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Modelos e Métodos de Leitura e de Escrita

FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2. APRENDIZAGEM DA LEITURA E DA ESCRITA

2.5. Modelos e Métodos de Leitura e de Escrita

As metodologias e as estratégias utilizadas pelo professor na aprendizagem da leitura e da escrita são, conjuntamente com as condições essenciais do desenvolvimento da criança acima mencionadas, elementos fundamentais para uma aprendizagem com sucesso. O papel do professor e o seu modo de ensinar são factores que teremos que ter em conta nos diferentes desempenhos das crianças. Esta questão preocupa em grande parte os professores que se questionam, muitas vezes, sobre qual o melhor método de ensino da leitura e da escrita e qual será o mais adequado ao conjunto de crianças que têm diante de si.

Apesar de muito se ter já falado e escrito acerca dos métodos de leitura e de escrita e dos modelos de aprendizagem que estão na sua origem, as respostas às questões

colocadas pelos professores são pouco conclusivas e, muitas vezes, ambíguas, acabando o professor por se ver inserido numa “guerra” sobre métodos.

A discussão sobre os modelos de aprendizagem da leitura e da escrita e sobre os métodos deve ter uma dimensão equilibrada, tendo em conta que este é apenas um dos elementos que pode facilitar ou inibir a aprendizagem das crianças. Não deve ser esquecido que os métodos e as estratégias adoptadas, por um professor, estão inseridos num contexto educativo mais vasto. Segundo Viana (1997), ao falar de métodos, não podemos esquecer que estes são postos em acção por professores, seres humanos com diferentes características, podendo cada um utilizar diferentes estratégias para a operacionalização de um mesmo método.

A autora resume de um modo muito simples a eficácia dos métodos, quando descreve o melhor método de aprendizagem da leitura como aquele que originar menos dificuldades à aprendizagem da criança. Ou seja, quanto maior for a dificuldade das crianças menos eficaz está a ser o método utilizado, quanto mais facilidade a criança mostrar, mais adequado será o método escolhido.

Mialaret (1997) considera que um método obedece a determinados princípios directores e que os processos e as técnicas estão ao serviço dos métodos, embora um mesmo processo ou técnica possa ser encontrado em métodos diferentes.

O autor apresenta três métodos de aprendizagem da leitura e descreve-os de um modo bastante resumido:

- Método Sintético, que tem por base, como o próprio nome indica, uma operação de síntese por parte da criança. Este método implica que a criança deve, em primeiro lugar, conseguir ler cada símbolo individualmente e, numa fase posterior, deve ser capaz de agrupar dois ou mais símbolos e fazer uma segunda leitura, ou seja, juntar as leituras dos símbolos lidos individualmente, numa única leitura.

- Método Analítico, requer da criança uma operação de análise, porque a aprendizagem da leitura parte das palavras e é através desta análise que a criança irá aprender as denominações e sonoridades das suas partes ou sílabas.

- Método Global, em que a criança inicia a aprendizagem com o trabalho de frases, chegando muito mais tarde para a análise de palavras.

Para melhor compreender e aprofundar a eficácia dos métodos referidos por Mialaret, vamos abordar as operações cognitivas que estão subjacentes à leitura e tentar perceber como é que se formam crianças leitoras e como é que estas chegam à compreensão da própria leitura. Deste modo, vamos fazer uma breve explanação sobre os modelos de leitura referidos por Niza e Martins (1998) e expor as principais críticas feitas a cada um dos modelos. Os modelos teóricos que fundamentam a aprendizagem de leitura são três: modelos ascendentes, modelos descendentes e modelos interactivos.

