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3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

3.2. Modelos Didáticos de Josep Gascón

Segundo Gascón (2003), o modelo teórico é representado por um hipotético espaço tridimensional, cujos pontos representam uma organização didática possível. Os eixos do sistema tridimensional, conforme Figura 5, são representados por três dos momentos ou dimensões da atividade matemática:

O momento tecnológico/teórico (𝜃/ 𝜣), o momento do trabalho da técnica (T/ 𝝉) e o momento exploratório (ex). Em cada eixo, estão situadas as organizações didáticas ideais que chamamos de unidimensionais porque se caracterizam por única dimensão do processo de estudo, possibilitando à referida dimensão prioridade absoluta e o papel secundário às outras dimensões. Nessa direção, surgem as organizações didáticas Teoricistas,

Tecnicistas e Modernistas (GASCÓN, 2003, p.19).

Figura 5: Sistema de Referência das organizações didáticas.

Fonte: Gascón(2003)

Na organização didática Teoricista predomina o momento tecnológico/teórico; isto implica que a atividade matemática enfatiza o aspecto teórico. O ensino da matemática se apresenta como conhecimento acabado,

deixando de lado a importância da exploração da atividade matemática. Gascón (2003) explica que as organizações didáticas Teoricista são identificadas pelo processo de ensinar e aprender teorias matemáticas e que o referido processo começa e praticamente acaba no momento que as teorias são transmitidas para os alunos. O autor ressalta que a resolução de problemas é considerada uma atividade secundária dentro do processo de ensino e que serve como um elemento auxiliar na aprendizagem das teorias.

A organização didática Tecnicista enfatiza o aspecto da técnica e, com isso, pode-se dizer que o mais importante na atividade matemática é o uso de algoritmos. Segundo Gascón (2003), o Tecnicismo parte de certas técnicas algorítmicas e propõe unicamente aqueles exercícios que servem como treinamento para chegar a dominar as técnicas. Diante disso, não são utilizadas estratégias de resolução de problemas sem aplicação de algoritmos.

Para Gascón (2003), a atividade de resolução de problemas nas organizações didáticas Teoricistas e Tecnicistas apresenta.

um grave defeito que é tratar os problemas matemáticos como se fossem isolados e descontextualizados. Isto significa, por um lado, que os problemas se tratam individualmente e nunca como representantes de certas classes de problemas e, por outro lado, que se tende apresentar os problemas separados de seu contexto, sem nenhuma conexão com o sistema (matemático o extramatemático) a partir do qual surgem no seio de uma atividade matemática (GASCÓN, 2003,p.25).

Na organização didática Modernista observa-se a predominância do momento exploratório da tarefa que conduz a um processo de estudo por meio de atividades matemáticas que enfatizam a construção de conhecimentos. Gascón (2003) explica que o Modernismo se caracteriza por conceder uma importância absoluta ao momento exploratório; isto significa que ensinar e aprender matemáticas consiste em propor aos alunos atividades exploratórias de problemas não triviais, evidenciando a valorização das estratégias de solução utilizadas para resolver os problemas propostos que não apresentem semelhança com os problemas dos livros didáticos (por exemplo, problemas do tipo de olimpíadas). O autor ressalta, ainda, que:

o Modernismo se posiciona contra a visão simplicista de um ensino considerado como um processo trivial, mecânico e

totalmente controlado pelo professor. Translada o centro de gravidade do processo didático para aprendizagem e considera que o referido processo de aprendizagem é um processo de descobrimento indutivo e autônomo (GASCÓN, 2003, p.26). Contudo, as organizações didáticas Modernistas se caracterizam por desenvolver atividades matemáticas que incluem os sujeitos (professores e/ou alunos) em um processo de pensamento livre e criativo. Para isso, as teorias e técnicas matemáticas ficam distantes do processo de ensino e aprendizagem. Dessa forma, segundo Gascón (2003), o isolamento e a descontextualização dos problemas, que eram preocupantes nas organizações didáticas Clássicas, se agravam ainda mais no modernismo.

O modernismo pretende destriavilizar a atividade matemática ocultando as classes de problemas que constituem o contexto em que estão situados os problemas e fingindo que não existem técnicas matemáticas, isto é, maneiras sistemáticas e compartilhadas que podem ser ensinadas na instituição. Esta ocultação se realiza com a intenção de assegurar que a exploração seja “livre”(das técnicas matemáticas potencialmente úteis, para que isso não diminua a liberdade do “explorador”) e “criatividade” no sentido cultural de “surpreendente” e “não rotineiro” (GASCÓN, 2003, p.26-27).

Em geral, as organizações didáticas Teoricistas, Tecnicistas e Modernistas enfatizam uma única dimensão da atividade matemática. A figura 5 mostra a representação geométrica idealizada por Gascón (2003) para o sistema de referência.

O plano formado pelos eixos que contêm os momentos tecnológico/teórico (𝜃/ 𝜣) e o trabalho da técnica (T/ 𝝉)constitui o que Gascón (2003) denomina de organizações didáticas Clássicas. Para o autor, as organizações didáticas Clássicas se caracterizam pela trivialização da atividade da resolução de problemas e por considerar o ensino das matemáticas um processo mecânico e totalmente controlado pelo professor.

O plano formado pelos eixos que contêm os momentos didáticos exploratórios (ex) e o trabalho da técnica (T/ 𝝉) constitui o que Gascón (2003) denomina de organizações didáticas Empiristas. Para o autor, as organizações didáticas Empiristas se caracterizam pela atividade da resolução de problemas dentro do processo didático global e por considerar que aprender matemática é um processo indutivo baseado na reprodução e na prática.

