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SUMÁRIO

I.3 JUSTIFICATIVA DE RELEVÂNCIA

É patente que a agricultura exerce, cada vez mais, um papel de destaque nos grandes fóruns de discussão voltados para o futuro das nações, uma vez que envolve questões estratégicas no plano mundial, já citadas anteriormente, como a busca de eficientes alternativas de energias renováveis, ou de formas para mitigar os efeitos crescentes de mudanças climáticas globais, além da questão de sobrevivência alimentar. Nesse sentido, a P&D e a inovação têm exercido papel primordial, sobretudo nos países em desenvolvimento (PED), para que esses possam assumir um destaque como provedor mundial de alimentos e fontes de energia mais limpa.

Por outro lado, frente a este panorama, não é demais enfatizar que hoje, mais do que nunca, a cooperação internacional é um instrumento da política externa que se destaca na promoção do desenvolvimento loco-regional e de propulsão à inovação. Nessa perspectiva, a persistência das grandes desigualdades regionais, no país, expõe o semiárido tropical brasileiro, região de jurisdição do CPATSA, como um polo que merece destacada atenção dos governos na proposição de políticas públicas voltadas para a promoção do desenvolvimento e integração do território, superando ou mitigando seus graves problemas estruturais. Ademais, o polo Petrolina-Juazeiro centro econômico-comercial desta região, constitui-se hoje no principal polo de produção e exportação de manga e uva do país, produzindo também diversos outros tipos de frutas, que compõem o complexo frutífero do Submédio São Francisco. Isso leva ao reconhecimento da importância crescente desta região no cenário nacional, bem como da relevância da agricultura irrigada para a dinâmica do seu desenvolvimento, uma vez que ela vem, inequivocamente, promovendo oportunidades de emprego e elevação de renda à população. Além disso, situa-se aí também a gênese da vitivinicultura da região nordeste, hoje em franca expansão, tendo o eixo Juazeiro-Petrolina se tornado o segundo polo de vitivinicultura de todo o país.

De forma peculiar, acirra-se a relevância estratégica deste estudo por focalizar a cooperação internacional no eixo da C&T nas suas diversas formas e modalidades, o que inclui a cooperação para o desenvolvimento. E como bem destaca Quiñones (2013, p.23-24), apesar de existirem muitos estudos que analisam a eficácia da cooperação internacional para o desenvolvimento de forma agregada, considerando aquela voltada para promover o crescimento econômico dos países em desenvolvimento, a literatura não vem analisando o papel da cooperação específica no eixo científico e tecnológico, mesmo sendo essa a

modalidade de ajuda que impacta profundamente no progresso econômico e está diretamente atrelada à inovação, base de competitividade dos povos na contemporaneidade.

Em outra direção, a relevância desta tese encontra apoio diante da constatação de que, apesar do significativo papel assumido pela cooperação internacional no mundo contemporâneo, há uma frequente falta de registros sistematizados dos processos de cooperação implantados nas regiões menos desenvolvidas, gerando uma lacuna de memória dessas experiências, imprescindível para que se possa delas extrair o conhecimento e evoluir na aprendizagem organizacional e relacional dos processos cooperativos, bem como subsidiar políticas públicas nessa direção. Esta realidade impossibilita também uma retroalimentação para políticas de desenvolvimento regional, lembrando ainda aqui que, conforme enfatiza Cardoso (1995), a capacidade de acumulação de conhecimento é um fator central para o desenvolvimento. Além disso, frente à complexidade do processo de cooperação internacional, especialmente em função da diversidade dos arranjos interinstitucionais que se formam para a sua viabilização, evidenciam-se dificuldades latentes para a sua gestão.

Mais complexos ainda se mostram os processos de cooperação em C&T/P&D, diante de questões polêmicas como a propriedade intelectual aí presentes, antes já mencionadas. Tais preocupações exacerbam-se frente à consciência crescente da importância da construção de uma cooperação com foco mais socialmente inclusivo, imperativa para que o Estado e a sociedade transformem a natureza de suas intervenções e se apropriem de forma plena da dinâmica desse processo, pavimentando um caminho para a mitigação da exclusão social, consequência de um desenvolvimento socioeconômico assimétrico, realidade marcante do território brasileiro. A importância deste estudo também se confirma porque, conhecer a natureza e o alcance da cooperação internacional, em suas inúmeras expressões, é profundamente estratégico para desenvolver reflexões e um adequado planejamento da inserção internacional do Estado. Sem esse conhecimento, corre-se o risco de não ser possível dimensionar o potencial de inserção internacional e de se desperdiçarem recursos e esforços em processos pouco relevantes para metas nacionais, regionais ou internacionais.

