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Na trama social e na complexidade em que se tece a realidade das periferias brasilei- ras, os diversos e particulares modos de reprodução da vida social, dos processos de aprendi- zagem e da produção subjetiva e prática da vida tendem a ser ignorados e silenciados pela ordem vigente; retirados do jogo de disputa pela hegemonia e para marcar o consenso de uma perspectiva de sociedade delineada pelo individualismo e pela disputa desigual do capital.

Por outro lado, existem também, outras relações de forças criadas a partir dos contex- tos populares, nas redes de trocas de saberes e reinvenções das práticas sociais. Nesse sentido, as relações construídas nos contextos dão visibilidade, legitimação e reconhecimento entre os sujeitos que interagem na percepção estética vivenciada no cotidiano, ainda que esses sujeitos estejam mergulhados em uma perspectiva desigual de sociedade. Os/as poetas são percebi- dos/as no contexto social, a exemplo do que nos conta a poeta Sil, que fora convidada a estar

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junto com alunos/as de uma escola em Mesquita; com uma turma do segundo segmento do ensino fundamental, especificamente, em que a professora trabalhara com seus poemas como forma de malear os contornos das palavras e sentidos com seus alunos/as na presença da auto- ra. Contava, com entusiasmo, do mesmo modo como havia narrado à entrevista feita no Me-

lhor da Baixada18, que quando começou a escrever, já havia as histórias de seu pai, histórias que seu pai contava e ela guardava, mas foi na escola que começou a escrever, estimulada por professores/as na organização de uma feira cultural, onde poetas se apresentavam e que logo ela estava ali escrevendo, junto com outros grupos. A caminhada de seus passos na escrita, indica a existência de acontecimentos que interagiram como força da experiência afetiva, pro- duzindo, também a sua própria movimentação. Assim, oscilam seus versos entre periódicos e as produções gráficas que ilustram os rostos19 dos livros de escritores/as e poetas. Em sua poesia, presente em seu livro Miscelâneas, escreve:

“É bom ouvir as histórias de nossos pais Saber de suas meninices e estripulias, Assim, eles se tornam mais reais” (Sil, 2006, p.16, Edição da Autora)

As narrativas, as histórias e os sentidos em que pairam as relações de se aprender e de ensinar, podem revelar interações imprevisíveis e não lineares, à medida que torna mais real a descoberta. Os sujeitos se entretecem juntos na dimensão afetiva promovendo significações. Entendo, deste modo, a escrita poética, desviando-se um pouco das definições na história lite- rária, como uso do território ocupado pela palavra dos sujeitos das classes populares, como intervenção no discurso hegemônico e/ou não-hegemônico, promovendo, de certo modo, a tomada do direito primordial de dizer a palavra (Freire, 2014) e como suporte que possibilita a autonomia desses sujeito na forma coletiva e individual.

Nesse sentido, tomar a palavra é um ato político. Expropriar aquilo que fora tomado, silenciado, invisibilizado para promover nova significação societária. A intervenção de Sil e de muitas outras mulheres, tomam a palavra porque é justo, porque a luta pela liberdade é cotidiana, porque impor-se com a palavra é uma das dimensões da luta contra as desigualda- des econômicas, as injustiças sociais, as práticas de colonialidade que se reproduzem na soci- edade capitalista. Dessa maneira, é necessário dizer com voz própria, desnudar seus desejos, inspirar novos sentidos e inscrever seus nomes e sobrenomes a critério de suas vontades.

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O Melhor da Baixada é um canal de notícias veiculadas pela internet. Publicado em 26 de abril de 2013.

https://www.youtube.com/watch?v=o-c5gj1X41A acessado em 06/02/2016.

19 Encontra-se o registro de Sil nas capas dos livros de Moduan e outros/as, nos projetos de diagramação, dese-

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Por esse motivo, delineio uma compreensão de que existe uma marca na produção de uma escrita feminina, que além do empoderamento em si, vai se constituir como força ativa para potencializar os processos formadores e as práticas de interações culturais.

Assim, encontro, ainda, na abertura do livro da Sil, Miscelâneas: Poemas e outros, as palavras de Ivone Landim, que parece indicar uma das marcas desse movimento de uma escri- ta feminina. Ivone nos dá pistas para pensar esse movimento entremeado por um turbilhão de sentimentos invisibilizados, frente à vigilância posta pelos costumes e valores que marcam as sociedades patriarcais. Sil, diz Ivone, “passeia com os seus aflorados sentidos, sempre aberta para o diálogo profundo das almas. (...) está atenta às diferentes facetas da intimidade femini- na, é suave, é menina, é explosão na passarela de versos”, e, com essa particularidade, digo, movimenta-se na experiência coletiva. Entendo, também que essa escrita feminina se produz de um modo diferente e simbolicamente extraordinário de encarnar a produção e expressão poética independente, para manter viva a luta contra o silenciamento e as práticas visíveis e invisíveis da cultura machista.

