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Sobre norma e preposições : um estudo das completivas finitas (des)preposicionadas em português

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Academic year: 2021

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(1)

INSTITUTO DE ESTUDOS DA LINGUAGEM

KELLY CRISTINA TANNIHÃO

Sobre norma e preposições: um estudo das

completivas finitas (des)preposicionadas em português

CAMPINAS,

2016

(2)

KELLY CRISTINA TANNIHÃO

Sobre norma e preposições: um estudo das

completivas finitas (des)preposicionadas em português

Tese

de doutorado apresentada ao

Instituto de Estudos da Linguagem da

Universidade Estadual de Campinas para

obtenção do título de Doutora em

Linguística.

Orientador: Prof. Dr. Emilio Gozze Pagotto

Este exemplar corresponde à versão

final da Tese defendida pela aluna

Kelly Cristina Tannihão e orientada

pelo Prof. Dr. Emilio Gozze Pagotto.

CAMPINAS,

2016

(3)

Ficha catalográfica

Universidade Estadual de Campinas Biblioteca do Instituto de Estudos da Linguagem

Crisllene Queiroz Custódio - CRB 8/8624

Tannihão, Kelly Cristina,

T158s TanSobre norma e preposições : um estudo das completivas finitas

(des)preposicionadas em português / Kelly Cristina Tannihão. – Campinas, SP : [s.n.], 2016.

TanOrientador: Emilio Gozze Pagotto.

TanTese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Instituto de

Estudos da Linguagem.

Tan1. Língua portuguesa Preposições. 2. Gramática comparada e geral

-Preposições. 3. Gramática comparada e geral - Subjuntivo. 4. Gramática comparada e geral - Indicativo. 5. Mudanças lingüísticas. 6. Norma lingüística. I. Pagotto, Emilio Gozze,1961-. II. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Estudos da Linguagem. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: Standardization and prepositions : a study of (un)prepositional

finite completive in Portuguese

Palavras-chave em inglês:

Portuguese language - Prepositions

Grammar, Comparative and general - Prepositions Grammar, Comparative and general - Subjunctive Grammar, Comparative and general - Indicative Linguistic change

Standard language

Área de concentração: Linguística Titulação: Doutora em Linguística Banca examinadora:

Emilio Gozze Pagotto [Orientador] Angel Humberto Corbera Mori Sonia Maria Lazzarini Cyrino

Manoel Mourivaldo Santiago Almeida Hosana dos Santos Silva

Data de defesa: 29-08-2016

Programa de Pós-Graduação: Linguística

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Emilio Gozze Pagotto

Angel Humberto Corbera Mori

Sonia Maria Lazzarini Cyrino

Manoel Mourivaldo Santiago Almeida

Hosana dos Santos Silva

Juanito Ornelas de Avelar

Aquiles Tescari Neto

Maria Aparecida Corrêa Ribeiro Torres Morais

IEL/UNICAMP 2016

Ata da defesa com as respectivas assinaturas dos membros encontra-se no processo de vida acadêmica do aluno.

(5)

A todos aqueles que, direta ou indiretamente,

contribuíram para que este trabalho fosse possível!

(6)

Primeiramente, gostaria de agradecer a meu orientador, professor Emilio Gozze Pagotto, pelas riquíssimas orientações e pela paciência durante todo o período em que trabalhamos juntos!

Aos professores Manoel Mourivaldo Santiago Almeida e Angel Corbera Mori, pelas valiosas contribuições no exame de qualificação e por terem aceitado participar da banca de defesa.

Às professoras que, muito gentilmente, aceitaram participar da banca de defesa: Sonia Cyrino e Hosana dos Santos Silva; assim como aos professores suplentes, Maria Aparecida Torres de Morais, Juanito Avelar e Aquiles Tescari Neto.

Ao colegas do Tycho Brahe, especialmente ao Pablo Faria, que me ajudou na construção das buscas no programa, o que permitiu a constituição do córpus de pesquisa.

À amiga Ivana Ivo, pela amizade, pelas ajudas e pelas revisões! Muito obrigada!

À Tatiane Macedo, pelo carinho e pelas ajudas nesse trajeto!

Ao Magnun Rochel Madruga, pelas dicas e pelas ajudas estatísticas com os dados!

A meu marido André, pelo suporte, pelo amor e pela compreensão durante todos esses anos!

A meus irmãos, Fabiana, Bruna e Felipe, pelas ajudas na caminhada! À minha avó Dalva, pelas preciosas e poderosas preces!

A meus pais, Raquel e Norivaldo, pelo incentivo, pelo amor e pelo apoio incondicionais em todos os momentos! Muito obrigada!

(7)

O presente trabalho analisa a mudança no emprego de preposição em fronteiras sentenciais de completivas finitas na língua portuguesa. O objetivo do estudo é descrever o estatuto de tal construção, correlacionando a ocorrência de completivas preposicionadas às normas linguísticas vigentes em diferentes sincronias da língua. Para isso, parte-se do pressuposto de que as completivas sentenciais finitas surgiram na língua sem preposição e que o uso de tais nexos foi introduzido posteriormente, constituindo, portanto, uma inovação. A hipótese de trabalho é que tal inovação tenha ocorrido artificialmente, isto é, tenha sido introduzida por pressão normativa de textos modelares escritos por pessoas eruditas e/ou de textos metalinguísticos. Na análise, são adotados os postulados do Funcionalismo linguístico, entendendo–se que a língua desempenha funções e que tais funções têm direta relação com fatores sociais, que, por sua vez, desempenham papel central na determinação de estruturas e de sistemas linguísticos. No estudo quantitativo, são avaliados fatores linguísticos e extralinguísticos, e os resultados são cotejados com abonações encontradas em gramáticas de diferentes períodos, assim como comparados à prática de escrita dos gramáticos, ou seja, os dados são avaliados à luz das normas subjetiva e objetiva vigentes em diferentes períodos da língua, a fim de se estabelecer o estatuto das completivas sentenciais finitas (des)preposicionadas em língua portuguesa. O trabalho se encontra dividido em cinco partes: o primeiro capítulo traz o delineamento do fenômeno estudado e apresenta alguns trabalhos importantes sobre o tema. O segundo capítulo é dedicado à fundamentação teórica e à apresentação da metodologia. No terceiro, é percorrido o trajeto de nascimento da gramática, bem como de alguns pontos importantes na constituição da norma linguística. Ainda neste capítulo, são apresentadas definições de complementação sentencial e de preposição. O quarto capítulo traz os resultados da pesquisa e a correlação entre os resultados das práticas linguísticas e a elaboração metalinguística encontrada nos manuais pesquisados, ou seja, são correlacionadas as normas objetiva e subjetiva. Por fim, são apresentadas as conclusões do estudo.

Palavras-chave: mudança linguística; complementação sentencial finita; preposição; norma linguística.

(8)

clauses in Portuguese. The aim of the study is to describe the status of such construction, correlating the occurrence of the prepositional completive clauses to the language standardization in different synchronicities of the language. To do this, we assume that finite completive clauses appeared without preposition, and that the use of such nexus was introduced later, thus constituting an innovation. The hypothesis is that such innovation has taken place artificially, that is, it has been introduced by regulatory pressure from exemplary texts written by erudite people, and/or from metalinguistic texts. In the analysis, we adopted the postulates of the linguistic functionalism, understanding that the language performs functions, and that these functions are directly related to social factors that in turn play a central role in determining structures and linguistic systems. In the quantitative study we evaluate linguistic and extra linguistic factors, and the results are compared with the accreditations found in grammars from different periods, as compared to the practice of writing of the grammarians, that is, the data is evaluated in the light of the subjective and objective standards current in different periods of the language, in order to establish the status of finite sentential completive (un) prepositional in Portuguese. The work is divided into five parts: the first chapter brings the design of the studied phenomenon and presents some important papers on the topic. The second chapter is devoted to theoretical basis and to the presentation of the methodology. In the third chapter, the birth of the grammar path is covered, as well as some important points in the constitution of the linguistic norm. In this chapter we also present definitions for sentence completion and for preposition. The fourth chapter brings the research results and the correlation between the results of linguistic practices and the metalinguistic formulation found in the researched manuals, that is to say, the objective and subjective standards are correlated. Finally, we present the findings of the study.

