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METODOLOGIAS ATIVAS: RESSIGNIFICANDO AÇÕES Juliana Delalibera Thobias Mendes 1 , Ellys Marina de Oliveria Lara 1 , Valéria Vernaschi Lima 2 e

Roberto de Queiroz Padilha1

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1. Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa 2. Universidade Federal de São Carlos - UFSCar

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Resumo

Este relato de experiência reflete o processo de ensino-aprendizagem nos cursos de especialização lato sensu concebidos pelo Instituto Sírio-Libanês de Ensino e Pesquisa que ocorrem em ondas de formação. Orientados por competência, os cursos utilizam metodologias ativas de ensino-aprendizagem como, Aprendizagem Baseada em Problemas, Problematização e Aprendizagem Baseada em Equipes. Essas estratégias educacionais são combinadas com a construção de Projetos Aplicativos, Portfólios reflexivos e Trabalhos de Conclusão de Curso. O processo de capacitação utilizando metodologias ativas, segundo uma abordagem construtivista da educação, tem contribuído para o fortalecimento de uma prática pedagógica fundada nos princípios de liberdade, autonomia, respeito e reflexão crítica. Além de oportunizar e ampliar a qualificação do trabalho em saúde nas diversas regiões do país.

PALAVRAS-CHAVE: Competência; Aprendizagem Baseada em Problemas; Problematização e Metodologias ativas de ensino-aprendizagem.

Introdução

O Instituto Sírio Libanês de Ensino e Pesquisa – IEP/HSL vem desenvolvendo, em parceria com o Ministério da Saúde, Projetos de Apoio ao SUS. Vinculados ao Programa de Apoio ao Desenvolvimento Institucional do SUS - PROADI, os projetos educacionais utilizam recursos advindos da renúncia fiscal concedida pelo Ministério da Saúde aos hospitais filantrópicos considerados de excelência no país (BRASIL, 2009).Com foco na capacitação de profissionais de saúde do SUS, esses

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projetos utilizam currículos orientados por competência e usam metodologias ativas de ensino- aprendizagem, segundo uma abordagem construtivista da educação (BRASIL, 2007).

Os cursos são presenciais e também utilizam educação à distância. São elaborados em formatos de especialização ou de aperfeiçoamento. Foram desenhados em ondas deformação, que utilizam as metodologias ativas de ensino-aprendizagem e têm como foco principal a qualificação profissional nas áreas de atenção à saúde, gestão em saúde e educação na saúde em diversas regiões de saúde no Brasil, definidas pelos gestores do SUS. As unidades educacionais, compostas por uma combinação de estratégias e atividades educacionais, são construídas pelos autores de cada curso e validadas por gestores de aprendizagem, responsáveis pela realização dos cursos nas regiões de saúde. Os gestores capacitam facilitadores que, por sua vez, formam os especializandos. Cada pequeno grupo de especializandos é acompanhado por um facilitador (Figura 1).

Figura 1 - Ondas de capacitação, Projetos Educacionais, IEP/HSL e MS.

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Os conteúdos das atividades educacionais são selecionados de acordo com o perfil de competência de cada curso e trabalhados segundo os pressupostos da educação de adultos, da aprendizagem significativa e do trabalho em equipe. O maior sentido dos projetos educacionais dos Projetos de Apoio ao SUS vincula-se à promoção de uma consciência crítica e postura ética e compromissada dos trabalhadores com as necessidades de saúde da sociedade.

127 Para além de orientar a seleção de conteúdos, o perfil de competência também é utilizado como referência para o desenvolvimento e avaliação do desempenho dos participantes. A metodologia de construção do perfil profissional é ancorada na abordagem dialógica de competência. Nessa perspectiva, a competência expressa a articulação de conhecimentos, habilidades e atitudes para a realização de ações contextualizadas diante dos problemas profissionais prevalentes (HAGNER, 1996; LIMA, 2005).

