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CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS

4.2. Discussão dos Dados

4.2.4. Mudanças ao nível da forma como os alunos percecionam e se envolvem

A partilha de informação e conhecimento estratégico entre o professor e os alunos/turma foi uma constante na fase inicial do estudo, como se explicou, tendo pontualmente sido recorrente ao longo do mesmo, no pressuposto de que na comunicação educativa deve existir proporcionalidade entre emissor e recetor, deve existir alternância entre emissor e recetor (retorno, feedback, interatividade), ambos (professor e alunos) são necessariamente emissores-recetores e, consequentemente,

122 sujeito e objeto de comunicação conscientes dos mesmos referenciais, de forma que o processamento da informação ocorra sem ruídos. Por outras palavras, não deve existir informação mantida em segredo, os alunos devem conhecer a terminologia de caráter pedagógico-didático usada pelo professor, o significado e os significantes devem ser debatidos e elucidados.

Verifica-se que muitos dos alunos envolvidos no projeto/estudo, depois de conhecerem termos técnicos, passam a aplicá-los com propriedade, oportunidade e pertinência. No caso da turma participante do 9º ano encontram-se indícios mais nítidos. No caso do 8º ano esses indícios são mais raros.

Partindo do princípio de que existe uma relação entre os resultados de aprendizagem dos alunos e a qualidade do ambiente de aprendizagem (Fraser e Walberg, 2005), procurou-se implementar estratégias que contribuíssem para criar um ambiente de aprendizagem positivo através de ações que incidiram sobre a qualidade das relações professor-alunos e aluno-alunos. Desta forma, foram esvanecidas questões de conflito, identificadas antes do início do estudo através da autorreflexão dos professores participantes, tendo por base situações vividas nas aulas em anos letivos anteriores. O trabalho colaborativo entre alunos, o trabalho de grupo em particular, revestiu-se de uma importância estratégica na medida em que possibilitou o aprofundamento das virtualidades da comunicação interpares, da entreajuda e partilha de conhecimentos e da participação ativa dos alunos na condução do processo de aprendizagem nos momentos do desenvolvimento e de avaliação. Como referem Hijzen, Boekaerts e Vedder (2006), as relações positivas entre professor e alunos contribuem para o desenvolvimento da autonomia do professor e da escola, assumindo que o ambiente de aprendizagem exerce uma influência significativa na definição e na adoção de objetivos pessoais, tal como reflete um aluno do 9º ano:

A minha motivação para vir para as aulas de Inglês nem sempre é boa, porque sou um bocado preguiçoso e como não percebo muito de Inglês fico um pouco à maré de alguns dos meus colegas, mas o professor consegue motivar-nos e todas as aulas saio da sala com algo novo aprendido.

123 Parece existir uma relação de causa-efeito entre a comunicação professor-alunos e a qualidade do ambiente interpessoal da turma: grande parte dos conflitos entre alunos ou entre alunos e professor parecem ter sido esbatidos depois de ter sido implementada a estratégia de comunicação referida anteriormente. Em particular, no caso da turma do 9º ano, três alunas que habitualmente eram inseguras e não participavam, aparentemente por sentimento de inferioridade, começaram a manifestar-se mais seguras, desenvolvendo as tarefas e apresentando-as à turma e ao professor.

Desta forma, tal como foi anteriormente exposto, o estudo parece indiciar que o diálogo e a explicação sistemática das opções do professor na condução do processo de ensino-aprendizagem favorecem a motivação e a aquisição de conhecimentos através da sua consciencialização acerca do processo – estes manifestam conhecimento dos conteúdos, das competências e dos critérios de avaliação. Esta ideia é referida por vários alunos, tanto nas reflexões individuais como nas sessões com os grupos focalizados:

Dialogar com os alunos é muito importante, faz-nos sentir à vontade para aprendermos mais e melhor.