Keywords: linguistic change; finite completive clauses; preposition; language standardization.

(9)
(10)

Quadro 1 - Continuum de gramaticalização das preposições ... 51 Quadro 2 – Verbos analisados ... 68 Quadro 3 – Nomes analisados ... 73

(11)

Gráfico 1 – Realização preposicional nos períodos estudados ... 120 Gráfico 2 – Realização preposicional de acordo com o período em completivas de nomes e de e de verbos ... 129 Gráfico 3 – Percentual de realização preposicional de acordo com o período em completivas de nomes e de verbos ... 129 Gráfico 4 – Realização de preposição de acordo com a estrutura do verbo e o período de publicação ... 146 Gráfico 5 – Realização preposicional em completivas nominais de acordo com a classe gramatical do regente e o período de publicação ... 163 Gráfico 6 - Realização de preposição de acordo com o meio de comunicação ... 175

(12)

Tabela 1 – Ocorrência de preposição em completivas sentenciais ... 120

Tabela 2 – Percentual de realização da preposição de acordo com o período das obras .... 121

Tabela 3 – Realização preposicional de acordo com o gênero textual ... 122

Tabela 4 – Realização preposicional de acordo com o gênero e o período de publicação . 123 Tabela 5 – Realização preposicional de acordo com o autor ... 125

Tabela 6 – Autores que apresentaram emprego categórico de preposição ... 127

Tabela 7 – Autores que apresentaram ausência categórica de preposição ... 127

Tabela 8 – Porcentagem de realização preposicional em nomes e em verbos ... 128

Tabela 9 – Ocorrência da preposição em completivas verbais de acordo com o gênero textual ... 131

Tabela 10 – Realização preposicional em completivas verbais de acordo com o período de publicação e o gênero textual... 133

Tabela 11 – Presença da preposição de acordo com a nacionalidade do autor ... 134

Tabela 12 – Realização preposicional de acordo com o autor... 135

Tabela 13 – Autores com ausência categórica de preposição... 137

Tabela 14 – Autores com emprego categórico de preposição ... 138

Tabela 15 – Realização de preposição de acordo com a forma verbal do regente ... 140

Tabela 16 – Presença da preposição de acordo com a estrutura argumental do verbo ... 140

Tabela 17 – Presença da preposição de acordo com a natureza do segundo complemento ... 141

Tabela 18 – Verbos com dois complementos que apresentaram variação no emprego de preposição ... 142

Tabela 19 – Adjacência das completivas verbais ... 147

Tabela 20 – Realização da preposição de acordo com o verbo regente ... 148

Tabela 21 – Preposições previstas e preposições realizadas nas completivas verbais ... 150

Tabela 22 – Realização da preposição em completivas nominais de acordo com o gênero textual ... 155

Tabela 23 – Realização preposicional de acordo com o gênero textual e o período de publicação ... 156

Tabela 24 – Realização da preposição em completivas nominais de acordo com a nacionalidade do autor ... 157

(13)

publicação ... 162 Tabela 28 - Realização preposicional em completivas nominais de acordo com a adjacência do termo regente ... 164 Tabela 29 – Realização da preposição de acordo com o nome regente... 165 Tabela 30 – Preposições previstas e preposições realizadas nas completivas nominais .... 168 Tabela 31 – Realização de preposição em completivas verbais e em completivas nominais de acordo com o gênero ... 174

(14)

INTRODUÇÃO ... 16

1 APRESENTAÇÃO E DELINEAMENTO DO FENÔMENO ... 20

1.1 Delineamento do fenômeno ... 20

1.2 Os trabalhos de Mattos e Silva (1989) e de Mollica (1989) ... 21

1.3 Alguns trabalhos sobre a variação no português europeu ... 31

1.4 Questões de pesquisa ... 35

2 ARCABOUÇO TEÓRICO-METODOLÓGICO ... 38

2.1 Embasamento teórico ... 38

2.2 A complementação sentencial em português ... 39

2.3 As preposições ... 48

2.4 A complementação sentencial em latim ... 57

2.5 Metodologia ... 63

2.5.1 Grupos de fatores das completivas verbais ... 65

2.5.1.1 Variáveis extralinguísticas de completivas verbais ... 65

2.5.1.2 Variáveis linguísticas de completivas verbais ... 66

2.5.2 Grupos de fatores das completivas nominais ... 70

2.5.2.1 Variáveis extralinguísticas de completivas nominais ... 70

2.5.2.2 Variáveis linguísticas de completivas nominais ... 71

2.5.3 Metodologia de análise ... 73

3 GRAMÁTICA E NORMA ... 75

3.1 O nascimento da gramática tradicional... 75

3.2 A norma linguística ... 84

3.3 Revisão de conceitos em gramáticas de Língua Portuguesa ... 91

3.3.1 A complementação sentencial ... 92

3.3.2 As preposições ... 108

3.4 A norma linguística e os manuais metalinguísticos ... 114

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ... 118

4.1 Descrição geral dos resultados ... 118

4.2 Convergências e divergências entre os resultados das completivas nominais e das completivas verbais ... 128

4.3 Descrição dos resultados de complementação verbal ... 130

4.3.1 Resultados de grupos de fatores extralinguísticos ... 131

4.3.2 Resultados de grupos de fatores linguísticos ... 139

4.3.2.1 As preposições nas completivas verbais ... 150

4.3.3 Síntese dos resultados das completivas verbais ... 152

4.4 Descrição dos resultados de complementação nominal... 154

4.4.1 Resultados de grupos de fatores extralinguísticos ... 154

(15)

CONCLUSÕES ... 182 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ... 186 APÊNDICE A ... 194

(16)

INTRODUÇÃO

Nos últimos anos, muitos estudos sobre variação no emprego de preposições têm sido feitos, e um dos principais contextos estudados é o de sentenças completivas finitas, tanto nominais quanto verbais. Tais estudos partem da construção preposicionada e analisam a variação no emprego de preposição antes do “que” completivo, conforme ilustram os exemplos a seguir:

1) Tenho esperança (de) que você diga a verdade. 2) Avisei João (de) que chegaríamos atrasados.

Em tais estudos, quase sempre se parte do pressuposto de que a não ocorrência de preposição é inovação1. Sob tal abordagem, tanto em (1) quanto em (2), a construção preposicionada seria a padrão e a não realização da preposição seria tomada como inovação. No entanto, se considerarmos os estudos de Mattos e Silva (1989) sobre o português trecentista, vamos constatar que, na origem da língua portuguesa, as construções completivas finitas não eram precedidas das preposições que nomes e verbos requeriam. Nesse mesmo sentido, Mollica (1989) afirma que a introdução de preposição antes do “que” completivo é inovação na língua, pois as sentenças subordinadas teriam sido iniciadas fundamentalmente pelo completizador “que”.

Se as completivas finitas foram introduzidas na língua pelo completizador “que”, ou seja, sem as preposições requeridas por verbos e nomes da sentença principal, o que teria motivado a entrada de tais preposições nesse contexto? Qual é o estatuto das completivas sentenciais finitas preposicionadas na língua portuguesa?

O presente trabalho parte da hipótese de que a entrada de preposições em fronteiras completivas sentenciais finitas ocorreu por vias eruditas, quer seja por meio de textos modelares, isto é, por práticas linguísticas de pessoas eruditas, quer seja por manuais metalinguísticos, em momentos de maior reflexão linguística. Dessa forma, a construção teria sido delineada em períodos linguísticos decisivos de séculos anteriores e finalmente imposta por vias eruditas, respaldada e propagada por uma norma culta

1

No presente trabalho, o termo “inovação” é utilizado para se referir a novas formas linguísticas que ocorrem na língua.

(17)

estabelecida no século XIX, como também é apontado por estudos de outros fenômenos (cf. PAGOTTO, 2013).