Os modelos ascendentes, baseados nos modelos de Gough (1972) e LaBerge & Samuels (1974) (cf Niza & Martins, 1998) assentam na ideia de que a linguagem escrita é a codificação da linguagem oral e, consequentemente, a leitura é a capacidade de traduzir a mensagem escrita numa mensagem oral equivalente. Para estes autores, o contexto não influencia a leitura, a aprendizagem da mesma implica, apenas, um percurso linear e hierarquizado que combina processos psicológicos primários na tarefa de juntar as letras e processos cognitivos superiores, na criação de sentido. Assim, a leitura é vista como a capacidade que a criança tem de transformar grafemas em fonemas, tendo, consequentemente, a criança leitora o papel de identificar letras, combiná-las em sílabas e formar palavras para com elas formar frases. As autoras apontam os métodos sintéticos como exemplo deste modelo de leitura.

Estes modelos são criticados, sobretudo, por dois aspectos, isto é, pela ausência de flexibilidade, pois, consideram que a única via de acesso à leitura é a correspondência grafo-fonológicas e por não levarem em consideração a influência do contexto na aprendizagem da leitura segundo Mitchell (1982 cf Niza & Martins, 1998).

Os modelos descendentes, baseados nos modelos de Smith (1971), Goodman & Gollasch (1980) referidos por Niza & Martins (1998) dão primazia ao reconhecimento global da palavra e consideram os processos cognitivos de ordem superior o ponto de partida para a aprendizagem da leitura, constituindo a leitura visual o mecanismo essencial para que a criança chegue ao sentido do escrito. A leitura é concebida, então, como a construção de significado de um texto, que funciona como um jogo de adivinhas psicolinguísticas, ou seja, é um processo de identificação de signos globais, de previsão

baseadas no contexto semântico e sintáctico e de confirmação das hipóteses produzidas. Os métodos analíticos e globais são exemplos dos modelos descendentes de aprendizagem.

As críticas feitas aos modelos descendentes de aprendizagem, situam-se na falta de explicação e esclarecimentos, sobre alguns aspectos importantes na aprendizagem da leitura. Assim, não clarificam a importância que atribuem à ortografia, ao léxico, à sintaxe e à semântica no desenvolvimento da leitura; e não explicam como é que os leitores conseguem ler palavras desconhecidas que a criança nunca encontrou na forma escrita, rejeitando a ideia de que a via visual seja a única utilizada na leitura. De acordo com Mitchell (1982) e Stanovich (1980) (cf Niza & Martins, 1998) as críticas apontam, ainda, que este modelo é desadequado para explicar comportamentos de leitores experientes, visto que o tempo que esse leitor poderia despender a fazer predições poderia ser maior do que o tempo investido no reconhecimento de palavras.

Os modelos interactivos, baseados nos modelos de Rumelhart (1977) e Stanovich (1980) (cf Niza & Martins, 1998) colocam como essencial na aprendizagem da leitura a existência de dois sistemas de reconhecimento de palavras que operam em simultâneo; são eles o sistema visual e o sistema de correspondências grafo-fonológicas. Estes sistemas actuam, quer a criança tenha que identificar palavras familiares ou não familiares. Assim, a criança utiliza, ao mesmo tempo e em interacção, estratégias ascendentes e descendentes. Um outro aspecto deste modelo é que para a criança compreender o texto necessita de ter conhecimentos sobre o tema em questão e dominar o código linguístico.

A grande crítica a estes modelos refere-se ao facto de estes se aplicarem a leitores experientes e não a leitores principiantes, não estando adequado a fases iniciais da aprendizagem da leitura.

A aprendizagem da leitura está, também, associada a outros modelos de aprendizagem apresentados por Amor (1993) que os define tendo em conta as concepções que cada um dos sete modelos tem sobre o que é a leitura. Vemos assim, que as concepções sobre o acto de ler e os modelos de leitura aparecem intimamente relacionados.