Desse modo, para prosseguir devo pedir licença para expressar uma percepção estética nessas produções. Faço isso, porque entendo que lutar com as palavras é também lutar contra os valores que reproduzem condições de inferiorização, de invisibilidade, de machismo, de racismo e tantas formas mais de dominação. Nesse sentido, não posso deixar de mencionar as marcas dessa escrita nas produções periféricas e o papel da escola na produção e criação do saber. Este aspecto de uma escrita feminina também é trazido por Rosilene Jorge dos Ra- mos20, entre outras poetas na tessitura da luta cotidiana contra a presença invisível de práticas de colonialidade que social e culturalmente se acomete sobre os sujeitos. Sobre essa reflexão, me recordo que, quando propus a Rosilene (2011) que juntasse todos os poemas para ajudá-la a compor o seu livro, ela não só aceitou, como moveu sua rede de amigos, de alunos, de fami- liares na experiência sensível que centra o seu universo discursivo e afetivo. No seu livro, então impôs na escrita, os anseios, as alegrias, os descobrimentos das experiências do corpo, das decepções amorosas e das muitas formas de desejo. E assim, escrevia:

“Tomei tua satisfação para meu ofício.

“Teus sentidos são meus guias. Deles me faço seguidor e protetor.

Inundo teu olfato com o cheiro do meu cio, acaricio o teu tato com meu corpo rígido,

20 Poeta e professora que trazem não só suas poesias para serem compartilhadas, mas se lança no esforço da

produção de escrita e valorização dos textos dos/as alunos/as confeccionando o livro coletivo intitulado Sobre Nós: um livro de histórias, crônicas e ideias sobre o viver (2014).

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entrego a teu paladar o tempero desejado, ilumino teu caminho...

para que tua visão não se perca, para que nossa imagem não distorça,

não se apague.

“Teu prazer é meu ofício. Tua entrega molhada, também é minha satisfação.”

(Oferenda – Rosilene Jorge dos Ramos, Poesias escondidas no quintal dos meus dias, 2012)

Na condição de participante do grupo, assumi a responsabilidade de colaborar com a editoração das publicações. Mas entremeado de tensões pessoais vividas com Rosilene, fruto de encontros e desencontros, algumas questões tornavam-se expostas a mim. Compreendia e compreendo a importância de que a experiência deve ser historicizada como demarcação do sentir e do viver. No entanto, me deparo com o sentimento que me causava estranheza, de que aqueles desejos que não eram os meus, ou pelo menos nada tinham a ver comigo, e, de certa forma ao revisitar essa experiência, possibilitou-me refletir sobre os sentimentos prescrivos enredados na vida afetiva. Visto que, assumia naquele momento um sentimento que não me fazia sequer ler as poesias que estavam ali sob a forma de generosidade estética e afetiva. Aquilo me incomodava e, saber que eu estava reproduzindo aquele sentimento, me deixou silenciado por algum tempo. Visto que minha relação pessoal com Rosilene não correspondia ao valor que aquela estranheza representava do ponto de vista de uma concepção machista e de relações de poder. Ao recuperar essa memória para buscar compreender um pouco mais sobre como essas “estranhezas” surgem em forma de sentimento, vou encontrar em Freire (2014) a reflexão sobre o sentido alienante das prescrições. Sobre isso, ele diz:

Um dos elementos básicos na mediação opressor-oprimido é a prescrição. Toda prescrição é a imposição da opção de uma consciência a outro. Daí o sentido alie- nador das prescrições que transformam a consciência recebedora no que vimos chamando de consciência „hospedeira‟ da consciência opressora.” ( p.46)

Junto a isso, entendo também que essas prescrições vão indicar práticas de coloniali- dade que produzem intersubjetividades, ao ponto que “os padrões formal-ideais de compor- tamento de gênero” estão assentados como relação de dominação “na classificação „racial‟: a liberdade sexual dos homens e a fidelidade das mulheres” (Quijano, 2010, p.123). Por outro lado, ainda com Freire(2014), é possível romper com estas práticas de dominação. Haja vista, que a luta pela libertação dessas práticas “é uma conquista” que “exige uma permanente bus- ca. Busca permanente que só exige no ato responsável de quem faz”. A superação da situação

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opressora, diz Freire, “implica o reconhecimento crítico, a „razão‟ desta situação, para que, através de uma ação transformadora que incida sobre ela, se instaure uma outra, que possibili- te aquela busca do ser mais” (p.46). Desse modo, entendo que essa busca me favorece cons- truir um pensamento coerente com a opção de vida na luta por uma sociedade justa.