Intentando descrever o estatuto das sentenças completivas finitas (des)preposicionadas2 na história da língua portuguesa, o presente trabalho investiga, diacronicamente, a complementação sentencial finita, o comportamento das preposições passíveis de ocorrer nesse contexto e também as normas objetiva - conjunto de práticas linguísticas dos eruditos - e subjetiva – conjuntos de regras idealizadas - vigentes em diferentes sincronias linguísticas.

Os dados são analisados sob postulados do Funcionalismo, considerando que a língua desempenha funções e que não pode ser desvinculada de suas funções sociais, que desempenham papel central na determinação de suas estruturas e sistemas. Dessa forma, considera-se que a língua é constituída de uma história interna, de fatos puramente linguísticos, mas também de uma história externa, ou seja, de pressões de uso e de reflexos da história social, que precisam ser considerados na análise de um fenômeno linguístico.

Para constituição do córpus de análise, foi utilizada a ferramenta CorpusSearch do Corpus Histórico do Português Tycho Brahe (GALVES; FARIA, 2010) e o AC/DC do Linguateca (SANTOS; BICK, 2000; SANTOS; SARMENTO, 2003); os dados foram analisados quantitativamente e são cotejados com abonações encontradas em gramáticas de diferentes períodos, bem como considerados sob a ótica histórico-cultural da sociedade que os produziu. Assim, será possível fazer uma descrição da complementação (des)preposicionada em português, relacionando seu uso à normatização linguística.

Considerando tais questões, o trabalho analisa, portanto, as sentenças completivas finitas (des)preposicionadas à luz da norma linguística de diferentes épocas, correlacionando os resultados às normas objetiva e subjetiva. O estudo está organizado em 5 capítulos, além da introdução, brevemente descritos a seguir.

2 Adota-se o “des” entre parênteses a fim de contemplar a constante variação preposicional em tais

estruturas, dado que, muitas vezes, a preposição é requerida pelo termo regente da oração matriz, mas não é realizada na fronteira sentencial da oração completiva.

(18)

O primeiro capítulo apresenta e delineia o fenômeno estudado. A partir dos trabalhos resenhados de Mattos e Silva (1989) e de Mollica (1989), é construído o pressuposto do estudo, bem como a hipótese de trabalho. Além dos trabalhos mencionados, também são apresentadas outras pesquisas, tanto sobre o português brasileiro quanto sobre o português europeu, para que se possa ter um referencial do tratamento dado ao fenômeno em análise. Após apresentação dos trabalhos sobre o tema, são expostas as questões de pesquisa.

No segundo capítulo, é apresentado o arcabouço teórico-metodológico utilizado na investigação. A primeira seção é dedicada ao embasamento teórico, ou seja, à abordagem do Funcionalismo linguístico; a segunda apresenta definições funcionalistas da complementação sentencial; na terceira seção, em uma perspectiva diacrônica, são abordadas as preposições; na penúltima seção do capítulo, são recuperadas as completivas sentenciais no latim; e, na última, há a descrição da metodologia da pesquisa, apresentando-se critérios de composição do córpus e os grupos de fatores analisados.

No terceiro capítulo, também é feita uma digressão cronológica e é retomada a origem da gramática. Na segunda seção, são apresentados pontos importantes para se pensar a constituição da norma linguística em Portugal e no Brasil. Para confrontarmos a norma objetiva e subjetiva, nas duas últimas seções do capítulo, há uma revisão dos conceitos de complementação sentencial e de preposições em gramáticas de língua portuguesa, partindo-se das primeiras gramáticas da língua e chegando-se a gramáticas mais atuais.

No quarto capítulo, há a descrição dos resultados da norma objetiva e uma discussão relacionando tais resultados à norma subjetiva. Em um primeiro momento, são apresentados os resultados gerais da pesquisa, considerando completivas nominais e completivas verbais juntas. Posteriormente, as completivas são apresentadas separadamente: resultados de completivas verbais e resultados de completivas nominais. Na seção dedicada à apresentação dos resultados das completivas separadamente, há subseções que contemplam resultados de fatores extralinguísticos, resultados de fatores linguísticos e o comportamento das preposições em cada uma das construções. Na finalização do capítulo, encontram-se as correlações entre os resultados da norma

(19)

objetiva e as elaborações metalinguísticas da norma subjetiva. O quinto e último capítulo traz as conclusões do estudo.

(20)

1 APRESENTAÇÃO E DELINEAMENTO DO FENÔMENO

1.1 DELINEAMENTO DO FENÔMENO

Em português, o emprego de preposições é muito suscetível de variação. Entre os diversos casos, encontramos a variação na realização de preposição em sentenças completivas finitas tanto nominais quanto verbais, como em:

(3) Tenho necessidade (de) que me faça um favor.

(4) Finalmente concordamos (em) que a produção deve ser exportada.

Nos estudos sobre variação no emprego de preposições em completivas finitas, quase sempre, parte-se do pressuposto de que as completivas sempre foram construídas com as referidas preposições e que a não realização das preposições nesse contexto constitui inovação. Por essa visão, em (3) e em (4), a ausência de preposição é considerada a forma inovadora e a realização da preposição é tomada como padrão.

Vários estudos, sob diferentes abordagens, já foram feitos a fim de descrever/explicar o estatuto das completivas preposicionadas em português. Borba (1971), em sua tese de livre docência, faz uma abordagem detalhada do sistema de preposições e afirma que é frequente a omissão de preposição em casos preposicionados como os de completivas. Gomes (1996) analisa a possibilidade de não ocorrência das preposições a, de, em, com e para no português do Rio de Janeiro e no português de contato com o Xingu, desconsiderando as estruturas relativas, e concluiu que a fala da comunidade do Rio de Janeiro revelou variação estável nos fenômenos estudados. Rocha (2009), utilizando como base a Teoria da Variação laboviana, descreveu a variação de preposições diante de “que”, na língua portuguesa falada do Brasil e de Portugal, em amostras da década de 70 e de 90, e constatou que a omissão da preposição é a variante mais usada, espelhando variação estável em orações completivas.

Em uma perspectiva diferente, os trabalhos de Mattos e Silva (1989) e de Mollica (1989) apontam que as completivas sentenciais surgiram na língua portuguesa sem preposição, o que muda o foco de análise e faz com que consideremos a construção

(21)

com ausência de preposição a construção vernácula3 e a construção preposicionada como inovação mais recente na língua.

Nesse sentido, se as completivas surgiram na língua sem preposição, como e em que situação ocorreu tal entrada? Quais são os fatores atuantes nesse processo de mudança linguística? Considerando essas questões, o presente trabalho analisa as circunstâncias da realização de preposição em completivas sentenciais diacronicamente. Para isso, parte-se do pressuposto de que as construções completivas finitas surgiram na língua sem preposição, tal qual apontam Mattos e Silva (1989) e Mollica (1989). A hipótese de trabalho é que a entrada de preposição, nesse contexto, tenha ocorrido por via erudita, quer seja por práticas de escrita eruditas, quer seja por meios normatizadores.

1.2. OS TRABALHOS DE MATTOS E SILVA (1989) E DE MOLLICA (1989)

Mattos e Silva (1989) faz uma minuciosa análise da sintaxe do português arcaico a partir dos Diálogos de São Gregório, texto do século XIV, e afirma que as subordinadas integrantes eram introduzidas principalmente pelos conectivos “ca” e “que”, o que também é afirmado por Hubber (1933) e Epiphanio Dias (1918).

Dentre tais conectivos, Mattos e Silva (1989, p.733) classifica o “que” conjunção integrante como a “subordinante por excelência das completivas”, constatando que ele ocorre 453 vezes nos dois primeiros livros dos Diálogos de São

Gregório. Na totalidade da parte analisada em seu trabalho, que foi de 20% do córpus,

ocorrem 697 enunciados completivos, dos quais 266 são iniciados por conectivos subordinantes e 431 apresentam a forma reduzida, com verbo no infinitivo. Das completivas iniciadas por conectivos subordinantes, 234 são introduzidos por “que”, enquanto os outros subordinantes ocorrem muito menos: “ca” aparece 6 vezes; “se”, 7; “como”, 12; “porque”, 1; “quanto”, 2; “hu”, 1; “quen”, 3. A autora chama a atenção para o fato de esses últimos subordinantes, exceto o “ca”, manterem traços semânticos

3

Utiliza-se o termo “vernáculo” no sentido laboviano, ou seja, “estilo em que se presta o mínimo de atenção ao monitoramento da fala” (LABOV, 2008 [1972] p. 244). Dessa forma, construção vernácula é a menos monitorada.

