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Assim como ocorre com as demais áreas do conhecimento, o histórico da Educação Especial mostra que muitas das evoluções decorreram de indagações e avanços da ciência que indicaram necessidade de mudanças. Isso demonstra que, sempre que há desafios, a pesquisa científica acaba produzindo subsídios cada vez mais amplos para o atendimento de toda sua clientela nos diferentes contextos necessários.

Nesse quadro histórico, o deficiente mental passou de uma condição de completa reclusão social em asilos para atendimentos diferenciados, tais como as classes e escolas especiais, e caminha atualmente em direção a inclusão social. Contudo, para que haja de fato a inclusão social não basta que o aluno com necessidades especiais seja colocado no ensino regular ou inserido no mercado de trabalho, mas sim que lhe sejam garantidas as oportunidades de interação com o novo grupo. Nossa sociedade parece depender cada vez mais de relacionamentos interpessoais complexos. Por isso, a comunicação interpessoal é muito importante como objetivo educacional, junto a diferentes populações, dentre elas de pessoas com deficiência (Peterson, 1999).

Conforme visto nas sessões anteriores, diversos autores verificaram déficits sociais (Eckert, 2000; Langone, Clees, Oxford, Malone & Ross, 1995; Malek & Yoshida, 1994; O’Reilly, Lancioni & Kierans, 2000) e comunicativos (Aguiar, 2002; Cannao, 1999; Fujiki & Brinto, 1993; Merril & Jackson, 1992) em pessoas com deficiência mental, assim como outros autores (Del Prette & Del Prette, 2003) indicaram as relações diretas desses déficits com a qualidade das relações interpessoais. Convergindo com essas observações, as definições vigentes do termo deficiência mental e o atual processo diagnóstico incluem, em seus critérios, além de déficits no funcionamento intelectual, déficits também nas habilidades adaptativas, dentre elas as sociais e as comunicativas.

Diante disso e do fato de que cada vez mais tem se discutido que as escolas devem promover habilidades que permitam aos alunos atuarem como adultos e membros comunitários eficientes, torna-se fundamental a promoção das habilidades sociais e comunicativas na escola, uma vez que estas são partes fundamentais da qualidade das relações interpessoais. Tais considerações evidenciam a importância do desenvolvimento de habilidades sociais, dentre elas as habilidades comunicativas, de crianças e adultos com deficiência mental embasando-se em três pontos principais: a) a concepção vigente de deficiência mental, centrada no funcionamento adaptativo e níveis de apoios necessários ao

aprendizado; b) as atuais políticas de inclusão da pessoa com deficiência no ensino regular; e c) as políticas atuais da educação escolar que visam um ensino mais amplo para todos seus alunos, com ou sem deficiência, para que estes sejam mais bem preparados para os desafios da vida adulta.

Estudos, em especial no campo das Habilidades Sociais têm se dedicado à promoção dessas habilidades em ambiente escolar tanto de professores como de seus alunos e vêm mostrando resultados satisfatórios (Del Prette & Del Prette, 1997, 1999, 2001a, 2003; Freitas, no prelo; Löhr, 2003; Mello, 2004; Molina, 2003; Molina & Del Prette, 2005). No entanto, a literatura nacional ainda é escassa de trabalhos que abordem especialmente a promoção de habilidades sociais e comunicativas de deficientes mentais em seus programas.

Dentre os estudos com essa população, há uma predominância de trabalhos com crianças, o que deixa uma lacuna na pesquisa científica quando se pensam nos possíveis avanços a partir de estudos caracterizando e promovendo habilidades sociais e comunicativas de adultos deficientes mentais e conseqüentemente um déficit em contribuição social quando se pensa na maior oportunidade de inclusão no mercado de trabalho e nos benefícios do ponto de vista do planejamento da vida futura dessas pessoas, a partir de melhoras na sua competência social e comunicativa.

Considerando, portanto, que a preparação para o trabalho e um bom desempenho escolar estão intrinsecamente vinculados a um bom desempenho interpessoal, o desenvolvimento de programas de promoção de habilidades sociais-comunicativas (adaptados às atuais exigências das práticas educacionais e aos apoios necessários a sua clientela) é fundamental para o avanço das pesquisas e a prática na área da Educação Especial. Diante ainda dos resultados satisfatórios de programas de intervenção desenvolvidos, principalmente na literatura internacional (Bradlyn et al., 1983; Ducker & Lent, 1991; Eckert, 2000; Frea & Hughes, 1997; Langone, Clees, Oxford, Malone & Ross 1995; Malek & Yoshida, 1994; O’Reilly, Lancioni & Kierans, 2000), pode-se supor que um programa delineado para atender as necessidades especiais de adultos deficientes mentais nessa área apresentará efeitos positivos sobre o desempenho comunicativo dos participantes.

Considerando ainda o objeto da Fonoaudiologia e a importância de dispor, na literatura técnica, de descrições sistematizadas de programas de intervenção com grupos de deficientes mentais adultos, em particular no campo das habilidades comunicativas,

acredita-se na grande contribuição de estudos nessa linha, tanto para a prática quanto para a pesquisa desse campo, assim como para outras áreas afins, tais como: a Psicologia e a Educação Especial.

