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CAPÍTULO 1 – REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO

1.3 Metodologia

Esta é uma pesquisa de abordagem qualitativa, resultante do diálogo crítico entre as referências bibliográficas e o exame dos dados empíricos coletados em duas creches da cidade de Santo André-SP, a respeito da reprodução do branqueamento no contexto escolar.

O corpo teórico desta tese é composto por estudos produzidos em diferentes áreas das ciências sociais, dentre elas, sociologia, história, filosofia, antropologia, pedagogia,

psicologia, que tratam de estudos sobre as questões étnico-raciais, e por trabalhos que integram o conjunto das referências teóricas desta investigação.

Para Bauer e Gaskell (2003, p. 19), “[...] um processo de pesquisa social perpassa por quatro dimensões, a saber: Princípios do Delineamento, Geração de dados, Análise de dados e Interesses do conhecimento”. Para atender à dimensão “Geração de Dados”, algumas de suas técnicas e instrumentos são a entrevista individual, o questionário, os grupos focais, filmes, vídeos, observação sistemática, coleta de documentos e gravação de sons. Como este trabalho assume uma metodologia de cunho exploratório, decidiu-se por utilizar as técnicas: observação, entrevistas individuais e grupo focal.

A coleta de dados ocorreu durante os anos 2015-2016, por meio da observação do cotidiano escolar, realização de entrevistas e grupo focal com diferentes sujeitos que compõem as equipes pedagógicas, gestoras e docente das unidades escolares aqui estudadas.

Como sujeitos desta pesquisa, buscou-se educadoras que, na função de Coordenadora do Serviço Educacional (CSE), Assistente Pedagógica (AP), Diretora da Unidade Escolar (DUE) e professores/as de Creche, pudessem fornecer dados sobre o cotidiano escolar e as práticas educacionais que contribuem ou não com a reprodução do branqueamento nos espaços da Creche.

A equipe de Coordenadoras do Serviço Educacional da Educação Infantil e Ensino Fundamental, atualmente, é composta por 18 educadoras. O processo seletivo para a escolha das coordenadoras é feito através de uma seleção interna, que leva em consideração prova escrita, entrevista, identificação com a política educacional, experiência pedagógica, prática docente e formação acadêmica. As coordenadoras fazem parte do quadro de funcionários da Secretaria Municipal de Educação (SME) que, junto ao acompanhamento estrutural e pedagógico das Creches, tem por responsabilidade mediar o diálogo entre a unidade de ensino e a SME e motivar a implantação da política educacional vigente. Cada coordenadora é responsável por 5 Creches (Unidades Escolares) e, para isso, semanalmente, realiza reuniões setoriais, assessora a elaboração do Projeto Político Pedagógico e acompanha diretamente a formação da equipe gestora.

A equipe gestora é constituída pela Diretora da Unidade Escolar (DUE) e a Assistente Pedagógica (AP), cargos que são, também, designados através de processo seletivo interno, no mesmo padrão da escolha das Coordenadoras do Serviço Educacional, acrescido do perfil de disponibilidade e parceria entre a DUE e AP. Quanto à equipe docente, é constituída por professores (as) concursados(as), com formação em Pedagogia ou Magistério.

Para a realização da coleta de dados, a decisão foi por observar o ambiente físico e relacional das creches visitadas. A observação da Creche Loná ocorreu nos meses de fevereiro, março, agosto e novembro de 2015 e da Creche Nirin, no primeiro semestre de 2016, período em que a pesquisadora observou diferentes ações: reunião de planejamento, o acolhimento das crianças e familiares no início do semestre letivo, o período de adaptação das crianças recém-chegadas na creche, o cotidiano escolar (rotinas e conteúdos), duas festas envolvendo também a comunidade externa.

Ressalta-se que tal observação assumiu um caráter de “[...] observação oculta versus observação aberta” (VIANNA, 2007, p.17). Num primeiro momento, utilizou-se do caráter oculto, pois o tema da pesquisa não foi, totalmente, revelado àqueles(as) que estavam sendo observados(as). A equipe gestora teve o conhecimento do tema da inclusão da criança negra, enquanto a equipe de professoras foi informada apenas sobre a observação do acolhimento das crianças em geral. É importante explicar que houve momentos em que a observação se tornou aberta, pelo fato de que houve a interferência de funcionárias que reconheceram a pesquisadora como palestrante sobre a temática do branqueamento, em processos de formação da equipe de funcionários públicos.32 Porém, oficialmente, foi somente na realização do grupo focal que as professoras tomaram conhecimento sobre o tema específico da pesquisa – o processo de branqueamento nos espaços da creche.

