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Metáfora dos ciclos

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4 RESULTADOS E DISCUSSÃO

4.2 Percepção do Serviço e do Servidor Público Brasileiro

4.3.2 Metáfora dos ciclos

Esta metáfora foi largamente encontrada nas entrevistas. É possível afirmar que as fases de vida da pessoa influenciam em sua decisão de prestar concurso público. A maioria dos entrevistados acredita nisso, e muitos relatam que a fase de vida em que se encontravam os motivou a buscar o setor público. Existem casos em que o indivíduo identificou o serviço público como a alternativa mais viável de sobrevivência, devido às dificuldades financeiras pelas quais passava e mesmo devido à pressão familiar. As turbulências e os acontecimentos inesperados na vida do profissional podem impulsioná-lo a procurar a segurança que a carreira pública oferece.

“Eu acho que sim. Por exemplo, principalmente depois que eu me separei que eu fiquei mais preocupada com isso. Depois que eu separei que comecei a procurar o serviço

público.” (Depoimento de concursanda, grifo nosso).

“Comecei a trabalhar bem cedo, aos 13 anos, na revista X como ofice boy. Fui para a faculdade de direito logo cedo, aos 20; com 21 eu casei; aos 23 tive meu primeiro

filho, ai já tive que mudar um pouco meu projeto de vida, não poderia me dedicar

apenas ao estudo. Quando resolvi tentar fazer concurso público para poder garantir

o meu estudo e a vida da minha família.” (Depoimento de servidor público em estágio probatório, grifo nosso).

“[...] eu fui sustentado durante um tempo pela minha família e pela família da

minha esposa, as duas nos ajudavam, [...], eu estar sendo sustentado pra mim era muito ruim, então, isso tudo fez com que eu batalhasse, eu queria sair daquela situação, então, eu passei para esse concurso [...].” (Depoimento de servidor público, grifo nosso).

“Sem dúvida, cada um tem um tempo [...], eu gosto de ser independente, então,

desde novo eu era muito, muito preocupado com isso. Eu tenho que resolver minha

vida é logo, é logo, ter segurança e se não gostar depois eu migro pra outra coisa, faço, tenho que ter alguma coisa certa. Foi por isso que eu passei muito cedo nos concursos, foi por conta disso. Agora tem pessoas que acabam precisando de mais tempo pra

sentir essa necessidade. Eu não precisei ter filho pra querer ganhar o tanto certo todo mês. Mas tem gente que tem. Eu conheço pessoas que foram fazer a faculdade de Direito depois de 40 anos pra ser promotor de justiça. Já tinha casado, com três

filhos e tudo mais e depois que foi buscar isso. Acho que cada um tem um tempo. As

fases da vida influenciam e os motivos são diferentes pra cada um. Mas, com

certeza, que as fases influenciam é certo.‟‟ (Depoimento de servidor público, grifo nosso).

“Talvez o fato de ter constituído família, sim [interferiu na decisão em buscar o setor público], mas, além disso, não.” (Depoimento de servidor público, grifo nosso).

“Ah, ocorreu. Minha mãe tinha um certo problema de saúde durante certo tempo e

isso me impediu, por exemplo, de deslocar pra outras cidades, porque eu que cuidava e cuido dela até hoje. E isso impede que eu possa exercer certo tipo de

atividade, porque isso me prejudicaria com relação à guarda dela. [...] eu percebi que eu

fiz o melhor negócio mesmo em vir pro serviço público.” (Depoimento de servidor público).

“Acho que sim. Veja bem, eu já sou viúva. Eu fiquei viúva agora, tem três anos. Mas

imagina uma pessoa que é casada, fica viúva e tem três filhos pra cuidar, tem que trabalhar e pode ser que o serviço [público] seja uma coisa que motive a ela, porque tem horário certo pra entrar, pra sair, tem pagamento no final do mês, tem férias, se fica doente ela entra com licença e recebe. [...].” (Depoimento de servidora pública, grifo nosso).

Mesmo entrevistados que não conseguem visualizar um evento específico ou uma determinada fase que os fez escolher a área pública acreditam que existe essa interferência, como mostram os seguintes depoimentos:

“Com certeza, influencia sim, dependendo da situação. Tem uns que tentam concurso

porque precisam da estabilidade porque tem família, aí precisa de ter uma segurança. Muda de cidade porque se estiver no concurso vai estar estável

financeiramente. Então, a fase de vida, dependendo se casa, é solteiro, tem filho,

influencia. O meu não teve nada. O meu realmente é a vontade de ser Juiz e a única

forma de se chegar lá é com concurso público.” (Depoimento de concursanda).

“[...] o jovem ele se lança com mais facilidade no mercado. Ele [...] vai com menos medo de arriscar. Então, ele faz uma tentativa assim, pelo campo privado. Depois

quando vai chegando ali por volta dos 29 aos 32 anos ele já começa a preocupar com uma carreira mais sólida. Então, busca sim o serviço público, depois de ter feito

alguma coisa no campo privado, ele vai buscar sim. E principalmente, quando é

casado, tem um outro investimento aí. Que a vida não dá mais pra arriscar tanto. Eu

compreendo dessa forma. [...].” (Depoimento de servidora pública, grifo nosso).

“Certamente. Você deve ter 25, lá pelos 40, se você está numa empresa e perde

emprego, poucos lugares podem dar acesso a pessoas nessa idade. Então, uma pessoa

que já tem aí uma experiência de vida maior eu acredito que ela tem muito mais chance num concurso público, que não olha sexo, religião, teoricamente não olha idade. [...]. Ele

não deixa de ser sempre uma opção pra vida. Em qualquer fase da vida eu acredito. Não, especificamente, quando eu fiz o segundo concurso que passei na Empresa

Pública X, foi logo depois do racionamento [de energia elétrica] ter acabado [...]. Existia

essa retração por assim dizer, do mercado. Eu estava em início de carreira, nem tantas pessoas me conheciam. Havia contas a pagar, a coisa mais certa na vida, a

morte e as contas. Então, pra você fazer, você fazer concurso não significa que vai passar. Eu tentei, tinha conhecimento, tinha formado a pouco tempo, então, era uma opção, pelas dificuldades das época era uma opção.” (Depoimento de servidor público, grifo nosso).

O ciclo de vida das pessoas interfere na busca pelo cargo público. Muitos indivíduos hoje optam pelo serviço público, devido a situações vivenciadas na vida privada, que os impelem a um redirecionamento da carreira, por exemplo, quando uma pessoa se casa e tem filhos ou quando passa por uma separação conjugal, como foi mostrado nos depoimentos. Esse redirecionamento, no caso do Brasil, tem sido para o setor público.

É possível perceber que uma boa parte dos concursandos encontra-se em uma fase de suas vidas caracterizada pela necessidade de estabilidade financeira, o que pode ser compreendido, se for

levada em consideração a faixa etária em que se encontram: a maioria possui idade entre 25 e 35 anos. Nessa fase, as pessoas saíram há pouco tempo da graduação e querem uma autonomia financeira em relação aos pais, inclusive, para poder constituir família, comprar bens, organizar sua vida de forma independente.

Quase todos os entrevistados entendem que os ciclos de vida interferem na escolha profissional e na procura pelo setor público, sendo poucas as pessoas que responderam o contrário.

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