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CAPÍTULO 4. A VIDA É A ARTE DO ENCONTRO: ESQUADRINHANDO OS

4.2 Letramentos, Identidades e Gênero(s): a corrente se forma

é uma característica e um compromisso, não apenas das lideranças de saraus, mas também de diversos escritores negros e marginais/periféricos e de grupos organizados do Movimento Negro e Movimento Cultural Hip Hop. Não são poucas as ações voltadas para a consolidação desse compromisso e nos encontros poéticos não é diferente. Desde a ornamentação do espaço físico até a seleção de textos e manifestações artísticas apresentadas, vemos o sarau seguir um roteiro com vistas a elaborar práticas letradas que cumpram com o compromisso assumido, ainda que não haja uma preparação prévia.

No segundo encontro observado, Osmar, em sua apresentação, ensina para o público os nomes de cada um dos toques tradicionais da capoeira42. Tocando um por um no berimbau e contando um pouco de sua história, detém-se um pouco mais no toque chamado de Cavalaria, segundo ele:

Os negros eles foram libertos, mas eles tavam jogando capoeira e a capoeira foi... Ela foi recriminada né... Tava no código penal então as pessoas não podiam jogar capoeira, tavam libertos, mas não podia jogar capoeira, então eles tavam jogando capoeira na praça [toca no berimbau um dos toques ensinados anteriormente,

como se estivesse na roda de capoeira] e a capoeira comendo

solta [continua tocando o berimbau], aí quando a polícia chegava, a cavalaria chegava, aí o berimbau anunciava [muda para o

Cavalaria, para demonstrar como os capoerias faziam na época alertar sobre a chegada da polícia] aí as baianas já entravam, as

negras entravam pra dentro... Pra dentro da roda e começava a sambar, aí começava o samba de roda [toca o samba de roda no

berimbau, sem parar de falar] aí a polícia parava na beira da roda

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Os toques foram: Regional (chamado por ele de tradicional da capoeira), Angola, Samba de Roda, segundo ele, onde nasceu o samba realmente, Iúna, um toque cujo nome ele não lembrava e, por fim, a cavalaria.

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e falava: „o que é isso aí negro?‟ „é samba de roda‟ „não é capoeira não?‟ „não, é samba de roda‟, aí a polícia virava as costas e continuava a capoeira [volta para os toques tradicionais da

capoeira]. Então é... O samba de roda... A capoeira foi disfarçada

no samba de roda pra poder praticar a capoeira43.

O objetivo da apresentação era fazer o público se familiarizar com os toques da capoeira, conhecer a musicalidade do berimbau e suas possibilidades sonoras. De fato, a diferença entre uma música e outra ficou perceptível, até mesmo para ouvidos destreinados como os da pesquisadora. Porém, o que chama a atenção foi a estratégia usada por Osmar, que conseguiu prender a atenção do público. Primeiro, pelo uso do instrumento musical e a demonstração prática do que estava tentando ensinar; segundo, pelos conhecimentos históricos e políticos transmitidos, que enriqueceram sua demonstração e também valorizaram a contribuição artística da capoeira e a mobilização política dos negros marginalizados.

Por si só, a apresentação já seria exemplo suficiente de uma prática de multiletramentos, uma vez que mobilizou diferentes semioses e atendeu à diversidade cultural que se pretende atingir nas escolas e também em espaços como os saraus (LEMKE, 1998; KALANTZIS; COPE, 2006b ROJO, 2013). Porém, todos os espaços dos saraus são aproveitados e a discussão levantada por Osmar não se encerrou aí. Na sequência, Douglas Alves, antes de apresentar Celinha Reis, a próxima a assumir o microfone, retomou o tema da criminalização da cultura negra, para falar sobre a marginalização do funk. Descreveu uma situação de repressão violenta da polícia militar a um baile funk próximo a sua casa e destacou a forte relação entre a capoeira e o contexto atual. Como já dissemos, Celinha fala sobre a greve dos professores, também destaca a violência estatal e policial e recita um poema sobre a situação da educação dos pobres.

