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O Modelo MIGT surgiu como uma resposta à visão dominante no campo institucional quanto ao padrão de comportamento das instituições e na explicação da forma pela qual a estabilidade dos padrões institucionais condicionaria o comportamento dos agentes, de modo a permitir a reprodução e a manutenção da ordem vigente (Lieberman, 2002; Mahoney & Thelen, 2010; Streeck & Thelen, 2005). De forma mais restrita, surgiu também como uma reação às críticas quanto à limitada capacidade dessa corrente de compreender os processos de mudança institucional (Mahoney & Thelen, 2010).

Partindo-se da perspectiva de que as instituições são propensas a conflitos, desequilíbrios e choques de interesses e de valores, entende-se que o processo de transformação

institucional é permeado não apenas por causas exógenas, mas também endógenas, que se manifestam no transcorrer do tempo e de forma gradual. A estabilidade dos padrões institucionais condicionaria o comportamento dos agentes, de modo a permitir a reprodução e a manutenção da ordem vigente (Mahoney & Thelen, 2010; Streeck & Thelen, 2005). Vieira e Gomes (2014), com base nos pressupostos lançados por Streeck e Thelen (2005) e por Mahoney e Thelen (2010), apontam o seguinte a respeito do processo de mudança institucional:

[...] é possível especular que o engajamento dos atores faz com que a própria interpretação possa provocar mudança na forma como a instituição é aplicada [...] Assim, o processo de mudança institucional teria como base as seguintes premissas: o sistema é composto por múltiplos atores com interesses diversos e desigual distribuição de poder; os atores interpretam as instituições de maneiras diferentes; as preferências e interesses de cada ator podem ser ambíguos; a agência também provoca consequências não premeditadas; os atores permeiam múltiplos ambientes institucionais complexos (p. 683).

Assentado na perspectiva lançada por Streeck e Thelen (2005) de que as pequenas e graduais mudanças que as instituições passam no transcorrer de um período de tempo podem resultar em alterações capazes de modificarem o comportamento humano e os resultados políticos obtidos no contexto institucional, Mahoney e Thelen (2010) concebem o Modelo MIGT como uma resposta à visão dominante no campo institucional sobre o comportamento das instituições. A base do modelo reside no papel que os atores desempenham nesse processo, uma vez que a sua movimentação, aliada à dinâmica dos conflitos internos existentes, mais do que gerarem os mecanismos de reprodução institucional e de reforço de padrões do sistema, podem proporcionar também alterações incrementais significativas com o passar do tempo (Mahoney & Thelen, 2010; Streeck & Thelen, 2005).

O processo de mudança gradual e transformacional tende a se manifestar a partir das lacunas existentes entre as regras e suas interpretações, ou entre as regras e suas diferentes aplicações. Isso acontece porque, em um contexto de regras formalizadas, há espaço para a manifestação da ambiguidade na sua interpretação e implementação por parte dos atores – seja individualmente ou agrupados em coalizões. Como consequência, abrem-se brechas para que estes mudem seus interesses, suas percepções e suas preferências, podendo resultar em questionamentos quanto à continuidade das instituições (Mahoney & Thelen, 2010).

A mudança gradual e transformativa é caracterizada por ser decorrente de um processo lento e incremental cujos resultados implicam em uma descontinuidade do status quo das instituições (Streeck & Thelen, 2005). Entretanto, para se avaliar o tipo de mudança institucional que pode se manifestar, é necessário analisar dois fatores – as características do contexto político (possibilidades de veto dos agentes) e as da própria instituição no que tange o

nível de discricionariedade na interpretação e/ou no cumprimento das normas. Ambos são essenciais para se determinar o perfil dominante de agente de mudança que pode emergir no contexto institucional em questão, bem como as estratégias que este estará predisposto a adotar em prol de seus objetivos (Mahoney & Thelen, 2010). Dessa maneira, o modelo concilia tanto os fatores de agência quanto os fatores de estrutura (Vieira & Gomes, 2014).

Quatro são as possibilidades de mudanças apontadas pelo Modelo MIGT: Displacement,

Layering, Drift e Conversion1. O tipo Displacement é caracterizado pela substituição das regras existentes com subsequente introdução de novas. Por sua vez, a mudança por Layering acontece através da introdução de novas regras às instituições já existentes, alterando progressivamente sua estrutura e sua influência no comportamento dos atores. O tipo Drift ocorre quando, a partir de alterações no contexto externo, modifica-se o impacto das regras já existentes, que permanecem formalmente as mesmas. Por fim, a mudança por Conversion decorre a partir de uma nova interpretação e aplicação das regras existentes pelos agentes devido à ambiguidade.

