busca, quando identificada a potencialidade de lesão do direito fundamental de proteção dos dados e da dignidade da pessoa em sentido amplo, o que incluiria a simples vontade do interessado de que seus dados não fossem mais acessados por terceiros (TJUE, 2014, p. 8).

Desta decisão, Google Spain e Google Inc. recorreram para Audiência Nacional da Espanha, que, por sua vez, suspendeu a instância e submeteu algumas questões prejudiciais para o TJUE, tendo em vista a necessária interpretação da Diretiva 95/46/CE (Diretiva de Proteção de Dados – Data Protection Directive) do Parlamento Europeu e do Conselho, de 24 de outubro de 1995, relativa à proteção das pessoas naturais no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados87 88,principalmente porque algumas das tecnologias envolvidas são supervenientes a sua edição.

                                                                                                               

87 Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

content/PT/TXT/?uri=CELEX:31995L0046. Acesso em 05/06/2014.

88 Revogada pelo Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do

Conselho de 27 de abril de 2016 relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses

dados. Disponível em http://eur-lex.europa.eu/legal-

Foram apresentadas três questões prejudiciais, subdivididas. No entanto, destaca-se a terceira:

3) No que respeita ao âmbito do direito de apagamento e/ou [de] oposição em conjugação

com o « direito a ser esquecido »89, submete-se a

seguinte [questão]:

Devem os direitos ao apagamento e bloqueio dos dados, regulados no artigo 12.°, alínea b), e o direito de oposição, previsto no artigo 14.°, [primeiro parágrafo,] alínea a), da Diretiva [95/46,] ser interpretados no sentido de que permitem que a pessoa em causa possa dirigir-se aos motores de busca para impedir a indexação da informação referente à sua pessoa, publicada em páginas web de terceiros, com base na sua vontade de que a mesma não seja conhecida pelos internautas quando considere que lhe pode ser prejudicial ou deseje que seja esquecida, mesmo tratando-se de uma informação publicada licitamente por terceiros?

Embora, em um primeiro momento, a impressão é a de que se está diante de uma questão restrita ao direito de controlar dados pessoais, ou seja, ao right to be forgotten e, portanto, em uma tradução mais precisa para o português, o “direito de ser esquecido”90, inclusive, tendo sido o principal fundamento para a decisão uma interpretação inédita da Diretiva 95/46/CE, o que poderia, de conseguinte, parecer que inexiste interesse de o examinar neste estudo, é preciso considerar que: 1) o caso ficou famoso pelo que muitos acreditam tratar-se de prova contundente da consagração do direito ao esquecimento, o qual se defende que no Brasil não se restringe a um controle de dados; 2) ainda que, em um primeiro momento, atribua-se isto a uma incompreensão da dupla significação da expressão “direito ao esquecimento”, explicada anteriormente, acredita-se que aqui há, sem dúvida, uma lide envolvendo um dado pessoal, mas que também reúne as características do referido direito, quais sejam, fato com divulgação originária lícita, fluência temporal e recordação provocadora de perturbação com consequente oposição do envolvido, já que o assunto era trazido à tona pelo apontamento de links correspondentes a uma publicação oficial de

                                                                                                               

89 Na versão em inglês, a expressão utilizada foi the right to be forgotten; em

francês, le droit à l’oubli; em espanhol, el derecho al olvido.

90

uma hasta pública, no jornal La Vanguardia, de anos atrás, quando efetuada pesquisa no google através do nome do postulante; 3) a pretensão de controlar dados pessoais, em determinadas situações, como a presente que ora se examinará, pode reunir todos os elementos para o direito ao esquecimento no formato aqui desenhado.

No documento A liberdade de expressão e o passado (páginas 83-86)