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A preocupação com a linguagem sempre esteve presente entre os povos antigos, entre os gregos, por exemplo, os fatos da linguagem sempre chamaram muita atenção. Neves (2005) atenta para o de fato de que, em Homero, apesar de não haver nenhuma reflexão sobre a linguagem, ela não é confundida com a força do corpo e da natureza, como em, segundo suas palavras, “sociedades primitivas”. De acordo com a autora, os gregos a entendem como “realidade sonora” (NEVES, 2005, p.20).

Ainda de acordo com a autora, com formação da pólis grega, surgiam duas linguagens: “a linguagem poética, inspiração das Musas, que falam por meio do poeta”; e a linguagem retórica, “em que o homem fala por si, pessoal por definição” (NEVES, 2005, p.25).

Nesse contexto, como parte da filosofia, surge a reflexão sobre a linguagem na Grécia, no século V a.C. Por pertencer à filosofia, a reflexão era uma parte da indagação geral sobre a natureza do mundo e das instituições sociais (LYONS, 1979).

Inicialmente, havia uma discussão entre naturalistas e convencionistas sobre se a língua era natureza ou convenção, ou seja, se tinha sua origem em princípios imutáveis ou se era resultado do costume e da convenção, um “contrato social”. Essa discussão entre natureza e convenção se concentrava na questão de haver ou não relação entre significado e forma das palavras. Para os naturalistas, descobrir a etimologia (etymo-,

em grego, significa “verdadeiro”, “real”) da palavra era revelar “uma das verdades da natureza” (LYONS, 1979, p.4), nesse sentido, a forma teria relação com o significado do que designa. Essa problemática, discutida por naturalistas e convencionistas, originou a investigação etimológica e inclui a gramática na indagação filosófica geral.

A partir do séc. II a.C., a questão entre os que estudavam a língua era até que ponto a língua é regular. Os que defendiam a regularidade sistemática são chamados de analogistas, e os que a refutavam são chamados de anomalistas. Estes últimos defendiam que se devia dar atenção ao uso, pois a língua não era completamente suscetível de descrição sob ponto de vista analógico de formação. Os analogistas, por sua vez, tentariam corrigir qualquer anomalia encontrada. No entanto, essa questão é mais complexa do que aparenta, pois também havia o problema de se pensar o que é regularidade e irregularidade na língua. Dessa forma, mais importante do que chegar a uma conclusão, a discussão entre anomalistas e analogistas contribuiu para a sistematização da gramática.

A partir dos estudos sobre etimologia, os estoicos, geralmente chamados anomalistas, assentaram os fundamentos da gramática tradicional, fundamentos utilizados pelos analogistas alexandrinos. Enquanto os estoicos se preocupavam com o problema da origem da linguagem, pela lógica e pela retórica, os alexandrinos se interessavam pela crítica literária.

O período alexandrino foi de extrema importância para o desenvolvimento da gramática. Alexandria se tornou centro de intensa pesquisa literária e linguística com o estabelecimento da biblioteca de Alexandria em III a. C. Como os manuscritos dos autores antigos estavam muito danificados, os filólogos alexandrinos dos séc. III e II a.C. tentaram restaurar e separar os trabalhos. Por ser a língua falada bem diferente da língua dos textos clássicos, eles então aderiram à prática de publicar comentários de textos e gramáticas para minimizar dificuldades que os leitores poderiam encontrar ao ler tais textos. Ficou então a impressão de que a língua que aparecia nos clássicos era mais correta do que a língua falada em Alexandria e em outros centros helênicos na época. Assim, essas gramáticas tinham duas finalidades: explicar a língua dos autores clássicos e preservar o grego da “corrupção”.

De acordo com Lyons (1979, p.9), essa abordagem alexandrina apresentava dois erros fatais de concepção: “o primeiro dizia respeito à relação entre língua escrita e

falada, e o segundo, à maneira como a língua evolui”, e o autor diz que chamará aos dois erros de “erro clássico” no estudo da língua. Nessa abordagem clássica, havia predileção pela língua escrita, da qual a língua falada era derivada, o que explica o primeiro erro. O segundo consiste na suposição de que a língua do séc. V a. C. era mais correta do que a falada naquele momento, havendo a ideia de que os iletrados a corrompiam.