Raquel Almeida, antes de chamar Seu Zé Corrêa, relata outro caso de violência policial a um baile funk:

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O que me entristece em tudo isso... A ação da polícia, infelizmente, é previsível, mas o que me entristece de verdade é ver que muitos MC‟s tão apoiando isso, apoiando a invasão da polícia na favela contra o funk, a redução da maioridade penal... E entre outras coisas assim que... Que me espanta né... Na época que eu comecei a ouvir rap era totalmente ao contrário e o funk tá passando por isso né, que o rap passou 80, 90, tá passando por isso agora... Eu não tô legitimando aqui algumas coisas né, que a gente sabe que tem dentro do funk, mas eu acho que é uma coisa de... A gente pensar, se posicionar44.

É notável o alerta ao caráter histórico da ação violentamente opressora da Polícia Militar, enraizado nas estruturas escravocratas da sociedade brasileira. Além disso, a sequência das apresentações tratou também da importância de valorizarmos a produção negra e pobre, independente da aprovação dos espaços privilegiados e das instâncias de poder. As falas completam um momento de aprendizado e militância, por um lado, e valorização e divulgação da arte e cultura negra e periférica, por outro.

Outro momento crucial para demonstrar a importância dos saraus para a formação de seus frequentadores ocorreu no terceiro encontro observado. João do Nascimento deu um importante relato sobre sua experiência e suas dificuldades no sarau:

Quando eu cheguei aqui eu... Falava... Era muito difícil eu falar aqui né... É... Errava todas as palavras, eu acho que foi um grande aprendizado e eu aprendi também a imaginar as coisas tudo que eu via ou era natural ou pra mim não era importante, não tinha... nenhuma... Pra mim não interessava ou era tudo normal né... E aí todo mundo fazia suas poesias temáticas com os acontecimentos e as minhas simplesmente eu fazia poesia mais voltada pra

[incompreensível] e eu tinha umas 10 poesias que falava da terra,

do chão né, é mais ou menos assim né... E aqui eu vejo todo mundo tratando dos seus problemas [incompreensível] eu aprendi também que era obrigado a gente falar também das coisas do que acontecia e não era natural, precisa melhorar45.

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Transcrição do encontro do dia 09 de maio de 2013.

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Na sequência, ele recita “uma poesia ou história, sei lá”46, chamada Realidade na Pele, como exemplo da mudança temática e política provocadas pela participação nos saraus.

Escassez lá pelo Norte E a seca no nordeste Zé no sul veio trabalhar, Cinco filhos barrigudos Guatambu era o canudo O diploma que Zé tinha; Chegou na cidade grande Arrochou-se na construção Hora extra e empreitada, E Zé nem tinha tempo De falar mais com Maria; Queria mesmo era o pão Para nutrir a família Apertado Zé tirava Todo mês ele guardava Do salario uma quantia; Certo dia Zé entrou Destemido na viela Só pensando em comprar Um barraco na favela, Pois já era do seu povo Quase toda moradia; Foi aí que Zé comprou Um barraco de madeira Na beirada de um córrego Pendurada na ladeira, Lá se foi, Zé e Maria, E mais toda broquelada! A mais velha já mocinha Pelos anos que passaram Logo veio um pretendente, Era filho de Antônio;

Que de lá daquelas bandas Também era retirante, E formaram o noivado Convidaram a parentela

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Transcrição do encontro do dia 11 de julho de 2013. Fala de João do Nascimento ao tentar definir o gênero de seu “texto”

127 Para o grande casamento Zé de Antônio e Manoela; Oito palmos de terreno

Com cinco palmos em largura Foi erguida a estrutura

Seu Zé pai de Manoela Ajudou Zé de Antônio Seu genro, marido d‟ela A fechar o corredor,

Transformando em moradia. Esta é mais uma história Fruto da minha agonia.

O poema segue a forma composicional dos folhetos de cordel, sobretudo pelos versos curtos ritmados pelas rimas e pelo próprio ritmo dado pela métrica. Outra característica interessante é a dificuldade do poeta em determinar o gênero de seu texto. De fato, as semelhanças com a narrativa são marcantes, pois personagens, espaço, tempo, fazem parte do texto, no entanto não podemos negar a estrutura poética rígida e em alguns momentos quase podemos cantar o texto. Essas são características dos folhetos de cordel e de outros gêneros típicos da literatura de cordel (AYALA, 1988; ÂNGELO, 1996), que nos colocam diante de mais um evento de multiletramento.