Refletir sobre isso me possibilita um salto de qualidade na compreensão e sentimentos que acampam a dimensão humana. Sobre este retorno digressivo é que vou recuperar algumas produções poéticas de Rosilene e de outras mulheres que tomam posse da escrita, enunciam suas vozes e transcrevem em seus corpos os versos de suas intervenções poéticas, mesmo em contextos adversos e de práticas silenciadoras. Rosângela Freitas, ainda na década de 1970, com o movimento Frente à Frente de poesia, apresentava seus poemas em forma de lábios, boca e olhos, etc., de tal modo que, fazia seus livretos mimeografados, grampeados e distribu- ídos. O mesmo ocorria com Catarina Climene, Sonalí e Rosângela.

Nessa compreensão, as elucidações aqui trazidas pretendem apenas marcar a presença significativa e representativa, tanto do ponto de vista estético, de sua forma, quanto do contin- gente de participantes dessas produções em espaços diversos.

Na literatura considerada “oficial”, temos algumas representantes dessa produção de escrita, mas não de qualquer nível social. Nos séculos XVIII e XIX, não se podia dizer o que se pensava na colônia, pelo menos, não de maneira autônoma, não em todos os espaços públi- cos, o que levava as pessoas a se agruparem em outros ambientes. Considerando apenas os 200 anos de produção literária, o que temos de produção efetiva, de um ponto de vista das classes populares? Das mulheres dessas classes? Salvo algumas exceções como Maria Firmi- na dos Reis, seu nome se oculta na impressão do livro para causar invisibilidade, mas a au- sência de seu nome é também uma evidência das relações de poder que estão em jogo e a per- seguição é uma dessas práticas. Maria Firmina dos Reis e outras mulheres sequer menciona- das ou associadas a movimentos de poesia (entendida pela cultura dominante como movimen- to de menor relevância). Tem-se, pelo contrário, uma produção elitista e conservadora que reflete uma lógica social. E, que mesmo dentro das produções elitistas surgem reflexões do modo de ser e viver dos sujeitos que passam a produzir novos sentidos de representação socie- tária. Sobretudo, porque cada um/uma reflete o mundo a partir do seu contexto social e do suporte que se permite pensar.

Voltando às páginas do século XXI, encontro algumas produções feitas por mulheres pertencentes à região da Baixada, trago as impressões, os sentidos, os desejos e as expectati- vas, não para tecer um valor, mas para promover uma compreensão de que a palavra luta quando ressignificada nas práticas culturais de homens e de mulheres. Neste sentido, essas

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escritas não superficializam sentimentos, mas corrompem latências para ebulir o seu ser mais, e assim elas dirão:

“Mulheres prendadas Nascem para pintar, bordar...

“As mais levadas apenas „pintam e bordam‟ “Cada uma a seu modo alinhava a vida

Cada uma a seu modo há de cicatrizar seus pontos “Pintar e bordar

Faz parte da vida de toda mulher” (Arteiras – Sil, Miscelâneas, 2006, p.09)

“Agora

dei em quebrar tabus pular muros, dar beijos furtivos, conhecer-me mais.” (Lucidez – Sil, 2006, p.77)

“Cada vez que o morro desaba Se dilacera.

Mas, o morro não morre Ressurge na passarela. Quando ele desaba É como se, se replantasse Revolvendo a terra Como milagre, quimera...

(Da expansão das favelas – Sil, 2006, p.19)

O tempo

É a humanidade em movimento. (Do Tempo – Sil, 2006, p.85)

“Tristeza que vaza Em lágrima É como o gozo... “Tudo que ferve Por dentro de nós Transborda.

(Sem título – Sil, 2006, p.94)

* * *

“O hálito quente e magro das noites de verão Deixa minhas costas nuas,

Meu seio em tuas mãos Sussurra em minhas coxas

O convite molhado para o devaneio. Não há com dizer não!”

(Noites quentes – Rosilene Jorge dos Ramos, Poesia escondida no quintal dos meus dias, 2012, p.29)

...