Na abordagem construtivista, a intervenção pedagógica visa contribuir para que o participante desenvolva uma capacidade crítica e transformadora em relação aos problemas da sociedade e se envolva em aprendizagens significativas orientadas à melhoria de sua prática. Para alcançar essas conquistas os especializandos devem desenvolver uma postura orientada à aprendizagem ao longo da vida de modo que todos aprendem a aprender (FREIRE, 2001; COLL, 1994).

A aprendizagem significativa destaca a necessidade de aproximação do ensino à prática cotidiana. Quando o processo do aprender é desencadeado por um problema do trabalho, onde os participantes utilizam os seus saberes prévios para identificar a natureza dos problemas e para formular perguntas, é possível buscar novos sentidos e significados para interpretar os fenômenos encontrados (AUSUBEL, 1980).

Ao estudar a formação dos educandos, Garcia e Valla (1996, p. 17) trazem a ideia de que “formar é muito mais do que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas”. A reflexão crítica sobre a prática deve permear toda a formação docente, sendo que “ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua produção ou construção” (FREIRE, 2013 p. 24).

Nas atividades educacionais dos cursos do IEP/HSL, a corresponsabilização de todos os atores envolvidos no processo é incentivada. Há uma permanente conexão entre autores, gestores de aprendizagem, facilitadores e especializandos, nas regiões de saúde do país. Quer em atividades presenciais ou a distância, por meio de uma plataforma virtual de aprendizagem, as comunidades de aprendizagem se retroalimentam e se mantêm ativadas no sentido da busca por melhores informações e práticas em saúde, gestão e educação.

Nos cursos de especialialização, os profissionais são estimulados a construir e ressiginificar saberes, ampliando suas capacidades de compreensão, análise, síntese e avaliação. O participante é o protagonista do seu processo de ensino-aprendizagem e reflete sobre sua prática de trabalho numa experiência focada na relação que envolve tanto o educando quanto o educador. Nesse sentido, “quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender”. Esse círculo virtuoso alimenta o processo educacional pautado na interação entre o sujeito que aprende e o mundo (FREIRE, 2013 p. 25).

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Nas diferentes atividades educacionais, os conhecimentos prévios dos participantes são valorizados como ponto de partida para a construção de novos saberes. Para além dessa característica, os disparadores de aprendizagem são problemas do cotidiano do trabalho em saúde, que podem ser construídos por especialistas ou trazidos pelos próprios participantes (OLIVEIRA, 2014).

Na Aprendizagem Baseada em Problemas - ABP- a “Situação Problema”, disparadora da aprendizagem de pequenos grupos de participantes, é construída por uma equipe de autores/especialistas e identificada por um título que, preferencialmente, chame a atenção, sem antecipar o problema. Na problematização, os problemas são construídos pelos participantes, por meio da observação e reflexão sobre a própria realidade/prática (BERBEL,1998).A partir de um conjunto de narrativas de práticas, os participantes, também em pequenos grupos, identificam semelhanças e diferenças em seus relatos. A partir dessa identificação, buscam agrupar os problemas e identificar os fenômenos neles envolvidos.

Nos cursos de especialização do IEP/ HSL, as realidades dos especializandos são trazidas para discussão em sala de aula por meio destas narrativas. Essas visam ampliar as capacidades para a construção de textos crítico-reflexivos. Para Bruner (1991), a construção de uma narrativa requer uma combinação de habilidades linguísticas e técnicas sócio-comunicativas que se diferenciam segundo as características pessoais, curiosidade e paixão, formadas por um conjunto de estruturas que são transferidas cultural e historicamente.

A partir da exploração destes disparadores, o processo de ensino-aprendizagem se dá por meio de diferentes etapas educacionais que ocorrem em movimentos articulados que se retroalimentam e podem ser representados pelo desenho de uma espiral, a Espiral Construtivista.

Quer para situações-problema ou narrativas, o momento inicial no processamento desses disparadores é de identificação de problemas e a formulação de explicações. O estímulo educacional fornecido pelo curso permite que cada participante explicite suas ideias, percepções, sentimentos e valores prévios, levantando evidências daquilo que já conhece e que pode ser utilizado para explicar melhor uma determinada situação.