Porém, a grande mudança está no tema, no sentido bahktiniano, pois a ideologia e a militância assimiladas nos encontros passam a moldar os conteúdos temáticos abordados por ele. Vemos aí as contribuições da “diáspora nordestina” (BORGES, 2007) para a construção de uma poesia híbrida e original.

Podemos observar semelhante (con)fusão de gêneros no poema Cara Estampada, de Michel Yakini. Embora não se trate exatamente das mesmas motivações da literatura nordestina, enfrentamos as mesmas dificuldades em definir o gênero do texto abaixo. Mas, assim como no texto de João do Nascimento, tal dificuldade apenas o torna ainda mais interessante.

Cara Estampada

Hoje o meu rosto estava estampado na portaria da escola, pra todo mundo ver e se reconhecer.

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Sabe aquelas fotos que ficam na entrada das Faculdades, dos prédios importantes pra mostrar quem é que da as caras por ali? Pois é, hoje minha cara estava lá, na escola que eu estudei.

Minha cara estampada no informativo público, bem na entrada, na recepção.

Deve ter alguma coisa a ver com reparação, superação da invisibilidade, com tratamento cidadão, é época de um país de todos, não é?

Minha cara estava lá, me instruindo os caminhos, me ensinando a viver com segurança.

Minha cara estava lá, me dizendo pra evitar a noite, me explicando como devo carregar a marmita na bolsa.

Hoje aprendi a maior das lições.

Me senti envergonhado, por tantas vezes não ser um aluno exemplar, de estar desmotivado, enquanto a escola me dá tanto valor. Por quê?

A resposta tá na minha cara, só não vê quem não quer.

Minha escola mesmo depois de anos, faz boas parcerias com a Policia Cidadã da cidade e juntas me deram o maior dos ensinamentos.

Me ensinaram que tudo ficará bem, seguro, basta alguns cuidados. Basta seguir algumas dicas:

Evitar ao máximo ficar no ponto sozinho, evitar viajar em vagões de trem vazios, e caminhar rápidos em trajetos curtos.

E principalmente se eu seguir um conselho essencial: O de não CRUZAR COMIGO MESMO por aí.

Obrigado Escola Pública! Obrigado Policia Cidadã!

O que seria de mim se vocês não existissem?47

O texto foi feito “em resposta” ao panfleto informativo da Polícia Militar, reproduzido abaixo, que estava sendo distribuído nas escolas da região. Pensando nas consequências que o conteúdo racista da propaganda poderia causar nas crianças e adolescentes negros/as que vissem o panfleto, Michel resolveu denunciar a ação ao SOS Racismo e também fazer essa denúncia no sarau ao apresentar seu “texto” inspirado no tema.

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Disponível em: http://elo-da-corrente.blogspot.com.br/2013/04/cara-estampada-por-michel- yakini.html. Acesso em: 15 abr. 2014.

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Figura – Panfleto da Polícia Militar do Estado de SP. Fonte: http://elo-da- corrente.blogspot.com.br/2013/ 04/cara-estampada-por-michel-yakini.html.

A leitura do texto junto à imagem do panfleto já seria suficiente para entendermos o “relato” como uma ironia do oprimido diante do opressor. O que poderia ser entendido como um agradecimento a uma tentativa de “reparação, superação da invisibilidade, com tratamento cidadão”, passa a ser uma ridicularização da ação de distribuir um panfleto retratando um criminoso negro em uma escola onde os alunos são majoritariamente negros. No blog do Elo a foto foi publicada junto ao texto e no sarau o panfleto circulou entre os participantes e Michel explicou o contexto e as atitudes tomadas.

A ironia também é reforçada pela palavra “cara” usada indiscriminadamente num reforço à animalização do sujeito negro. Não era seu rosto que estava ali, mas sua “cara”. Além disso, a “cara” que estava ali não era de fato o rosto do eu-lírico do texto, mas sim a “cara” do povo negro. Há uma preocupação com a identificação dos jovens negros com o criminoso no panfleto, que representa mais do que um indivíduo, pois representa todo um povo. A ironia, base do texto, é reforçada pela escolha do relato pessoal como gênero. Porém, a estrutura do texto, sobretudo a paragrafação atípica para um texto em prosa, lembrando, antes, uma divisão em estrofes, nos tira dos limites do relato e da prosa para nos fazer transitar entre uma prosa poética e um relato pessoal. Por

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outro lado, a linguagem é totalmente informal e reproduz a fala, o diálogo cotidiano, do início ao fim do texto. O que não é característica nem da poesia, nem do relato, nos deixando novamente impossibilitados de definir o gênero a que pertence o texto.