Neves (2005) faz uma contextualização histórica importantíssima para se entender a gramática nascente: a época helenística era marcada por confronto de culturas e de línguas, situação que explica o zelo visto no desenvolvimento da reflexão linguística, primeiramente de ordem filosófica e posteriormente em uma perspectiva histórica e linguística. A língua grega precisa ser ensinada para ser preservada, e a necessidade de estabelecimento de padrões – a partir de modelos escritos da língua clássica - a serem seguidos leva à construção de quadros gramaticais. Assim, a gramática grega representa um mecanismo de preservação, para transmissão, da cultura helênica. As obras então são escolhidas de modo a representarem os padrões ideais que devem ser preservados e tem-se, ao lado da crítica literária, um trabalho filológico.

Contextualizada a história do nascimento da gramática, é possível percorrer o caminho dos pensamentos gramaticais. No percurso do pensamento linguístico, a filosofia pensava a língua teoricamente; a gramática, além de investigá-la, apresenta-a com finalidade de expor seus fatos e, de acordo com Neves (2005), também de impô- los.

Inicialmente, a gramática se preocupa principalmente com a fonética e morfologia, o que se explica pelo fato de ser condicionada por uma finalidade prática – explicar e proteger a língua –, e tais áreas apresentam manifestação mais depreensível, possibilitando a construção de quadros de modo mais concreto. Nesse momento, portanto, a sintaxe é deixada de lado, pois, por ser um sistema de relações mais abstratas, implicaria um prosseguimento de investigações teóricas e considerações filosóficas, e a gramática surge como disciplina empírica.

Em uma síntese muito bem elaborada, Neves (2005, p.267) resume a conjuntura do nascimento da gramática:

Paralelamente ao exame dos textos literários como tais, faz-se o exame dos fatos linguísticos. Comprometidas com a existência de uma

língua comum (koiné) que se distribui por todas as cidades, as noções gramaticais que se codificam associam-se à noção de norma. Levantam-se os quadros de flexão como paradigmas e, paralelamente, levantam-se os desvios e irregularidades que o uso determinou. A dicotomia analogia/anomalia perde o sentido estritamente teórico com que nascera, e os fatos linguísticos isolados, examinados e codificados, convergem para uma disciplina – está então inaugurada a gramática tradicional. Ela nasce, assim, com uma função bem determinada.

Assim, com uma função muito bem determinada, a gramática investiga a norma linguística e “se institui como a ‘arte de bem escrever’, consumação do registro da separação entre a linguagem e a realidade” (NEVES, 2005, p.269). Nesta definição, portanto, já é possível identificar claramente a diferença entre o que, de fato, utiliza-se linguisticamente e o que é descrito/prescrito nas gramáticas tradicionais desde a Grécia antiga.

Após o surgimento da gramática no Ocidente, outros povos, além dos gregos, também se preocuparam com a reflexão linguística, sempre tendo estes como modelo.

No período romano, continuaram vivas algumas questões gramaticais já discutidas pelos gregos, como a controvérsia entre anomalistas e analogistas. Pela dependência cultural dos romanos em relação aos gregos, é de se esperar que tal dependência também se mostre nos estudos gramaticais. Assim, as gramáticas latinas se organizavam tal como as gregas, tanto que se fez uma gramática latina padrão dividida como a de Dionísio, o Trácio, em três partes: a primeira definia a gramática como a arte de falar corretamente e de compreender os poetas, aborda também as letras e as sílabas; a segunda trata das partes do discurso, com as variações de tempo, número, gênero, caso etc.; e a terceira discute bom e mau estilo, advertências de erros e figuras da linguagem recomendadas. As gramáticas latinas tardias, de Donato (400 a.C.) e de Prisciano (500 a.C.), assim como as gregas, cultuavam a língua clássica, principalmente Cícero e Virgílio, perpetuando o que Lyons (1979) chamou de “erro clássico” na descrição linguística.

Esse padrão de manuais gramaticais permaneceu por muito tempo. No período medieval, o latim ainda ocupava papel importante no sistema educacional, afinal era a língua oficial da diplomacia, da erudição e da cultura, motivo pelo qual se produziu muito material para auxiliar na aprendizagem dos alunos. Tais materiais eram baseados

principalmente em Prisciano e Donato, e o latim era principalmente uma língua escrita, na medida em que a língua falada ia se diferenciando nas regiões em que era utilizada.