Durante este processo, cada especializando é capaz de contribuir com suas explicações e formular hipóteses explicativas, possibilitando o reconhecimento das necessidades de aprendizagem que irão favorecer a criação de questões de aprendizagem. As questões construídas apontam a necessidade de aprendizagem e desafiam o especializando a buscar novas informações em bancos de dados e fontes confiáveis para além do reconhecimento de fatos e mecanismos, mas requerendo interpretação e posicionamento, corroborando para ampliação da capacidade de aprender ao longo da vida. A busca e análise críticas de informações e fontes é realizada individualmente pelos participantes.

129 Ao retornarem com suas buscas para um momento presencial destinado ao compartilhamento e discussões dos estudos, os grupos são estimulados, pelo facilitador, a confrontarem as novas informações trazidas com os saberes prévios. Durante todo o processo, os especializandos entram em contato com novos saberes e são incentivados a ampliar seus olhares/perspectivas, no sentido de potencializar a construção de novos significados.

A avaliação formativa também é um momento importante na espiral construtivista, pois permite que o especializando contribua ativamente com a melhoria do processo de ensinar e aprender. Verbalmente, o participante faz a sua autoavaliação, avalia a participação dos outros integrantes do grupo e também o processo de facilitação.

As estratégias de avaliação utilizadas nos cursos de especialização do IEP/HSL de Apoio ao SUS tem o caráter contínuo e valorizam os deslocamentos de aprendizagem promovidos pelos participantes, permitindo a identificação de avanços e a detecção de dificuldades. Visam qualificar e melhorar o processo ensino-aprendizagem, seus produtos e resultados (OLIVEIRA, 2014).

Outro instrumento de avaliação formativa utilizado nos cursos de especialização do IEP/HSL é o portfólio reflexivo. Por meio desse instrumento são promovidos espaços individuais/tutoriais, em duplas e em pequenos grupos para o compartilhamento das produções e reflexões. O portfólio é construído pelo especializando e visa retratar sua trajetória de aprendizagem, no decorrer das atividades desenvolvidas. Este instrumento de aprendizagem e de avaliação privilegia o desenvolvimento do pensamento crítico-reflexivo, da independência intelectual e da criatividade (SÁ- CHAVES, 2000).

Uma das principais características do portfólio está na autonomia do participante de formular seus próprios objetivos de aprendizagem e organizar este instrumento de maneira que o produto mais relevante seja a aprendizagem construída na sua criação, refletindo sua trajetória de aprendizagem e realizações (MURPHY, 1997; VILLAS BOAS, 2004).

Os conteúdos e vivências mais significativas para os especializandos devem ser registradas em seu portfólio. A partir deles, os especializandos constroem uma síntese reflexiva que ocupa o lugar de Trabalho de Conclusão de Curso - TCC. Existe, ainda, um instrumento escrito de avaliação do desempenho dos participantes no processo ensino-aprendizagem que é aplicado no meio e ao final do curso. Esse formato está voltado à análise das capacidades de aprender a ser, a conviver e a aprender, ao longo da vida. Para os participantes com conceito “precisa melhorar” nesse instrumento, é construído um plano de melhorias em conjunto (especializando e facilitador) que deve ser acompanhado durante o restante do período da especialização.

Sob a orientação do respectivo facilitador e apoio do gestor de aprendizagem, cada pequeno grupo de participantes constrói um Projeto Aplicativo - PA. O PA constitui-se em trabalho técnico-

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científico aplicado, orientado à intervenção numa dada realidade a partir do reconhecimento de necessidades relacionadas às áreas de atenção à saúde, gestão em saúde e educação em saúde, devendo seguir as características de um projeto científico. A redação deve pautar pela clareza, objetividade e relevância segundo os padrões de redação científica. Devem, ainda, incluir os elementos do planejamento situacional, voltado à análise estratégica e de viabilidade das propostas de mudança.