No dia dessa apresentação houve uma situação que tornou ainda mais complexos os sentidos construídos ali. Um policial, cuja viatura estava parada há algum tempo na porta do bar, é convidado a também se apresentar e ele diz ter visto a reportagem no SPTV48 e queria conhecer o espaço, também se colocando à disposição para garantir a segurança no local, caso fosse necessário.

O trabalho que você faz, certo... É... Tanto é que tá na imprensa né? Ó a colega fazendo mestrado, né? Tá fazendo mestrado né? É sua tese de mestrado né? Então o negócio é legal, se existe uma coisa ilegal não é aqui, certo? Não é aqui que a polícia vai procurar ilegalidade, é lá fora, né? Aqui a gente tem pessoas de bem, são moradores da comunidade, como eu falei pra você, eu fui morador da comunidade também...

Muitos desconfiaram das reais intenções do policial, uma vez que ele chegou exatamente no dia em que foi feita uma denúncia contra a Polícia Militar e Michel fez questão de entregar a ele a reclamação e pedir providências. Mas é inegável sua tentativa de legitimar seu discurso por meio de uma identidade comum, colocando-se no mesmo lugar social e identitário daqueles ali presentes. Além disso, é notável o respeito pelas instâncias legitimadoras do Estado, no caso ali a universidade, representada na figura da pesquisadora, que havia se apresentado antes dele, e pela mídia, que havia veiculado a reportagem sobre o sarau naquele mesmo dia.

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Nesse dia foi ao ar uma reportagem no SPTV sobre o Elo da Corrente, fruto do trabalho de dois jornalistas do bairro de Pirituba. Segundo Michel, foi a segunda vez que a Rede Globo os procurou para realizar a matéria, porém, na primeira oportunidade a proposta não condizia com a ideologia do sarau, por isso eles recusaram, mas dessa vez, ainda segundo ele, tudo foi negociado, respeitando os interesses e ideologias do espaço. Veja a reportagem completa em:

http://g1.globo.com/sao-paulo/parceiro-sp/noticia/2013/04/sarau-em-pirituba-mistura-literatura- capoeira-e-musica.html. Acesso em: 15 mai 2013.

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Embora seja um espaço de entretenimento e apreciação estética, nos saraus há momentos de tensão e o predomínio de questões polêmicas e dolorosas, como o racismo, contribui para essa tensão. Nesse contexto, a cultura nordestina torna-se ainda mais importante, um dos elos fortes do sarau, dentre outras coisas, por descontrair, divertir e politizar o ambiente por meio de uma poesia intensa, altamente humanizada e sensível. Seu Zé Corrêa, Martinho da Bahia, Douglas Alves, João do Nascimento e Eunice são alguns dos nomes que priorizam a cultura do norte e nordeste do Brasil em suas intervenções. Em suas apresentações, as barreiras dos gêneros são rompidas e as semioses envolvidas geram efeitos de sentido que divertem e ensinam.

Seu Zé Corrêa quase sempre canta e prefere o aboio, música bastante cantada entre os vaqueiros nordestinos. A música tem um tom sério, quase soturno, porém as temáticas abordadas nas letras cantadas por ele nem sempre condizem com o ritmo, ainda mais sério em sua voz grave e forte. Histórias de maridos traídos e rejeição de mulheres são acompanhadas com seriedade pelo público que termina rindo das anedotas. Em outros momentos o tema é mais sério e com a finalidade de ensinar algo, como por exemplo, o aboio sobre a lei seca e os riscos de dirigir embrigado, mas a mensagem sempre é transmitida de maneira leve e divertida.