(Aluno 6, reflexões individuais dos alunos do 9º ano)

A implementação de estratégias de trabalho colaborativo entre os alunos parece ter contribuído para a melhoria do ambiente da turma e do relacionamento interpessoal, em conformidade com estudos desenvolvidos por Hijzen, Boekaerts e Vedder (2006). A reflexão colaborativa entre professor e alunos (do tipo “socrático”) é um processo semelhante à reflexão colaborativa entre professores/colegas, do qual se tornou complementar, e do qual o excerto é ilustrativo o seguinte excerto:

PI: E agora… estas três atividades são atividades interessantes mas por razões diferentes. Trabalha-se coisas diferentes. Trabalho de grupo, quais são as vantagens, as caraterísticas, ao nível da aprendizagem?

A4: A interação e a troca de ideias. A2: Discutir opiniões.

PI: A1, ainda não ouvi a tua opinião, quase… A1: Não sei…

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A1: Sim. PI: Porquê?

A1: Não sei… é mais divertido e não é tão teórico.

PI: E em termos de aprender, aprendes alguma coisa nos trabalhos de grupo? Por exemplo, imagina que eu quero que vocês respondam a umas perguntas. Certo? Eu posso mandar fazer individualmente ou em grupo.

A2: Individualmente é mais seca. PI: Porquê?

A2: Porque estamos sempre sozinhos e a fazer cansa-se um bocado. PI: E em grupo?

A2: Em grupo, enquanto estamos a fazer podemos conversar um bocado. PI: A1, e tu o que achas? Se for individualmente o que é que achas? A1: Eu acho que espero que alguém faça no quadro para passar. Todos: HEHEHEHE

PI: Era exatamente o que eu queria! É isso que me interessa. Individualmente não fazias! Até porque tu sabes que depois vai haver uma correção no quadro, foi isso que disseste, não foi? Em grupo, trabalhas ou não trabalhas?

A1: Trabalho.

PI: Portanto, trabalhas mais um bocado. E qual é a vantagem?

A1: A vantagem é que se eu não sei, o meu colega pode saber e assim fazemos tudo. PI: Era a isto que eu queria que vocês chegassem. Chama-se a isso trabalho colaborativo.

(Transcrição da sessão 2 do grupo focalizado 1)

Os resultados deste estudo parecem estar em conformidade com estudos desenvolvidos por Leite e Tagliaferro (2005), na medida em que a questão da afetividade aparece também referida por muitos alunos nas reflexões individuais, parecendo transparecer a ideia de que a motivação do aluno está relacionada com a afetividade: uma boa relação entre professor e alunos favorece a motivação e a reflexão sobre o processo de aprendizagem, levando a que o aluno reflita sobre as suas limitações e defeitos, bem como sobre as suas capacidades e pontos fortes. Um aluno refere de que forma a exigência e falta de paciência do professor inibe a sua participação, o que podemos aceitar como prova do que anteriormente foi exposto:

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Eu acho que o professor de Inglês por vezes não age corretamente com os alunos que têm algumas dificuldades. Estamos no 9º ano e sei que já devíamos dominar a língua Inglesa, mas nem todos somos e aprendemos facilmente. Acho que deveria ter mais paciência quando um aluno não sabe algo que até seja básico. Por vezes até pode ter medo ou vergonha que esteja mal.

(Aluno 17, reflexões individuais do 9º ano)

Alguns alunos identificam e reconhecem a vantagem do diálogo entre professor e alunos, como fator positivo para desenvolver a afetividade e melhorar a motivação e a aprendizagem. Um dos aspetos que aparece mais marcadamente referido pelos alunos quando falam do diálogo e da inter-relação entre professor e aluno, é a capacidade deste saber ouvir e dar aos alunos a oportunidade e a possibilidade de exprimirem as suas ideias e opiniões, pois a interação e a troca de ideias permitem que os alunos concluam: “Acho que nós pensamos com a nossa própria cabeça” (Transcrição da sessão 2 do grupo focal 1).

Um aluno refere mesmo que a interatividade é uma estratégia diferenciadora no contexto de ensino-aprendizagem, pois “por vezes, os alunos com melhores notas tendem a cobrir os de piores notas, mas através destas aulas mais interativas conseguem todos aprender aos seus diferentes níveis” (Aluno 12, reflexões individuais dos alunos do 9º ano).

Assim, foram encontrados dados que nos permitem dar uma resposta positiva à quarta questão deste estudo.

