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“São mensagens, Letras falantes,Gritos visuais, Ordens de uso, abuso, reincidências. Costume, hábito, premência,Indispensabilidade, E fazem de mim homem-anúncio itinerante, Escravo da matéria anunciada”. Carlos Drummond de Andrade

No cenário atual, as empresas produzem e vendem sistemas de valores definidos pelos consumidores, sendo a marca um dos símbolos desse sistema. Allérès (2006) chega a afirmar que o objetivo de uma sociedade de consumo é ver os desejos das pessoas representados por objetos materializados em logomarcas, símbolos, que têm todo um significado próprio, em um contexto social.

As marcas de luxo “constituem parâmetros tangíveis do gosto de uma época naquilo que há de mais elevado. Elas sugerem mais do que objetos, uma referência de gosto, um habitus, para retomar a expressão de Bourdieu”. (KAPFERER, 2003, p. 73).

As grandes marcas mundiais e os seus preços elevados apresentam um mercado consumidor cada vez mais amplo. Na visão de Kapferer (2004), a notoriedade mundial é um fator que desperta sonho e desejo em consumir marcas globais. Esta característica de internacionalidade das marcas globais, em que a padronização é universal, aliada a uma intensa identidade de origem, são fatores intrínsecos à sua identidade.

De acordo com Nueno e Quelch (1998), as tradicionais marcas de luxo carregam entre suas características alguns atributos que lhe conferem prestígio. Estes são: a tradição de seus antecedentes históricos, a qualidade superior, a herança de fabricação manual, o estilo próprio e marcante, a reputação global, a associação com o país de origem, a habilidade de acompanhar o dinanismo da moda, a personalidade do seu criador, e ainda uma produção e distribuição limitada.

Segundo dados da empresa de branding Interbrand48, entre as cem marcas mais poderosas do mundo, 15 são do segmento luxo (INTERBRAND,2007). O quadro a seguir mostra o faturamento anual das marcas mais valorizadas do segmento:

MARCA US$ (bilhões)

LOUIS VUITTON 6,71 GUCCI 5,10 CHANNEL 4,32 ROLEX 3,67 TIFFANY 3,54 PRADA 2,54

Quadro 1: Quanto vale uma marca de luxo.

Fonte: Turchi (2007).

Lipovetsky (2005) diz que as marcas de luxo devem justificar seu valor agregado por sua legitimidade e identidade. A legitimidade da marca, por sua vez, se alicerça na qualidade, no refinamento, pois a marca de luxo “é a excelência do know-how , a tradição de qualidade, a criatividade, mas também o mito”. (CASTARÈDE, 2005, p. 108).

48

Estão entre as 100 mais valiosas, Louis Vuitton (17ª) (Gucci (46ª), Chanel (58ª), Rolex (71ª), Hermés (73ª), Tiffany & Co (79ª),Cartier (83ª), Prada (94ª) e Burberry (95ª). (Fonte: Interbrand, 2007).

Essa qualidade mítica de uma marca de luxo de que fala Castarède (2005) parece sempre se expressar por meio de uma história, um relato, em que os elementos básicos da meta narrativa do mito estão sempre presentes, muito mais até do que uma lista de atributos quaisquer. Tome-se a seguinte passagem, por exemplo:

[...] Salvatore Ferragamo cuidava pessoalmente de muitos de seus clientes, tirando suas medidas e gastando horas com eles, não só para satisfazer suas exigências, mas também para educá-los a respeito da qualidade superior de seus calçados. Em Florença, Ferragamo comprou um dos palácios mais belos, o Pallazzo Feroni-Spini, onde a decoração aristocrática e o esplendor florentino dariam as boas-vindas a seus famosos clientes, transformando ao mesmo tempo seus calçados numa espécie de sonho. (LONGINOTTI-BUITONI, 2000, p.90).

A propósito dos códigos de identificação de uma marca de luxo, vale mencionar como emblemático o exemplo da marca francesa Chanel , que possui o que se pode chamar de um forte "código genético" de marca. Gabrielle Chanel, a criadora original da marca, estabeleceu códigos muito precisos sobre o uso da marca e seus valores: rigor, linhas puras e vigorosas, força, simplicidade e postura, que orientam as criações da empresa até os nossos dias, com um sucesso inquestionável.

Como destaca Galhanone (2005), até hoje os signos do estilo Chanel permanecem inabaláveis: o logo com dois Cs entrelaçados, os sapatos bicolores, as bolsas com correntes, os ternos de tweed, as longas bijuterias. Graças a esse trabalho de retenção de valores, a marca nunca perdeu sua unidade e a formidável força de sua imagem.

O senso comum, geralmente, costuma referir-se a griffe, quando se trata de marca de luxo dotada de certo prestígio. Como bem nos ensina Kapferer (2004), no entanto, os dois conceitos diferem no território e no funcionamento. O ideal da griffe é a obra de arte, única, que será feita somente uma vez. Seu universo de referência é a criação pura, a arte, e sua intenção é fazer a perfeição. Segundo o autor, uma griffe pode vir a tornar-se uma marca.

Na concepção de Strehlau (2004), Montblanc, Kenzo, Dunhill, Boss, Armani são marcas e não griffes, porque seu berço não é o ateliê, mas a fábrica; seu modo de produção é a racionalização dos métodos. A marca pode ser falsificada, mas somente a griffe é copiada.

Considerando que as marcas de luxo satisfazem necessidades simbólicas, Roux (2005) oferece uma classificação perceptual das marcas, categorizando-as em marcas de luxo e marcas haut de gamme 49, com base no posicionamento e na estabilidade das comparações feitas pelos consumidores, e faz uma comparação dos elementos do composto mercadológico dessas categorias.

