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LAÇOS QUE HUMANIZAM: REFLEXÕES SOBRE JUSTIÇA RESTAURATIVA E DIREITOS HUMANOS

Pedro Henrique Bezerra de Farias – UERN

Um dos maiores desafios para a vida humana na contemporaneidade tem sido lidar com o outro, com a vida social. Vivemos uma realidade cada vez mais conectada, global, de inter- relações, sobretudo, potencializada por meio de uma virtualidade. Já dizia o sociólogo Polonês Zygmunt Bauman, “vivemos tempos líquidos”, onde as principais formas de socialização é por meio da rede, o que tem diminuído nossa capacidade de relações humanas, ter sentimento pelo outro, empatia, amor...

Dessa forma, não seria diferente com o Direito. De fato, a epistemologia jurídica tem se debruçado em entender as diversas facetas desta ciência; inclusive, tem percebido uma incompletude por parte da norma jurídica e consequentemente a crise humana no Direito. Tem-se percebido, cada vez mais, que o Direito necessita estar em contato e ser perpassado por outros saberes, outras vivências.

É nesse sentido que Lyra Filho (1982, p. 4), visualiza o direito achado na rua, fruto das necessidades populares, o que ele caracteriza como uma das expressões/manifestações do pluralismo jurídico. Nesse sentido, pode se visualizar a Justiça Restaurativa como uma dessas manifestações do pluralismo jurídico. É importante ressaltar, nesse sentido, que pensar essas alternativas ao Direito não exclui a norma posta de fonte estatal. Na verdade, tem-se como proposta a absorção pelo Estado dessas estratégias.

Ademais, a Justiça Restaurativa caracteriza-se por ser um acontecimento local, comunitário, aborígene, sendo esta derivada de formas antigas de justiça comunitária, tendo conceitos ancestrais como a cura, a reconciliação e o respeito mútuo. Dessa maneira, ela vem se expandindo pelas nações a partir de resoluções por organismos internacionais, a exemplo da Resolução 2002/12 da ONU, que discute sobre a formulação de padrões das Nações Unidas no campo da mediação e da justiça restaurativa.

Nessa perspectiva, o presente trabalho tem o objetivo de refletir sobre a Justiça Restaurativa, partindo da experiência que o projeto de extensão “Direitos Humanos na Prática” nos possibilitou. Ao longo dos meses de outubro e novembro, foram ministrados pelos extensionistas 04 (quatro) módulos sobre Justiça Restaurativa e mediação de conflitos, sendo o último sobre Justiça Juvenil Restaurativa, que está mais alinhado com projeto, o qual desenvolve atividades no âmbito do sistema socioeducativo.

As discussões dos módulos ocorreram em forma de diálogo, com a comunidade em geral, estudantes de variados cursos, extensionistas do projeto, e ainda com agentes que atuam ou atuaram no sistema socioeducativo, os quais discutiram temáticas como mediação de conflitos e

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justiça restaurativa. Salienta-se que esta pluralidade de vivências possibilita uma reflexão mais complexa sobre os Direitos Humanos.

Percebeu-se, a partir dos diálogos que não existem efetivas políticas de socioeducação com relação ao cumprimento das medidas socioeducativas, sobretudo aquelas em meio fechado. Dessa forma, a medida de internação tem representado uma espécie de “ócio”, no qual os adolescentes têm a chance de refletir sobre seu ato infracional.

No entanto, nem toda reflexão é positiva se não acompanhada de efetivas ações “socioeducativas” (lazer, educação, qualificação profissional, convivência familiar e comunitária, saúde psicológica, cidadania, etc.), inclusive o direito de participar de momentos restaurativos com agentes do sistema e outros adolescentes, vítimas e sociedade civil externa à unidade.

Por outro lado, entende-se que existe uma deficiência estrutural e operacional da justiça para lidar com a socioeducação, tanto em desconsiderar a subjetividade e característica peculiar desses adolescentes, como por não efetivar a socioeducação numa perspectiva eficaz, como destacado anteriormente. Outrossim, pensar em uma política de mediação e resolução de conflitos, seria fundamental para apaziguar conflitos internos nas próprias instituições em que adolescentes cumprem as medidas socioeducativas.

É nessa perspectiva que entra a Justiça Juvenil Restaurativa, discutida no último módulo dos minicursos, a qual visa à resolução do conflito em outros ambientes, nos bairros, com pessoas que conheçam vítima e ofensor, que atuariam como mediadores. É notório que a experiência da Justiça Restaurativa possibilita a autonomia das partes e comunidade, além do senso de justiça e humanização dos sujeitos envolvidos.

De acordo com o que foi refletido durante os módulos, notou-se que a justiça restaurativa auxiliaria na restituição dos laços entre vítima e ofensor, e ainda da comunidade como um todo, e até mesmo do dano, quando for materialmente reparável ou compensação com prestação de serviços. Os sujeitos envolvidos teriam mais autonomia. O procedimento é mais informal, deixando os envolvidos mais à vontade.

Salienta-se que a Justiça Juvenil Restaurativa parte da premissa de tratar com dignidade os adolescentes em conflito, e adotar estratégias de aproximação com o ofensor e comunidade, restituindo laços e o senso de justiça. Ademais, teríamos resultados quanto à quebra de estereótipos e estigmas, e consequentemente um olhar mais humano.

Reitera-se que, no decorrer das discussões, refletiu-se sobre a existência de laços de humanidade que nos unem, e que as violações podem ser cicatrizadas, restauradas, no sentido de reunir, trazer à tona a humanidade que atravessa a todos (vítima, ofensor, comunidade), com vícios e virtudes compartilhadas.

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REFERÊNCIAS

BAUMAN, Z .Tempos líquidos. Tradução de Carlos Alberto Medeiros. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2007.

ESCOLA NACIONAL DE SOCIOEDUCAÇÃO (Brasil). Curso sobre Justiça Juvenil

Restaurativa. Disponível em: http://sinase.ceag.unb.br/moodle/mod/page/view.php?id=553.

Acesso em: 10 jun. 2016.

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MEDIAÇÃO PENAL COMO FORMA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA EM

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