O conhecimento e entendimento da realidade da cooperação internacional e seus resultados possibilitam aos gestores públicos uma melhor instrumentalização da sua política de cooperação internacional, para o que muito contribuem as reflexões e considerações, ora trazidas para as suas práticas e interfaces, bem como as políticas públicas inerentes, e as estratégias que, explícita ou implicitamente, mostraram-se utilizadas pelos gestores da Embrapa Semiárido nos seus processos de cooperação internacional. Não se pode olvidar que, no Artigo 4º da Constituição Federal (CF) brasileira de 1988, figura a cooperação entre os

povos para o progresso da humanidade, como um dos princípios regentes das relações internacionais do país.

I.4 PROCEDIMENTOS, TÉCNICAS E DELIMITAÇÃO DA PESQUISA

A pesquisa tem caráter qualitativo, não utilizando portanto, instrumentos estatísticos robustos na análise dos dados, e, sim, técnicas qualitativas, de modo precípuo, entrevistas diretas. O estudo possui também uma perspectiva exploratória, descritiva e analítica. A primeira, porque sistematiza informações ainda não levantadas, não tendo sido encontrados trabalhos específicos sobre o tema, cruzando as dimensões conceituais propostas e dirigindo- se para o recorte geográfico selecionado (MARCONI e LAKATOS, 2001; ANDRADE, 2007). Destarte, a reunião consolidada dessas informações por si só já caracteriza, em uma primeira instância, o ineditismo deste trabalho. A pesquisa também tem um caráter descritivo porque se preocupa em identificar e compreender o objeto de estudo mediante um levantamento sistemático de dados e informações, sem dispensar sua análise (ANDRADE, 2007). A estratégia da pesquisa recorreu ao estudo de caso, considerado fundamental para viabilizar o entendimento profundo do fenômeno a ser analisado no seu contexto. Para Yin (2010, p.22), esse é o método geralmente preferido quando questões do tipo “como” ou “por que” são propostas e o enfoque é voltado para um fenômeno contemporâneo no contexto real. Como já indicado anteriormente, a unidade de estudo foi a Embrapa Semiárido, localizada no Km 152 da Rodovia BR-428, Zona Rural, Petrolina/Pernambuco, onde se desenvolveu a coleta de dados primários. A pesquisa contemplou o horizonte temporal do início da década de 1990 aos dias atuais, e fez um corte espacial e geográfico focalizando a região do Semiárido brasileiro, analisando a cooperação internacional em C&T (incluindo transferência técnica) ocorrida com a participação da Embrapa Semiárido nesse período. Adotou uma abordagem metodológica de enfoque histórico e comparativo no corte temporal definido para a unidade única do caso selecionado, e, em todo o seu percurso, o estudo faz uso de descrições, comparações e interpretações, à luz do referencial teórico adotado.

A seleção para estudo desta unidade da Embrapa, dentre as demais existentes na sua estrutura organizacional, deve-se aos seguintes fatores: i) relevância da região no cenário internacional, pelo fato da sua característica de semidesertificação e por abrigar um dos biomas mais discutidos e carentes de estudos hoje, frente às questões de mudanças climáticas

e preocupações mundiais com a escassez de recursos hídricos; ii) relevância da região no cenário nacional, por essa ter se transformado em poucas décadas no principal polo exportador de frutas frescas no Brasil, bem como o segundo polo vitivinicultor brasileiro, apesar da sua difícil condição territorial semiárida, profundamente dependente de irrigação, e da sua realidade socioeconômica, incipiente até poucas décadas atrás; iii) inexistência de estudos no enfoque aqui proposto voltados para a unidade Semiárido da Embrapa. Para uma visão inicial do perfil dessa cooperação ao longo do tempo, foram focalizados na etapa exploratória ambos os fluxos de cooperação, tanto do eixo do recebimento quanto da oferta, tendo o enfoque, na etapa subsequente de aprofundamento dos processos, se dirigido exclusivamente para o eixo do recebimento da cooperação.

