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Justificativa e relevância de nosso estudo

Para dar direcionamento à pesquisa, decidimos realizar uma primeira investigação com um grupo de professores de Matemática em formação, de uma universidade estadual da Bahia, com a finalidade de fazer um estudo preliminar acerca das concepções de docentes da Educação Básica sobre a noção de simetria ortogonal. Para tanto, utilizamos como referência os estudos de Grenier (1988) sobre as concepções de alunos franceses com relação à simetria ortogonal. Para investigar tais concepções, Grenier (1988) propôs uma série de situações, nas quais era solicitado aos alunos que traçassem à mão livre figura simétrica com relação a uma reta, como pode ser visto na Figura 17:

Figura 17. Situações propostas por Grenier

Fonte: Grenier (1988, p.20)

No Quadro 1, apresentamos as variáveis didáticas estudadas e uma síntese das concepções detectadas por Grenier (1988):

Quadro 1. Variáveis didáticas e concepções detectadas por Grenier (1988)

Variáveis didáticas Concepções detectadas

A interseção da figura com o eixo de simetria;

A concepção da simetria como transformação de um semiplano em outro semiplano (delimitado pelo eixo) é revelada pelas dificuldades que provoca a interseção da figura com o eixo. O que parece mais intervir é o local da figura com relação a esses dois semiplanos.

As direções do eixo de simetria e dos elementos que compõem a figura objeto;

A simetria axial transforma uma figura em outra isométrica, do outro lado do eixo situado sobre uma reta horizontal ou vertical.

A posição da figura objeto em relação ao semiplano delimitado pelo eixo de simetria na folha;

A imagem de um segmento vertical (horizontal) é um segmento de mesma direção na folha.

O tipo de papel (branco ou quadriculado) e sua influência sobre os procedimentos e respostas dos alunos.

Os itens sobre papel quadriculado não são mais bem sucedidos que aqueles sobre o papel branco, isto é, o papel quadriculado induz a levar em conta os pontos particulares da figura.

Fonte: Elaborado pela autora de acordo com Grenier (1988)

A pesquisa de Mabuchi (2000), realizada no Brasil com professores, e os estudos de Lima (2006), realizados na França com alunos, sobre o estudo de tais variáveis, corroboram os resultados obtidos por Grenier (1988). Sobre sua investigação Mabuchi (2000, p.192) argumenta que ela revelou que “muitos dos docentes apresentaram procedimentos semelhantes aos assinalados em pesquisas feitas com alunos do Ensino Fundamental”. Com essa motivação, construímos e aplicamos um instrumento de coleta de dados, cujo objetivo de algumas das questões era observar se as concepções detectadas por Grenier (1988), em seu estudo com alunos, também seriam observadas por nós com relação a professores de Matemática, em formação.

O grupo investigado constava de nove professores que cursavam a licenciatura em Matemática do Plano de Nacional de Formação de Professores da Educação Básica (PARFOR). Desses, apenas cinco responderam as questões relacionadas com a simetria ortogonal, e a análise de duas dessas questões está publicada nos anais do XI Encontro Nacional de Educação

Matemática. Apresentamos, a seguir, uma síntese de nossa análise dessas duas questões relacionando-as às variáveis didáticas elencadas com as concepções por nós observadas.

Quadro 2. Síntese dos resultados de uma investigação preliminar

Variáveis didáticas Síntese de nossa análise

A interseção da figura com o eixo de simetria;

Acreditamos que o fato de o eixo de simetria ser oblíquo, e a figura-objeto cortar esse eixo, tenha adicionado um grau de dificuldade maior à situação proposta e evidenciado outra concepção detectada em estudos anteriores, realizados com alunos, ou seja, a concepção da reflexão como transformação de um semiplano em outro semiplano (delimitados pelo eixo).

As direções do eixo de simetria e dos elementos que compõem a figura objeto;

Com relação à posição do eixo de simetria, não houve dificuldade, quando ele tinha direção vertical ou horizontal à folha.

Já quando o eixo de simetria era oblíquo e não tinha a mesma direção da figura-objeto (segmento), apenas um professor apresentou a solução correta.

A posição da figura objeto em relação ao semiplano delimitado pelo eixo de simetria na folha;

Percebemos que, quando o eixo de simetria é oblíquo em relação à folha e paralelo à figura (segmento de reta), o êxito prevalece.

O tipo de papel (branco ou quadriculado) e sua influência sobre os procedimentos e respostas dos alunos.

Observamos nas resoluções de quatro dos cinco professores investigados procedimentos de contagem sobre as linhas horizontais ou verticais, cujos procedimentos são falsos quando o eixo de simetria é oblíquo.

Fonte: Elaborado pela autora baseado em Silva e Almouloud, (2013)

Os resultados dessa investigação preliminar reforçaram aqueles apresentados por Grenier (1988) e fortalecidos por Silva e Almouloud, quando afirmam que

a figura imagem será paralela à figura inicial. Outra propriedade levada em conta pelos professores é que a figura imagem estará do outro lado do eixo de simetria, a mesma distância ao eixo que a figura inicial. Não foi uma constante observável nas respostas dos professores a ortogonalidade. (SILVA; ALMOULOUD, 2013, p.12)

Os resultados desse estudo preliminar nos forneceram perspectivas no que diz respeito às concepções de professores sobre o ensino de simetria ortogonal, na busca de compreender como um processo de formação de professores influencia na passagem de uma concepção inicial a uma concepção final, relacionada à simetria ortogonal.

Realizaremos, no próximo capítulo, um estudo sobre a simetria ortogonal à luz da ecologia do didático, com a intenção de estudar alguns elementos da realidade que cercam os processos de ensino e de aprendizagem de simetria ortogonal.

CAPÍTULO 3

UM ESTUDO SOBRE A SIMETRIA ORTOGONAL

À LUZ DA ECOLOGIA DO DIDÁTICO

Neste capítulo, utilizamos a noção de Ecologia do Didático para fazer um estudo do ponto de vista didático sobre a simetria ortogonal com o objetivo de entender como esse conteúdo se configura no sistema de ensino brasileiro. Acreditamos que tal estudo passe pela análise dos referenciais curriculares, sua efetiva presença em livros didáticos, numa discussão sobre a simetria ortogonal e as condições de sua existência no sistema de ensino.