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CAPÍTULO II – ESTUDO EMPÍRICO

2.1. Enquadramento teórico: literacia para a saúde

2.1.3. Literacia para a saúde na adolescência

Durante a última década tem havido progressos consideráveis para entender os fatores que afetam os adolescentes (10-19 anos de idade) (WHO, 2013) e a introdução de intervenções para atender às suas necessidades de saúde. Apesar disso, muitos ainda não têm o apoio necessário para o seu desenvolvimento, incluindo o acesso à informação, competências e serviços de saúde.

Uma em cada cinco pessoas no mundo, ou seja, 1,2 biliões de pessoas são adolescentes. A ideia geral é que os adolescentes são saudáveis. Eles sobreviveram a doenças da infância precoce, e problemas de saúde associados ao envelhecimento ainda estão longe. Como resultado, é dada menos atenção às suas necessidades.

Segundo a WHO (2014), um indicador trágico das consequências desta falta de atenção à sua saúde e às suas necessidades sociais é que cerca de metade das novas infeções VIH em 2000 estava nessa faixa etária. O uso de substâncias psicoativas, tais como, por exemplo, anfetaminas, opióides e cocaína, também está a aumentar em muitas partes do mundo, e a injeção de algumas destas substâncias é uma importante via de transmissão do VIH. Além disso, estima-se que 1,4 milhões jovens, com idades entre 10 e 19 anos de idade, morrem - a maioria devido a lesões não intencionais, suicídio, violência, complicações relacionadas com a gravidez e doenças evitáveis ou tratáveis. Os problemas de saúde reprodutiva são a principal causa de morte entre os jovens com idades entre 15 e 19 anos de idade, tendo as taxas mais altas de novas infeções sexualmente transmissíveis. Por sua vez, a nutrição na adolescência

continua a ser um problema em todas as regiões. Alimentação inadequada e falta de atividade física promovem o rápido aumento da obesidade entre os jovens. As principais preocupações para crianças e adolescentes, além da sua sobrevivência e crescimento físico, são também o seu desenvolvimento psicossocial e a sua saúde mental. Cerca de 10% a 20% das crianças têm um ou mais problemas mentais ou comportamentais.

Muitas mortes prematuras em adultos são devidas a comportamentos iniciados durante a adolescência, incluindo a adoção de comportamentos e padrões alimentares e de atividade física errados, e os exemplos óbvios de consumo de álcool e tabaco. É um facto comprovado que as decisões tomadas por adolescentes hoje, vão influenciar a sua saúde como adultos e a dos seus filhos.

Esta fase de desenvolvimento – a adolescência – caracterizada por grandes mudanças físicas, psicológicas e sociais (OMS, 2010; Stormshak & Connel, 2011; Torres, Barbosa, Pinheiro & Vieira, 2010), assume-se como uma fase que oferece grandes oportunidades de aprendizagem, sendo também, como já vimos, um período de risco para a saúde e bem-estar dos adolescentes, tornando-os bastante vulneráveis (OMS, 2010; Torres et al., 2010).

Tratando-se de grupos com reduzido nível de interação com o sistema de saúde, apresentam, contudo, um potencial de intervenção elevado, sobretudo porque fazem uso das tecnologias de informação como a internet, sendo uma das fontes privilegiadas de procura e acesso à informação em saúde (L. Loureiro et al., 2012).

Em Portugal, a saúde escolar tem sido um referencial para a saúde das crianças e dos jovens, adaptando-se aos desafios da saúde e à evolução do sistema de saúde português.

Segundo o Health Behaviour in School-aged Children (HBSC), um estudo colaborativo da OMS que pretende estudar os estilos de vida dos adolescentes e os seus comportamentos, e em que Portugal participa desde 1998, os últimos dados nacionais, de uma amostra de n=6026, do ano 2014, referem, entre outros, que:

 A maioria dos adolescentes inquiridos consome doces pelo menos uma vez por semana (65,1%) e metade dos jovens consome refrigerantes também pelo menos uma vez por semana (50,7%);

 Pelo menos às vezes, uma grande percentagem de jovens refere comer alimentos pouco

comer o que calha (62,9%), comer quando calha (51,0%), comer muito pouco (35,1%) e quando começa a comer custa-lhe parar (34,5%);

 A maioria dos jovens (69,9%) refere que lava os dentes mais que uma vez por dia, mas

existem ainda 1,2% que raramente ou nunca o fazem;

 A maioria dos adolescentes refere raramente ou nunca sentir sonolência durante o dia, fora das aulas (61,4%); nas aulas (50,2%), ter dificuldades em adormecer (64,9%) e cansaço/exaustão (46,9%). Mas um terço dos jovens menciona ter dificuldades em acordar de manhã (34,4%) quase todos os dias;

 Cerca de 15,2% dos adolescentes apresenta excesso de peso e 3,0% obesidade;

 Dos jovens que mencionaram já ter experimentado tabaco, álcool ou drogas, a média de

idades de experimentação quer de tabaco, quer de álcool foi 13 anos, e a média de idades quer da primeira embriaguez quer de drogas foi 14 anos. A bebida mais consumida todos os dias é a cerveja e a bebida energética com álcool;

 Quanto ao tipo de drogas ilícitas experimentadas, a substância que os adolescentes referem mais frequentemente ter experimentado são os solventes, seguindo-se a “marijuana” (cannabis/haxixe/erva);

 Mais de um terço dos jovens menciona já ter tido relações sexuais e não ter usado o preservativo (n=88), referindo que o principal motivo para não usar preservativo foi o não ter pensado nisso. Mas também se destacam outros motivos para não usar preservativo, nomeadamente, não ter preservativo consigo, os preservativos serem muito caros e os jovens terem bebido álcool em excesso;

 Quanto à comunicação com a família e apoio familiar em geral, a maioria dos adolescentes menciona ter boa comunicação, apoio e qualidade na relação com a família. No que diz respeito, especificamente, à facilidade em falar com a família, embora a maioria dos jovens considere ser fácil falar com os pais, especialmente com a mãe, alguns referem ter dificuldades em dialogar, sobretudo com o pai.

