• Nenhum resultado encontrado

LAVA JATO: E SE O FORO PRIVILEGIADO ACABAR?

No documento O Supremo Tribunal Criminal: o supremo em 2017 (páginas 107-110)

Silvana Batini 09 | 05 | 2017

O fim do foro não retiraria o Supremo do cenário da Lava Jato. Longe disso

O envolvimento de autoridades na Lava Jato determinou, desde o início, uma partição de competências extremas: pessoas comuns julgadas em Curitiba, em primeiro grau de jurisdição, e deputados federais e senadores no Supremo, o último grau. Enquanto o núme- ro de envolvidos no Supremo estava em torno de poucas dezenas, pôde a duplicidade de foros ser administrada de forma razoável. O inevitável descompasso de velocidades entre a primeira e a última instância gerou algum desgaste. Acabou diluído, porém, em meio a algumas medidas duras e inéditas que o tribunal adotou – a prisão de um senador, o recebimento da denúncia contra o presidente do Senado e seu afastamento da linha sucessória, além do afastamento do presidente da Câmara.

Entretanto, a recente aceleração de delações premiadas espargiu autoridades investigadas em todos os graus da estrutura judiciária e em diversos estados da federação, além de acumular mais nomes na conta do Supremo. As inevitáveis comparações entre o ritmo ágil das ações de Curitiba e o compasso lento das ações do Supremo retorna- ram com força. O foro privilegiado está em xeque e agora Supremo e Congresso avançam em medidas para reformá-lo.

No Senado, a proposta de emenda constitucional aprovada em primeiro turno de votações é radical e preserva o foro apenas para

O SUPREMO EM 2017

Mas como ficaria a Lava jato neste cenário de mudanças? A proposta de restrição de foro a ser apreciada pelo Supremo ainda este mês, em princípio, teria pouco impacto na Lava Jato. Até onde se sabe a maioria dos investigados detentores de foro teriam praticado seus crimes no exercício de seus cargos. A menos que o Supremo amplie a proposta do ministro Barroso para decidir também a questão da competência quando o detentor perde o mandato no curso da ação, pouca coisa mudaria nestes processos.

Já a PEC do fim do foro no Senado teria impacto variado nos processos da Lava Jato, dependendo do momento processual em que entrasse em vigor. Se a PEC fosse aprovada hoje – 09 de maio de 2017 –, somente as investigações contra Eunício de Oliveira e Rodrigo Maia permaneceriam no Supremo e apenas enquanto eles fossem presidentes dessas casas. Dificilmente um processo contra eles terminaria antes de seus mandatos. Os demais casos envolven- do parlamentares sofreriam o chamado declínio de competência, e seriam enviados para juízes de primeira instância pelo Brasil afora.

No caso de inquéritos instaurados contra deputados federais e senadores, a situação seria simples. Não há foro privilegiado para investigação, a polícia que investiga um deputado é a mesma que investiga um homem comum. O que muda é a forma de tramitação do inquérito que, nos casos de autoridades, são acompanhados de perto pelo ministro do Supremo que detém a relatoria. Com o fim do foro, a tramitação de um inquérito contra um deputado ou sena- dor passaria a ser comum, entre polícia e Ministério Público, com intervenção judicial apenas em casos pontuais de necessidade de medidas constritivas, como quebras de sigilo, mandados de busca ou mesmo prisões.

Nos casos em que já há denúncia oferecida, ou mesmo recebida, em princípio o declínio para a primeira instância seria imediato, com aproveitamento de todos os atos já praticados no processo. Por se tratar de alteração superveniente da competência, o juiz de primeiro grau receberia o processo no estado em que se encontra, bastando prosseguir com ele. Neste caso, mais cedo ou mais tarde, o processo poderia, em grau de recurso, ir parar novamente no Supremo, que um dia reveria, em última instância, o processo que ele mesmo co- meçou a julgar.

O trâmite de deslocamento de processos entre instâncias diferen- tes envolve burocracia e pode consumir algum tempo. Tempo para

O SUPREMO TRIBUNAL CRIMINAL

que novos envolvidos tomem pé dos fatos. Nada que não possa ser superado com tecnologia e racionalidade. Isto já vem acontecendo na Lava Jato com réus que perderam o foro privilegiado, como foi o caso de Eduardo Cunha, cujo processo ganhou notória agilidade ao ser deslocado para a Curitiba. Não se pode desconsiderar, todavia, o fato de que, tanto Sergio Moro quanto a força tarefa do Ministério Público, trabalham com exclusividade nos casos da Lava Jato. É um modelo que não poderá ser reproduzido em todos os casos de declínio de competência.

O fim do foro retiraria também a competência do STJ para inves- tigar e processar os governadores citados nas delações. Igualmente, deputados estaduais e prefeitos teriam que se haver com a justiça de primeiro grau. Não, necessariamente, com Sergio Moro, já que a competência de Curitiba, segundo decisão do Supremo, se restringe a fatos envolvendo a Petrobrás.

O fim do foro, portanto, não retiraria o Supremo do cenário da Lava Jato. Longe disso. Basta lembrar que as recentes decisões de revogação de prisões preventivas envolvem réus sem foro privilegiado. Genu, Bumlai, Eike Batista e José Dirceu e agora Palocci são cidadãos comuns. O Supremo analisa seus casos por força da competência ampliada que tem para examinar habeas corpus, sem paralelos no direito comparado.

Ou seja, mesmo que essas ações não sejam mais julgadas inicial- mente pelo Supremo, provavelmente só chegarão ao fim quando o Supremo eventualmente se pronunciar sobre elas. No final, como o caso de Palocci ilustra tão bem, para o bem e para o mal, o Supremo continuará ditando os rumos da Lava Jato. Quanto a isto, não há projetos de alteração à vista.

17

TEMER E AS GRAVAÇÕES:

No documento O Supremo Tribunal Criminal: o supremo em 2017 (páginas 107-110)