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4 A CADEIA PRODUTIVA DA POLPA DO AÇAÍ

4.2 PRODUÇÃO E EXTRATIVISMO

4.2.2 Manejo e coleta do fruto

Para Santos, Sena e Homma (2013) o manejo compreende um conjunto de práticas culturais que visam aumentar o número de touceiras produtivas nos açaizeiros, bem como a proporcionar o adensamento de espécies florestais e frutíferas nas áreas com açaizeiros por meio de vegetação nativa. Canto (2001), Corrêa (2010) e Nogueira (2011) são unânimes em

afirmar que os produtores da região do Pará usam técnicas de manejo inovadoras, objetivando exclusivamente o aumento da produção do açaí fruto, e que a técnica do manejo utilizada é antiga.

Canto (2001), Nogueira (2011) e Santos, Sena e Homma (2013) convergem para os seguintes tipos de manejo dos açaizais:

a) O desbaste, em que as touceiras são reduzidas, eliminando-se os estipes pouco produtivos, muito velhos, muito altos, muito finos, que ofereçam perigo de cair. Esta prática diminui a competição entre estipes e proporciona o aumento de produção de frutos, ao mesmo tempo em que permite a extração do palmito dos estipes removidos, na época de baixa produção de frutos.

b) O ralamento para redução da concorrência, por meio do qual são removidas as espécies de menor valor econômico, ou as touceiras de açaí menos produtivas, ou que estejam muito próximas umas das outras. Esta prática diminui a competição por luminosidade, fazendo as plantas amadurecerem mais rapidamente e evitando que cresçam muito em busca de luz, além de ajudar na decomposição dos resíduos no solo. O aumento da luminosidade favorece também as brotações na base da touceira.

c) E a roçagem, que é a limpeza periódica do terreno, eliminando-se as plantas de outras espécies, ervas, cipós que estejam crescendo em volta; as grandes árvores têm os galhos cortados abaixo das copas dos açaizeiros para evitar sombreamento e os açaizeiros que estejam crescendo fora do espaçamento são também removidos para evitar o adensamento.

Já Batista (2013, p.40) cita outros quatro grupos de manejos identificados por Grossman et al (2004):

a) Manejo intensivo. Pode ocorrer a eliminação de toda a vegetação que não seja composta por açaizeiros, visando maior luminosidade no açaizal, bem como a não competição nutricional com outras espécies. A densidade populacional da palmeira fica compreendida na faixa de 1.500 a 3000 estipes adultos/ha.

b) Manejo intermediário. Há a eliminação parcial da vegetação no interior do açaizal, preservando-se espécies com valores econômicos e eliminando-se as demais. Em média deixa-se 3 a 4 estipes/touceiras de açaizeiros.

c) Manejo moderado. Há a retirada de apenas algumas espécies vegetais, tais como murumuru (Astrocaryum murumuru), juquiri (Mimosa regnellii), limorana (Chlorophora tinctoria) e verônica (Verônica officinalis), para facilitar a passagem dos transeuntes no açaizal no

momento de vistoria e colheita dos frutos ou extração de palmito. Nessa tipologia de manejo há preservação de todos os estipes/touceiras de açaizeiros.

d) Sem manejo. O açaizal fica intacto, pois não há qualquer prática cultural visando ao aumento da produtividade nos açaizais, nem o manuseio de espécies nativas.

Acredita-se que ambas as classificações sejam complementares, dependendo do foco do estudo com relação o manejo de açaizal. O manejo normalmente ocorre no período da entressafra (Janeiro a Junho), quando o produtor tem mais tempo disponível para o tratamento do terreno, embora as chuvas sejam mais freqüentes e intensas.

No processo de coleta do fruto, os trabalhadores que realizam a tarefa são conhecidos como peconheiros ou escaladores de palmeiras. Para coletar o fruto se faz necessário subir na palmeira e para isso o caboclo amazônico faz uso da peconha, um artefato feito de folha do próprio açaizeiro ou de outra espécie, para servir de suporte para os pés, conforme mostra a Figura 10. Além da peconha, faz-se uso também de algum instrumento cortante, como a faca ou facão, utilizado para a retirada do cacho do fruto e uso da rasa (cesto de palha) utilizado para depositar o fruto.

Figura 10 - Peconheiro

Fonte: Ferreira (2006)

A atividade da extração do açaí é remunerada e exercida normalmente por homens jovens que detêm a habilidade e força para subir e descer das palmeiras. Essa tarefa da extração ocorre nas primeiras horas do dia, entre as 6 horas até as 10 horas, pois nesse horário o caule do açaí ainda está frio, beneficiando o peconheiro na retirada do açaí. No período da tarde não é aconselhável a retirada do fruto, uma vez que o caule da palmeira fica muito quente, prejudicando as condições físicas dos escaladores. No entanto, no período de safra alguns peconheiros realizam tal atividade também após as 16 horas da tarde.

