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4 O LUGAR DEVIDO DA PSICOMETRIA

5.7 MODELO DE TRÊS NÍVEIS DE CARROLL

Carroll (1993) realizou uma meta-análise capaz de englobar todos os estudos relevantes do campo psicométrico até o final da década de 1980. Carroll (1993) encontrou mais de 1500 matrizes de correlação em sua busca pelos estudos fatoriais do campo, selecionando um conjunto de 461 matrizes.

Em relação ao estudo de Carroll, é importante salientar que em nenhum outro período da psicometria houve uma meta-análise que tivesse como procedimento a reanálise total das matrizes de correlação selecionadas. Poucas meta-análises foram realizadas ao longo da história da psicometria, assim como foram promovidos poucos

empreendimentos para uma identificação e um mapeamento global das habilidades cognitivas. Vernon foi o pioneiro nessa tentativa, realizando uma meta-análise sobre os principais estudos psicométricos até a década de 1940. No entanto, diferentemente de Carroll, Vernon não reanalizou a maior parte das matrizes de correlação selecionadas, assim como utilizou alguns critérios subjetivos para identificação dos fatores encontrados.

Além de Vernon, três meta-análises foram realizadas pelo Educational Testing

Service (ETS), respectivamente nas décadas de 1950, 1960 e 1970 (Ekstrom, French &

Harman, 1979). Todas as meta-análises realizadas pelo ETS focavam apenas fatores primários, envolvendo a revisão dos fatores existentes na literatura e sua replicação. A última meta-análise do ETS identificou 23 fatores cognitivos primários, demarcando a elaboração do Conjunto de Testes de Referência para Fatores Cognitivos, com um universo de 72 testes, dos quais 45 foram selecionados nesta pesquisa. Onze fatores primários foram replicados nesse último estudo. Os fatores restantes já haviam sido replicados nas análises anteriores.

Quase cinqüenta anos após a meta-análise de Vernon, Carroll (1993) definiu um conjunto padrão de critérios para a extração dos fatores, possibilitando que o enorme contingente de dados pudesse ser relacionado e comparado, gerando um modelo sólido sobre dados muito diferentes e divergentes.

Em geral, os dados utilizados foram matrizes de correlação das pesquisas originais, e não os escores. Um dos critérios para a seleção dos estudos que comporiam a re-análise dizia respeito à qualidade metodológica das pesquisas, com a presença de matrizes de correlação adequadas. Os estudos que não possuíam essa característica foram descartados.

Carroll (1993) evitou o uso de critérios subjetivos para a identificação de fatores, enfatizando normas objetivas. Ele usou o critério cego, um procedimento que nomeia os fatores dos estudos selecionados através de siglas e números aleatórios, evitando que o pesquisador selecione ou elimine certos fatores extraídos em função de um conhecimento prévio sobre os fatores dos estudos selecionados.

Foram várias as estratégias de extração e rotação de fatores. Em linhas gerais, elas foram conservadoras, evitando definir fatores poucos precisos ou ambíguos. Variáveis tais como idade, gênero e nível educacional foram excluídas quando as matrizes originais possuíam esses elementos, da mesma forma que variáveis dependentes de experimentos controlados.

Para a extração de fatores, foram utilizados os seguintes passos6:

1. Extração dos fatores por meio de Fatores Principais, através de Componentes Principais seguidas do Método dos Eixos Principais. A extração pelo Método dos Eixos Principais foi escolhida por proporcionar a identificação da variância comum entre as variáveis, ao contrário da variância total. Ao enfatizar a variância comum, ela alcança a matriz fatorial final através das comunalidades extraídas das variáveis.

2. Os valores das comunalidades geradas na matriz inicial eram postas na diagonal da matriz fatorial original e uma nova matriz era extraída, de forma repetida. O processo somente terminava quando a diferença de comunalidade obtida era de 0,0005 entre a matriz inicial e a matriz final. Esse procedimento evitava a ocorrência de casos Heywood, ou seja, da presença de comunalidades maiores do que um nas diagonais das células das matrizes fatoriais obtidas. Quando as células nas diagonais apresentam valor do que um isso significa a presença de

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colinearidade entre os fatores extraídos pela análise fatorial, indicando que a solução fatorial obtida não é adequada.