(22)

específicos, respectivamente: dúvida, modo, causa, quantidade, lugar, pessoa; ao passo em que “ca” e “que” “tem um valor apenas decorrente do seu papel na sintaxe” (MATTOS E SILVA, 1989, p.734), além de o “que” introduzir completivas com diferentes funções sintáticas.

A autora frisa que alguns verbos aparecem com preposição quando seguidos de infinitivo, mas, quando aparecem com completivas iniciadas pelo “que”, a preposição não é realizada, como nos exemplos que seguem:

(5) “E portanto conven [...] que se muden aqueles moesteiros” (6) “Non ti conven de jejunhar”

(7) “Non conven a fazer” (MATTOS E SILVA, 1989, p.743)

Como é possível observar, o verbo “convir” aparece sem preposição em (5), mas aparece preposicionado em (6) e (7). Após citar esses exemplos, a autora ressalta que:

Vale destacar que no corpus as completivas iniciadas por ‘que’, contrariamente ao que preconiza a norma culta actual, nunca estão precedidas das preposições próprias aos verbos que as requerem, ao contrário do que ocorre com as completivas de infinitivo e as introduzidas por como (...) (MATTOS ESILVA, 1989, p.744).

Em relação às completivas nominais, houve poucas ocorrências no córpus da autora, apenas 23, diante de 370 objetivas. Das 23 ocorrências, apenas 6 são introduzidas por partículas subordinantes, enquanto as outras 17 são infinitivas. A autora novamente ressalta que as completivas nominais introduzidas por “que” não vêm precedidas de preposição, como em: “(8) Non ouveron esperança que nunca o ferro podesse aver” (MATTOS E SILVA, 1989, p.745). No entanto, assim como nas completivas verbais, quando o complemento é uma oração infinitiva, a preposição é realizada: “(9) E Paulino ouve cuidado de lavrar o horto” (MATTOS E SILVA, 1989, p.745).

Após tais exemplos, a autora sintetiza o emprego de preposições em completivas dizendo que “nunca ocorre a preposição antes da completiva introduzida por que (...); e diante de completiva infinitiva, sempre ocorre a preposição quando ela é requerida pelo

(23)

elemento do enunciado subordinante que é complementado pelo completivo” (MATTOS E SILVA, 1989, p.747).

Assim, a partir desse estudo, podemos afirmar que as completivas verbais e nominais, no português arcaico, quando introduzidas pelo “que” completivo, eram construídas sem a preposição requerida pelo termo regente.

Outro estudo que chega à mesma conclusão é o de Mollica (1989). A autora adota a Teoria da Variação Laboviana, o Funcionalismo Givoniano e o Modelo da Difusão Lexical para analisar, nas variedades escrita e falada do português atual, a variação no emprego preposicional nas relações de complementação nominal e verbal, em outras palavras, a presença da preposição “de” antes de sentença subordinada introduzida pelo complementizador “que”. Tal processo de variação recebe o nome de queísmo – quando a norma prevê a preposição e ela não é realizada – e dequeísmo – quando a norma não prevê, e a preposição é realizada4. De acordo com Bentivoglio (apud MOLLICA, 1989, p.16):

(...) El reemplazo de que por de que, la sustitución de otra preposición por de y la inserción de de que delante de si constituyen el fenómeno que há sido llamado “dequeísmo”. Por otra parte la supresión de la preposición, em los casos de las subordinadas introducidas por preposición + que, ha sido llamado “queísmo”.

Na sequência são apresentados exemplos:

(10) “Tenho a certeza 0 que entre mim e o povo há muita coisa em comum e 0 que nós nos daremos muito bem.” (Deputado Federal, pronunciamento do partido X, em rede nacional de tv, em 20/04/1988) (MOLLICA, 1989, p.17)

Nos exemplos dados, a norma recomenda o uso de preposição e sua não ocorrência, como em (10), é chamada, portanto, de queísmo. No exemplo a seguir, encontra-se o processo contrário, ou seja, a introdução de uma preposição não prevista.

4 No presente trabalho, optamos por não utilizar os termos “queísmo” e “dequeísmo” para nos referirmos

à variação no emprego de preposição por considerarmos que tais rótulos carregam julgamento normativo. Tais termos só serão mantidos quando forem utilizados por outros autores.

(24)

(11) “eu poderia provar para o povo de que houve fraude nas eleições passadas” (Deputado federal, programa Sem Censura, TVE, em 18/05/1988)

No exemplo (11), observa-se a realização de uma preposição em um contexto que não a exige, constituindo, portanto, um caso de dequeísmo. Segundo a autora, com base em um pressuposto normativista, há perda de preposição em (10) e inserção de preposição em (11). No estudo, os fenômenos são tratados primeiro separadamente e, depois, são analisados como um único processo variável. Como parte de tal análise, a autora faz uma digressão cronológica intentando precisar a época em que o queísmo se instalou no português.

A partir dessa digressão, a autora afirma que o queísmo, ou seja, a não realização da preposição é mais antiga; já em relação ao dequeísmo, ressalta não haver registros em compêndios gramaticais portugueses, diferente do espanhol, que registra dados em estágios mais antigos da língua. Diante desses fatos, Mollica (1989) afirma que o dequeísmo é uma inovação.

Como os dados para o espanhol aparecem mais cedo, alguns trabalhos são retomados. A autora os organiza de acordo com a avaliação de natureza normativa de suas análises, começando pelos trabalhos com caráter normativo mais extremado, que tratam a variação como “usos indevidos”. Dentre esses, há um texto da Real Academia Espanhola (1973) e de Alonso (1972), por exemplo.

Os trabalhos do segundo grupo também apresentam caráter normativo, mas apresentam hipóteses explicativas para o fenômeno. Nesse grupo, encontram-se Rabanales (1974), Arjona (1978; 1979) e Paz Urdaneta (1984).

Rabanales (1974) foi quem definiu os nomes “queísmo” e “dequeísmo” para a variação “0 que” e “de que” e, sobre os fenômenos, afirma:

(...) Ambas as tendencias revelan, pues, uma inestablidad normativa dentro de uma misma comunidad linguistica, y, com frequencia, dentro de um mismo hablante, por el cruce de dos estructuras parecidas: cp. “espero que venga manana” / “tengo la esperanza de que venga manana”, ejemplos que, por obra de dicho cruce, pueden transformarse fácilmente em “espero de que venga manana” (dequeísmo); “tengo la esperanza 0 que venga manana” (queísmo). (apud MOLLICA, 1989, p. 36)

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Como é possível observar, Rabanales (1974) explica a variação por cruzamento sintático, análise que aparece em vários trabalhos realizados posteriormente. Além da variação da preposição “de”, o autor também constatou omissão de “em”, “para”, “por”, “a”, “com” e “contra” em vários contextos. Em Arjona (1979), além do cruzamento sintático, aparecem como explicação para o fenômeno a instabilidade da norma e a ultracorreção. Em relação à instabilidade, Arjona (1979 apud MOLLICA, 1989, p.38) afirma:

(...) se puede pensar, sin embargo, en una debilitación de la norma provocada por factores extralinguísticos. Esta inestabilidad se ve reforzada por una variación en el uso de la preposición de, en particular, y en todas las preposiciones, en general (...).

Para Páez Urdaneta (1984), o queísmo é uma economia da língua, enquanto o dequeísmo é “um processo antieconômico e confuso do sistema, uma forma de obscurecer o significado, dificultar o sentido” (apud MOLLICA, 1989, p.40).