O primeiro modelo, chamado estruturalista, vê a leitura como uma associação de um significado a um estímulo visual, que pode ocorrer de dois modos distintos, pela recodificação sonora, ou seja, a leitura oral, ou por movimentos internos substitutivos, isto é, a leitura silenciosa. Como é referido por Amor (1993:84) trata-se “…de um processo instantâneo e mediado pela fala de conversão de um significado, codificado em estímulos visuais, num outro significado”. A autora faz duas críticas a este modelo, a primeira está relacionada com o facto de requerer a vocalização como suporte da leitura e a segunda prende-se com o facto de se considerar apenas como pré-requisito essencial à aprendizagem da leitura, a discriminação de formas visuais e sons.

O segundo modelo apresentado, modelo de processamento de dados, é alvo das mesmas críticas que o modelo anterior. O modelo caracteriza-se por ser um modelo linear e indutivo da leitura, considerando que as diferentes tarefas cognitivas podem ser avaliadas em etapas ordenadas, sendo a primeira etapa um estímulo sensorial e a última, uma resposta.

O modelo de Luria, investigador na linha de Vygotsky, intitulado “Leitura sem mediação sonora” concebe a leitura como um processo de recodificação sonora que envolve uma actividade de reconhecimento e compreensão, transformando a leitura numa activação de um léxico visual num determinado contexto linguístico. Este modelo destaca-se dos anteriores pela valorização das práticas que permitem a apreensão global da palavra, recorrendo ao contexto linguístico da criança.

Um outro modelo referido é o de análise pela síntese o qual vê a leitura como um processo combinado, sintético e analítico. Assim, a leitura faz-se pela conjugação de processos indutivos e dedutivos., estando associado ao primeiro processo o tratamento literal, palavra a palavra e sínteses interpretativas progressivas e ao segundo processo a análise da confirmação e da regulação dos sentidos produzidos.

Para o modelo das múltiplas hipóteses, a leitura baseia-se numa multiplicidade de processos, actuando ao nível local, ou seja, no plano da micro-estrutura frásica, e ao nível integrativo, isto é, da macro-estrutura semântico-textual. Deste modo,

“Desdobrando-se em sequências-tipo – formulação de hipóteses, síntese de dados, confirmação/infirmação, o processo ocorre em vários planos, nos quais vão sendo tomadas decisões, fixados sentidos e anulados outros, em consonância com hipóteses já confirmadas ou com os dados fornecidos por novas sequências.” Amor (1993:87)

O modelo construtivista insere a leitura na área de conhecimento, mas remete, ao mesmo tempo, a leitura para o domínio dos sistemas de crenças, valores e afectos da criança. Segundo este modelo, quando a criança lê, está a confrontar-se com o objecto de leitura, o texto e a sua própria visão do mundo. Assim, neste processo de inferências e predições, a criança, mais do que ler o que está no texto escrito, lê o que espera, deseja e pensa que lá esteja.

O último modelo apresentado é o modelo reconstrutor, que, como o próprio nome indica, vê a leitura como recuperação dos objectivos do autor. Assim, a leitura caminha lado a lado com um modelo de produção, sendo o leitor, um participante cooperativo da própria leitura.

Amor (1993:90) considera, assim, que os processos fundamentais para a realização da leitura são cinco, designadamente, “a leitura-análise, a leitura-construção, a leitura que combina estes dois processos, a leitura-cooperação e a leitura-reconstrução.”

Paralelamente aos modelos de leitura, nos anos setenta, surgiram várias investigações sobre a aprendizagem da escrita. Estas investigações procuraram aprofundar o conhecimento sobre o processo de escrita através da análise das operações e estratégias cognitivas presentes nesse processo.

Neste âmbito, surgem vários modelos que podem ser agrupados da seguinte maneira: modelos lineares de escrita e modelos não lineares de escrita segundo Niza & Martins (1998).

Os modelos lineares de escrita, assentes nos modelos propostos por Rohman & Wlecke (1964) e King (1978) (cf Niza & Martins, 1998), entendem o processo de escrita como um fenómeno que acontece ao longo de várias circunstâncias; são elas, a intenção e objectos daquele que escreve, o significado que se quer comunicar e, ainda, a organização sintáctica do significado, que vai ser feita através da estruturação das frases, que, por sua vez, vão sendo codificadas no sistema alfabético. Deste modo, segundo as autoras, a composição escrita acontece em três fases distintas: pré-escrita, escrita ou articulação e reescrita.