A habilidade necessária para a tarefa é repassada de pai para filho, isto é, as crianças dessas comunidades são treinadas para fazer uso de tal ferramenta para subir em troncos de altas árvores para coletar os frutos: manga, ingá, coco, açaí, etc..

Embora os peconheiros sejam pessoas experientes em subir nos troncos das árvores, normalmente jovens e com saúde, os acidentes ocorrem. Não se tem estatística sobre os acidentes que acontecem nas comunidades ribeirinhas, mas o risco inerente à atividade é alto, tal como ela é realizada.

Canto (2001, p.82) analisou os aspectos posturais do trabalho extrativista do açaí, na fase de coleta dos frutos, para diagnosticar as possíveis conseqüências nocivas do trabalho na saúde do trabalhador e identificou as seguintes ocorrências de acidentes e doenças: picada de cobras ou escorpiões; esfolamento nos pés, nas mãos e nas pernas; empalação, ferimentos e fratura de ossos; ferimentos de faca; dores no peito, nos pés e nas costas; perda do tato e artroses.

Nos estudos de Canto (2001, p. 88), a tarefa do peconheiro foi cronometrada nos processos de subida, de corte do cacho e de descida da palmeira. Identificou que o ciclo de trabalho é muito rápido, um pouco mais de um minuto, variando em função da altura da palmeira. Embora seja rápido, tem-se que levar em consideração que esse trabalhador escala várias palmeiras no dia e no processo de descida, carrega consigo um cacho do fruto que pode pesar de 1 a 3 quilos e que não pode deixar cair no chão para evitar contaminação e perda de qualidade do fruto.

Para amenizar o problema de acidentes e reduzir o problema da dependência dessa mão-de-obra (peconheiros), surgiu uma inovação relevante para ajudar na fase de colheita do fruto, o “Traz Cacho”. O Traz Cacho é um instrumento para colheita de cachos de açaí desenvolvido e registrado pela Embrapa Amazônia Oriental e Embrapa Instrumentação Agropecuária sob o título ‘Equipamento e método para a colheita de cachos de frutas’ (ver Figura 11). Consiste de uma vara que pode ser de alumínio, com aproximadamente 12 metros de comprimento, contendo na sua extremidade superior uma lâmina, para o corte do cacho; um recipiente, para a depositação do cacho e uma roldana, permitindo a descida e a exploração intensa e racionalizada, dando maior segurança ao colhedor, pois dispensa a necessidade de escalar o açaizeiro. Tal instrumento também pode ser utilizado na colheita de frutos que se localizam em árvores muito altas que exige a sua escalada para colheita (INAMASU, 2006).

Figura 11 – Traz Cacho da Embrapa Amazônia Oriental

Fonte: Registro no INPI - EMBRAPA (2010)

Outra inovação foi também desenvolvida pelo agricultor de Abaetetuba o Sr. Edilson Cavalcante. O invento está registrado sob o título “Inovação Tecnológica na Agricultura Familiar e a Segurança do Trabalho em Abaetetuba/Pará: Apanhador e Debulhador de Açaí”. Que é nada mais que uma vara de alumínio, medindo três ou seis metros, com um mecanismo na ponta, conforme demonstrado na Figura 12. O processo de coletar o cacho de açaí se dá em torno de 30 segundos e também foi desenvolvida uma garra de alumínio que ajuda no processo de debulhar o açaí. Foi o próprio Sr. Edilson que desenvolveu e produz o mecanismo que é vendido em torno de R$300.

Figura 12 – Apanhador e debulhador de açaí – Sr. Edilson Cavalcante

Fonte: Rede Globo. Apanhador e debulhador de açaí (04/04/2015)

Uma terceira invenção apareceu no Acre, com a ideia do Sr. Trajano José Alves Brito, que patenteou e fabrica o referido instrumento, que também tem o objetivo de coletar o cacho de açaí. A diferença desse último instrumento para os demais é que esse deve ser acoplado no caule da palmeira e faz uso de algumas rodinhas que movimentam o aparelho de corte até o cacho, isto é, o tempo para acoplar a máquina e subir até o cacho é maior em relação às demais invenções anteriores citadas, conforme pode ser visto na Figura 13.

Figura 13 – Apanhador e debulhador de açaí – Sr. Trajano J. A. Brito

Fonte: Site http://www.trajano.ind.br/#acai.

Esses instrumentos em sua maioria estão sendo utilizados nos açaizais em terra firme. Nos açaizais de terra firme com irrigação que foram visitados no município de Tomé-Açu, o instrumento utilizado para coletar os cachos de açaí é o da Figura 14, isto é, uma adaptação mais simples do modelo da Embrapa, que consiste em uma vara de madeira, uma foice para cortar o cacho e um gancho para prender o cacho na descida.

Figura 14 – Apanhador de açaí utilizado pelos produtores de Tomé-Açu

Fonte: Foto cedida pelo Prof. Alfredo K. O. Homma