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Licenciaturas Interdisciplinares: lições do percurso

No documento Por uma formação para a docência (páginas 96-107)

Na leitura da lição não se busca o que o texto sabe, mas o que o texto pensa. Ou seja, o que o texto leva a pensar. Por isso, depois da leitura, o importante não é o que nós saibamos do texto o que nós pensamos do texto, mas o que - com o texto, ou contra o texto ou a partir do texto - nós sejamos capazes de pensar (LARROSA, 2010, p. 142).

A primeira lição é aquela que indica a interdiscipli- naridade, com a permanente presença da transversalidade, como o caminho mais promissor a ser seguido pelas licencia- turas como forma de enfrentar as fragmentações, historica- mente, constituídas nos cursos de formação de professores. Cabe aqui ressaltar que embora não tenhamos (ainda) regu- lamentações específicas para as licenciaturas interdiscipli- nares, os “Referenciais Orientadores para os Bacharelados Interdisciplinares e Similares” (Portaria SESu/MEC nº 383, e, posterior, Parecer CNE/CES Nº:266/2011), se constituíram em significativo instrumento de orientação para os dese- nhos curriculares propostos pelos Cursos de Bacharelados Interdisciplinares. Neste sentido, as significativas mudanças curriculares dos Bacharelados Interdisciplinares que resulta- ram num expressivo sucesso acadêmico, impulsionaram a cria- ção de Licenciaturas Interdisciplinares a partir de estruturas curriculares organizadas em grandes áreas do saber: Artes, Humanidade, Saúde, Ciências e Tecnologias, já consolidadas pelos cursos de bacharelado.

A criação de Cursos de Bacharelados e de Licenciaturas Interdisciplinares indicam a possibilidade de superação das

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fragmentações dos conhecimentos acadêmicos a partir da religação dos saberes em grandes áreas trabalhadas por meto- dologias ativas de ensino-aprendizagem. Os desafios, agora, ficam por conta de não cair nas armadilhas da “justaposição” ou da “fusão” dos conhecimentos e, ao mesmo tempo, construir arquiteturas curriculares que favoreçam as conexões e inter- conexões entre as licenciaturas interdisciplinares e as escolas de educação básica. Dificilmente, a transversalidade poderá se efetivar, na perspectiva da qualificação da formação de educa- dores e educadoras, se não houver um diálogo efetivo com (no lugar do para) a educação básica.

A segunda lição focaliza as persistentes divisões entre teoria e prática. Elas remetem às históricas separações entre os conhecimentos pedagógicos e os conhecimentos especí- ficos das áreas, metamorfoseadas, por vezes, em diferentes formatos, tendo no “esquema 3+1” sua versão mais estereoti- pada. Relacionam-se, também, com os estágios nas licencia- turas. Novamente, a lógica curricular impõe a hierarquização da teoria sobre a prática. Não à toa, em geral, os estágios são deixados como ritual de encerramento do curso, uma espécie da “hora da verdade”.

Como consequência do distanciamento entre a formação inicial de professores e a educação básica, a educação conti- nuada para professores em exercício da docência, tem abriga- do, conforme Gatti (2008) a um conjunto amplo e heterogêneo de práticas, programas, projetos, cursos etc., que dificulta, inclusive, precisar a compreensão acerca da expressão forma- ção continuada. Estas problemáticas apontam para desafios a serem enfrentados pela interdisciplinaridade na formação de professores, na medida em que, possam fazer da “escola

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– comunidade” um espaço vivo de interlocução entre os saberes da docência que, no limite, são teórico-práticos.

A terceira lição remete a Anísio Teixeira e a criação do Instituto de Educação (1932) como experiência pioneiríssima na formação do magistério. Deste projeto, muitos ensinamentos! Um deles, diz da exigência de que a formação de professores, para todos os níveis, aconteça em universidades onde ensi- no, pesquisa e extensão estejam presentes em todo o percur- so formativo. Depois, a sensibilidade de perceber que o como ensinar se relaciona com o que ensinar e para quem ensinar. Não por acaso, o Instituto de Educação congregava formação docente com a formação dos níveis de educação básica exis- tentes à época. Nesta direção, importa frisar que, de acordo com o “Texto orientador para a reunião acerca da Política Nacional de Formação de Professores para a Educação Básica Brasileira”, elaborado pela Comissão do Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação, Portaria CNE/CP nº 1, de 28 de janeiro de 2014,

a formação docente, inicial e continuada, para a educação básica, deve ser assumida em regime de colaboração pelos entes federados e respectivos sistemas de ensino e desen- volvida pelas instituições de educação superior, com o apoio técnico e financeiro do Ministério da Educação (MEC), e constitui-se em processo dinâmico e complexo direcionado à melhoria permanente da qualidade da educação e à valori- zação profissional (BRASIL, 2014a, p. 37).

Teremos, para além da Universidade Federal do Sul da Bahia, novas e outras universidades anisianas?

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