Há ainda o trabalho de Cano Aguilar (1985), que aponta a regência de alguns verbos no espanhol. O autor, em relação à variação preposicional, alega estágios anteriores do espanhol, referindo-se à tendência do espanhol clássico de introduzir as completivas por meio do “que”. Ainda para o espanhol clássico, o autor estabelece três princípios:

(1) alternância de construções direta e preposicional (com de) em orações completivas em função de sujeito; (2) preferência pela introdução direta nas orações regidas por substantivos, adjetivos ou advérbios; (3) frequente omissão da preposição (não de todas) ante “que” relativo (apud MOLLICA, 1989, p.42).

Do terceiro e último grupo fazem parte os trabalhos mais descritivos, dos quais se destaca Bentivoglio (1976). Nesse trabalho, a autora detecta a omissão das preposições “de” e “em” nos dados do espanhol de Caracas. Ao comparar seus dados com os de Rabanales (1974) para o espanhol de Santiago, a autora encontra resultados muito parecidos para o dequeísmo, para os quais utiliza a hipótese de ultracorreção como explicação.

Garcia (1986) estuda a variação sob ótica funcionalista, destacando a função comunicativa de “de” antes do “que”. Para a autora, há diferença entre 0 e “que”:

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(...) Si no hay nada, los términos irán juntos, y estarán directamente ligados. Si está de, em cambio, hay un conector explícito y la presencia de este conector hace que los elementos estén, de facto, menos unidos entre si que cuando van directamente yuntapuestos. (apud MOLLICA, 1989, p.48)

A hipótese da autora é de que o “de” é um “conector à distância”, e formula então o princípio da “distância relativa”, “segundo o qual a variante ‘de’ é um atenuador de sentido versus a variante ‘0’, de justaposição” (MOLLICA, 1898, p.49). Assim, para Garcia (1986), a realização do “de” antes do “que” da oração subordinada expressa o distanciamento do falante em relação ao conteúdo de sua fala, o que explicaria a grande incidência da estrutura “de que” em discursos políticos, defendendo sua explicação de valor icônico simbólico para a variação estudada. Para subsidiar sua explicação, a autora refere um uso parecido no holandês, em que “van” (“de” em português) introduz uma ideia de incerteza e modéstia (HORST, 1982); no entanto, ressalta que são apenas indicadores do dequeísmo no holandês, não podendo ser tomados como fato comprovado.

Bogard e Company (1986a; 1986b; 1989) analisam o comportamento das completivas nominais sem preposição e estudam a entrada de preposição nesse contexto no espanhol. Na análise de textos datados entre os séculos XI e XX, os autores afirmam que a introdução de preposição entre um substantivo e sua oração subordinada é inovação na língua, explicada pela analogia com a estrutura NOME + DE + INFINITIVO, amplamente documentada no espanhol de todas as épocas. Os autores ainda afirmam que “todas as línguas têm em comum o feito de conectar a oração substantiva com seu completivo exclusivamente por meio de uma conjunção” (BOGARD; COMPANY, 1989, p.261); mas algumas línguas, como o espanhol e o português, não se enquadram nessa configuração, permitindo uma preposição anteposta à conjunção, “esquema tipologicamente menos comum no panorama global das línguas indoeuropeias” (BOGARD; COMPANY, 1989, p.261). Os autores defendem que é possível identificar dois cortes cronológicos que permitem reconhecer três estágios de língua no que diz respeito à realização da preposição em completivas nominais finitas: o primeiro corte, que corresponde à segunda metade do século XVII, corresponde à generalização do emprego de preposição nesse contexto; o segundo corresponde a meados do século XX, em que se observa uma perda de preposição nessas orações. No

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primeiro estágio da língua, que vai até meados do século XVII, o “normal” é a estrutura originária, sem preposição; no segundo estágio, que corresponde ao final do século XVII, século XVIII, XIX e início do XX, generaliza-se a estrutura com preposição, de forma que não foram encontrados casos de completivas nominais sem preposição no material analisado pelos autores; e, no último estágio da língua, correspondente a meados do século XX, observa-se uma expansão da estrutura sem preposição, segundo os autores, cada vez mais frequente na fala e na escrita (BOGAND; COMPANY, 1989).

Segundo Sanz (1986), que, de acordo com Mollica (1989), ainda integra o grupo de trabalhos mais descritivos, a omissão de preposições não ocorre somente com o “de”, mas atinge outras preposições em outras estruturas que não somente as queístas. Para a autora, a variação se deve a neutralizações no sistema preposicional, decorrentes da instabilidade no uso de preposições.

A partir da revisão de trabalhos, Mollica (1989, p.77-78) lista os contextos queístas encontrados em seus dados:

1. Verbo não pronominal + (de) que (“Ele não gosta 0 que interrompam a aula para pedir explicação”)

2. Verbo pronominal + (de) que (“Vocês se lembram 0 que naquele primeiro texto que nós vimos aqui a respeito de estilo...”)

3. Verbo + nome + (de) que (“Eu tenho a impressão 0 que deve andar até cobra naqueles jardins ali no fundão”)

4. Verbo + adjetivo + (de) que (“... estou convencido em suma ... 0 que ver hoje Alvorada da Glória...”)

5. Substantivo + (de) que (“Eu acho maravilhoso o fato 0 que lugares que fazem música brasileira tenha essa quantidade de gente”)

6. SN + (de) que + oração relativa (“... Todas as manifestações 0 que nós precisamos das autoridades superiores”)

7. Locuções prepositivas ou conjuntivas (“Eu já tive a audácia de dizer que não importa o problema político nacional no sentido 0 que certas liberdades não existem, isso é claro” / “... hoje, apesar 0 que muita gente não percebeu: os policiais disseram para gente que a gente tinha mais é que fazer greve”).

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Após discutir queísmo e dequeísmo separadamente, a autora propõe que ambos os fenômenos sejam analisados sob a mesma perspectiva, entendendo “0 que” e “de que” como variantes disponíveis para a introdução de sentenças subordinadas em geral; nessa perspectiva, rotula a variação como (de)queísmo. De acordo com a autora, essa variação é condicionada por fatores estruturais, psicolinguísticos e psicopragmáticos; e, para aprofundar algumas questões, recorre à diacronia do português.

Ao discutir a formação das relações de complementação, cita o trabalho de Bourciez (1930 apud MOLLICA, 1989), segundo o qual a oração completiva surge no latim vulgar, a partir de um emprego particular do relativo neutro, e são três tipos de verbos que dão origem a tal formação: intelectivos, afetivos e volitivos. Ainda segundo o autor, no latim clássico, esses verbos podiam ser acompanhados de um infinitivo,

tendo como sujeito um acusativo, que, na origem, dependia do verbo da principal na qualidade de complemento: ‘credo terram esse rotundam’. Mas os verbos afetivos já se construíam com ‘quod’, indicando a causa (‘gaudeo quod vales’); os volitivos com ‘ut’, ou equivalentes ‘ne’, ‘quonimus’ (‘volo ut mihi respondas’), ou sem partícula expressa (‘volo mihi respondas’) (apud MOLLICA, 1989, p.229)

Ainda nesse processo de mudança, Mollica (1989) afirma que a inovação consistiu na substituição de uma sentença infinitiva por uma introduzida por partícula relativa na complementação de verbos intelectivos. Bourciez (1930) afirma que, já na fase romana primitiva, estruturas com o relativo “quod” (“credo quod terra est rotunda”) tinham substituído completamente as sentenças infinitivas (“credo rotunda terra essere”) (apud MOLLICA, 1989, p.229). A partícula relativa posteriormente passou a ser o “quid”, que originou o “que” português e francês e o “che” italiano e espanhol.

Assim, no período romano, as completivas eram construídas de 2 maneiras: introduzidas por “que” e introduzidas por infinitivo preposicionado; para Bourciez (1930 apud MOLLICA, 1989), a substituição do infinitivo preposicionado pela integrante com “que” em sentenças se propagou mais nas línguas de Península Ibérica – espanhol e português – línguas nas quais é possível verificar a variação estudada.