“Aperto em mim:

Tua voz, teu membro, tua força, teu movimento. Dentro de mim:

Teu grito, teu rio, teu gozo, teu espasmo louco. Nosso trabalho,

Nosso cansaço, nosso riso, nossa alegria. Toque gemido, tremido.

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(Prazer – Rosilene Jorge dos Ramos, Periódico Gambiarra Profana/Folha Cultural Pataxó, 2015)

...

“Vou fazer morada no teu peito Para colher teu cheiro pelas manhãs. Teu corpo é meu quintal,

Onde o lema é só risos. Banho-me no teu suor me alimento de teus suspiros te escondo entre minhas coxas para depois de achar sorrindo. É pique-esconde de prazer. É pique-pega de sentidos. Teu corpo é meu quintal, Onde encontro meu sorriso.

(Meu quintal – Rosilene Jorge dos Ramos, 2012, p.31) ...

“Ligaram o botão do foda-se: Foda-se isso, foda-se aquilo, Foda-se tudo e todos, Foda-se todo mundo. Só não fodam comigo,

Porque aí o negócio é mais embaixo.

Foda-se então tu também que se fode para todo mundo.

Desligaram o botão do foda-se? Viva a solidariedade, viva o Rio.

Que mentirinha fodida me obrigaram a acreditar

Foda-se é esse sistema que fode muitos

para que poucos possam gozar.

Foda-se mil vezes foda-se

Milhões de bocas amarelas, negras, sem dente, com fome e doente

gritam mais uma, duas, três, ... mil vezes FODA-SE o capitalismo.

(Sem título – Rosilene Jorge dos Ramos, Periódico Folha Cultural Pataxó, 2004)

* * * “Esmurro O muro Do não Este espaço Onde pronunciamos Nossos protestos E nossa intenção Derrubo, Agora,

Com os raios brilhantes De mágicos girassóis A fim de retratar caminhos Após desatados certos nós.

Nós –

Reunidos em ninhos, Em voos,

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(Quereres – Elaine de Freitas, Palavras armadas, Edição da autora, 2011, p.45)

“É preciso estar Fora de si Para ser O que se quiser Proibido Os desejos De homem De mulher A pessoa Vira Outra: Bebe, Cheira, Goza Rouca; Acorda, Esquece E, depois, Fenece Em amor demais A quem não merece

Proibidos Os desejos De homem E de mulher, Virgínia Inventa A liberdade Moldada

Em sua própria carne Para ser o que quiser Assim,

Como a gente é.”

(Virgínia – Elaine de Freitas, 2011, p.114)

“Procuro um modo antigo de amor: A forma Imperfeita De choro Ao gozar Com quem Não se tem Certeza De nada. Quero enfeitar de flores

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O vestido e a lapela, Armar a rede, Quebrar espelho,

Arder de sede E apagar com palma A única luz da casa Sustentada pela vela.

Procuro uma paixão atormentada Para sustentar o curso do rio Que me carrega

Porque vivo, Sinto, Vejo E desejo

O mundo pelo avesso”

(Busca II – Elaine de Freitas, 2011, p.135)

* * *

“Para ti, um verso desalinhado, beijos quentes na testa e sabedoria: Talvez a insanidade chama-se um barco,

Que ancorou em minha atordoada alma...

Por ter pele negra, a mim permitem solidões e trabalhos infames, Discursos cifrados e mesmo os amigos,

Apontam cartões de salvem-se quem puder. Rouca e brusca,

Para que o precipício não trague nossas almas; Viagens e silêncios, beijos e amenidades;

So-li-tá-ria e aérea, pássaros cantam ao redor de mim; Cozida em lágrimas refaço-me tinta e poesia nas esquinas.

(Alma Vaga – Tati, Periódico Gambiarra Profana/F. Cultural Pataxó, 2015) ...

“Escritos bordados de saudade, das prosas que engrandecem e também, faz soldar os buracos,

que a dureza das cidades cinzentas e adoecidas nos impactam... Dos que compartilham as palavras e às tornam,

mais que belos adornos em livros empoeirados!”21 (Tarde morna...– Tati, 2012)

...

“No meio de nós o aborto de sonhos: Entre eles o pacto dos lobos.

Sem rastro. Cada um esconde punhais entre os dedos: A espera da Ciranda, para matar cada cobra – vingança.

Sujeitos cegos. Damas sem pétalas e Cavalheiros com fogo nas entranhas. (Cotidiano sem metáfora – Tati, 2011)

* * *

“Ai amor não faça isso! Ai amor não faça! Ai amor não! Ai amor! Ai!”