Contudo, há organizações didáticas, com raízes no Empirismo, que vão além das barreiras da reprodução e da prática, denominadas de

Procedimentalistas ou Procedimentalismo. Para Gascón (2003), as

organizações didáticas Procedimentalistas são:

formas de organizar o estudo das matemáticas que situam como principal objetivo didático o domínio de sistemas estruturados de técnicas heurísticas( o sentido de não algorítmica). Nesse sentido completa e melhora a destrivialização dos conhecimentos matemáticos iniciados pelo modernismo (GASCÓN, 2003, p.27). Com isso, o Procedimentalismo se caracteriza por iniciar o processo de ensino e aprendizagem com a exploração dos problemas(Modernismo) e, depois, com o desenvolvimento do trabalho das técnicas matemática(Técnicismo). Nessa direção, Gascón (2003), explica que a resolução de problemas é utilizada como estratégia didática que conduz o aluno a dominar sistemas estruturados de técnicas.

O plano formado pelos eixos que contêm os momentos didáticos exploratórios (ex) e o tecnológico/teórico (T/ 𝝉) constitui o que Gascón (2003) denomina de organizações didáticas Construtivistas. Segundo o autor, as organizações didáticas Construtivistas se caracterizam por considerarem a atividade da resolução de problemas o caminho para construção de conhecimentos, tornando a aprendizagem um processo ativo, e que as etapas dessa construção dependem dos conhecimentos adquiridos anteriormente. As organizações didáticas construtivistas se dividem em duas concepções: Construtivismo Psicológico e Construtivismo Matemático.

As organizações didáticas que surgem sob a perspectiva do construtivismo psicológico utilizam a resolução de problemas como um caminho simples de construir novos conhecimentos, ou melhor, como instrumento para a formação dos conceitos. Gascón (2003) explica que esse fato faz com que o trabalho da técnica seja ignorado na aprendizagem das matemáticas e, particularmente, na resolução de problemas.

Para Gascón (2003), o uso de situações-problema9 no contexto do

construtivismo psicológico:

Apresenta o problema matemático tão isolado como o Teoricismo, o Tecnicismo e quase tanto como o Modernismo. Porém o sistema conceitual em que o conceito a construir ocupará seu lugar constitui certo contexto da situação-problema e, com isso, o instrumento de construção desse conceito permite que os problemas sejam apresentados mais contextualizados, diferentemente das outras organizações didáticas (GASCÓN, 2003, p.29).

As organizações didáticas atreladas à perspectiva do construtivismo matemático procuram desenvolver a formação do conhecimento mediante um processo de Modelização. Gascón (2003) explica que o “aprender matemática”, nessa organização, é interpretado como um processo de constituição do conhecimento matemático, relativo a um sistema matemático e extramatemático10, por meio da utilização de modelos matemáticos desse

sistema. Nessa direção, a resolução de problemas compõe um papel importante no construtivismo matemático, porque representa a atividade responsável pela modelização matemática.

Gascón (2003) explica que as organizações didáticas Clássicas, Empiristas e Construtivistas possuem seus fundamentos em modelos epistemológicos gerais das matemáticas. Para o autor, as organizações didáticas Clássicas são sustentadas pelo modelo denominado Euclidianismo; o modelo epistemológico denominado Quase-empirismo sustenta as organizações didáticas Empiristas; e as organizações didáticas Construtivistas são sustentadas pelo modelo denominado Construtivismo.

Para Pires (apud CAMILA, 2007),os modelos epistemológicos de Gascón apresentam características peculiares diante de situações de ensino das matemáticas:

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. Mirieu (1988), citado por Perrenoud et al.(2002,p.115), define situação-problema sendo uma situação didática na qual se propõe ao sujeito uma tarefa que ele não pode realizar sem efetuar uma aprendizagem precisa. E essa aprendizagem, que constitui o verdadeiro objetivo da situação- problema, se dá ao vencer o obstáculo na realização da tarefa. É nessa perspectiva que entendemos a ideia de situação-problema em Gascón (2003).

10

. Para Gascón(2003) são construções matemáticas realizadas no campo da Economia, no campo da Física, da biologia etc..

No modelo Euclidianista o professor “usa o problematizar como controle das aprendizagens adquiridas pelos alunos”, o aluno “deve aprender o conteúdo, suas relações e seus fundamentos” e no saber predomina o caráter conceituar. No modelo Quase-

empirista o professor usa o problema como motivo para

satisfazer as inquietações dos alunos”, o aluno “ seu interesse é medido pela sua participação e desempenho nas sequências apresentadas” e no saber ”predomina o caráter atitudinal”. No modelo Construtivista o professor “usa o problema como meio para aproximar o aluno do saber matemático”, o aluno “importa como se relaciona com o saber” e no saber ”predomina o caráter procedimental”(PIRES apud CAMILA, 2007,p.27).

Diante do exposto, esta pesquisa se encontra dentro da abordagem antropológica do didático, na qual investigamos a organização matemática e a organização didática dos objetos da Análise Combinatória. A organização matemática refere-se à realidade que se pode construir com os objetos da Análise Combinatória para ser desenvolvida em uma sala de aula. A organização didática refere-se à forma que os objetos da Análise Combinatória se configuram nos livros didáticos. Os resultados da pesquisa referentes ao estudo dessas organizações praxeológicas que realizamos serão descritos no capítulo seguinte.

4. ANÁLISES PRAXEOLÓGICAS E ASPECTOS HISTÓRICOS DOS