No que tange à operacionalização da pesquisa, inicialmente, foi realizado um aprofundamento no conhecimento do tema, visando à compreensão ampla dos campos de estudos envolvidos. Nesta etapa, foi efetuado um levantamento secundário de caráter bibliográfico, na forma de livros, teses e dissertações. Parte significativa desta atividade foi desenvolvida na University of Toronto/Munk Scool of Global Affairs / Canadá no período de estágio doutoral sanduíche da autora (de Julho de 2013 a Maio de 2014, este incluso), onde a mesma teve acesso a uma das duas maiores bibliotecas da área de Ciências Sociais da América do Norte (Robarts Library), além de acervo do Innovation Policy Lab, laboratório de Políticas de Inovação, junto ao qual evoluiu sua pesquisa sob a supervisão do Prof.David Wolfe, diretor desta instância e do Programa Globalization and Regional Innovation Systems6. Nesta oportunidade, a autora contou ainda com um enriquecimento do conhecimento do tema a partir da sua participação em inúmeras conferências, palestras e reuniões de grupos de pesquisas voltadas para cooperação internacional e para inovação promovidas pela University of Toronto, contando com proeminentes autores destacados nas referidas áreas, oriundos de diversas universidades e instituições internacionais. Aqui estão incluídas universidades de relevância global, a exemplo das estadunidenses Princeton, Harvard University, Columbia University e do Massachussets Institut of Technology (MIT), de instituições acadêmicas europeias de reonome como London University (Inglaterra), Lausanne University (Suíça) e Institut de Sciences Politiques de Paris (SciencesPo), bem como universidades de países emergentes, a exemplo da University of Delhi e University of Mumbai, (Índia), Athens State University (Grécia) e da Universidade de São Paulo (Brasil), dentre outras, além de organizações internacionais voltadas para consultorias no âmbito mundial.

No plano nacional, esta etapa recorreu ao acervo bibliográfico disponível em instituições de pesquisa, agências e universidades brasileiras mais reputadas nas grandes áreas de Administração e de Relações Internacionais, citando-se aqui, dentre outras, a Universidade de Brasília (UnB) a Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), a Universidade do Estado de São Paulo (UNESP), a Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), a Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), a Universidade Federal da Bahia e a Universidade Estadual da Bahia (UNEB - campus Juazeiro). A pesquisa específica sobre o objeto de estudo proposto consistiu de quatro etapas, não linearmente sucessivas, quais sejam:

a) pesquisa documental junto ao acervo físico da Embrapa Semiárido, buscando: instrumentos celebrados entre a Embrapa e as instituições internacionais cooperantes (convênios, acordos e contratos); Relatórios Anuais de Atividades; Relatórios de viagens internacionais de pesquisadores; Relatórios de final de implantação de projetos de cooperação internacional; Panfletos informativos e Jornais institucionais, todos publicados dentro do corte temporal definido;

b) levantamentos secundários nas bases de dados eletrônicas disponibilizadas pela EMBRAPA no âmbito nacional, incluindo pesquisa bibliográfica da produção científica dos pesquisadores da unidade do Semiárido;

c) entrevistas de gestores-chave7 da EMBRAPA Semiárido (CPATSA) lotados a 40 km de Petrolina, além de entrevista de gestor da Codevasf e de chefe de terceirizada desta Agência de Desenvolvimento, atuante desde seus primórdios (ver capítulo 4); d) entrevistas de pesquisadores do CPATSA, realizadas em dois momentos distintos:

d.1) entrevistas com 80 pesquisadores (do universo de 83 ativos - vide relação nominal no Apêndice A.1) mediante as quais foi realizado o mapeamento das iniciativas de cooperação internacional por eles experienciadas;

d.2) entrevistas em profundidade dos 38 pesquisadores (incluindo um analista chefe) que apontaram na entrevista anterior já ter vivenciado processos de cooperação internacional nessa instituição; esta etapa foi desenvolvida de forma bifurcada, dividindo-se em dois blocos de entrevistas que se dirigiram para os seguintes interesses: i) entendimento de questões de ordem político- estratégica das iniciativas, além de técnicas, de gestão e do modus operandi dos processos; ii) mapeamento da produção de conhecimento, geração de