(Sem título – Lírian Tabosa, Anos 90, Poetas da Baixada, M.M., 1997, p.28) ...

“Contemplo

O templo do seu corpo pomposo E no gozo

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Vou esquecendo De mim De todos!”

(Sem título – Lírian Tabosa, Anos 90, Poetas da Baixada, M.M., 1997, p.28) ...

“Teus seios dizem tudo, quando entumecidos. Descontraida jogada sobre a cama, quer se abrir, mostrar as coxas, entregando-se mulher.

(Sem título – Lírian Tabosa22 – 05/2011)

* * *

“O céu é uma grande cama Forra com lençóis de cetim Cheio de ninfetas com buquês De clitóris a reluzir”

(Sem título – Ivone Landim, Anos 90, Poetas da Baixada. M.Matus, 1997, p.58) ...

“Hoje

Não quero falar de amor Não quero graça Quero ser mal-educada Não quero frases de efeito.

Hoje

Não quero saber do mundo Das mortes dos inocentes Quero sentir minha própria Dor de dente

Não quero o remédio dado. Hoje

Não quero conselho de padre Não vou dizer muito obrigada Não quero vinho, nem pão Não quero falso bom dia Nem o beijo sincero da traição.

Hoje

Quero parar a terra

Pedir carona à outros astros Ter a liberdade sonhada Num disco voador Quero a invasão dos ETs. Hoje

Vou atentar a fé Ser a escolha maldita Dita e refletida.

Hoje Vou intuir Ir por aí

Sem política e filosofia. Hoje

Vou quebrar a poesia!”

(Hoje - Ivone Landim23. 05/2011)

22 Poema publicado no blog: http://poesiasfulanasdetal.blogspot.com.br/2011/05/mulher.html) 23

Poema publicado no livro Ventos da Primavera de Arnoldo Pimentel, em 2010. Publicação independente da Folha Cultural Pataxó e Gambiarra Profana.

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* * *

“Andando pelas ruas da cidade, Me pergunto o porquê do encanto. Fio pra todo lado, asfalto em todo canto... Deve ser esse monte de ônibus colorido... Esse barulho de freio, esse gemido. Talvez seja o contraste brando... Da mata com o concreto

O que fala assim simples em minha mente, Calmo, direto.

A certeza da raiz Da terra escolhida Dos amigos que eu fiz... - Finco aqui!

Uma bandeira de trabalho Por essa gente, esse assoalho Que faço parte sem querer Que me encanta sem saber. É daqui que eu gosto... Cidade perfume. Só me resta saber... Perfume, de quê?

(Cidade perfume - Gabriela Boechat24, 2013) ...

“Quando sinto sua mente por perto

O que arrepia em mim é tudo mais que físico Muito menos que material

Quando vejo sua indiferença passar ao meu lado O que sinto é quase ímã. Não resisto

Repito sua voz olhando para pro outro lado Sofro em seguida com os minutos vão Queria tanto me engolir

Culpa do que ainda nem fui Íma. Não resisto. Não entendo.

(Quase ímã – Gabriela Boechat, Periódico da Gambiarra Profana, 2013)

* * *

“Eu nunca amei assim Tão triste

Com dores esparramadas Na minha sala

Eu nunca amei assim Tão sozinha

Parindo poemas de lágrimas Eu queria amar

O sim desse amor assim” (Assim... – Camila Senna25) ...

“Quero longe Te amo arredia Não te quero de dia Nem de noite Te quero distante Mas te quero 24 http://poesiasfulanasdetal.blogspot.com.br/2011/02/cidade-perfume.html 25

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Esse querer Sem querer perto Me agonia.” (- Camila Senna – 12/2013) ... “Meu (par)tido! O meu partido Só faz sentido Se minha caligrafia

For liberta dentro da poesia!” (-Camila Senna)

* * *

“O acabamento da obra.

A degustação do aperitivo e do processo. Manter a calma. Suco de maracujá. Lembrar-se de respirar.

Lembrar-se de esquecer. Se acostumar com a saudade

e com a ausência dele na cadeira ao lado. O acontecer no agora e não no porvir. Rabisco de desejo na brecha do intervalo. Sinos silenciosos. Luz elétrica.

Azulejo desbotado. A água sanitária. Dor de cabeça, nas costas e nas pernas.

Caminho errado para a farmácia. O famoso desconserto. Nenhuma mensagem no celular.

Caminhada pelo calçadão.

Cansaço humano. Lixo. Funk e Rock clássico. Brinquedos pirateados.

Crianças roubadas de si. Mochila rasgada.

Palavras encostadas no ouvido.