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Métodos transacionais baseados no lucro das operações

6.3. Dos métodos previstos nas Diretrizes da OCDE

6.3.2. Métodos transacionais baseados no lucro das operações

Os métodos denominados de “transacionais baseados no lucro das operações” (Transactional Profit Methods) por aquela organização internacional são: PSM – Profit Split Method e TNMM – Transactional Net Margin Method.

Ao contrário do que dispõe a legislação brasileira – que a princípio se baseou no princípio arm’s length e assim também nas OECD Guidelines –, a OCDE introduziu outros

métodos para o controle dos preços de transferência, disponíveis para utilização enquanto os métodos tradicionais não possam ser aplicados de forma consistente ou excepcionalmente não possam ser aplicados como um todo, assim como dispõe o parágrafo 3.1 de suas Diretrizes.

Inicialmente, havia um consenso internacional de que poderiam ser empregados quaisquer outros métodos para a apuração de um preço arm’s length, devendo-se, contudo,

dar-se preferência aos métodos chamados de “tradicionais”. Atualmente, a OCDE aceita qualquer método baseado no lucro, desde que estes partam do critério transacional, ou seja, apurem os lucros gerados em cada transação controlada específica, rejeitando-se métodos

331

As Guidelines apresentam, em seu parágrafo 2.35, uma comparação entre duas operações realizadas, uma

entre partes vinculadas e outras não, em que a primeira consiste na venda de um determinado produto e a segunda na venda de outro produto, similar. Neste exemplo, a OCDE conclui pela incomparabilidade das transações, tendo em vista as empresas objeto de comparação possuem diferenças significativas no grau de eficiência de suas produções. Cf. OECD. 1995 OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations. p. II-12

baseados no lucro global, entendidos como contrários ao princípio arm’s length,332 sem prejuízo, nada obstante, de permanecerem os métodos “tradicionais” como preferenciais.

Tratam-se de métodos de fixação dos preços de transferência que consistem em verificar os lucros gerados por determinadas operações controladas entre uma ou mais empresas associadas, sendo aceitáveis somente os métodos PSM e TNMM ou outros que a eles

sejam equivalentes, eliminando-se, de pronto, o chamado Global Formulary Apportionment

(GFA), por não proporcionar aproximação consistente com o arm’s length.

Vejamos de que modo a OCDE trata dos dois métodos transacionais baseados no lucro.

6.3.2.1. Profit Split Method (PSM) – O “Método Transacional da Divisão do

Lucro” é um método de controle dos preços de transferência com base nos lucros da operação, que consiste em identificar o lucro combinado a dividir entre as empresas associadas na seqüência de uma operação controlada (ou de operações controladas que podem ser englobadas) e em proceder à posterior repartição desses lucros entre as empresas associadas, assente numa base economicamente válida, idêntica à repartição dos lucros que teria sido combinada e refletindo um acordo baseado no princípio arm’s length.333

Este é o primeiro dos métodos alternativos eleitos pela OCDE no rol previsto nas

Guidelines, destinado ao controle dos preços de transferência em transações nas quais, em

razão do extremo inter-relacionamento nelas presente, seja impossível uma avaliação em bases separadas, tais como as transações em que empresas independentes acertam uma forma de parceria334 e nela uma forma de divisão dos lucros.

O método objetiva eliminar, nos lucros, o efeito de condições especiais feitas ou impostas em transações controladas, através da determinação da divisão de lucros que empresas independentes teriam esperado alcançar realizando as mesmas transações, identificando, primeiramente, o lucro a ser dividido entre as empresas associadas decorrente

332

Neste sentido, SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de transferência no direito tributário brasileiro. p. 124.

333

Cf. OECD. 1995 OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations.

p. III-2.

334

Que Luís Eduardo SCHOUERI compara ao consórcio no direito brasileiro. Cf SCHOUERI, Luís Eduardo.

das transações controladas em que tenham participado, e posteriormente o dividindo entre aquelas empresas em uma base economicamente válida, que aproxime a divisão dos lucros que deveria ter sido estimada e considerada em um acordo efetuado at arm’s length.