“A finalidade real da pesquisa qualitativa não é contar opiniões ou pessoas, mas ao contrário, explorar o espectro de opiniões, as diferentes representações sobre o assunto em questão” (BAUER; GASKELL, 2003, p. 68), por isso, no percurso para a coleta de dados, foram elaboradas, também, quatro entrevistas individuais e semiestruturadas com a equipe gestora - Diretoras e Assistentes Pedagógicas, das Unidades Escolares. Para Bauer e Gaskell (2003, p. 65),

[...] o emprego da entrevista qualitativa para mapear e compreender o mundo da vida dos respondentes e o ponto de entrada para o cientista social que introduz, então, esquemas interpretativos para compreender as narrativas dos atores em termos mais conceptuais e abstratos, muitas vezes em relação a outras observações. A entrevista qualitativa, pois, fornece os dados básicos para o desenvolvimento e a compreensão das relações entre os atores sociais e sua situação. O objetivo é uma compreensão detalhada das crenças, atitudes, valores e motivações, em relação aos comportamentos das pessoas em contextos sociais específicos.

32 Assistentes do Desenvolvimento Infantil, merendeiras, pessoal da limpeza e higienização, segurança,

As entrevistas com a equipe gestora - Diretora e Assistente Pedagógica, de cada Unidade Escolar, foram feitas antes da realização do Grupo Focal com as respectivas equipes de professoras. Visto que, em meados de 2015, foi iniciada a observação do cotidiano na Creche Loná, as entrevistas individuais foram realizadas, primeiramente, com Assistente Pedagógica (abril/16) e, depois, com a Diretora (maio/16) da referida Creche. No final de 2015 para 2016, houve troca na direção da Unidade, o que dificultou o agendamento da entrevista com a nova diretora. Na Creche Nirin, a entrevista foi realizada primeiramente com a Assistente Pedagógica (março/16) e três dias depois com a Diretora (março/16). Essa ordem das entrevistas se deu porque foi solicitado, pela pesquisadora, que as entrevistadas guardassem certo sigilo em relação às perguntas realizadas, para que não houvesse interferência nas respostas de cada uma delas. O que se pôde perceber foi que, em razão do “possível sigilo”, cada uma com suas especificidades demonstrou certo nervosismo e preocupação ao responder as questões. Essa reação foi explicitada por elas, ao afirmarem não ter domínio sobre o assunto e se demonstrarem preocupadas em dialogar sobre o tema, mas que esperavam ajudar de alguma maneira no processo da pesquisa, ou ao reconhecerem ter domínio sobre o assunto, mas estarem preocupadas com a linguagem (escolhendo as palavras com muito cuidado) e com a maneira de exporem suas ideias.

Conforme explicam os manuais para realização do Grupo Focal, técnica bastante empregada na pesquisa social nas últimas duas últimas décadas, sobretudo na educação, é importante que “[...] os participantes possuam algumas características em comum [...]” e tenham “[...] alguma vivência com o tema discutido, de tal modo que sua participação possa trazer elementos ancorados em suas experiências cotidianas” (GATTI, 2005, p. 7). Neste sentido, foi realizado um encontro com cada um dos grupos - sujeitos desta pesquisa. Pode-se dizer que um encontro com cada grupo foi o suficiente, pois, segundo Gatti (2005), a quantidade está vinculada à possibilidade de se alcançar (ou não) um conjunto de ideias necessárias para a compreensão do problema investigado. Segundo Morgan e Krueger (1993):

[...] a pesquisa com grupos focais tem por objetivo captar, a partir das trocas realizadas no grupo, conceitos, sentimentos, atitudes, crenças, experiências e reações, [...]. O grupo focal permite fazer emergir uma multiplicidade de pontos de vista e processos emocionais, pelo próprio contexto de interação criado, permitindo a captação de significados que, com outros meios, poderiam ser difíceis de manifestar. (apud GATTI, 2005, p. 9).

Com a intervenção da Assistente de Direção do Departamento de Educação Infantil e Ensino Fundamental, da Secretaria Municipal de Educação, foi agendado o Grupo Focal com as Coordenadoras do Serviço Educacional da Educação Infantil e Ensino Fundamental. Tendo

conhecimento do tema da pesquisa e, validando a sua relevância para o Departamento de Educação Infantil, a Assistente formalizou o convite à equipe de coordenadoras e enfatizou a temática que seria desenvolvida e a metodologia do grupo focal; explicou, também, que poderiam participar as 7 Coordenadoras de Creche, mais aquelas que, mesmo estando, naquele momento, na coordenação da Educação Infantil ou Ensino Fundamental, acumulavam experiência na coordenação de Creche. Segundo devolutiva da Assistente de Direção da SME, as coordenadoras demonstraram interesse e o agendamento do Grupo Focal foi feito para um dia e horário em que, normalmente, realizavam as reuniões da equipe para assessoria pedagógica. A entrada da pesquisadora junto à equipe de coordenadoras foi facilitada pela intermediação da própria SME, o que contribuiu para a predisposição das 7 participantes (4 coordenadoras de Creche e 3 coordenadoras de EI e EF, com experiência na coordenação de Creche) em responder às questões levantadas ao grupo e em contribuir na interação das ideias e opiniões ali apresentadas.