Os comportamentos de saúde dos adolescentes estão fortemente associados às suas competências em literacia (Sanders, Federico, Klass, Abrams & Dreyer, 2009).

Sabe-se que as crianças e jovens com um bom início de vida aprendem melhor, têm vidas mais produtivas e contribuem ativamente para a sociedade. As desigualdades e os determinantes sociais, incluindo o género, são fatores de risco em termos de educação e acesso a serviços de saúde. Numa escola para todos, podem ser minorados e revertidos em benefício do bem-estar, da participação escolar e social e de escolhas mais saudáveis das crianças e dos jovens.

O PNSE (MS, 2015), defende que a melhoria do nível de LS e o fortalecimento da participação da comunidade educativa na promoção da saúde são os pilares do bem-estar, do desenvolvimento, da proteção da saúde e da prevenção da doença em contexto escolar.

Um jovem que possua competências de LS, deverá ser capaz de cuidar de si a nível físico, emocional, social, mental e espiritual, conseguindo compreender o conceito de risco, lidar com documentação e impressos relacionados com a saúde, encontrar serviços de saúde consoante a sua necessidade, dialogar com os profissionais de saúde conseguindo receber respostas que clarifiquem as suas dúvidas, compreender os efeitos e interações dos fármacos e tomar uma posição de advocacia de forma a proteger a sua saúde, a da sua família e a da sua comunidade (Fetro, 2010).

Em 1995, o Joint Committe on National Health Education Standards, criou sete normas de conhecimento e competências essenciais que um jovem deverá atingir para conseguir um excelente nível de LS, e que deveriam ser desenvolvidos e atingidos através de programas de EpS nas escolas:

 Compreender conceitos relacionados com a promoção em saúde e prevenção da doença;

 Demonstrar a capacidade de aceder a informação de saúde válida e a produtos e serviços de promoção de saúde;

 Demonstrar a capacidade de ter comportamentos promotores de saúde e reduzir os riscos em saúde;

Analisar a influência da cultura, media, tecnologia e outros fatores na saúde;

 Demonstrar a capacidade de utilizar competências de comunicação interpessoal para promover a saúde;

 Demonstrar a capacidade de utilizar metas definidas e competências de tomada de decisão para promover a saúde;

 Demonstrar a capacidade de defender a saúde pessoal, familiar e comunitária.

Uma revisão sistemática da literatura realizada por Sanders et al. (2009) revela que, de acordo com os estudos analisados, a prevalência de níveis baixos de LS de adolescentes e jovens adultos varia de 10% a 40%.

Quanto mais frequentemente receberem informação sobre saúde de fontes como os media, pais, amigos e professores, maiores são os seus níveis de LS (Paek, Reber & Lariscy, 2011). Um estudo realizado na China, com o objetivo de conhecer os níveis de LS e relacioná-los com os comportamentos e atitudes promotoras de saúde nos jovens, numa amostra de 8.008 adolescentes a frequentar escolas primárias e secundárias do país, demonstrou que existe uma correlação positiva entre os conhecimentos em saúde e as práticas e atitudes promotoras de saúde (Yu, Yang, Wang & Zhang, 2012).

Segundo González (1998), salienta-se que o processo educativo representa uma das melhores estratégias de melhoria da saúde e da QV dos indivíduos. A educação pode ajudar na divulgação dos conhecimentos e influenciar modos de pensar, mudando atitudes e crenças e produzindo alterações de comportamento e estilos de vida.

Num outro estudo, que decorreu em ambiente escolar, ¾ dos jovens envolvidos admitiu querer saber mais sobre a medicação que lhe prescrevem (Macdonald, Macdonald, Crooks & Collicott, 2011). Por um lado, os adolescentes podem ter menos interação com o sistema de saúde e ter menos custos de cuidados de saúde do que os adultos, mas envolvem-se cada vez mais com a vertente da saúde, especialmente os adolescentes portadores de doenças crónicas (Manganello, 2007).

Sabe-se que aproximadamente cinco milhões de jovens nos Estados Unidos vivem com uma doença crónica, como asma, diabetes tipo 1 e tipo 2, fibrose cística, obesidade e anemia falciforme (National Center for Healthcare Statistics, 2006), sendo que a maioria desses jovens será transferida em termos de atendimento, de um serviço de pediatria, para um serviço de atendimento de adultos (Blum, 1995). Vários estudos recentes mostram que essa transferência de serviços resulta num aumento da morbilidade e mortalidade desses jovens (DeBaun & Telfair, 2012; Quinn, Rogers, McCavit & Buchanan, 2010).

Embora este problema seja claramente identificado na literatura, é necessária mais investigação para ajudar a identificar os facilitadores e os obstáculos a uma transição de

sucesso. Se os doentes com doenças crónicas tiverem maior nível de LS enquanto adolescentes, eles potencialmente terão melhores resultados durante e depois desta transição (Perry, 2014).

Eles são assíduos consumidores dos meios de comunicação e de outras tecnologias de acesso à informação em saúde e constituem um grupo alvo para muitas intervenções educativas relacionadas com a saúde (M. L. Antunes, 2014).