No estudo da origem das subordinadas completivas em português, a autora cita o trabalho de Mattos e Silva (1989), anteriormente referido, cujos resultados são

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convergentes com os de Bourciez e atestam o emprego comum de estruturas sentenciais de infinitivo preposicionado no português arcaico. A partir da revisão de trabalhos sobre o assunto, Mollica afirma (1989) que:

Podemos concluir, então, com base na leitura de Bourciez, na pesquisa cuidadosa de Mattos e Silva, nos registros de Huber e na leitura dos textos reunidos por Vasconcelos, que a configuração das sentenças subordinadas na origem do português iniciou-se fundamentalmente através do complementizador “que”. Havia também originariamente outras estruturas, tais como a sentença infinitiva preposicionada. Mas comparando “que” com “de que”, não resta mais dúvida de que a construção “de que” constitui inovação posterior ao estágio mais primário da língua. Também para o espanhol, pode-se afirmar que o introdutor subordinante inicial é “que” e que a construção “de que” é posterior (MOLLICA, 1989, p.233-234).

A autora ressalta que, das línguas românicas, só se encontra a variação estudada no português e no espanhol, e cita exemplos de Bogard e Company (apud MOLLICA, 1989, p.234) das línguas românicas:

Catalão: tots sentien el desig que tu triomfessis Espanhol: tengo la necessidad (de) que me escuches Francês: cette déclaration est un signe qu’il se port bien Italiano: ho l’impressione che tu sei sbagliato

Romeno: credinta ca va veni ma face as ramin

Português: deixei-me estar em casa, na esperança (de) que me chamasse.

A partir da pesquisa e dos exemplos citados, Mollica (1989) afirma que o uso da preposição “de” antes do subordinante “que” é inovação, ou seja, uma construção mais recente na língua, e que apenas o português e o espanhol, das línguas românicas, admitem tal estrutura. Em suas palavras:

o mecanismo subordinador ‘de que’ se introduziu como uma inovação em certo estágio, diferentemente das demais línguas românicas, alternando com ‘que’. Mais adiante ainda, na história das duas línguas, a variante ‘de que’ torna-se a variante de prestígio, e a variante ‘0 que’ passa a ser estigmatizada (...) (MOLLICA, 1989, p.235).

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Em relação ao período de ocorrência da estrutura no português, Mollica (1989) fez um estudo a partir de Vasconcelos (1922) e de outros textos em prosa, intentando datar seu uso, mas afirma que “uma investigação criteriosa do ponto de vista diacrônico está por ser realizada” (MOLLICA, 1989, p.236).

No material reunido por Vasconcelos (1922), ainda segundo a autora, não houve ocorrência de “de que”, mas foi encontrada alternância entre “0 que” e “de que” na

Demanda do Santo Graal, um texto do final do séc. XII início do séc. XIII, o que

indicaria que há variação entre as duas construções já no final do séc XII. Apesar desse indício, segundo a própria autora, não se pode afirmar essa data com certeza, pois o material analisado era uma edição com base em uma versão posterior da obra, já que não se tem acesso ao texto original.

Barreto (1980) afirma que o amplo uso de infinitivo preposicionado no século XVI e XVII origina as completivas nominais preposicionadas, por um processo analógico em que “jurou de cumprir” e “fez juramento de” dão origem a “fez juramento de que” (apud MOLLICA, 1989, p.239); tal explicação é a mesma usada por Bogard e Company (1986ab, 1989) para o espanhol.

Diante desses dados, Mollica (1989, p. 240) conclui que:

tudo leva a crer que a inovação consiste num processo de ‘inserção’ e não de ‘omissão’, uma vez que originariamente a variante ‘0 que’ foi a base da relação de complementação sentencial em quaisquer dos contextos de subordinação entre orações, na história das línguas românicas.

A autora, então, defende que a variação teve início em fronteiras queístas e que se reintroduziu no português moderno em fronteiras dequeístas, marcando um ciclo de perda/recuperação de preposição.

Diante de tais resultados e conclusões, tal como afirmações de Bourciez (apud MOLLICA, 1989), o presente trabalho parte do pressuposto de que a complementação inicialmente era feita por construções com infinitivo e apenas posteriormente foram utilizadas partículas relativas como conectivos. Ainda nessa linha de raciocínio, adota-se que a inovação é realmente a inadota-serção da preposição diante dos conectivos e não sua omissão, como apontado por vários trabalhos.

(31)

Após a resenha dos trabalhos de Mattos e Silva (1989) e de Mollica (1989), a seguir, apresentam-se alguns trabalhos sobre a variação de preposições nas completivas sentenciais em português europeu.

1.3. ALGUNS TRABALHOS SOBRE A VARIAÇÃO NO PORTUGUÊS EUROPEU

Para o português europeu, também são encontrados diversos estudos sobre a variação no emprego da preposição em fronteiras sentenciais completivas. Arim (2008) estuda a não realização preposicional em completivas verbais com estrutura verbo+preposição+conjunção “que”, fenômeno denominado queísmo. A autora aponta que estudos trazem como principal argumento para a variação a analogia com estruturas como:

(12) “a. Gosto disso. b. *Gosto isso.” (13) “a. Gosto de ir à praia.

b. *Gosto ir à praia.” (ARIM, 2008, p.47)

Tal argumento foi defendido por Rabanales (1974) para o espanhol do Chile e depois por outros autores, no entanto, é contestado pela autora. Para o estudo, são analisados três dicionários de português europeu e um córpus de linguagem dos meios de comunicação social portugueses – córpus REDIP (variedade oral e escrita da língua, com dados da imprensa de 1998).

Na análise dos dicionários, a autora afirma que a preposição “a” é sempre realizada; em relação à preposição “com”, nota que, exceto o verbo “fazer”, não existem verbos que rejam a preposição com antes de oração finita. O que se verifica é que a preposição com selecionada pelos verbos antes de complementos nominais é substituída pela preposição em ou não é realizada antes de complementos oracionais. Como exemplo, cita:

“a. O aluno concordou com [a professora] Sintagma Nominal

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Salienta ainda que as construções com o verbo “fazer” têm comportamento diferente dos outros verbos, pois a preposição só aparece como possibilidade com orações finitas:

“a. O chefe fez isso.

b.??O chefe fez que ele fosse demitido.

c. O chefe fez com que ele fosse demitido.” (ARIM, 2008, p.51)

Com a preposição “em”, em geral, as ocorrências levantadas apareceram sem a preposição, como com o verbo “acreditar”; já as preposições “para” e “por” tendem a ser realizadas; a preposição “de”, por sua vez, é registrada de forma muito irregular.

Em relação à estrutura em que aparecem as preposições, com os verbos pronominais, o nexo prepositivo foi preferencialmente realizado; com os verbos ditransitivos, há uma tendência à realização da preposição, mas a variação foi mais equilibrada; e com os verbos transitivos indiretos não pronominais, a preposição tende a não ser realizada. A autora nota que as gramáticas e prontuários prescrevem o uso da preposição com verbos pronominais e ditransitivos, mas não há referência explícita com verbos como “duvidar” e “gostar”.

Na análise do córpus REDIP, as preposições “a”, “com” e “para” foram quase sempre realizadas; já “em” e “de” foram quase sempre suprimidas, revelando uma forte tendência à não realização. Na análise das construções, com verbos pronominais, houve forte tendência queísta (88%), com verbos transitivos indiretos não-pronominais houve queísmo categórico e com verbos ditransitivos a variação não foi significativa. Em relação ao meio de comunicação, apesar de discreto, houve maior índice de queísmo na rádio e na televisão do que na imprensa. A partir dos resultados, a autora conclui:

Parece assim que o argumento segundo o qual a regência de um verbo deve ser generalizável a todas as estruturas em que ocorre é falível (se se diz «acredito nele», mas é agramatical dizer «acredito em que ele é inocente», porque deverá a preposição estar presente numa construção como «duvido que ele seja inocente»?)

