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MIL arte de coordenar a acção das forças militares, políticas, económicas

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Capítulo 2: EA: do conceito às tipologias

1 MIL arte de coordenar a acção das forças militares, políticas, económicas

e morais implicadas na condução de um conflito ou na preparação da defesa de uma nação ou comunidade de nações 2 MIL parte da arte militar

que trata das operações e movimentos de um exército, até chegar, em condições vantajosas, à presença do inimigo  cf. táctica (MIL) 3 p.ext. arte de aplicar com eficácia os recursos de que se dispõe ou de explorar as condições favoráveis de que porventura se desfrute, visando ao alcance de determinados objectivos 4 p.ext. ardil engenhoso; estratagema, subterfúgio (Houaiss, 2003a p.1635).

Como podemos verificar, o termo, na origem associado ao âmbito militar ou arte da guerra, apresenta desde logo ideias-chave que se aplicam à palavra “estratégia” usada atualmente em sentido comum: coordenar ação, aplicar com eficácia recursos disponíveis, visar alcançar objetivos. No fundo, o termo envolve a ideia de gestão

58 otimizada/gestão para otimizar. Um conceito satélite que surge é “tática”, mas convém distingui-lo de “estratégia”, uma vez que tática designa as ferramentas para atingir o sucesso da estratégia (Oxford, 1990). Ainda que distintos, estes dois conceitos surgem por vezes usados indiferentemente, como sinónimos, pelo facto de estas duas expressões terem alguns aspetos em comum, a saber: planeamento, competição, manipulação consciente e movimento na prossecução de um objetivo (Oxford, 1990). Também entre os conceitos de “estilo de aprendizagem” e “EA” por vezes a fronteira é ténue, contribuindo para aumentar a dificuldade em delimitar o conceito de EA (Griffiths, 2003). Saindo da esfera militar, estratégia passou a ter o sentido vulgar de plano, passos ou ação consciente encetada com a intenção de atingir um determinado objetivo, como referido por Oxford (2003a). No âmbito da educação, o conceito tomou novos significados e passou a designar EA (Oxford, 1990).

O conceito de EA no domínio das línguas é considerado por alguns autores como ainda um pouco vago (Ellis & Sinclair, 1994) e não consensual (Griffiths, 2003), apesar de ser investigado desde meados dos anos 70 (Griffiths, 2004). Este aspeto difuso do conceito está bem patente nas palavras de O’Malley et al. (1985a) ao afirmarem que não existe consenso no que se refere à essência das EA em LS ou mesmo no que as distingue de outro tipo de atividades. Estes autores acrescentam ainda que as EA, de ensino e de comunicação estão frequentemente interligadas em discussões de aprendizagem de língua e que não raro são aplicadas a propósito do mesmo comportamento.

Atentemos ao que diz o QECR a propósito das estratégias e mais especificamente das estratégias de comunicação:

As estratégias são um meio que o utilizador da língua explora para mobilizar e equilibrar os seus recursos, para activar capacidades e procedimentos, de modo a estar à altura das exigências de comunicação em contexto e a completar com êxito a tarefa em causa, da forma mais exaustiva ou mais económica, segundo os seus objectivos pessoais. As estratégias de comunicação não devem, portanto, ser entendidas apenas como um modelo de incapacidade, um modo de compensação de uma

59 deficiência linguística ou de um erro de comunicação. Os falantes nativos empregam regularmente estratégias de comunicação de todas as espécies […] quando adequadas às exigências comunicativas com que devem lidar.

O uso de estratégias de comunicação pode ser visto como a aplicação de princípios metacognitivos: Planeamento prévio, Execução, Controlo e Remediação a diferentes tipos de actividades comunicativas: Recepção, Interacção, Produção e Mediação. A palavra “estratégias” tem sido usada de modos diferentes. Neste contexto, refere-se à adopção de uma linha específica de acção destinada a maximizar a eficácia (Conselho da Europa, 2001, p. 90).