O lucro a ser dividido deve ser representado pelo lucro total da transação (e não da empresa) ou um lucro residual, i.e., o lucro que não pode ser imediatamente imputado a

apenas uma das partes, citando-se como exemplo o lucro resultante de um intangível exclusivo e de alto valor.

A contribuição de cada parte é baseada em uma análise funcional (functional analysis), que consiste na análise das funções desempenhadas (considerando os ativos

utilizados e os riscos assumidos) por cada parte sendo admitido o uso de dados de mercado externo confiáveis disponíveis, o que inclui percentuais de divisão de lucros ou ganhos observados entre empresas independentes com funções comparáveis.335

A OCDE apresenta nos parágrafos 3.6 a 3.9 de suas Guidelines os pontos fortes e

fracos deste método, considerando como um dos primeiros o fato de o PSM não depender

diretamente de transações comparáveis muito próximas, e consequentemente, poder ser utilizado em casos em que nenhuma transação entre empresas independentes possa ser identificada, já que a alocação dos lucros é baseada na divisão de funções entre as próprias empresas associadas, estando a relevância dos dados externos obtidos de empresas independentes limitada a avaliação das contribuições que cada empresa associada faz às transações, e não para determinar diretamente a divisão do lucro.

Conseqüência disso é que o PSM possui flexibilidade por levar em consideração

fatos e circunstâncias específicos, possivelmente exclusivos das empresas associadas que não estejam presentes em empresas independentes, enquanto ainda constituindo um método de apuração do preço arm’s length de modo que reflita o que empresas independentes realmente

tenham efetuado se submetidas às mesmas circunstâncias.

335

Conforme aponta Martin PRZYSUSKI, o PSM tende a ser aplicado quando da existência de bens intangíveis compartilhados entre empresas e lucros não usuais a serem comprovados em um contexto de preços de transferência. PRZYSUSKI, Martin. Invitation to comment on transactional profit methods. A practitioner’s response to the OECD. p. 3. Disponível em <http://www.oecd.org /dataoecd/51/33/ 37227281.pdf>. Acesso em

Outro ponto forte apontado é o fato de que sob o PSM é menos provável que alguma

das partes da operação controlada seja considerada como tendo obtido um resultado extremo ou improvável em seus lucros, tendo em vista que ambas as partes na transação são avaliadas, o que é deveras importante quando submetidas à análise as contribuições relacionadas a bens intangíveis empregados nas operações controladas.

Um dos pontos fracos, por sua vez, se relaciona ao fato de os dados externos de mercado considerados na avaliação da contribuição que cada empresa associada efetua às operações controladas estarão menos intimamente conectados àquelas transações se comparado com a utilização dos outros métodos disponíveis, em função da natureza dos dados externos de mercado ser vaga e resultar em alocações de lucros mais subjetivas.

As dificuldades na aplicação do PSM são também consideradas como pontos fracos

pela OCDE. Apesar de se basear menos em dados externos à operação controlada, as empresas associadas e as Administrações Tributárias dos Estados podem, de igual modo, terem dificuldades em acessar informações de suas afiliadas estrangeiras, bem como ainda em razão de, em se procurando estabelecer comparação com empresas independentes, geralmente estas não costumam utilizar o PSM para estabelecer seus preços de transferência (exceção se

faz quando se tratarem de joint ventures).336

Adicionalmente, ainda existem as dificuldades relacionadas a determinação das receitas e custos coletivos, pela necessidade de padronização de suas demonstrações contábeis e a identificação de despesas operacionais associadas com as transações submetidas a controle, bem como a alocação dos custos entre as transações e outras atividades das empresas.

