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Elihab Pereira Gomes – UnP Maria Beatriz de Souza Nascimento – UnP

Historicamente a criança e o adolescente não detinham seus direitos assegurados; por isso tinham suas condições básicas de vida fragilizadas, principalmente aqueles que pertenciam a uma classe social em vulnerabilidade econômica/social. Só a partir do século XX, com a ascensão dos direitos humanos e demais conquistas da classe trabalhadora no Brasil, foi então regulamentada a Lei nº 8.069, de julho de 1990, referente ao Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Para além da Constituição Federal de 1988, o ECA garante e reafirma os direitos fundamentais para esses sujeitos, que por muito tempo foram esquecidos, expresso desde as primeiras linhas que norteiam esta lei, no Art. 1º que diz “Esta lei dispõe da proteção integral à criança e ao adolescente”.

É importante destacar que, mesmo com a efetivação de seus direitos básicos, na contemporaneidade a criança e o adolescente carregam a herança da violência marcada por seu contexto sócio histórico, sofrendo diversos tipos de abusos – físicos e psicológicos – que os levam a também reproduzirem tais condições, partindo do princípio de que os mesmos são sujeitos em pleno desenvolvimento biopsicossocial (CARVALHO, 2010).

Contudo, é de suma importância uma reflexão prévia do que historicamente entende-se por infância. Segundo Nascimento, Brancher e Oliveira (2011, p. 2), demorou muito tempo para que as ciências humanas e sociais entendessem a criança como parte integrante da sociedade e, demorou ainda mais para que as pesquisas considerassem a relação entre a sociedade, a infância e a escola, entendendo a criança como sujeito histórico e de direito.

Com o decorrer da evolução das pesquisas, foi observado que crianças e adolescentes estão em seu pleno desenvolvimento humano e que, se houver algum problema nessas fases, provavelmente surgirão dificuldades futuramente, que acarretarão problemas na sociedade, caso não revertidos a tempo. Para Papalia, Olds e Feldman (2010, p. 32), Freud considerava as três primeiras fases – do início da vida – cruciais para o desenvolvimento da personalidade. Nisso, propôs que, se as crianças receberem pouco ou muita gratificação (ou frustração, punição), correm o risco de desenvolverem fixação, que é uma interrupção no desenvolvimento que pode afetar de forma direta ou indireta a personalidade do sujeito. Ou seja, nitidamente observa-se o quão dinâmico e frágil é o momento de desenvolvimento do ser humano. Esse desenvolvimento deve ser, de forma direta, respeitado nas decisões que competem ao Judiciário, com relação às medidas aplicadas aos adolescentes em conflito com a lei.

Na medida em que a criança e o adolescente comentem algum ato que seja caracterizado como crime, esses atos são designados como ato infracional, pois segundo a Constituição Federal Vigente, tais sujeitos são considerados inimputáveis, aplicando-lhes medidas socioeducativas, que

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detalhar tal política pública de atendimento. As medidas socioeducativas objetivam, de acordo com o SINASE, a responsabilização do adolescente, a integração social e desaprovação da conduta mediante o ato infracional. Dentre as seis medidas prescritas por Lei (art. 112, ECA), focaremos a internação, a medida máxima atribuída ao adolescente.

Na aplicabilidade dessas medidas, é notório que existe um abismo no que está prescrito em Lei, do que é efetivado. O que deveria estar atrelado às práticas Restaurativas – de acordo com o art. 116, no inciso III, do ECA – apresenta caráter muito mais punitivo e retributivo. No entanto, é notório observar que o senso comum com a ajuda da mídia vem gritando diariamente frases como “bandido bom é bandido morto”, “se tem idade pra roubar, matar, tem idade para ser preso” e dentre outras que são explicitadas quase que diariamente nas redes sociais. Desta forma a sociedade acaba clamando pela punição, pelo castigo do adolescente em conflito com a lei, desconsiderando todos os condicionantes que o levaram a realizar o ato infracional.

É de suma importância transcender o debate acerca das medidas socioeducativas para além da academia e dos fóruns. Torna-se necessário levar conhecimento à sociedade, visto que esta concentra um elevado grau de preconceito para com estas crianças e adolescentes que estão saindo nas manchetes de jornais diariamente, sendo eles na sua grande maioria, moradores de periferias, negros e pobres. Há uma responsabilidade que é nossa, tanto quanto acadêmicos, profissionais, bem como cidadãos. Faz-se necessário entender que a criança e o adolescente precisam ser tratados diferente, porque de fato são. Crianças e adolescentes no geral, não apenas filho de patrão. O filho da empregada, do vendedor ambulante, o menino da favela, todos! Antes do julgamento moral pedindo “justiça” (ou seria vingança) a todo tempo, que promovamos reflexão acerca das políticas públicas voltadas à criança e ao adolescente que não estão em sua plena efetividade – quando há.

Enquanto extensionistas do projeto “Direitos Humanos na Prática”, da Universidade Federal Rural do Semi-Árido, pudemos observar que este sistema socioeducativo de Mossoró, anda longe de ser aplicado de forma desejável, isso por inúmeros fatores, sendo um deles o despreparo da equipe técnica bem como dos educadores. A lógica das práticas socioeducativas previstas no SINASE é deixada de lado, o que seria a oferta de educação, profissionalização, esporte, sendo realizadas de forma efetiva e ressocializante, acabam na verdade sendo ações que não passam de uma justiça retributiva, visando apenas punição, o que gera o falido sistema interno e também não gera ressocialização, o que é nítido, visto o grau de reincidência, sobretudo do sistema penal adulto, que é noticiado diariamente na mídia.

REFERÊNCIAS

BRASIL. [Estatuto da criança e do adolescente (1990)]. Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990, e

legislação correlata. Brasília: Câmera dos Deputados. Edições Câmera, 2010. p. 11. Disponível

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CARVALHO, C. M. Violência infanto-juvenil, uma triste herança. In: ALMEIDA, M. da G. B.

A violência na sociedade contemporânea. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2010. p. 30-43.

Disponível em: http://ebooks.pucrs.br/edipucrs/violencia.pdf. Acesso em: 16 mar. 2018.

NASCIMENTO, C. T.; BRANCHER, V. R.; OLIVEIRA, V. F. A construção social do conceito

de infância: algumas interlocuções históricas e sociológicas. Santa Maria: UFSM, 2011. p. 2.

PAPALIA, D. E.; OLDS, S. W; FELDMAN, R. D. Desenvolvimento humano. 10. ed. Porto Alegre: AMGH, 2010. 32 p.

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DESESTIGMATIZAÇÃO DA CRIMINALIZAÇÃO JUVENIL E A

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