Da passagem citada podemos destacar alguns aspetos quanto à relação entre EA e estratégias de comunicação. Assim, segundo o entendimento do QECR, as estratégias em si são uma forma de mobilizar os recursos, capacidades e procedimentos (que variam nomeadamente em função da tarefa, das características do aprendente) necessários ao cumprimento eficaz de um objetivo, de uma “exigência comunicativa”. O facto se referir “exigência comunicativa” como alvo da ação estratégica revela o entendimento que este documento orientador tem destes dois tipos de estratégias: integrar as EA e as de comunicação. Este documento vê as estratégias de comunicação integradas na lógica da resolução de tarefas: “Para realizar tarefas comunicativas, os utilizadores terão de se empenhar em actividades comunicativas em língua e construir estratégias de comunicação” (Conselho da Europa, p. 89). Ainda que metodologicamente se possam separar, na aprendizagem da língua para o uso, ambos os tipos de estratégias normalmente se fundem, de forma que as EA são ativadas na comunicação e as estratégias de comunicação promovem a aprendizagem (Fernández López, 2008c): “Al aprender a utilizar una lengua, el aprendiz puede ensayar con nuevas estratégias y mejorar así su rendimiento” (Fernández López, 2008c, p. 577).

60 [e]sta capacidad estratégica no es específica del uso y aprendizaje de la lengua, sino que se trata de una capacidad general de la persona que se aplica a cada ámbito o área de experiencia; en la utilización de la lengua se da también esta aplicación, para lo que se sirve de la competencia linguïstica y de todos los procesos de la comprensión, expresión e interación. De esta forma, la capacidad estratégica se convierte en componente esencial de la competencia comunicativa y del desarrollo de ésta en el aprendizaje de una nueva lengua, ya que es la encaregada de movilizar el resto de los saberes para utilizar la lengua en situaciones de comunicación (Fernández López, 2008c, p. 586).

No sentido que toma o QECR, a competência estratégica instaura-se pois como uma componente da competência comunicativa, o que se explica pela própria história dos estudos que foram desenvolvidos no âmbito da competência de comunicação.

A partir de estudos levados a cabo no âmbito de diferentes áreas, como a sociolinguística, a etnolinguística e a pragmática, concluiu-se que a variabilidade linguística é a norma. Assim, perspetivou-se a competência do falante não só como cumprindo a gramaticalidade dos enunciados, mas também adequando os enunciados às diversas situações de comunicação. Passa-se a falar da competência comunicativa integrante do conhecimento linguístico e do seu uso (Fernández López, 2008c):

Pronto este concepto de competencia comunicativa adquiere una posición relevante en la enseñanza-aprendizaje de las lenguas, que se orienta ahora a facilitar el intercambio en una sociedad cada vez más globalizada. En este sentido, el Consejo de Europa proporciona un fuerte impulso con la publicación de un texto en el que se hace referencia expressa a los niveles umbrales (Van Ek, 1975 […]) y donde se propone ya una metodología orientada a favorecer el desarrollo de la competencia comunicativa, atendiendo a las diversas situaciones de comunicación y al lenguaje necesario para responder adecuadamente a cada una de ellas (Fernández López, 2008c, p. 575).

61 Além disso, no excerto citado as estratégias de comunicação não surgem associadas a mecanismos compensatórios de incapacidades. As primeiras definições de estratégias de comunicação incidiam apenas sobre a resolução de dificuldades comunicativas, todavia, hoje alargam-se a todos os planos e ações concretas que acontecem na comunicação quer seja oral ou escrita (Conselho da Europa, 2001; Fernández López, 2008b; 2008c). Na passagem citada podemos verificar o reconhecimento por parte do QECR da quadripartição das estratégias de comunicação em estratégias de produção, estratégias de receção, estratégias interativas e estratégias de mediação. No que respeita à produção, o QECR contempla as estratégias de evitação e as de êxito, na esteira de Corder (1981) que refere duas formas de agir de um aprendente face a um problema comunicativo – evitar o risco ou enfrentá-lo e arriscar- se –, e de Faerch e Kasper (1983), que se referem às estratégias de redução e às de consecução. De acordo com os últimos autores, as estratégias que assumem o risco, as que tentam cumprir a mensagem em vez de reduzí-la, seriam as que levariam à progressão na aprendizagem (Fernández López, 2008c), sendo estas mais típicas dos níveis mais proficientes em língua (Fernández López, 2008b):