336

Conforme Heleno Taveira TÔRRES, tratam-se, as joint ventures, de modelos de associações temporárias de

cooperação, cuja origem se encontra na prática empresarial desenvolvida nos países de sistema jurídico do tipo

Common Law, tendo como sua tradução literal “empreendimento conjunto”, entre duas ou mais empresas, com

ou sem a criação de uma entidade distinta delas, com a finalidade de desenvolvimento de uma atividade econômica específica e transitória, em um setor de comum interesse. O ilustre professor acrescenta que, perante o direito brasileiro, não existe tal figura como espécie societária, o que não prejudica a existência de sua formação concreta, que consiste na constituição de um empreendimento conjunto por contrato, como num consórcio, sendo exteriorizada sob uma das formas de sociedades legalmente previstas. A decisão entre constituir uma joint venture, um estabelecimento permanente ou uma filial, ou ainda uma empresa independente,

deve levar em conta o aspecto tributário. TÔRRES, Heleno Taveira. Pluritributação internacional sobre as rendas de empresas. 2. ed. p. 284.

São apontados nas Guidelines, finalmente, dois métodos para a estimativa da divisão

de lucros, baseados tanto nos lucros projetados quanto reais, denominados pela OCDE de “contribution analysis” e “residual analysis”.337

Sob o primeiro método, os lucros coletivos, que correspondem ao lucro total das transações submetidas a controle, devem ser divididos entre as empresas associadas baseado no valor relativo das funções desenvolvidas por cada empresa, complementado-se tanto quanto possível por dados de mercado externos que indiquem como empresas independentes tenham dividido seus lucros em circunstâncias similares, sendo que, em casos em que o valor relativo das contribuições possa ser determinado diretamente, pode não ser necessário estimar o valor real de mercado de cada contribuição das partes, ou de modo contrário, em havendo dificuldades, poderá depender dos fatos e circunstâncias de cada caso.

O segundo método funciona dividindo o lucro coletivo em duas etapas, sendo que, na primeira, a cada parte é alocado lucro suficiente para lhe possibilitar uma remuneração básica apropriada pelo tipo de transação em que está incumbida, determinada a partir de comparação com remunerações obtidas por empresas independentes realizando transações similares. Na segunda etapa, qualquer lucro residual, ou perda, remanescente após a divisão efetuada na etapa anterior, deve ser alocado entre as partes baseado em uma análise dos fatos e circunstâncias que devem indicar como este lucro residual deve ter sido dividido entre empresas independentes, sendo que indicadores das contribuições das partes com bens intangíveis e posições de barganha338podem ser particularmente úteis neste contexto.

6.3.2.2. Transactional Net Margin Method (TNMM) – Denominado de “Método

Transacional da Margem Líquida do Lucro”, é o método de controle dos preços de transferência baseado no lucro da operação e que consiste em verificar a margem de lucro

337

Conforme disposto nos parágrafos 3.15 a 3.25 das Guidelines, em que é afirmado ainda que tais métodos não

são exaustivos nem mutuamente excludentes. OECD. 1995 OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations. p. III-5 – III-8.

338

A posição de barganha de uma empresa é maior quando ela é a única fabricante de um produto, sendo menor quando concorre com outras empresas. Neste sentido, SCHOUERI, Luís Eduardo. Preços de transferência no direito tributário brasileiro. p. 127.

líquida em relação a uma base adequada (por exemplo, os custos, as vendas ou os ativos) que um contribuinte obtém a partir de uma ou várias operações controladas.339

Tem-se que o TNMM opera de maneira similar aos dois métodos tradicionais RPM e CPM, o que significa que deve ser levado em consideração, para que haja consistência, que a

margem liquida do contribuinte obtida em uma transação controlada deve ser estabelecida com referência a margem líquida que o mesmo contribuinte obtém em operações não controladas comparáveis e, em não sendo possível, a margem liquida que seria obtida em uma operação comparável por uma empresa independente pode servir como orientação.

Uma análise funcional da empresa associada e, em último caso, da empresa independente, é requerida para determinar se as transações são comparáveis e que ajustes podem ser necessários para se obter resultados consistentes, e adicionalmente os outros requisitos de comparabilidade dispostos nas Guidelines da OCDE, em seus parágrafos 3.34 a

3.40.

Luís Eduardo SCHOUERI340 observa, em atenção ao quanto disposto nas

Guidelines, haver extrema importância na análise funcional e que os ajustes necessários para a

satisfação da comparabilidade são maiores que nos métodos tradicionais, tendo em vista estes tradicionais se basearem em margens brutas e os demais partirem de margens líquidas, que comportam um número muito maior de variáveis.

