• Nenhum resultado encontrado

3 ABORDAGEM ACERCA DO CONHECIMENTO LITERÁRIO E SUA

3.4 MIMESIS E DRAMA: A ARTE DE REPRESENTAR A REALIDADE

O conceito de mímese é central na arte literária e muito se debateu acerca dessa noção. Primeiramente por Platão e Aristóteles, que a entendiam como “imitação”. O primeiro assentava-se na ideia de que a imagem não captava a essência, portanto, não traduzia o conhecimento do real; Platão concebia a imitação poética como não sendo portadora da verdade. Para Aristóteles, a mimese adentra na essência, isto é, preconiza que “imitar não é duplicar o referente; implica conhecimento da natureza profunda do ser humano e do mundo” (FILHO, 2007, p. 30). A ideia que unifica os filósofos é que “a noção de que toda a arte poética – como toda obra de arte – tem de manter uma relação de semelhança e de adequação com uma realidade natural já existente” (AGUIAR E SILVA, 1979, p. 143- 144).

A partir do século XIX com estudos de Kant e Hegel, por exemplo, acerca da Arte Poética de Aristóteles, compreende-se que a mímese configura-se como uma mostra do real, do existente. Entende-se, portanto, que a arte de imitar não é apenas cópia e sim um entrelaçamento das possibilidades de interpretação do objeto.

Consideramos, portanto, Aristóteles como o primeiro estudioso da Literatura, quando no século III a.C., escreve acerca da mímese da realidade em sua Arte Poética e é a partir dessa escrita que a teoria literária começa a ser delineada. É ele também que traça referências sobre os gêneros literários, dos quais, nos ocuparemos de características de um para compor nossa pesquisa, o drama.

A concepção de gênero literário ainda hoje é discutida, pois se questiona acerca de seu valor, sua existência, sua função, enfim, falar sobre gênero literário é bem complexo. Platão concebia três divisões: poesia lírica, épica e dramática. Mas foi Aristóteles quem manifestou uma reflexão profunda sobre os gêneros literários.

Aristóteles considera dois modos fundamentais da mimese poética: um modo narrativo e um modo dramático. No primeiro caso, o poeta narra em seu próprio nome ou narra assumindo personalidades diversas; no segundo caso, os atores representam diretamente a ação, como se fossem eles próprios as personagens vivas e operantes (AGUIAR E SILVA, 1979, p. 205).

O autor organizou a produção literária em gêneros literários a partir dos seguintes critérios: a forma e o conteúdo. São três gêneros literários que se

firmaram: épico, lírico e dramático. O gênero literário épico compreende aqueles textos cuja narrativa diz respeito a grandes feitos de um povo. Temos como obras principais “Ilíada” e “Odisseia”, ambas escritas por Homero. O gênero lírico tem como características basilares a construção dos textos em versos e estrofes considerando a musicalidade, já que o nome desse gênero provém da lira, instrumento musical utilizado para cantar os poemas; e a voz desse gênero literário parte de um eu lírico, voz que fala no poema. O conceito de drama, noção esta que foi cunhada por Aristóteles, compreende a dimensão da apresentação oral acerca de uma obra literária; a voz narrativa é dos personagens, os quais (re)contam uma história através de diálogo/monólogo. Destacamos que a nomenclatura “dramatização” rememora a ideia de peça teatral, e que, por escolha/interpretação, faremos o uso dessa terminologia para nos referirmos às produções cênicas relativas às obras literárias que foram estudadas durante o desenvolvimento desta pesquisa.

A palavra “drama” tem origem grega e significa ação, comumente a entendemos como a apresentação da encenação de um texto. Nas palavras de Staiger (1975, p. 14), o “drama significa aqui uma composição para o palco”; essa ideia perpassa por nossa pesquisa, isto é, entendemos aqui “dramatização” como a encenação de textos literários com intuito de repassar os conhecimentos imbricados nesses textos, promover a aprendizagem do enredo e apresentar essa produção cultural humana àqueles que não têm acesso à Literatura, ao espetáculo. Primamos também pela participação dos estudantes na compreensão da importância em conhecer a Literatura e ainda fazê-los socializar com a turma e com a comunidade.

Reverbel (1997) revisita os primórdios do teatro, que tem seus primeiros registros no século V a.C. Platão valorizava as manifestações artísticas ao modo de que com as atividades lúdicas acontecia a constituição de sujeitos educados e cidadãos de caráter; para Aristóteles educar através de jogos precedia a preparação para a vida adulta. O teatro para os romanos, em especial para Horácio, tinha o propósito de educar, ensinar valores morais. No século IX, o rei do Sacro Império Romano-Germânico, Carlos Magno, criou escolas e monastérios onde as obras de Aristóteles foram revisitadas e reavaliadas: o teatro só poderia servir como recreação. Já na Renascença, a arte de dialogar tomou proporções maiores e isso propiciou a valorização dos espetáculos escolares. Nas escolas da Inglaterra, por exemplo, “o estudo dos clássicos e as atividades artísticas, sobretudo as dramáticas,

41

eram considerados excelentes recursos para o aprendizado da linguagem” (REVERBEL, 1997, p. 13).

A arte, de modo geral, sempre foi importante no ensino. Essa assertiva, juntamente com a exposição anterior, nos faz pensar acerca da importância da valorização de qualquer movimento artístico produzido no espaço escolar, pois é a arte em todas as suas formas, música, dança, Literatura, que propicia uma visão mais alargada do mundo e que constitui sujeitos melhores.

A palavra imitação também ganha destaque nos postulados de Vigotski, noção esta que é entendida como recriação, ou seja, um ato imitativo é internalizado e pensado para ser executado; a imitação é basilar para a apropriação do conhecimento. O autor não descarta a imitação como apenas cópia do real (em seu sentido estrito), todavia, enfatiza seu sentido mais amplo, afirmando que imitar precede o aprender.

Em consonância com essas colocações acerca da imitação, podemos pensar nas dramatizações como movimentos imitativos das obras literárias, isto é, a partir do já dado, operacionalizamos a história a partir de uma outra leitura/interpretação que ao mesmo tempo está dada e está em construção. Imitar, portanto, nesse sentido, demonstra apropriação e entendimento da obra lida, pois somente a partir da compreensão do enredo consegue-se dramatizar.