La práctica y el adiestramiento en las actividades comunicativas conllevan una progresión – consciente o inconsciente – en la competencia estratégica. Las investigaciones suelen coincidir (Ellis, 1985: 183) en que en los primeros estadios predominan las estratégias de reducción tanto formal como de contenido, y que, progresivamente, tienen a adquiri mayor importancia las estrategias de realización (Fernández López, 2008c, p. 589).

Por fim, podemos ainda verificar uma associação das estratégias de comunicação aos princípios metacognitivos de planeamento prévio, execução, controlo e remediação.

62 Todavia, o entendimento do QECR não é unânime e a relação entre EA e estratégias de comunicação é deveras complexa, pelo que vale a pena atentar a outras interpretações de investigadores que se interessaram por esta questão.

Se, por um lado, Rubin (1981) inclui as estratégias de comunicação nas EA indiretas, por outro, Brown (1994) delimita bem as fronteiras entre ambas, colocando as estratégias de comunicação do lado do output e as de aprendizagem do lado do input. Ellis (1986) vai um pouco mais longe ao afirmar que é mesmo possível que o uso bem- sucedido de estratégias de comunicação possa impedir a aprendizagem de línguas, já que a compensação hábil por falta de conhecimento linguístico pode eliminar a necessidade de aprendizagem. Já Tarone posiciona-se de forma diferente face a esta problemática ao sugerir:

that by helping students to say what they want or need to say, communication strategies can help to expand language. Even if the communication is not perfect […] the learner will be exposed to language input which may result in learning which therefore may be considered a learning strategy. The key point in this argument would seem to be that in order to be considered a learning strategy rather than a communication strategy, the “basic motivation is not to communicate but to learn” (1980, p. 419).

Além disso, Tarone (1980), assim como Ellis (1994) e Fernández López (2008b; 2008c), chamam a atenção para o caráter problemático destes dois tipos de estratégias ao sublinhar que, se o vetor distintivo reside na intencionalidade ou motivação com que se encetam as estratégias de comunicação ou de aprendizagem, é na prática impossível determiná-las. O aluno pode ter uma dupla motivação ou também pode acabar por aprender quando o seu objetivo primeiro é comunicar ou pode ter necessidade de comunicar com o objetivo de aprender.

Além disso, O’Malley et al. (1985a) destacam também o facto de, ainda que dentro de um grupo de atividades muitas vezes referidas como EA, haver uma

63 considerável confusão no que diz respeito às definições de estratégias específicas e relações hierárquicas dentro das próprias estratégias (Griffiths, 2004). Fernández López (2008b) acrescenta que o facto de as EA terem sido estudadas de várias perspetivas e de forma prolixa, levou a que cada trabalho de investigação tivesse enriquecido o leque de aspetos estudados, explorando novos ângulos do objeto de estudo EA. Esta circunstância, no seu entender, resultou em que as conclusões provindas de tantos estudos e tão diversos se instituíssem mais como sugestões do que como conclusões definitivas. Tardif contribuiu para a tentativa de definir EA considerando-as como “quelque chose d’intentionnel: il s’agit d’atteidre efficacement un objectif. Elle a aussi quelque chose de pluriel: il s’agit d’un ensemble d’opérations” (Tardif, 1992, p. 23).