A pré-escrita corresponde ao processo exploratório do tema e das ideias, ou seja, a criança vai começar a pensar sobre o que escrever, activando uma ligação do pensamento à linguagem. Por seu turno, a escrita ou articulação relaciona-se com o acto de escrever em si, momento em que a criança vai escrever no papel, ou em outro suporte, o que pensou anteriormente. Finalmente, a reescrita é o momento em que a criança vai reflectir sobre o que escreveu e vai fazer algumas correcções, suprindo, substituindo ou acrescentando palavras ou frases.

A grande crítica feita a este modelo diz respeito à sequência fixa e linear da produção de texto escrito. Segundo estes modelos, o pensamento seria anterior à escrita, no entanto, considera-se que a escrita, também, traduz formas de pensamento. Como afirmam Niza & Martins (1998) o que acontece é que quando escrevemos ou falamos vamos simultaneamente alterando o nosso pensamento; assim, pensar e escrever são processos interactivos e recíprocos e não acontecem sequencialmente.

Contrariamente aos modelos anteriores, os modelos não lineares de escrita apresentam a escrita como um conjunto de processos que decorrem em qualquer altura, durante todo o tempo que a criança leva a escrever o texto. Segundo o modelo apresentado por Hayes e Flower (1980 cf Niza & Martins, 1998), devemos ter em conta, no processo de escrita, o ambiente da tarefa, os conhecimentos da criança que escreve o texto e os próprios processos de escrita.

Os autores Hayes e Flower (1980), citados por Niza & Martins (1998), defendem, ainda, que os processos de escrita integram três fases: a planificação, a tradução e a revisão. A planificação consiste em procurar informações necessárias para o texto, o que poderá ser feito tomando, organizando e seleccionando notas, antes da escrita do texto. A segunda fase, a tradução, é a concretização do plano em frases escritas, gramaticalmente organizadas. Por último, a revisão pode coincidir com o terminar do texto escrito, mas pode acontecer nas fases anteriores, de planificação e tradução, podendo alterar as mesmas.

Estes modelos são criticados por considerarem, apenas, a interacção individual entre a criança e o seu próprio texto e esquecerem que a construção de um texto pode ser uma actividade colectiva. Outra crítica aos modelos não lineares de escrita está relacionada com a dimensão social, que é esquecida por estes modelos. A criança que escreve tem,

também, de enfrentar e solucionar problemas de ordem social, não se limitando a escrita a resolver problemas cognitivos. Segundo Niza & Martins (1998) o conhecimento da realidade só é possível enquanto função de interacção entre os sujeitos, as suas comunidades e os seus contextos materiais.

As autoras reforçam a dimensão social da escrita, referindo que a interacção com a escrita dos outros pode trazer grandes vantagens à aprendizagem e ao desenvolvimento da escrita. A criança que escreve em grupo necessita de explicitar o que vai dizer e, ao mesmo tempo, negociar o modo como se vai traduzir o que quer dizer em palavras. Segundo Niza & Martins (1998) esta interacção contribui para o desenvolvimento de aprendizagens múltiplas: textuais, uma vez que há uma consciência dos processos linguísticos envolvidos na escrita; sociais, porque se aprende a ter em conta a opinião dos outros.

A escrita é, assim, uma actividade social que pode ser promovida, enquanto tal, pelo professor na sala de aula. Desde o primeiro momento, o professor pode conduzir a criança na escrita de textos com sentido, tendo em conta as suas necessidades e objectivos comunicativos. O papel do professor assume, notoriamente, uma importância considerável na aprendizagem da escrita e da leitura. É o seu papel na sala de aula que passaremos a abordar no próximo ponto deste capítulo.