Este argumento, aliado a outros como o facto de nenhuma construção preposicionada ter ocorrido no corpus REDIP com verbos transitivos indirectos não-pronominais, o carácter marcado destas construções, a falta de um esclarecimento inequívoco por parte dos instrumentos de normalização linguística relativamente ao uso da preposição nestas

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estruturas ou, ainda, o facto de serem as variantes não-preposicionadas as canónicas em outras línguas românicas – catalão, francês, italiano-, leva-me a colocar a hipótese de que construções como «gosto de que me elogiem» possam constituir preciosismos, devido a uma generalização abusiva, sendo nestes casos as variantes não-preposicionadas as canónicas. (ARIM, 2008, p.59)

Ainda sobre o português europeu, Barbosa (2013, p.1888) afirma que “o emprego da preposição de antes de completivas finitas constitui uma das áreas mais instáveis da língua, estando sujeito a grandes oscilações no uso e nos juízos dos falantes”. A autora ainda afirma que, contrariando a norma gramatical, ora a preposição é inserida em contextos não previstos, ora é omitida em contextos previstos. Tal variação ocorre no mesmo falante, dependendo do registro mais ou menos formal, ou também idiossincraticamente. A autora ressalta que o fenômeno da supressão antes de “que” completivo atinge principalmente a preposição de, mas que também pode ocorrer, menos frequentemente, com as preposições em e com. Assinala ainda que a preposição é opcional em “todos os casos em que o complemento é uma oração finita, com alguma variabilidade nos juízos dos falantes, em função do registro, do seu grau de escolarização ou da sua faixa etária” (BARBOSA, 2013, p.1891).

Souza (2014), com base na Gramática discursivo-funcional, analisa as orações subordinadas que completam o nome, considerando as propriedades pragmáticas, semânticas e morfossintáticas dos predicados nominais e de seus complementos oracionais em variedades lusófonas da língua portuguesa. Nos inquéritos analisados, quanto aos aspectos morfossintáticos, há emprego mais frequente da preposição “de”; em oração não-finita, na complementação nominal, a preposição é sempre realizada, como em:

“há alturas em que é preciso esperar, esperar, esperar. mas, eh, é uma questão de

gostar. (PT97: BP)” (SOUZA, 2014, p.13).

No caso de orações finitas, há possibilidade de não realização da preposição, recaindo a relação de dependência sobre a conjunção “que”, como no seguinte exemplo:

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“mas eu estou convencido Ø que... nem sequer no Brasil a vida é como as

telenovelas mostram. (PT95: JH)” (SOUZA, 2014, p.14).

Na análise desse aspecto, o autor conclui que, em completiva nominal na forma finita, a expressão da preposição é facultativa, já que o complementizador “que” marca a função semântica de referência. Já em completiva nominal na forma não-finita, o emprego da preposição é obrigatório, considerando que ela marca a relação de subordinação entre o predicado nominal e a oração completiva.

Herdeiro e Barbosa (2015) investigaram, sob perspectiva da sociolinguística variacionista, o queísmo na variedade falada do norte de Portugal, intentando determinar quais os principais fatores que condicionam a presença/ausência da preposição em complementos oracionais oblíquos finitos, selecionados por verbos, nomes e adjetivos. Para isso, foram controladas três variáveis linguísticas (categoria gramatical do predicador, preposição e subtipo de verbo) e duas extralinguísticas (idade e escolaridade). Para a construção da hipótese, as autoras usam a Teoria dos Princípios e Parâmetros. A hipótese testada é a de que nomes e adjetivos não atribuem caso, assim, é necessário inserir uma preposição para que ela atribua caso oblíquo ao complemento, como nos seguintes exemplos, em que a preposição “de” atribui caso e é vazia de sentido:

a.Eu tenho a certeza disso.

b. Eu estou certa disso.(HERDEIRO; BARBOSA, 2015)

As autoras entendem que as orações finitas não necessitam de caso, ao contrário das expressões nominais, e aproximam as orações infinitivas das expressões nominais, que exigem a preposição. Assim, as orações infinitivas precisam de caso, no que se aproximam das expressões nominais e se distanciam das orações finitas.

Na análise dos dados, as autoras contabilizaram 162 ocorrências de completivas oblíquas finitas, das quais 136 (84%) não apresentaram preposição. As preposições menos realizadas foram o “de” e o “em”; e o queísmo foi verificado principalmente quando a preposição não apresenta uma contribuição semântica significativa. No controle das variáveis extralinguísticas, os informantes com mais escolaridade

(35)

(licenciatura) e os falantes com mais de 75 anos apresentaram menos construções queístas.

As autoras chegam à conclusão de que a regência de um verbo/nome/adjetivo não deve ser generalizável a todas as estruturas em que ocorre, recorrendo à hipótese de Arim (2008, p.59) de que “construções como ‘gosto de que me elogiem' possam constituir preciosismos, devido a uma generalização abusiva, sendo nestes casos as variantes não-preposicionadas as canónicas”, e concluem:

A generalização e naturalidade do queísmo, bem como o facto de as preposições que mais se destacam serem as puramente gramaticais, tradicionalmente consideradas marcadoras de Caso gramatical, são fatores indicativos de que o processo subjacente ao fenómeno em apreço é estrutural e decorre de restrições impostas pela gramática interiorizada dos falantes. Por hipótese, os complementos oracionais de tempo finito, contrariamente às expressões nominais e às orações infinitivas, não necessitam de Caso, razão pela qual dispensam a inserção da preposição. (HERDEIRO; BARBOSA, 2015)

Após apresentar alguns trabalhos, de diferentes abordagens, sobre o assunto, a seguir são apresentadas as questões da presente pesquisa.

1.4 QUESTÕES DE PESQUISA

Considerando-se a variabilidade no emprego de preposições, o presente trabalho analisa a constituição de completivas sentenciais (des)preposicionadas na história da língua portuguesa.

Para tal estudo, parte-se dos trabalhos de Mattos e Silva (1989) e principalmente de Mollica (1989), cujos dados indicam que as sentenças completivas “nasceram” na língua sem o nexo prepositivo suscetível de variação. Partindo desse pressuposto, o foco não é o estudo dos fatores que interferem na não realização da preposição e sim quais são os fatores que determinam a entrada da preposição em fronteiras sentenciais completivas, dado que as construções completivas canonicamente eram feitas sem preposição.

Nessa perspectiva, a hipótese de estudo é que a inovadora construção preposicionada constitui a forma prestigiada e que sua entrada foi feita através de textos modelares e/ou normatizadores, como textos escritos por pessoas eruditas e manuais

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metalinguísticos; portanto, a entrada foi por vias eruditas, sendo referendada pela elaboração metalinguística, e é a construção preconizada pela gramática normativa até os dias de hoje.

Pensando na questão da normatização, há outros pontos gramaticais em que a normatização teve papel fundamental, o que justificaria também olhar para a complementação preposicionada por essa perspectiva.

Pagotto (2013) afirma que, no Brasil, no séc. XIX, é fixada a moderna norma padrão. Em um trabalho que compara os dois textos constitucionais do século XIX – a Constituição do Império, de 1824, e a primeira Constituição Republicana, de 1891 - o autor analisa alguns processos de mudança. De acordo com ele, nesse período,

irradiado especialmente a partir do Rio de Janeiro, um trabalho de normatização procurou fixar uma nova norma culta, que chega aos começos do século XX devidamente descrita e codificada pelos gramáticos e vem, até os dias de hoje, como padrão idealizado de linguagem (PAGOTTO, 2013, p.32).

O estudo apresenta dados de colocação pronominal nos dois textos estudados e revela que há uma considerável inversão na posição dos pronomes, concluindo o autor que a Constituição do Império segue a norma do português clássico e que a primeira Constituição Republicana segue a norma do português moderno. Além dos clíticos, o autor também cita diferenças entre os dois textos no uso das preposições. Na Constituição do Império, há passagens em que as preposições não são realizadas em relativas:

Art. 65 – Esta denegação tem effeito suspensivo sòmente: pelo que todas as vezes, que as duas Legislaturas que seguirem áquella, que tiver approvado o Projeto, tornem successivamente a apresentalo nos mesmos termos, entender-se-há, que o Imperador tem dado a Sancção. Art. 179 – I – Ainda com culpa formada, ninguem será conduzido á prisão, ou nella conservado estando já preso, se prestar fiança idonea, nos casos, que a lei a admite; e em geral nos crimes, que não tiverem maior pena, do que a de seis mezes de prisão, ou desterro para fóra da Comarca, poderá o Réo livrar-se solto (PAGOTTO, 2013, p.42).