Posteriormente, houve um florescimento cultural no séc. XII, período das grandes escolásticas. Nesse momento, os filósofos escolásticos estavam interessados na língua como instrumento para analisarem a estrutura da realidade, por isso priorizavam a significação. Nesse sentido, ao retomarem a obra de Donato e Prisciano, concordavam com a descrição gramatical feita, mas se opunham pelo fato de os autores não terem explicado os fatos cientificamente, deduzindo-os de suas causas.

A gramática científica ou especulativa objetivava descobrir os princípios pelos quais a palavra se relacionava com a inteligência humana e com a coisa que ela representava. Presumia-se que os princípios fossem universais; a gramática era, então, uma teoria filosófica das partes do discurso e de seus modos de significação característicos.

Na Renascença, acreditando-se que a Antiguidade clássica era fonte de valores civilizatórios, houve a reunião e publicação de textos clássicos, principalmente após a invenção da imprensa, no final do séc. XV; assim como na Grécia, novamente a gramática serviu para ajudar na compreensão da literatura e, agora, na escrita do “bom latim”. Posteriormente o grego e o hebraico passaram a ser também objeto de estudos.

De acordo com Peter Burke (2004), a Renascença retomou a discussão sobre a relação entre as palavras e o que elas designam, como nos diálogos de Platão; para o autor, a consciência linguística foi despertada pelo número crescente de pessoas estudando grego e hebraico e também diferentes línguas vernáculas europeias.

A primeira gramática de língua vernácula foi Gramática de la lengua Castellana (1492), do espanhol Elio Antonio de Nebrija (KEMMLER, 2013). Assim, a partir de 1500, paulatinamente as línguas da Europa passaram a atrair a atenção de estudiosos, e muitas gramáticas de línguas vernáculas foram escritas, em um momento de estabelecimento das línguas nacionais.

O interesse pela história das línguas e pela diversidade linguística se torna mais visível e, a exemplo das histórias da língua latina, então, muitas histórias de línguas vernáculas foram surgindo: no século XVI, Joachim Perion, Etienne Pasquier e Claude Fauchet escreveram sobre a história da língua francesa; em 1600, Celso Cittadini publicou o trabalho de Vincenzio de Borghini sobre a história do italiano, ao qual

chamou de A formação da língua toscana; cinco anos depois, foram publicados dois estudos sobre o inglês, um de William Camden e outro de Richard Verstegan; mais ou menos no mesmo período, Bernardo de Aldrete escreveu sobre a história do espanhol, e Duarte Nunes de Leão, sobre o português; a história do alemão foi publicada um pouco mais tarde, em 1716, por Johann Augustin Egenolff, assim como a história das línguas eslavas, que apareceu posteriormente (BURKE, 2004).

Leite (1999) defende que é importante refletir sobre a trajetória do “uso” no Francês – língua mais estudada entre as línguas românicas – porque, durante muito tempo, é esta língua que serve como padrão cultural para a civilização ocidental, de forma que muitos estudiosos portugueses buscam nela exemplo para seus estudos, incluindo a variável noção de norma linguística.

Nesse sentido, a primeira gramática francesa, escrita por Palsgrave, em 1530, seguiu o modelo da gramática grega de Théodore Gaza (1496), posteriormente, Dubois, em 1536, “procurou restituir a latinidade ao francês” (LEITE, 1999, p.20). Contrariando essa abordagem, em 1550, Meigret se esforça para fundar a gramática no uso – uso feito por pessoas que “aprenderam” francês. De acordo com Leite (1999), aos poucos, a gramática latina passa a oferecer apenas o esquema para as gramáticas de outras línguas, pois as categorias gramaticais estabelecidas para a língua clássica não se enquadram na descrição das “línguas vulgares” (LEITE, 1999, p.20). Para a autora, “as línguas românicas firmam-se em redor do próprio uso” (LEITE, 1999, p.20).

Com um distanciamento das gramáticas clássicas, o modelo de “bon usage” da língua passa a ter como referência o uso da corte depois da publicação de “Remarques

sur la Langue Française”, de Vaugelais, em 1647; de acordo com este autor, somente a

corte tinha o poder de legislar sobre a língua. Nessa concepção, o “bom uso da língua” se baseava na fala da corte e nos autores do tempo (LEITE, 1999).

