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CAPÍTULO 3: PRESSUPOSTOS METODOLÓGICOS

1. LENTE TEÓRICA

Como ressaltado no capítulo de revisão da literatura, nos estudos de Organizações Sociais é possível verificar o uso de três lentes teóricas: a terceirização, a privatização e a publicização. Este estudo utiliza a lente teórica de publicização, com o viés de parceria. Conforme analisado na revisão de literatura e com base do PDRAE (Brasil, 1995), acreditamos que a privatização não é uma lente adequada para o estudo das Organizações Sociais uma vez que não há transferência de patrimônio público as entidades não-estatais – elas gerenciam equipamentos ou programas públicos, sem que haja transferência de propriedade. Nesse sentido, a lente de terceirização também não se aplica, pois a entidade assume a gestão de todo o equipamento ou programa – e não apenas as atividades auxiliares.

Dessa forma, a lente teórica utilizada nesta pesquisa é a de publicização – designada no Plano Diretor como forma adequada de gestão para os serviços sociais e científicos. No Brasil, o termo “publicização” e os estudos sobre este fenômeno surgiram a partir da publicação do Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado, em 1995.

A partir da publicação do PDRAE, diversos autores estudaram esse fenômeno, dentre eles: Abrucio (2007), Bresser-Pereira (1996), Costin (2005), Falconer (1999) e Martins (2007). Além disso, a tese de doutorado de Oliveira (2016), que analisa Organizações Sociais em governos de partido de esquerda (Bahia e Pernambuco) já parte do pressuposto que o que existe entre poder público e uma OS é uma relação de parceria.

Assim, a publicização torna-se um conceito importante para entender a relação da administração pública com o terceiro setor, seja com Organizações Sociais (OSs), com Organizações da Sociedade Civil (OSCs) ou Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIPs). Torna-se, também, importante para analisar a implementação de políticas públicas cuja execução não é exclusiva do Estado.

A publicização é fenômeno diferente da privatização, pois não envolve preço, lucro ou aquisição de ativos por particulares. O que é transferido à sociedade é a

36 gestão de um equipamento ou serviço público, mediante a qualificação de uma organização não-governamental – ONG – e a assinatura de um Contrato de Gestão que estabelece as bases da parceria. Concretamente, fixam-se metas associadas a serviços a serem prestados por esta ONG e, como contraprestação, valores que o poder público deve repassar. (Costin, 2005, p.110, grifo nosso).

Com o surgimento desse conceito, tornou-se possível um novo posicionamento nas análises de parcerias entre o poder público e as Organizações Sociais. É possível verificar que os estudos na área, principalmente boa parte da literatura jurídica, tem um posicionamento crítico em relação à prestação de serviços pelo terceiro setor, com a argumentação de que equivale à terceirização e à privatização – como é o caso de Violin (2009). Já na área da administração pública e das ciências sociais, muito pelo reconhecimento da importância do Plano Diretor de Reforma do Aparelho do Estado, o posicionamento de publicização entre poder público e o terceiro setor é aceito com mais frequência, como é caso de Pinto (2000), Sano e Abrucio (2008), e Oliveira (2016).

Até o momento, a literatura estudada na temática não apresentou publicização como lente teórica declaradamente. Sendo assim, damos um passo a mais e defendemos que a publicização pode ser tanto um conceito, bem como um posicionamento teórico (ou lente) utilizado por autores que estudam as relações entre a administração pública e o terceiro setor, especialmente no caso das OSs – e passa a ser importante, também, para o campo de estudos da implementação de políticas públicas. Bresser-Pereira (1997) define a publicização como o ato de transformar uma organização estatal em uma organização pública não-estatal.

[...] a reforma do Estado [...] não implica em privatização, mas em publicização - ou seja, em transferência para o setor público não-estatal. A palavra publicização foi criada para distinguir este processo de reforma do de privatização. E para salientar que, além da propriedade privada e da propriedade estatal existe uma terceira forma de propriedade relevante no capitalismo contemporâneo: a propriedade pública não estatal (Bresser-Pereira, 1997, p. 25).

Nas análises realizadas sobre publicização, verificamos que a denominação de “parceria” une-se ao termo. Na administração pública, o conceito de parceria é amplo:

Parceria significa todos os ajustes entre setor público e setor privado para a consecução de fins de interesse comum, como concessões, permissões, convênios, contratos de gestão e quaisquer outras modalidades admissíveis perante o nosso ordenamento jurídico (Di Pietro, 2006, p. 13).

Em relação à parceria, as Organizações Sociais são especificadas na definição proposta por Modesto (1997, p. 318).

No aspecto da parceria, as organizações sociais definem-se como instituições do terceiro setor (pessoas privadas de fins públicos, sem fins lucrativos, constituídas voluntariamente por particulares, auxiliares do Estado na persecução de atividades de

37 relevante interesse coletivo), pois possuem o mesmo substrato material e formal das tradicionais pessoas jurídicas privadas de utilidade pública.

Martins (2017) afirma que, distinguindo-se da ideia de terceirização, que é uma prestação de serviços, e de privatização, que envolve a venda de ativos e a perda de controle, a parceria baseia-se na confiança e na interdependência. Esse termo faz referência a um tipo de relação entre “iguais”, pautado em contratos com prazos e responsabilidades mútuas, devendo ser respeitados por ambos. Em contraste com a visão de “fornecedor” nos contratos de terceirização, pode-se dizer que a parceria possui um caráter negocial, no qual prevalece entre as partes o princípio do “vamos combinar”.

Para Martins (2017), a relação de parceria entre o Estado e determinada Organização Social de Cultura possui o caráter de fomento, uma vez que este é apoio, estímulo e/ou indução da intervenção ocasionada pela parceria, buscando satisfazer um conjunto de beneficiários. Diferenciando-se da prestação de serviços e de relações comerciais, o fomento é um processo, não um ato; é o processo de apoiar, estimular, induzir parceiros a gerar bens ou serviços a certos beneficiários.