A análise empírica das situações de aprendizagem, particularmente através da observação dos alunos durante as aulas, permite concluir que, em consonância com o estudo desenvolvido por Lopes (2011), existiu uma melhoria ao nível do desempenho dos alunos que, antes do estudo, apresentavam resultados mais fracos. Tal deveu-se a uma maior predisposição desses alunos para a aprendizagem, pela novidade e pelo aumento da confiança no professor, em resultado das mudanças ao nível da comunicação pedagógica e das atividades desenvolvidas.

Os dados recolhidos através das sessões com os grupos focalizados, das reflexões dos alunos e da observação e reflexão dos professores participantes, permitem-nos

126 também concluir que podem ser identificadas algumas mudanças ao nível das aprendizagens dos alunos em consequência das transformações operadas ao nível do desempenho profissional e pessoal dos professores envolvidos num processo de supervisão pedagógica interpares e, desta forma, parece consistente com a ideia defendida por Yoon et al (2007), que partindo da análise de nove estudos realizados nos E.U.A., concluem que os efeitos do desenvolvimento profissional do professor sobre os alunos são proporcionais ao seu conhecimento e práticas na sala de aula. Desta forma, o desenvolvimento profissional do professor afetou as aprendizagens dos alunos, na medida em que melhorou o ambiente de aprendizagem.

Durante um dos ciclos de observação de aulas, PP refere que um “ponto inovador foi os alunos terem tido realmente oportunidade de testarem o conhecimento e reconhecimento de vocabulário, e talvez perceberem (tanto eles como a professora) que eles sabem mais do pensam” (Feedback do Observado PP, Registo Colaborativo: aula observada 2).

Em consonância com estudos levados por Darling-Hammond (2000) nos E.U.A., pode concluir-se que o desenvolvimento profissional do professor não contribui apenas para este se sinta melhor com a sua prática, mas também acarreta ganhos de aprendizagem para os seus alunos. E em consonância com estudos levados a cabo por Kubitskey, Fishman e Marx (2003) e Goddard e Goddard (2007), conclui-se que a observação mútua entre colegas professores tem impacto não apenas na sua própria aprendizagem como na aprendizagem dos seus alunos, na medida em que constitui um meio de adquirir novos conhecimentos através da partilha e de refletirem sobre o seu ensino. Esta interdependência entre o desenvolvimento profissional do professor e as aprendizagens dos alunos, que acarreta também aprendizagens ao nível do conhecimento e capacidades do professor e da forma como planifica, desenvolve e avalia o processo de ensino e aprendizagem, encontra-se esquematizado na Figura 10.

Assim, se por um lado a análise dos dados recolhidos neste estudo não permite concluir em definitivo que os resultados dos alunos das turmas envolvidas estão diretamente relacionados com a ação dos professores participantes, por outro lado permite concluir sem sombra de dúvida que o trabalho colaborativo, a observação e a

127 reflexão mútuas tiveram um impacto transformacional, pois induziram os professores participantes para modificações nas suas práticas de ensino e na forma de comunicar/dialogar com os alunos, incrementando nestes a motivação e a compreensão do processo de ensino-aprendizagem.

FIGURA 10: Como o desenvolvimento profissional afeta as aprendizagens dos alunos (adaptado de Yoon et al, 2007)

Tal foi, por exemplo, o facto da turma do oitavo ano, da PP, que se caraterizava inicialmente pelo desinteresse e desmotivação da maioria dos alunos. Ora, depois de PP ter inovado e iniciado estratégias mais interativas e dinâmicas das suas aulas (trabalho de grupo e recurso a meios audiovisuais, por exemplo), em consequência do processo reflexivo associado aos ciclos de observação de aulas, os alunos mudaram a sua atitude. Esta mudança foi evidente logo na segunda aula observada em que “a espaços, os alunos manifestaram comportamentos de entreajuda, partilha e colaboração. Quase todos os alunos trabalharam (diria que apenas 1 não trabalhou)” (Comentário/Inferência do Observador PI, registo colaborativo: aula observada 2).