Em 1660, a Gramática de Port-Royal, de Antoine Arnauld e Claude Lancelot, propôs um estudo racional e filosófico da língua. O racionalismo dessa abordagem se opunha ao “bom uso” de Vaugelais, assim, a gramática não deveria ser apenas o registro de normas baseadas no “bom uso” - como defendia Vaugelais (1647) e como predominou até a primeira metade do séc. XVII -, mas sim a procura de um fundamento racional desse uso.

De acordo com Gonçalves (2006), os reflexos do Iluminismo chegaram com atraso a Portugal e assumiram diferentes feições. Em uma recuperação de dados contextualizadores de Portugal em setecentos, a autora cita: a contestação do Barroco, da Ortodoxia e da Contrarreforma; e dois momentos distintos no país, no século XVIII: o período joanino, associado à ostentação, à crise dos meios produtivos e ao absolutismo régio; e o período josefino ou pombalino, do qual, além da expulsão dos Jesuítas, em 1759, é possível destacar o “absolutismo esclarecido”, as reformas legislativas e as medidas para desenvolver as atividades produtivas e econômicas do país.

Em relação à atividade metalinguística e pedagógica, a autora destaca:

Vocabulario Portuguez e Latino (1712-1721), do Pe. Rafael Bluteau, Verdadeiro Método de Estudar (1746), de Luís António Verney, e o Novo Método de Gramática Latina (1752), de António Pereira de Figueiredo. Gonçalves (2006) salienta que, com o

poder nas mãos de Sebastião José - o futuro Marquês de Pombal -, inspirado no paradigma das Luzes, não ficavam imunes nem a língua nem a gramática: esta estaria a serviço do poder, e aquela seria a manifestação desse poder.

Nesse período, conhecido como “Iluminismo linguístico”, observa-se uma intensa atividade metalinguística em torno da “norma” da língua portuguesa. O

Verdadeiro método de estudar (1746), de Verney, obra norteada “pela utilidade, pela

necessidade e pela racionalidade” (GONÇALVES, 2010, p.85), lemas encontrados posteriormente em outros documentos oficiais relativos à reforma pombalina do ensino, inicia uma polêmica: a polêmica verneiana, ocorrida na disputa entre os Congregados de S. Filipe Néri, que criticavam os métodos inacianos, e os Jesuítas, que, até a Reforma Pombalina (1759), praticamente detinham o monopólio do ensino.

Com a reforma educacional de Pombal, em Portugal, assim como em outros países europeus, foi estabelecido que a língua materna substituísse o latim no ensino, destacando, para isso, tanto a facilidade de ensino quanto a facilidade no método. De acordo com Gonçalves (2006, p.4):

O “fascínio do método” (Swiggers 1997: 182), consagrado no

Discours de la Méthode (1637) de Descartes, será porventura o leitmotiv da documentação pombalina, e não apenas no tocante ao

ensino. Presente no Verdadeiro Método de Estudar, o “cortejo semântico das Luzes” (Chaunu I, 1995: 21-29), que incluía palavras

como razão, método, utilidade e brevidade, e bem assim inúmeras referências às Luzes ou às “Nações iluminadas”, denunciava a mudança de paradigma de que a gramática era tão só uma caixa de ressonância. Perante tais desígnios reformistas não será difícil compreender a importância assumida pelos materiais pedagógicos, mormente a gramática, à luz dos objectivos do legislador (...)

A autora ainda ressalta o Alvará Régio de 9 de outubro de 1770:

[...] sendo a correcção das linguas Nacionaes hum dos objectos mais attendiveis para a cultura dos Povos civilizados, por dependerem della a clareza, e energia, e a magestade, com que devem estabelecer as Leis, persuadir a verdade da Religiaõ, e fazer uteis, e agradaveis os Escritos: Sendo pelo contrario a barbaridade das linguas a que manifesta a ignorancia das Naçoens; e não havendo meio, que mais a possa contribuir para polir e perfeiçoar qualquer Idioma, e desterrar delles esta rudez, do que a applicaçaõ da Mocidade ao estudo da Grammatica da sua propria lingua; porque sabendo-a por principios, e naõ por mero instincto, e habito, se costuma a fallar, e escrever com pureza, evitando aquelles erros, que tanto desfiguram a nobreza dos pensamentos, e vem a adquirir-se com maior facilidade, e sem perda de tempo a perfeita intelligencia de outras differentes linguas; pois que tendo todas principios communs, acharaõ nellas os principiantes menos que estudar todos os rudimentos, que levarem sabidos na Materna (Alvará de 9 de Outubro de 1770: 97 apud GONÇALVES, 2006, p.4).