Além de apontar os tipos de mudança possíveis, o Modelo MIGT avalia também o comportamento dominante adotado pelos agentes, indo além de uma simples divisão entre vencedores e perdedores. Questionando-se a respeito da intenção do agente em preservar as regras existentes e se ele cumpre as regras institucionais, chega-se a uma combinação que determina quatro tipos de agentes de mudança gradual, conforme apontado na Figura 1 – os Insurgentes (insurrectionaries), os Simbióticos (symbionts), os Subversivos (subversives) e os Oportunistas (opportunists).

Figura 1. Tipos de agentes de mudança e seus comportamentos

Tipos de agentes O ator busca preservar as regras existentes?

O ator cumpre as regras institucionais?

Insurgentes (insurrectionaries) Não Não

Simbióticos (symbionts) Sim Não

Subversivos (subsersives) Não Sim

Oportunistas (opportunists) Sim/Não Sim/Não

Fonte: adaptado de Mahoney e Thelen (2010)

Os Insurgentes caracterizam-se por uma rejeição do status quo e visam conscientemente eliminar as instituições ou as regras vigentes, mobilizando-se, de forma ativa, contra elas ao adotar estratégia do tipo Displacement. Os Simbióticos subdividem-se em dois

1 Segundo Vieira e Gomes (2014), esses termos podem ser traduzidos como Substituição (displacement), Camadas (layering), Deslocamento (drift) e Conversão (conversion). Entretanto, optou-se por manter, neste trabalho, as nomenclaturas originais dos tipos de mudança apontas por Mahoney e Thelen (2010) na construção do modelo MIGT.

tipos – Parasitas e Mutualísticos. Ambos se caracterizam por explorar a instituição vigente para ganhos próprios, mas, enquanto que os Parasitas acabam por comprometer a sobrevivência desta no longo prazo, os Mutualísticos conseguem explorá-la sem colocar em risco sua existência. Tendem a atuar para garantir a manutenção e a estabilidade das instituições, embora possam provocar mudanças do tipo Drift. Por sua vez, os Subversivos almejam a mudança institucional, contudo sem comprometer as regras vigentes, promovendo a adição de novas regras em uma estratégia tipicamente de Layering. Finalmente, os Oportunistas manifestam preferências ambíguas sobre as instituições. Sua atuação é marcada pela inércia, contudo, quando decidem emergir como agentes de mudança, adotam estratégias do tipo Conversion, explorando as ambiguidades existentes na interpretação e na aplicação das regras.

Ao proporcionar uma visão endógena do processo de mudança institucional centralizada no comportamento dos agentes, o Modelo MIGT agrega uma perspectiva de que a mudança é decorrente da compreensão, pelos atores envolvidos, de que os interesses serão melhor atendidos caso promovam alteração no status quo das instituições, mesmo que de forma gradual e progressiva. Agregando-se à análise dos empreendedores, suas categorias referentes aos tipos de agente e aos comportamentos estratégicos adotados permitem compreender como estes podem atuar para desencadear as mudanças almejadas. Contudo, conforme apontado por Vieira e Gomes (2014), esse modelo também possui limitações, em especial no sentido de compreender os meios utilizados para desencadear os processos de mudança. Os preceitos do Neoinstitucionalismo Discursivo fornecem, por sua vez, elementos interessantes que permitam entender como os agentes inseridos em um dado contexto político ou institucional – incluindo, aqui, os empreendedores – difundem suas ideias.

2.5. O Neoinstitucionalismo Discursivo

Desenvolvidas como uma reação à perspectiva behaviorista, o Neoinstitucionalismo, embora englobando diversas correntes de pensamento, assentou-se basicamente em três versões clássicas: a Sociológica (também denominada de Organizacional), a Histórica e a da Escolha Racional (DiMaggio & Powell, 1991; Hall & Taylor, 1996). Contudo, embora as correntes clássicas do Neoinstitucionalismo tenham contribuído para reafirmar a importância das instituições dentro da agenda de pesquisa das ciências sociais, essas abordagens permaneceram relativamente estáticas em suas compreensões sobre as dinâmicas do meio institucional (Hope & Raudla, 2012). Ao analisar as três versões de forma comparada, Hall e Taylor (1996) afirmam que cada uma possui suas limitações e vantagens, não sendo capazes de individualmente