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A METAMORFOSE E A DEGRADÇÃO

No documento INÁCIO RODRIGUES DE OLIVEIRA (páginas 99-101)

Transcrição de causo cont ado por Geraldo Tart aruga São Luiz do Parait inga, SP

A METAMORFOSE E A DEGRADÇÃO

A porca de sete leit ão é um a porca branca e sete leit ãozinho branco que nem algodão. Essa porca é um a m ulher que m orava lá no alt o do cruzeiro, lá no grot ão. Ent ão, essa m ulher, quando ela m orava lá num a casinha de barrot e, um a casinha aqui bem ant iga ela m orava lá, esse alt o cruzeiro não t inha casa nenhum a, era só a dela lá naquele cartão [ quart eirão] , e m ais um as duas casinha aqui em baixo e só. Ent ão, essa m ulher, ela era da vida, né, t odo dia ela t inha que colhê hom e dent ro de casa. Os hom e ia t udo lá. Mas quando ela ficava prenhe, nascia um filho dela, ela m at ava Ent ão, t udo ano, o filho nascia, ela m at ava e ent errava no quint al. Foi ent errando. Ent errou os set e filho. Mas quando ela... os sete filho ela enterrou, daí deu um negócio nela t am bém , logo no parto né e ela m orreu.

A oração, com o verbo no presente, cria o efeito de sent ido do real. O ator é configurado com o porca branca, figura que se desdobra em sete leit õezinhos brancos que nem algodão. Os porcos conseguem m uito dificilm ent e conservar- se lim pos. Assim , a descrição causa surpresa e prepara para o est ranham ent o da m etam orfose: a porca era m ulher que m orava, outrora, no alto, no grotão acim a do cruzeiro que m arca esse espaço no t em po present e da enunciação.

A linguagem espacial com pleta a descrição do at or fem inino, enfat izando sua im agem disfórica e culpabilidade: era segregada devido à sua condição de m ulher da vida, culpada por parir filhos e m atá- los, finalm ent e, castigada visto que, após o sétim o, deu um negócio nela e

92 ano) pelos m esm os e sucessivos eventos de vida e m orte (nascia, matava, enterrava) .

A m em ória desses fatos recupera o valor disfórico no present e, dando a seu sim ulacro a força de verdade, própria do tem po vivido agora, sem , ainda, nada j ust ificar t extualm ente, à exceção da pont uação da cor branca do corpo. Ent retanto, a isotopia j á se instala por m eio das polarizações: alto e baixo, dent ro e fora, nascim ent o e m ort e, m arcadas pela disforia da m et am orfose, cuj o traço principal é a culpabilidade, pois a t ransform ação em anim al im plica perder a espirit ualidade.

As t ransform ações ocorrem segundo a interação de um actant e Destinador com seu actant e Destinat ário, apresentados por Greim as & Courtés ( 1979) com o entidades distint as. Tais actant es destinador ou destinatário ( escrit os com inicial m inúscula) at uam com o em issor ou recept or de qualquer processo de com unicação, enquant o que o Destinador ou Dest inatário ( com inicial m aiúscula) t êm função bastante diferenciada:

Freqüentem ent e dado com o pertencendo ao universo t ranscendent e, o Dest inador é aquele que com unica ao Dest inat ário- suj eit o ( do âm bit o do universo im anent e) não som ent e os elem ent os da com pet ência m odal, m as t am bém o conjunt o dos valores em jogo; é t am bém aquele a quem é com unicado o result ado da performance do dest inat ário-suj eit o, que lhe com pet e sancionar. Desse pont o de vist a, poder- se-á, port ant o, opor, no quadro do esquem a narrat ivo, o Dest inador m anipulador ( e inicial) ao Destinador j ulgador ( e final) . ( p. 115)

Devido à estrut ura polêm ica das narrativas, que com portam um suj eito e um anti-suj eit o, o Destinador pode t er um contrário, o anti- Dest inador, assim com o cont radit órios, ou sej a, o não- Dest inador e o não- ant i-Dest inador. É esse suj eito m anipulador que configura as im posições do grupo social, as paixões ou as forças da nat ureza.

Nem sem pre o act ante Dest inador m ostra claram ente sua função m anipuladora. Nest e causo, o suj eit o de estado, m ulher da vida, é im pulsionado a assum ir tal com port am ento, assim com o t er, m atar e enterrar filhos, por algum a paixão não referida no t exto. Som ent e se sabe, nesta seqüência, que a conj unção com essa vida e atitudes foi

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sancionada com um castigo: prim eiro um incidente de saúde ( deu um

negócio nela tam bém ), depois a m ort e ( ela m orreu) e a degradação pela

m et am orfose, fat o inicial do causo ( essa porca é uma mulher) . A VOLTA E OS ATAQUES

Daí, passando uns ano, com eçou surgí no art o do cruzeiro um a porca de set e leitão que descia do art o do cruzeiro, descia at é aqui ondé a praça. A praça aqui ainda não exist ia, t inha pouca casa, t ava com eçando esses casarão, né. Ent ão, a porca descia at é aqui em baixo de noit e e t udo que ela achava no cam inho, ela devorava. Tudo que ela achava no cam inho. É gent e que ela encont rava, ela m at ava, bicho, cachorro, t udo que ela encontrava em redor do cam inho que ela ia passar, ela destruía.

A notação que m arca a seqüência é de um grande tem po de espera ( passando uns anos) at é o reconhecim ent o de sua presença, m ostrando que o processo ou os efeit os da m etam orfose apresentaram - se im precisa e lentam ent e, pois são descrit os por m eio de im agem indefinida e ação incoativa ( com eçou a surgir um a porca) , por realizações às escondidas ( descia até aqui em baixo de noit e) e por at ividade desorganizada ( devorava tudo o que achava no cam inho) . Todas as ações dem onst ram agressividade, sem dist inguir quem , com o, onde ou por que atacar. É difícil det erm inar o m otivo dessas ações, o que leva a caract erizar suas atividades com o irracionais, port anto, com o a de um suj eito realm ente degradado, sem espírito. Neste a seqüência, o Dest inador do suj eit o de est ado é a paixão da fúria irracional.

No documento INÁCIO RODRIGUES DE OLIVEIRA (páginas 99-101)