Martinho da Bahia, conhecido pelos versos que introduzem sua participação no sarau49, é um dos maiores admiradores dos saraus. Frequentador do Elo e de outros encontros, além de eventos sobre literatura da periferia, afirmou, certa vez “a melhor coisa que inventaram foi esse negócio de sarau, se eu pudesse ia em todos”. Em uma conversa no I Seminário de Literatura da Periferia50 disse ter vários livros e nem sempre consegue ler todos, mas ele

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Sempre que é chamado para assumir o microfone, quem o apresenta e também ele mesmo quando começa, recita esses versos: “Martinho da Bahia/ transmitindo alegria/ o homem que brilha/ que transmite alegria/ pra você e sua família”.

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A Feira foi entre os dias 15 e 17 de março de 2013 no Centro Cultural da Juventude. Nesta primeira edição, foi voltada à difusão de publicações e produções culturais da periferia, por meio, dentre outras coisas da venda de publicações da literatura periférica. Ocorreram oficinas e mesas

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compra para incentivar e apoiar o trabalho dos poetas. Martinho da Bahia e Douglas Alves cantaram em todas as suas apresentações. Forró, rastapé, frevo, ciranda, coco, embolada foram alguns dos ritmos apresentados, quase sempre acompanhados das palmas do público ou de instrumentos de percussão e berimbau. Eunice, nas duas apresentações que a vi, falou sobre o projeto de construção de uma universidade livre em Perus e em uma delas recitou uma letra de Luiz Gonzaga. O fez de tal modo e com tal entonação que só foi possível descobrir que se tratava de uma letra de música quando ela anunciou ao final.

A presença constante de manifestações ligadas ao movimento cultural hip hop tornam ainda mais ricas as práticas de letramentos e multiletramentos. Como vimos no capítulo II, o hip hop é um movimento cultural multissemiótico por natureza. Nos quatro encontros observados, o rap e o grafite foram mais presentes. A grande diferença entre o rap no movimento hip hop e o rap nos saraus é a ausência da base musical, o que evidencia ainda mais as rimas e a entonação dos MC‟s. A estrutura poética do rap é indiscutível, porém suas características estilísticas, sua forma composicional e, sobretudo, a entonação dos poetas/rappers/declamadores criam efeitos de sentido que enriquecem ainda mais as práticas de letramentos e multiletramentos presentes nos saraus.

Algumas apresentações possibilitaram a visualização da diferença entre recitar uma poesia e “cantar” uma letra de rap. Embora seja inegável a estrutura poética das letras de rap, o gênero apresenta certas características que o distingue da poesia, ao menos no que se refere à declamação. Um representante do grupo Juventude e Atitude, da zona norte de São Paulo, foi ao sarau pela primeira vez no encontro do dia 11 abril de 2013. Em sua apresentação tenta “recitar uma letra de rap”, chamada “Brasil, Terra dos Índios”. Após apresentar bastante dificuldade para lembrar a letra, declara “pô, eu sei, eu sei fazer em freestyle, mas recitar é mais difícil”. Diante disso, o público pediu para que fizesse

de debates sobre o tema em conjunto com o I Seminário de Literatura da Periferia, organizado

pelo Coletivo Cultural Poesia na Brasa. Ver mais em:

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o freestyle e então a letra foi apresentada em um estilo entre cantado e falado, típico do rap. A mudança na entonação também é marcante para enfatizar o tom de protesto e revolta contra o colonizador, o que se perdeu durante sua tentativa de apenas “recitar a letra”.

A apresentação de Mano Merenda, na mesma noite, deixa ainda mais evidente essa diferença. O rapper “fez uma rima”, a letra de rap transcrita abaixo, em homengem ao Elo da Corrente.

Sarau uma mistura de rap, sertanejo e berimbau Nossa poesia, Brasilândia lado a lado

Com muita literatura tamo junto e misturado Que deus me abençoe e me faça progredir Mto amor no coração aos manos que estão aqui Inevitavelmente, é pra bater de frente

Urbanos FM, nós do Elo da corrente Sentimento verdadeiro

pras guerreira e pros guerreiro

Que mantém a resistência, Zumbi conselheiro Os versos ficam aqui, mas não vamos desistir Nossa luta continua mesmo até depois do fim Pregando a palavra, aí parceiro se envolve Esquece 38, AR15 e sua 9

E pra todos os poetas Tamo aqui firme e forte

Em seguida recitou o poema Sou Homem, Sou Mais, resultado de um projeto desenvolvido com moradores em situação de rua.

Sou homem, sou mais

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