Neste ponto, convém referir que os alunos com menos sucesso (ou, visto por outro prisma, os alunos com mais insucesso) tendem a valorizar caraterísticas da personalidade do professor e metodologias e recursos interativos nas aulas; os alunos com mais sucesso tendem a valorizar as experiências de aprendizagem, isto é, as situações práticas em que podem exercitar as competências comunicativas e linguísticas. Face ao exposto, parece

CURRÍCULO, METAS, AVALIAÇÃO DO DESEMPENHO, AVALIAÇÃO DAS APRENDIZAGENS

Desenvolvimento profissional Conhecimento e capacidades do professor Ensino na sala de aula Aprendizagens dos alunos

128 ser difícil recuperar a motivação pela disciplina quando o aluno tem um historial de falta de aproveitamento:

Sobre as aulas não gosto lá muito porque deixei-me de importar com a língua e isso agora faz com que eu não perceba muito. Sobre o professor, tem dias que é fixe e outros que não gosto lá muito…

(ALUNO 11, Reflexões Individuais dos alunos do 9º ano)

Outra conclusão relevante, é que a maioria dos alunos evidencia uma consciência elevada acerca dos conteúdos, objetivos e processos envolvidos na aprendizagem da língua. Este facto transparece da leitura e análise das reflexões individuais dos alunos do 9º ano, bem como das intervenções dos participantes nas sessões com os grupos focalizados. Nestes documentos encontram-se evidências da capacidade reflexiva dos alunos sobre as aulas, sobre o desempenho do professor e sobre o seu próprio desempenho. No entanto, a profundidade e a pertinência reflexiva relaciona-se diretamente com a qualidade da aprendizagem: os alunos com insucesso/baixo sucesso, para além de evidente dificuldade de expressão, apresentam um discurso genérico e pouco aprofundado; os alunos com sucesso tendem a manifestar relativa coerência interna no discurso e a aplicar terminologia especializada.

“Este ano, apesar de ter levado 2, sei que aprendi mais, não é por o professor ensinar mal nos outros anos, mas sim por este ano perceber que o Inglês é importante e me tentar esforçar.”

(Aluno 18, Reflexões Individuais dos alunos do 9º ano)

Esta perceção é reconhecida tanto pelo Professor Investigador como pela Professora Participante:

“A forma como os alunos trabalham mudou muito, até o N e o N trabalham nas aulas. E acho que os resultados têm vindo a melhorar. De facto, as últimas composições que corrigi mostram que todos os alunos (exceto N!) tentam escrever, e todos sabemos bem como os alunos normalmente detestam a expressão escrita.”.

129 Pode, pois, assumir-se que as transformações que se operam nos professores repercutem-se nos alunos, sejam elas ao nível psicológico seja ao nível do desempenho. Quanto mais elevada for a motivação para a inovação e a mudança, maior será a qualidade do processo de ensino e aprendizagem. Estas constatações estão em consonância com a perspetiva defendida por Zeichner (1993), segundo o qual se o professor se dá conta de que não está sendo entendido, cumpre-lhe investigar porquê e proceder às mudanças necessárias, pois o aluno não vai mudar, é fruto de seu tempo, tem suas caraterísticas e necessidades, competindo ao professor responsabilizar-se sobre o seu próprio desenvolvimento profissional. Nesta perspetiva, os professores envolvidos na investigação das suas próprias práticas parecem adotar modelos de ensino mais centrados nos alunos, partindo do pressuposto de que é importante ouvir, observar e procurar entender os alunos.

Outro aspeto relevante neste estudo é a ideia de que a relação entre aluno e professor deve caracterizar-se pela dimensão de entreajuda e de estímulo à autonomia, usando como plataforma a confiança e o respeito, em consonância com as ideias defendidas por Borralho e Oliveira (2010):

 A procura do feedback‖dos alunos levou a uma maior aproximação entre alunos e professores, melhorando, portanto, a relação pedagógica.

 Os alunos demonstraram um pouco mais de motivação para as aulas, com a diversidade de materiais e estratégias utilizados pelos professores e com o facto de terem sentido que o professor se preocupava com as suas opiniões e dificuldades.

 O reconhecimento explícito, por parte dos alunos, da dedicação dos professores, fez renascer nestes, algum do ânimo e esperança, tornando-se evidente que é possível resolver os problemas emergentes no contexto da sala de aulas.

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