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Paradigma Interpretativo

CONCEPÇÃO E REALIZAÇÃO DA INVESTIGAÇÃO

1. METODOLOGIA DA INVESTIGAÇÃO: ALGUMAS QUESTÕES

1.1. Paradigma Interpretativo

O conhecimento dos paradigmas metodológicos e o enquadramento da investigação apresentada, tornaram-se fundamentais na realização prática da investigação, pelo que sentimos necessidade de fazer uma breve abordagem aos dois grandes paradigmas de investigação - normativo e interpretativo - e ainda, caracterizar o paradigma que norteou este estudo.

O paradigma no contexto da investigação dever ser entendido “...como um conjunto de crenças básicas que conduz o investigador, não só na escolha dos métodos, mas também ontológica e epistemologicamente” como refere Botelho (2002:287). Assim, um paradigma caracteriza-se pelo tipo de objecto estudado e, também, pelo modo como é conduzida a investigação. Estas opções metodológicas estarão também na origem do tipo de interpretação feita aos dados recolhidos.

Tornou-se importante reflectir sobre o conceito de paradigma, uma vez que é sobre a interpretação que fazemos do mesmo, que assentou a linha metodológica da nossa investigação. Acreditamos, também, que paradigma agrega todo um conjunto de pressupostos teóricos que fundamentam um estudo. Olhemos para o conceito de paradigma de Herman (1983) em Lessard-Hébert et al. (1990:19): “...um conjunto de pressupostos filosóficos, de modelos teóricos, de conceitos-chave, de resultados influentes de investigações, constituindo um universo habitual de pensamento para os investigadores num dado momento do desenvolvimento de uma disciplina”.

Erickson em Lessard-Hébert et al. (1990) designa os dois principais tipos de abordagem da investigação em educação, que considera paradigmas, são eles a abordagem positivista/behaviorista e a abordagem interpretativa. Por seu lado, Cohen e Manion (1986) utilizam os termos normativo e interpretativo para definir os dois paradigmas, estando o primeiro associado a uma perspectiva positivista e o segundo a uma perspectiva anti-positivista. Miles e Huberman (1984) citados por Lessard-Hébert et al (1990) preferem a clássica distinção entre paradigma quantitativo e qualitativo, integrando em cada um deles as várias abordagens metodológicas. Verifica-se portanto, que os autores citados utilizam diferentes terminologias para se referirem aos dois grandes paradigmas de investigação.

Para melhor definir o paradigma em que se insere esta investigação, pretendemos caracterizar os dois paradigmas, normativo e interpretativo, segundo a terminologia de Cohen e Manion (1986) e estabelecer as principais diferenças entre eles. Procurou-se que o conhecimento de ambos contribuísse para melhor definir o caminho a percorrer ao longo deste estudo.

As grandes diferenças entre o paradigma normativo e interpretativo de acordo com Cohen e Manion (1986) situam-se ao nível das ideias que os orientam e em relação aos conceitos chave.

As ideias que orientam o paradigma normativo dizem-nos que o comportamento humano é regulado por regras, que deveriam ser estudadas pelos métodos das ciências naturais. Assim, o conceito chave do paradigma normativo é o comportamento, dando ênfase, mais concretamente, às respostas, estimuladas exteriormente ou interiormente pelo ambiente estudado, residindo sempre a causa do comportamento no passado. Deste modo, os estudos normativos são positivistas.

Por outro lado, o paradigma interpretativo é caracterizado pela preocupação no individual e centra-se na acção, sendo esta assumida como comportamento com significado, ou seja, comportamento intencional direccionado para o futuro. Cohen e Manion (1986:36) referem ainda a relação das acções e dos significados que lhe são atribuídos “Actions are only meaningful to us in so far as we are able to ascertain the intentions of actors to share their experiences.” Pelo que foi mencionado, os estudos interpretativos são considerados anti-positivistas.

Outros dois aspectos distinguem os paradigmas normativo e interpretativo, são eles o papel da teoria produzida pela investigação e, consequentemente, os objectivos dos investigadores.

No paradigma normativo, os investigadores tentam criar teorias gerais do comportamento humano, tentando a sua validação através de complexas metodologias de investigação, assumindo a teoria o papel de indicar como pode a realidade ser mudada para melhorar. Deste modo, segundo Cohen e Manion (1986), o objectivo dos investigadores normativos é estabelecer um ‘edifício racional’ compreensivo, uma teoria universal, para a descrição e explicação do comportamento social e humano.

Segundo os mesmos autores, no paradigma interpretativo, a teoria não deve preceder a investigação, emergindo esta de situações particulares. A teoria é fundamentada nos dados criados pala actuação do investigador. Os investigadores interpretativos têm, então, como objectivo o trabalho directo com os indivíduos, tentando compreender as suas interpretações do mundo. Como referem Cohen e Manion (1986:37):

“Investigators work directly with experience and understanding to build their theory on them. The data thus yielded will be glossed with the meanings and purposes of those people who are their source. Further, the theory so generated must make sense to those to whom it applies.”

Consideradas as diferenças entre os dois grandes paradigmas, pensa-se que a investigação apresentada está em consonância com as principais directrizes do paradigma interpretativo, dado que o seu objectivo é interpretar uma determinada realidade, procurando a sua compreensão no contexto específico em que se desenrola.

Com a investigação não se pretende pois uma obtenção de resultados aplicáveis a outras realidades semelhantes, mas procura-se que a realidade estudada possa ser comparada com fenómenos similares que ocorram em outras realidades e que a compreensão da mesma possa auxiliar na interpretação e também na compreensão de realidades idênticas. Como é apontado por Cohen e Manion (1986) a teoria emergente do estudo de uma realidade fornece-nos uma maior compreensão e, consequentemente, o alargamento do conhecimento dos indivíduos e da forma com estes actuam. Os mesmos autores referem ainda que:

“The aim of scientific investigation for the interpretive researcher is to understand how this glossing of reality goes on at one time and in one place and compare it with what goes on in different times and places. Thus theory becomes sets of meanings which yield insight and understanding of people’s behaviour.” Cohen e Manion (1986:37)

Embora os autores façam referência ao comportamento, entende-se esta referência ao comportamento como parte integrante da acção do indivíduo, uma vez que se assumiu que a investigação desenvolvida dentro do paradigma interpretativo, está focada na acção dos indivíduos e não sobre o seu comportamento. Entende-se, assim, como acção “o comportamento físico e ainda os significados que lhes atribuem o actor e aqueles que interagem com ele.” como é referido por Erickson (1986 cf Lessard-Hébert et al., 1990:39). Deste modo, o objecto da investigação interpretativa pode ser designado, segundo o autor mencionado, de acção-significado («meaning-in-action»).

Assume-se, então, que o conhecimento produzido no contexto do paradigma interpretativo se constrói na interacção estabelecida entre investigador e participantes, pretendendo, como afirma Botelho (2002:288), “a reconstrução, pelo investigador, das realidades construídas pelos participantes”.

Assim, um estudo desenvolvido numa perspectiva interpretativa faz surgir, não uma teoria universal, mas antes um conjunto variado de imagens do ser humano, sendo tão variado quanto o número de contextos estudados.

A designação de paradigma interpretativo é muitas vezes utilizada como sinónimo de investigação qualitativa e, nalgumas ocasiões, esta última é integrada no paradigma interpretativo como sendo uma das suas abordagens. Para clarificar melhor estes conceitos entendeu-se que seria benéfico para a investigação perceber como alguns autores apresentam a questão e onde inserem a investigação qualitativa.