Ao lembrar que um dos objetivos do Grupo Focal é compreender “[...] não somente o que as pessoas pensam e expressam, mas também como elas pensam e porque pensam o que pensam” (GATTI, 2005, p. 9), pode-se afirmar que a realização de um encontro com as Coordenadoras do Serviço Educacional (CSE), que atendem às Creches Municipais de Santo André, foi o suficiente para o levantamento de dados e informações que contribuíram para o avanço e continuidade da pesquisa.

Em relação à organização dos grupos focais realizados com equipe docente das referidas creches, o agendamento foi realizado pela equipe gestora de cada Unidade, em horário de Reunião Pedagógica Semanal (RPS). Na Creche Loná, aconteceu após a pesquisadora ter feito as visitas para observação do cotidiano escolar, ter acompanhado duas reuniões pedagógicas e uma festa com as famílias. Como já explicado, iniciou-se a observação com um caráter de “observação oculta”, pois a equipe de professoras não tinha a informação do tema específico da pesquisa (reprodução do branqueamento). Oficialmente, sabiam que o olhar da pesquisadora estava direcionado para as práticas de acolhimento das crianças. Somente no encontro para realização do Grupo Focal, as professoras tomaram conhecimento do tema, através do acolhimento feito à pesquisadora e apresentação do Termo de Consentimento livre e esclarecido (Apêndice I). A Assistente Pedagógica presenciou todas as discussões do grupo focal, na condição de observadora, pois foi solicitado pela pesquisadora que evitasse emitir suas opiniões, visto que já havia passado pelo processo de entrevista.

Quanto ao Grupo Focal realizado na Creche Nirin, da mesma forma, a convocação foi feita pela Assistente Pedagógica, e foi realizado em dia e horário de RPS, após a pesquisadora ter realizado as visitas para observação do cotidiano escolar, ter participado de uma festa com as crianças e de um encontro de acolhimento às famílias. A observação também teve o caráter de “observação oculta”, sendo que as professoras tomaram conhecimento da temática da pesquisa, através da própria pesquisadora, ao apresentar a proposta do grupo focal. A diretora e assistente pedagógica participaram do grupo focal, como observadoras, pois foi solicitado a elas que evitassem omitir opinião sobre as temáticas, para que houvesse o mínimo possível de influência na discussão e reflexão do grupo docente.

Quanto ao perfil das educadoras-sujeitos da pesquisa, seguem as informações obtidas através da ficha de identificação preenchida por cada participante (Apêndice I). No total foram entrevistadas 30 educadoras, sendo: 7 coordenadoras do serviço educacional (SME); 4 gestoras (2 diretoras e 2 assistentes pedagógicas) e 19 professoras. Grupo de coordenadoras do serviço educacional: as participantes estão entre 42-49 anos de idade, todas autodeclaradas brancas, tempo de experiência na educação entre 13 e 29 anos e tempo na gestão entre 3-16 anos. Grupo de gestoras: as entrevistadas estão entre 36-49 anos de idade, 02 autodeclaradas brancas, 01 negra e 01 não identificou sua cor/raça, tempo de experiência na educação entre 16-28 anos e tempo de gestão entre 3 meses e 6 anos. Grupo de professoras da Creche Lona: as participantes estão entre 26-47 anos de idade, 8 autodeclaradas brancas e 3 pardas, tempo de experiência na docência, entre 3-25 anos; na Creche Nirin: as participantes estão entre 23- 44 anos de idade, 5 autodeclaradas brancas, 1 negra e 2 pardas, tempo de experiência na docência entre 2-19 anos.

Para o tratamento analítico dos dados, foi utilizada a metodologia da Análise de Conteúdo, sendo esta uma das técnicas da pesquisa social que “[...] apoia-se em dados sociais - dados sobre o mundo social – que são o resultado, e são construídos no processo de comunicação” (BAUER; GASKELL, 2003, p. 20). Essa técnica permite “[...] visualizar os núcleos organizadores dos discursos, as variáveis e categorias, bem como os conflitos e consensos estabelecidos pelas pessoas dos grupos estudados. Possibilita observar os dados por meio de uma visão ampla, na qual a totalidade do material coletado permite levantar categorias do grupo” (REIS; BELLINI, 2011, p. 154).

Para compreender e interpretar criticamente o conteúdo das diferentes comunicações, os dados coletados foram analisados, também, a partir do sentido da comunicação no momento do discurso. Como afirma Bauer e Gaskell (2003, p. 21), “estamos interessados na

maneira como as pessoas espontaneamente se expressam e falam sobre o que é importante para elas e como elas pensam sobre suas ações e as dos outros”.

O processo de coleta de dados e apresentação dos instrumentos metodológicos foram realizados com a finalidade de aprofundar as questões levantadas pela pesquisadora e explicitar os problemas em relação à prática do branqueamento nos espaços da creche.