Carol Griffiths (2004) procurou estabelecer uma terminologia básica e uma definição de EA em línguas, apresentando no mesmo texto uma revisão da literatura até à data. Como Griffiths fez notar, o termo “estratégia(s)” – no âmbito da educação EA – está em si mesmo envolto em controvérsia, tendo sido por diversas vezes mencionado como sinónimo de outros termos a ele associado17, tornando difícil a sua fixação. No entanto, Griffiths optou pela designação “estratégia” em detrimento dos outros termos satélite, como “tática” ou “técnica”, já que, como observaram Larsen-Freeman e Long (1991), o termo foi cunhado por Rubin (1975) num dos primeiros estudos feito nesta área e é este o termo que continua a ser mais difundido. Esta é a razão pela qual comummente se tem adotado esta designação, e pela qual será igualmente por nós adotado no presente trabalho de investigação.

Com os trabalhos pioneiros surgidos em 1975 pelas mãos de Rubin e Stern, surgiu a consciência de que as EA no âmbito das línguas podiam ser um instrumento pleno de potencialidades.

No entender de Veiga Simão:

[…] o termo estratégias de aprendizagem [designa] “processos de tomada de decisão (conscientes e intencionais) pelos quais o aluno escolhe e recupera de maneira organizada os conhecimentos que necessita para

17

Cf. a título de exemplo: learning behaviours (Politzer & McGroarty, 1985) / techniques (Stern, 1992) / tactics (Seliger, 1984).

64 completar um determinado pedido ou objectivo, dependendo das características da situação educativa na qual se produz a acção” (Monereo, Castelló, Clariana, Palma, Pérez, 1995:25) (Veiga Simão, 2002a, p. 18).

As palavras da autora põem em evidência alguns dos principais traços que caracterizam as EA, sendo estas apresentadas enquanto processos de tomada de decisão, conscientes e intencionais, selecionadores e mobilizadores de conhecimentos invocados por determinada solicitação, atendendo à envolvência educativa. As características referidas apresentam algumas das potencialidades das EA que fazem delas uma possível resposta aos problemas, sempre novos, com que o aluno se deparará ao longo do seu percurso académico (não só no âmbito da aprendizagem de uma LE) e em diversos momentos da sua vida em geral. As EA instauram-se desta feita como uma constante possibilidade de encontrar a solução mais adequada para um determinado problema e não como uma listagem fixa fornecida ao aprendente onde as soluções são prévias, estandardizadas, ignorando objetivos e particularidades contextuais.

Já de acordo com Paul Cyr,

malgré ces problèmes initiaux de terminologie, on emploie généralement aujourd’hui l’expression stratégies d’apprentissage en L2 afin de désigner un ensemble d’opérations mises en œuvre par les apprenants pour acquérir, intégrer et réutiliser la langue cible. […] Ces stratégies d’apprentissage peuvent se manifester par de simples techniques. Elles peuvent devenir des mécanismes lorsqu’elles ont atteint leur but plusieurs fois. Elles peuvent être vues comme des comportements. Elles peuvent être conscientes, inconscientes ou potentiellement conscientes. Elles peuvent être observables directement ou relever de processus mentaux que l’on ne peut sonder qu’á l’aide de l’introspection. Enfin, l’utilisation de stratégies favorisant le processus d’apprentissage peut varier en nombre et en fréquence selon les individus (Cyr, 1998, p. 5).

65 A definição de EA dada por Paul Cyr (1998) toca pontos fundamentais e comuns a quase todas as definições deste termo: as EA são operações acionadas pelo aprendente de forma a construir a sua aprendizagem, mostrando-se responsável pelas suas decisões e recorrendo à metacognição. É chamada a atenção para o facto, de muitas vezes, as estratégias não serem observáveis, sendo necessário recorrer a indicadores observáveis, como é o caso das táticas e, genericamente, enfatiza-se a centralidade do aprendente no processo e a requerida autonomia da aprendizagem. Por fim, destaca-se um ponto bastante relevante para a definição das EA: a consciência e intencionalidade na sua utilização.

Porque, como podemos verificar, é complexo definir EA, atentemos à síntese de características desse conceito estabelecido por Ellis (1994) a partir da literatura da área:

Figura 6

Síntese das características das EA de acordo com a literatura (Fonte: Ellis, 1994)

Estratégias de