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Art. 29 – Os Senadores, e Deputados poderão ser nomeados para o Cargo de Ministro de Estado, ou Conselheiro de Estado, com a differença de que os Senadores continuam à ter assento no Senado, e o Deputado deixa vago o seu logar na Camara, e se procede a nova eleição, na qual póde ser reeleito e acumular as duas funções.

Art. 41 – Cada Provincia dará tantos Senadores, quantos forem metade de seus respectivos Deputados, com a differença que, quando o numero de Deputados da Provincia fôr impar, o numero dos seus Senadores será metade do numero immediatamente menor, de maneira que a Provincia que houver de dar onze Deputados, dará cinco Senadores (PAGOTTO, 2013, p.43).

Mas não foram registrados casos parecidos na Constituição da República. Há ainda outros pontos que indicam a mudança de norma nos dois textos, como o uso de

aonde e onde e o uso da preposição a variando com em e por, além de algumas outras

questões mais pontuais. Diante dos dados, o autor conclui que há uma mudança na norma culta entre o começo e o final do séc. XIX, mudança esta que “permitiu construir a unidade da língua escrita entre Brasil e Portugal” (PAGOTTO, 2013, p.48).

A partir das propostas apresentadas, adota-se que a complementação sentencial preposicionada é inovação na língua portuguesa e seu estudo, correlacionado às questões normativas, constitui uma investigação criteriosa do ponto de vista diacrônico, cuja necessidade foi apontada por Mollica (1989).

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2 ARCABOUÇO TEÓRICO-METODOLÓGICO

2.1 EMBASAMENTO TEÓRICO

O presente trabalho considera a língua como um instrumento de interação e entende que seu uso é determinado por um propósito, contextualizado em uma situação social. Por essa perspectiva, é língua é analisada sob os postulados do Funcionalismo linguístico.

Ao lado do formalismo, o funcionalismo integra as duas grandes abordagens de estudo e reflexão da linguagem desde o século XX. As duas correntes se distinguem na estratégia de abordagem do fenômeno linguístico e no papel conferido às partes do texto, ou seja, à gramática, à semântica e ao discurso.

Para Castilho (2012), as várias abordagens funcionalistas coincidem em alguns pontos: “(i) a língua é uma competência comunicativa; (ii) as estruturas linguísticas não são objetos autônomos; (iii) a explicação linguística deve ser procurada nos usos linguísticos e numa percepção pancrônica da língua” (CASTILHO, 2012, p.22).

Ainda para o autor, o conjunto de subteorias reunidas pelo Funcionalismo concorda no fato de que a língua tem funções cognitivas e sociais, que desempenham papel central na determinação das estruturas e sistemas de uma língua. Assim, as análises funcionalistas se dedicam ao esclarecimento das relações entre forma e função da estrutura gramatical.

Neves (2010) aponta lições básicas de uma gramática de direção funcional:

 A língua não é um fenômeno isolado, mas, pelo contrário, serve a uma variedade de propósitos (Prideaux, 1987).

 A língua (e a gramática) não pode ser descrita nem explicada como um sistema autônomo (Givón, 1995).

 As formas da língua são meios para um fim, não um fim sem si mesmas (Halliday, 1985).

 Na gramática estão integrados os componentes sintático, semântico e pragmático (Dik, 1978, 1980, 1989a, 1997; Givón, 1984; Hengeveld, 1997).

 A gramática inclui o embasamento cognitivo das unidades linguísticas no conhecimento que a comunidade tem a respeito da organização dos eventos e de seus participantes (Beaugrande, 1993).

 Existe uma relação não-arbitrária entre a instrumentalidade do uso da língua (o funcional) e a sistematicidade da estrutura da língua (o gramatical) (Mackenzie, 1992).

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 O falante procede a escolhas, e a gramática organiza as opções em alguns conjuntos dentro dos quais o falante faz seleções simultâneas (Halliday, 1973, 1985).

 A gramática é suscetível às pressões de uso (Du Bois, 1993), ou seja, às determinações do discurso (Givón, 1979b), visto o discurso como a rede total de eventos comunicativos relevantes (Beaugrande, 1993).

 A gramática resolve-se no equilíbrio entre forças internas e forças externas ao sistema (Du Bois, 1985).

 O objeto da gramática funcional é a competência comunicativa (Martinet, 1994) (NEVES, 2010, p.16).

Assim, em uma gramática funcionalista são pontos centrais: o uso, o significado e o social, que se sobrepõem respectivamente ao sistema, à forma e ao individual.

No presente trabalho, não se adota o funcionalismo como rótulo para diferentes abordagens teóricas, como o funcionalismo holandês, inglês, norte-americano etc., mas sim como uma expressão mais ampla, desvinculada de escolas particulares, oposta ao formalismo.

Nesta concepção, o fio condutor da investigação linguística é a função desempenhada pela língua, que é primordialmente a comunicação em diferentes contextos sociais de interação. Assim, assumem-se as lições básicas elencadas por Neves (2010) e concebe-se que função social da língua desempenha papel central na determinação de suas estruturas e sistemas.

2.2 A COMPLEMENTAÇÃO SENTENCIAL EM PORTUGUÊS

Na abordagem funcionalista, subordinação é, em geral, definida como um processo sintático em que uma oração é tomada como argumento de outra oração (GIVÓN, 1980; NOONAN, 1985; DIK, 1997; HENGEVELD; MACKENZIE, 2008).

Hopper e Traugott (1993) definem sintaticamente uma sentença complexa como uma unidade que consiste em mais de uma cláusula, isto é, um núcleo e um ou mais núcleos adicionais. Dentre os núcleos adicionais, também chamados pelos autores de “margens”, há três tipos semanticamente distintos: os complementos, que funcionam como uma frase nominal; as cláusulas relativas, que funcionam como modificadores do nome; e as cláusulas adverbiais, que modificam a frase verbal ou toda a proposição. (THOMPSON; LONGACRE, 1985 apud HOPPER; TRAUGOTT, 1993, p.169).

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Sob perspectiva da mudança linguística, Hopper e Traugott (1993) afirmam que as cláusulas complexas se iniciaram a partir da combinação entre dois núcleos separados e autônomos que eram mutuamente relevantes (HOPPER; TRAUGOTT, 1993). Seguem afirmando que unir linguisticamente essas cláusulas é uma estratégia retórica. Nessa perspectiva, as estruturas independentes e autônomas são, então, combinadas. Os autores propõem um cline com três pontos de fragmentação:

A)“Parataxis,” or relative Independence, except as constrained by the pragmatics of “making sense” and relevance.

B) “Hypotaxis” or interdependency, in which there is a nucleus, and more clauses which cannot stand by themselves, and are therefore relatively dependent. However, they are typically not wholly included within any constituent of the nucleus.

C) “Subordination,” or, in its extreme form, “embedding,” in other words, complete dependency, in which a margin is wholly included within a constituent of the nucleus (HOPPER; TRAUGOTT, 1993, p.170).

A partir dessa definição, estabelecem um cline de combinação de sentenças: parataxe > hipotaxe > subordinação. Considerando-se os critérios de dependência e de encaixamento das sentenças, tem-se:

Parataxe > hipotaxe > subordinação

- dependente + dependente + dependente - encaixado - encaixado + encaixado

(HOPPER; TRAUGOTT, 1993, p.170).

Os autores defendem que, estabelecendo essa classificação, a terminologia de duas tradições é definida: parataxe e hipotaxe - parataxe inclui todos os tipos de justaposição, e hipotaxe inclui todos os tipos de dependência; e coordenação e subordinação – encaixamento -, definidos em termos de estrutura constituinte. Ainda na explicação de tais conceitos, apresentam a seguinte figura:

Referências

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