3. Utilização do procedimento Cureton para a correção de eventuais casos Heywood.

4. Aplicação da Medida de Adequação da Amostra de Kaiser, para avaliar se os fatores encontrados eram atribuíveis a erros aleatórios devido à amostra.

Foram estabelecidos critérios para definir quais fatores extraídos deveriam ser mantidos e quais deveriam ser eliminados:

1. Uso do Scree Test de Cattell para uma análise exploratória do número de fatores a serem considerados. O Scree Test fornece uma curva gráfica, onde cada ponto da curva representa o autovalor de um fator extraído. Recomenda-se eliminar os fatores que alteram o padrão inicial da curva.

2. O fator que possuísse um autovalor maior do que um (procedimento de Kaiser- Guttman) não era aceito imediatamente, devendo passar pelo procedimento 3. 3. Uso do critério de análise paralela de Montanelli e Humphreys. O fator extraído

pela matriz fatorial que apresentasse um auto-valor menor que o auto-valor do mesmo fator extraído de uma amostra casual hipotética era eliminado e desconsiderado.

Para a rotação dos fatores, Carroll utilizou os seguintes processos: 1. Rotação ortogonal Varimax.

2. Rotação oblíqua através da técnica DAPPFR (Direct Artificial Personal

Probability Function Rotation), considerada a mais adequada para a rotação das

matrizes e a melhor no caso de extração de fatores de alta-ordem.

3. Em casos de correlação entre fatores primários eles eram rotados de forma oblíqua, para a verificação de possíveis fatores de segunda-ordem.

4. Caso os fatores de segunda-ordem apresentassem correlação importante, eles eram rotados de forma oblíqua na busca por fatores terciários.

5. Se a extração apresentasse dois ou mais níveis hierárquicos era utilizada a técnica de Schmid-Leiman de ortogonalização de todos os fatores encontrados.

Figura 4.Modelo dos Três Níveis de Carroll (1993).

Carroll (1993) obteve um modelo da inteligência de três níveis. O primeiro nível foi composto pelos fatores primários e demonstrou a presença de um número bem grande de fatores, o que de fato já era esperado, tendo em vista o vasto número de testes da psicometria para a mensuração de habilidades específicas. Este nível pode ser observado na Figura 4. Cada traço representa um fator primário relacionado com seu respectivo fator secundário. O segundo nível, composto pelos fatores secundários, demonstrou a presença de oito fatores, Inteligência Fluida (2F), Inteligência Cristalizada (2C), Memória Geral e Aprendizagem (2Y), Percepção Visual Abrangente (2V), Percepção Auditiva Abrangente (2U), Habilidade de Retenção Abrangente (2R), Rapidez Cognitiva Abrangente (2S), e Velocidade de Processamento (2T). O terceiro nível foi demarcado por um fator apenas, denominado de Fator Geral (g) (Figura 4).

É importante destacar que as evidências de Carroll (1993) possuíam uma força incomparável, na medida em que se baseavam em todos os dados psicométricos importantes do século XX até o final dos anos de 1980. Nesse sentido, seu modelo sintetizou todos os resultados importantes da psicometria e forneceu um modelo sintetizador e unificador, enfatizando a importância do Fator Geral (g) e a presença de fatores secundários e primários.

Sintetizando as discussões deste capítulo, foram salientadas as diferenças entre a escola psicométrica americana e britânica, assim como foram descritos os principais modelos da psicometria. O último modelo, o Modelo dos Três Níveis de Carroll, sintetiza as principais evidências do campo, através de uma meta-análise que incorporou todos os dados importantes da psicometria até o final da década de 1980. Se no seu início a psicometria permaneceu por um bom tempo dividida entre as escolas americana e britânica, a partir dos anos de 1980 houve uma progressiva incorporação dos modelos de ambas as escolas, assim como a geração de um modelo capaz de realizar a unificação das evidências do campo.

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A ANÁLISE FATORIAL EXPLORATÓRIA E SUAS TÉCNICAS