7 Gestores entrevistados na etapa exploratória: Natoniel Franklin de Melo (Chefe geral), Pedro G.da Silva (Assessor), Maria Auxiliadora C.de Lima (Chefe de Pesquisa) e Rebert C.Correia (Chefe Administrativo); Gestores entrevistados na etapa de aprofundamento; Pedro G.da Silva (Chefe geral), Sérgio Guilherme de Azevedo (Chefe de Transferência Tecnológica) e Maria Auxiliadora C.de Lima (Chefe de Pesquisa).

inovações e das ações realizadas de difusão das iniciativas internacionais vivenciadas, com posterior discussão sobre os resultados e benefícios aportados pelas intervenções implantadas no Semiárido com a cooperação internacional (vide relação nominal no Apêndice A.2);

e) entrevistas de stakeholders importantes para a EMBRAPA Semiárido, especificamente: i) diretores8 de órgãos internacionais que atuaram e ainda atuam na cooperação junto ao CPATSA (CIRAD / INRA / CGIAR);e ii) g) político9 local ligado ao desenvolvimento regional do Vale do São Francisco desde 1970.

Cabe ressaltar que não foi possível obter os instrumentos celebrados entre a Embrapa e as instituições cooperantes, referentes aos processos de cooperação internacional vivenciados no Semiárido, apesar dos esforços envidados nessa direção. Apenas quatro acordos, dentre aqueles que deveriam reger as 30 iniciativas mapeadas de cooperação recebida de órgãos estatais (as quais serão discutidas adiante), foram disponibilizados para serem consultados. Além da solicitação preliminar feita à unidade local, foi encaminhada solicitação à Diretoria da Secretaria de Relações Internacionais (SRI) da Embrapa-sede, em uma primeira instância de forma direta. Após o insucesso dessa empreitada, foi solicitado apoio institucional da Universidade Federal do Vale do São Francisco (UNIVASF), instituição com a qual a autora possui vínculo efetivo de docência. Destarte, foram encaminhadas solicitações pela administração central desta universidade, nas figuras do seu Reitor e do seu Assessor de Relações Internacionais (vide memorandos no Anexo), as quais foram remetidas à Diretoria da SRI em Brasília, o que entretanto, não alterou o quadro da disponibilização documental ensejada para os fins desta pesquisa. Assim, em alguns casos, este estudo recorreu a estimativas de dados numéricos, fornecidas pelos entrevistados, método que valoriza o recurso de entrevista em relação à coleta de dados documentais.

O processo de coleta de dados e levantamento de informações nos citados órgãos foi realizado com base nos seguintes instrumentos abaixo relacionados (vide modelos no Apêndice C), os quais, no seu conjunto, buscaram responder às questões da matriz de análise multidimensional traçada para a pesquisa, a qual é apresentada nas páginas finais deste capítulo introdutório (Quadros I.1 e I.2):

a) Quadro de mapeamento das iniciativas internacionais; b) Questionário semiestruturado Foco Político-Estratégico; c) Questionário semiestruturado Foco Técnico-Gestor;

8 Bernard Mallet (CIRAD/INRA) e Francisco J. B. Reifschneider (Ex-diretor CGIAR). 9 Osvaldo Coelho, ex-deputado federal, com atuação por quatro décadas na região.

d) Questionário semiestruturado, focalizando a produção de conhecimento, inovação e processos de difusão;

Pari passu aos levantamentos, conduziu-se a sistematização do material obtido, prosseguindo-se com a análise, interpretação e avaliação comparativa longitudinal desses, construindo-se quadros e tabelas sintetizadas visando à facilitação do entendimento dos resultados consolidados, bem como sua análise. Os dados foram tabulados e analisados à luz das consolidações obtidas no seu conjunto, bem como dos elementos qualitativos vindos à tona no processo das entrevistas.