Linguisticamente, o racionalismo do período se fundamenta no pressuposto de que as línguas são regidas por princípios gerais ou universais da razão; assim, com pensamento racionalista, a gramática portuguesa daria mais ênfase à sintaxe ao invés de privilegiar apenas as partes do discurso. Dessa maneira, “com o propósito de esclarecer e civilizar a Nação, regista-se uma frenética actividade regulamentadora, o que, transposto dos domínios comercial e industrial para o domínio metalinguístico, significava reduzir a profusão de regras e excepções dos manuais inacianos a um número consonante com a simplicidade requerida pela razão” (GONÇALVES, 2006, p.6).

Após o período pombalino, encerrado em 1777, com a morte de D. José, inicia- se o período mariano, época da fundação da Academia Real das Ciências (1779) e do início da publicação do Jornal Encyclopédico.

Posteriormente, seriam publicadas as primeiras gramáticas filosóficas, ou seja, gramáticas pautadas pela razão, que tinham três conceitos-chave: linguagem, língua e

gramática. A primeira é Grammatica Philosophica da Lingua Portugueza, de Melo Bacelar, publicada em 1783. Das gramáticas filosóficas, a mais representativa é

Grammatica philosophica da lingua portugueza ou principios da grammatica geral applicados à nossa linguagem, de Jerônimo Soares Barbosa, publicada postumamente,

em 1822. Os gramáticos filosóficos se diferenciam dos não filosóficos porque seriam capazes de “reconectar a gramática com a filosofia” (GONÇALVES, 2006, p.10).

Assim, tardiamente inspiradas pelas “Luzes”, houve muitas gramáticas publicadas no final de 1700 e início de 1800 que refletem a evolução do “Iluminismo Linguístico” português (cf. GONÇALVES, 2006).

No que diz respeito ao Brasil, na época colonial, os jesuítas ensinavam os índios usando línguas indígenas e língua geral; nas escolas de crianças brancas, usavam principalmente o latim. Com a administração de Marquês de Pombal, além da expulsão dos jesuítas e de tornar obrigatório o ensino de língua portuguesa em Portugal, o Marquês também institui que, no Brasil, fossem obrigatórios o ensino e o uso de língua portuguesa com um diretório confirmado por D. José I em 1758. Tal diretório, que durou 40 anos, tem, portanto, objetivo normatizador e unificador da língua (cf. MARIANI, 2001).

Em relação a manuais metalinguísticos, Elia (1963) divide os estudos gramaticais, no Brasil, em dois períodos: vernaculista, de 1820 a 1880; e científico, a partir de 1880.

Até 1880, os manuais eram voltados ao ensino; a gramatização brasileira do português tem, como um dos iniciadores, Júlio Ribeiro, que publica Grammatica

Portugueza, em 1881; e um manual com o mesmo título é publicado por João Ribeiro

em 1887 (cf. ORLANDI; GUIMARÃES, 2001).

Em meados do século XIX, tanto em Portugal quanto no Brasil, tem-se um discurso metalinguístico mais explícito a fim de se consolidar padrões normativos – discutidos a seguir. Nesse contexto, ocorrem várias polêmicas envolvendo práticas linguísticas de autores renomados, e tais polêmicas serão responsáveis, em grande parte, pela norma linguística constituída no período.

Com esse breve histórico, pode-se observar que a gramática tradicional, por seus objetivos práticos, ou seja, por objetivar explicar, proteger ou unificar a língua, nasceu prescritiva e se mantém mais ou menos assim até os dias de hoje. A língua explicada

geralmente é a da literatura, e a literatura estudada continua sendo a de autores consagrados, motivo capaz de explicar o grande distanciamento entre as formas utilizadas efetivamente e as formas presentes nas gramáticas.