Assim, o projeto aplicativo se constitui a partir de uma determinada leitura de mundo dos participantes e de uma proposta deles de transformação nessa realidade percebida. Para Freire (2013), “ensinar exige compreender que a educação é uma forma de intervenção no mundo” e por essa característica, o PA tem sido uma das estratégias mais valorizadas pelos gestores do SUS, demandantes das iniciativas educacionais.

Considerações

O trabalho educacional baseado no diálogo, em grande parte promovido pelo uso de metodologias ativas de ensino-aprendizagem, pressupõe o respeito à autonomia e à dignidade de cada sujeito, especialmente quando leva em consideração a (re)construção de própria história (FREIRE, 2013).

Os especializandos dos cursos do IEP/HSL de Apoio ao SUS são convidados a se envolver profundamente em vivências educacionais inovadoras e, por meio delas, ressignificar a educação e o processo de aprender. São estimulados a construir o próprio saber, com desenvolvimento de autonomia, responsabilidade e independência intelectual. Trabalhar na construção de um perfil de competência favorece contemplar diversos pontos de partida para a construção de pontos semelhantes de chegada. Nesses pontos de chegada, busca-se profissionais ativos na construção de seus saberes e orientados à transformação de sua realidade, saindo do papel de mero observador e provocando mudanças pautadas pela reflexão contextualizada da sua prática.

Além de favorecer a avaliação formativa, o portfólio tem possibilitado equacionar conflitos cognitivos, afetivos e psicomotores dos especializandos em tempo hábil, garantindo condições de desenvolvimento progressivo da autonomia e da identidade destes (MARIN et al., 2010).

Narrar suas experiências e ler seus próprios escritos tem sido um elemento potente no desencadeamento de mudanças nas práticas dos participantes, tanto nas áreas de gestão, atenção à saúde e educação na saúde (CUNHA, 1997).

Os Projetos Aplicativos podem ser considerados um diferencial nos cursos dos Projetos de Apoio ao SUS. Estudos promovidos pelo IEP/HSL para o acompanhamento desses projetos estão em

131 andamento e visam revelar os aspectos que tem favorecido, dificultadoou inviabilizado a continuidade deles, após o término dos cursos.

A formação de educadores como facilitadores dos cursos de especialização tem contribuído para o fortalecimento de uma prática pedagógica fundamentada nos princípios de liberdade, autonomia, respeito e equidade. Esta formação torna-se os participantes potenciais multiplicadores destas iniciativas em atividades em seus municípios.

Por se tratarem de cursos oferecidos em mais de 70 regiões de saúde no país, entre 2012-4, a maioria dos Estados brasileiros já tiveram a oportunidade de vivenciar processos de ensino- aprendizagem pautados em metodologias ativas e fundamentados por uma abordagem construtivista para a educação de profissionais de saúde. A disseminação dessas experiências em maior escala pode promover, a médio prazo, a produção de um grande contingente de trabalhadores do SUS com repertório vivencial voltado à produção de mudanças. A expectativa é que esse movimento possa promover melhoria na saúde e na qualidade de vida da população brasileira.

Referências

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AUSUBEL D, NOVAK J.D., HANESIAN H. PsicologiaEducacional. Rio de Janeiro: Interamericana, 1980.

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BRUNER, J.S. The narrative construction of reality. Critical Inquiry, v.17, p.1-21, 1991.Disponível em:<http://www.scielo.br/pdf/icse/v2n2/08>. Acesso em: 02 abr. 2014.

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CUNHA, M. L. Conta-me agora!: as narrativas como alternativas pedagógicas na pesquisa e no ensino. Rev. Fac

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MARIN, M. J. S. et al. O Uso do Portfólio Reflexivo no Curso de Medicina: Percepção dos Estudantes. Rev.

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SÁ-CHAVES, I. Portfólios reflexivos: estratégia de formação e de supervisão.Cadernos didácticos, série supl.1; Aveiro: Universidade de Aveiro, 2000.

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AS IMPLICAÇÕES DO ENSINO E PESQUISA DA

PSICANÁLISE NA UNIVERSIDADE: UM DESAFIO

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