Partindo desses pressupostos, o presente estudo teve como objetivos gerais: a) elaborar e descrever instrumentos e procedimentos para a avaliação e promoção de habilidades comunicativas de adultos deficientes mentais; b) delinear, implementar e descrever um programa de promoção de habilidades comunicativas verbais e não verbais para um grupo de adultos deficientes mentais; c) analisar o desempenho de cada um dos participantes desse programa, conforme indicadores obtidos em diferentes momentos da intervenção.

A presente pesquisa assemelha-se aos estudos descritos quanto ao uso de diferentes procedimentos de intervenção para a promoção de habilidades verbais e não verbais em um grupo mesclando homens e mulheres com idades variadas, porém diferencia-se destes, na medida em que se propôs a ser desenvolvido a partir de um delineamento de múltiplos sujeitos, no qual os participantes são analisados em grupo e individualmente, semelhantemente a um estudo de caso e na medida em que se propõe oferecer diretrizes para replicações de programas semelhantes. Com isso, busca responder se um programa de treinamento de habilidades verbais e não verbais, mesclando sessões estruturadas e atividades práticas, com uso de procedimentos e técnicas diversificadas, é efetivo na promoção das habilidades treinadas. Busca ainda arrolar diretrizes gerais e específicas para a implementação e o desenvolvimento de um programa de promoção de habilidades verbais e não verbais para adultos deficientes mentais.

MÉTODO

1. Aspectos éticos

A autorização dada pela coordenadora e diretora da Instituição, na qual parte da pesquisa foi desenvolvia, foi registrada em Termo de Concordância (Anexo II) e das famílias em Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (Anexo III). A assinatura de ambos os termos foi realizada após a leitura deste, aberta para esclarecimento de possíveis dúvidas pela pesquisadora.

A aprovação do projeto foi deliberada pelo Comitê de Ética em Pesquisa para Experimentos em Seres Humanos da UFSCar (CEP/UFSCar) em 18 de março de 2004 com protocolo nº 013/04 (Anexo I).

2. Participantes

Participaram do estudo seis adultos deficientes mentais, de ambos os sexos (Diana, Davi, Denis, Elen, Marta e Paula), com idades variando de 19 a 29 anos de idade, matriculados em uma Associação filantrópica do Município de São Carlos, sendo, quatro destes, participantes do primeiro estudo - três mulheres – Diana, Marta e Paula e um homem - Davi (Aguiar, 2002). Os critérios para a escolha dos participantes do estudo consistiram em: a) convite verbal para participação na pesquisa aos familiares de todos os alunos desta Instituição que apresentavam comunicação verbal funcional, ou seja, fala com intenção/propósito comunicativo identificável pelo interlocutor (12 famílias); e b) aceitação do convite (oito famílias). No momento da leitura formal e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido um dos oito prováveis participantes havia deixado a Instituição, o que reduziu o número de participantes para sete. No decorrer do programa de intervenção ainda houve a mudança de uma das famílias para outra Cidade, e conseqüentemente a desistência de uma participante que não foi considerada na análise dos dados por não ter concluído o programa de intervenção.

Participaram, como informantes, os familiares dos participantes e profissionais que atuavam com estes no período da coleta dos dados. O convite à participação foi estendido a todos os familiares de cada participante e a todos os profissionais da Instituição, sendo que para cada participante houve um familiar interessado e disponível em participar e dois profissionais (professora e terapeuta ocupacional).

A Tabela 3 apresenta, sinteticamente, alguns dados gerais de caracterização dos participantes do estudo. Parte das informações apresentadas foram coletadas junto aos familiares e profissionais por meio de conversa informal em ocasião do contato inicial com estes, sendo ainda parte das informações obtidas nos prontuários escolares e parte pelas observações informais da pesquisadora em campo, no decorrer da pesquisa. As informações quanto ao grau de deficiência mental, comportamento adaptativo e nível de independência foram obtidos por meio da aplicação de testes específicos, conforme será mais detalhado posteriormente.

A análise das características comportamentais foi realizada pela própria pesquisadora, a partir dos dados obtidos nos prontuários dos participantes junto à Instituição; de conversa informal com os profissionais e com os familiares; e da observação direta e informal da pesquisadora, em campo, quanto às características comunicativas, considerando os aspectos fonoaudiológicos da comunicação em termos de predominância expressiva (participação mais ativa nas interações sociais) ou receptiva (participação mais passiva nas interações sociais). Considerou-se como sendo mais ativos nas interações (predominância expressiva) os participantes que iniciavam mais diálogos e trocavam mais turnos dialógicos e conseqüentemente mais passivos (predominância receptiva), aqueles que iniciavam conversas em poucos momentos, caracterizando uma interação mais de respostas ao interlocutor. Ainda foram considerados os aspectos formais da fala tais como: fluência, velocidade de fala, intensidade de voz, articulação e prosódia, sendo descritos apenas aqueles que chamaram muito a atenção, ou seja, que fugiram bastante do esperado para uma troca comunicativa satisfatória.

PART.5 SEXO IDADE