Um resumo geral dessas propostas de classificação das marcas , bem como suas características de diferenciação apontadas pelos autores, podem ser vistas no quadro apresentado a seguir:

PROPOSTA/

AUTOR CLASSIFICAÇÃO CARACTERÍSTICA MARCAS

Marcas de luxo Pequena gama Criação fora da tendência

Chanel, Cartier, Hermès, LuisVuitton Classificação

perceptual de Marcas

Roux (2005) gama elevada Marcas de

Ampla gama Criação conforme a moda

(bi anual)

Lancel, Mont Blanc

Griffes (création)

Assinatura do criador em obras únicas; trabalho puro

de criação e arte, que será feito somente uma vez.

Traje Yves Saint- Laurent ( alta-costura)

Marcas de luxo

A marca assina pequena produção em série, porém

com baixo volume de produção. Chanel, Hermés, Rolls-Royce, Cartier. Diferenciação entre griffe e Marca de Luxo conforme o universo de referência. Kapferer (2004)

Marcas de alto nível A produção é mecanizada e em série.

Cosméticos e perfumes La Praire,

Chanel e outros.

Quadro 2: Classificação das Marcas de Luxo.

Fonte: Elaborado pela autora com suporte em Kapferer (2004) e Roux (2005).

49

Na literatura francesa é comum a referência à extensão haut de gamme, aqui traduzido como gama elevada. Para Roux (2005), esta é a parcela intermediária do mercado que aspira a um segmento do mercado de gama mediana, mas também ao segmento do alto luxo.

Os criadores mais recentes buscam imortalizar suas marcas por meio de estilos baseados nas imagens que representem os estilos de vida dentre os vários tipos de homem contemporâneo. Por exemplo: a marca Giorgio Armani é o “símbolo de uma postura informal, funcional e libertária do homem no mundo dos negócios”. (BARONE, 2002, p.20); enquanto a marca Paul Smith representa a “sobriedade inglesa com uma pitada de humor” (BARONE, 2002, p.17); já a marca Ralph Lauren simboliza o visual esportivo da elite dos EEUU; e a marca Kenzo, “o homem zen”. (BARONE, 2002, p.21).

A valorização de aspectos intangíveis de uma marca evidencia a simbologia em seu uso, pois, como lembra Gobé (2002), a aceitação de uma marca não diz respeito somente à visibilidade e as funções de um produto, mas também ao “diálogo emocional” que ela provoca com o consumidor. De acordo com o autor, para que uma marca se torne relevante e sobreviva no mercado competitivo, “é preciso ter conhecimento das necessidades emocionais e dos desejos das pessoas”. (GOBÉ, 2002, p.17).

Dubois e Pasternault (1995) defendem a idéia de que toda marca de luxo pode ser posicionada em termos de relação entre consciência da marca, compra e sonho. Segundo os autores, o valor do sonho de possuir uma marca é afetado negativamente por sua super- difusão, pois é o princípio de raridade do produto que dá suporte para que este venha a ser considerado um bem de luxo. Além disso, o consumidor contemporâneo prefere comprar o “fascínio da segurança e da tradição inserido simbolicamente em um produto ou marca do que se inserir em novos conceitos que coexistem neste mundo que assusta pela inovação”. (CASTILHO, 2006, p. 44).

Os conglomerados mundiais de luxo há algum tempo utilizam a estratégia multimarca, quer dizer, criando uma marca para ser vendida numa categoria de produtos onde a empresa já trabalha. Na visão de Schweriner (2005), um dos maiores erros que a gestão de marcas de luxo pode cometer é a “democratização” dos seus produtos.

Este argumento do autor é recorrente ao fato de que, se o produto chega a se popularizar um dia, não mais voltará a ser um objeto de desejo, e nunca mais será um produto ou serviço de luxo. Segundo ele ,“se muita gente tiver, deixa de ser Luxo, e se não for chancelado por uma marca de prestígio e glamour, deixa as pessoas órfãs quanto à origem da peça”. (SCHWERINER, 2006, p. 25).

Diante desses argumentos, pode-se pensar que o maior problema dessa ampliação na linha de produtos sob a mesma marca de luxo é o efeito sobre sua simbologia. Ao lançar novas linhas de produto sob a mesma marca guarda-chuva, as marcas tradicionais colaboram com a diluição do conceito de luxo.

[...] a marca tradicional simboliza um nível de status elevado, mas quando este se torna amplamente utilizado transforma-se num símbolo fraudulento, e acaba por perder seu valor, criando um vácuo para outros símbolos que diferenciem a elite da massa. (SOLOMON, 2002, p. 455).

Se analisada de modo geral, a diversificação amplia a difusão da imagem da marca, produz novos canais de distribuição, aumenta a influência internacional e favorece sobremaneira a mobilidade na empresa, no entanto , “ a diversificação pode ser a melhor ou a pior das coisas , pois pode poluir e até matar uma marca”. (CASTARÈDE, 2005, p. 115).

4. O CONSUMO DE LUXO

“A única coisa necessária é o supérfluo” Oscar Wilde

Como tudo na Pós-Modernidade, os consumidores contemporâneos parecem utilizar múltiplas formas de consumo de luxo. Para Allérès (2006), este tipo de consumo obedece a um encadeamento de significados, que remete o consumidor a diversas motivações. Os processos pelos quais os consumidores adquirem e consomem itens de luxo permanecem enigmáticos (DUBOIS E PATERNAULT, 1995).