Assim como apontados os pontos fortes e fracos do PSM, a OCDE faz o mesmo em

relação ao método sob análise. São apontados como fortes os seguintes aspectos: margens líquidas são menos afetadas por diferenças nas transações que os preços, como em geral no método CUP; margens líquidas podem ser mais tolerantes a algumas diferenças funcionais

entre transações controladas e não controladas que margens de lucro brutas; diferenças nas funções desempenhadas entre empresas são frequentemente indicadas em variações em despesas operacionais, consequentemente, as empresas devem ter uma grande variação de margens de lucro bruto, mas permanecem obtendo amplamente níveis similares de lucro liquido; desnecessidade de serem determinadas as funções desempenhadas e as responsabilidades assumidas por mais de uma das empresas associadas, bem como,

339

Cf. OECD. 1995 OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations.

p. G-7.

340

consequentemente, de serem padronizados os demonstrativos contábeis de todos as partes envolvidas na operação ou ainda de serem alocados os custos para todas estas partes.

É apontada como a maior fraqueza a possibilidade de o lucro liquido de um contribuinte ser influenciado por alguns fatores que podem não ter efeitos ou ter efeitos pouco substanciais ou diretos no preço ou nas margens brutas, aspectos que tornam difíceis as determinações precisas e consistentes das margens líquidas at arm’s length.

Observação oportuna é feita no sentido de que qualquer método de apuração do preço arm’s length depende de informações obtidas em transações não controladas que, por

sua vez, podem não estar disponíveis ao tempo em que ocorrem as operações controladas, o que pode dificultar o interesse do contribuinte em aplicar especialmente o TNMM. Outrossim,

os contribuintes podem não ter acesso a informações específicas suficientes sobre os lucros atribuíveis em transações não controladas para uma aplicação válida do método.

Tal situação pode não ocorrer em relação a Administração Fiscal do Estado que esteja efetuando o controle de preços, já que esta pode ter informações – não obtidas pelo contribuinte submetido ao controle – em decorrência de outros procedimentos fiscalizatórios realizados em outros contribuintes. Diante disso, a OCDE manifesta seu posicionamento quanto a não ser justo aplicar qualquer método de controle de preços sem que os dados obtidos pelo Fisco que tenham servido de parâmetro para as retificações necessárias para se chegar ao preço arm’s length na operação, sejam disponibilizados para o contribuinte que

esteja submetido ao controle – obviamente respeitando-se os limites de sigilo impostos pelas leis tributárias do país –, de modo que a este possa ser concedido o direito a ampla defesa e ao contraditório.341

Ao contrário do PSM, que é um método bilateral, o TNMM é um método

unilateral,342 em que somente uma das partes envolvidas na operação submetida a controle tem seus dados verificados, a exemplo dos demais métodos, chamados de “tradicionais”. Nada obstante, por haver inúmeros fatores não relacionados aos preços de transferência que

341

Neste sentido, o parágrafo 3.30 das Guidelines. OECD. 1995 OECD Transfer Pricing Guidelines for Multinational Enterprises and Tax Administrations. p. III-11.

342

Martin PRZYSUSKI observa que, tendo em vista se tratar de método unilateral, o TNMM é melhor aplicado

em operações em que haja lucros de uma empresa singular que não contribua para o desenvolvimento de qualquer intangível de valor. Cf. PRZYSUSKI, Martin. Invitation to comment on transactional profit methods. A practitioner’s response to the OECD. p. 3. Disponível em <http://www.oecd.org/dataoecd/51/33/37227281.pdf>.

influenciam as margens liquidas e que, por isso, podem causar menor consistência ao TNMM,

aumenta a preocupação quanto a viabilidade de uma análise unilateral, que pode não levar em conta a rentabilidade geral de um grupo transnacional nas operações controladas para fins de comparabilidade, ou pode potencialmente atribuir a um membro do grupo um nível de lucro que deixa completamente os outros membros com níveis de lucro improváveis, sejam eles altos ou baixos.