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CAPÍTULO IV: APRESENTAÇÃO DOS DADOS E ANÁLISE DOS RESULTADOS

4.5. Necessidades de aprendizagem dos educandos

Ainda no âmbito da análise da oferta educativa da educação de adultos, fizemos o levantamento das matérias/disciplinas lecionadas e das atividades de natureza didática desenvolvidas na sala de aulas no decurso do processo de ensino-aprendizagem. Assim, nesta abordagem procurámos saber se os educandos tinham, para além do que estavam a aprender, interesse de integrar outros conteúdos de aprendizagem no conjunto das disciplinas curriculares da alfabetização. Assim, colocámos-lhes a seguinte questão:

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Há outras coisas que gostaria de aprender aqui na alfabetização, para além do que está a aprender?

Com as respostas que apurámos desta questão, formámos quatro grupos, apresentados no quadro abaixo, nomeadamente, o primeiro grupo que considera que a oferta educativa corresponde às suas necessidades de aprendizagem, o segundo grupo que tem a necessidade de aprendizagem de línguas estrangeiras, o terceiro grupo com necessidades de conciliar os conteúdos da alfabetização com ofícios e o quarto grupo que apresenta outras necessidades de aprendizagem.

Gráfico 5: outras necessidades da aprendizagem dos educandos para além da alfabetização

Grupo 1: Não tem outras necessidades de aprendizagem – os educandos cujas respostas fazem parte deste grupo referiram que as suas necessidades de aprendizagem são efetivamente satisfeitas com os programas da alfabetização, razão pela qual não necessitam de aprender outras coisas para além dos conteúdos providenciados pelo processo da alfabetização.

Nessa perspetiva, admitindo que a leitura e a escrita constituem as habilidades fundamentais do processo da alfabetização, podemos afirmar que esses educandos correspondem àqueles que, outrora, não tiveram oportunidades de ter uma instrução escolar básica, por isso, a sua necessidade premente circunscreve-se à preocupação com a aquisição e aprimoramento dessas habilidades para fazer face à interação com outros nos diferentes contextos do quotidiano. Para exemplificação, apresentamos o caso de dois educandos que encontram satisfação total em termos de aprendizagem nos programas de alfabetização:

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“Gostaria de aperfeiçoar a leitura e a escrita” S22

Grupo 2: Necessidade da aprendizagem de línguas estrangeiras - as respostas dos educandos que fazem parte deste grupo apontam as línguas estrangeiras como sendo a sua principal necessidade de aprendizagem, para além dos conteúdos da alfabetização. Eles precisam de aprender, além da leitura e da escrita da língua oficial portuguesa, o inglês.

Fazendo uma análise, podemos afirmar que as preocupações dos educandos estão relacionadas com a localização geográfica. Moçambique, sendo um país cujos vizinhos têm como língua oficial o inglês, tem havido necessidade de aprendizagem dessa língua para facilitar a comunicação com os imigrantes que entram no território movidos pelo turismo e pelos negócios.

Também aponta-se como justificativa da aprendizagem do inglês o facto de o país ser membro integrante da Comunidade de Desenvolvimento dos Países da África Austral (do inglês SADC), onde todos os países membros, com exceção de Angola, têm como língua oficial o inglês. Associada a isso está o facto de o país ser um dos membros da Commonwealth27 e a tendência da língua inglesa manter

uma relativa hegemonia entre as maiores línguas de trabalho no continente africano e no mundo em geral.

Grupo 3: Necessidade de conciliar a alfabetização com ofícios - este grupo de respostas dos entrevistados pertence aos educandos que acreditam que a alfabetização seria um maior sucesso se conciliasse o ensino da leitura e da escrita com atividades relacionadas com ofícios como forma de assegurar aos participantes a aquisição de conhecimentos manuais que possam ajudá-los no seu quotidiano. A seguir, estão dois exemplos de educandos que se referiram a este facto:

“Podiam ensinar-nos a costurar à máquina, fazer bordados, cozinha, fazer bolos, há mães que até agora não sabem fazer bolos…” S5

“Se houvesse um curso, a estudar e a fazer um curso podia empenhar- me mais nisso…”S35 A tendência da incorporação, no campo de práticas da educação de adultos, de atividades de caráter diferenciado não é uma questão recente, é um assunto que carateriza tanto a multiplicidade de necessidades de conhecimentos do público-alvo destas práticas educativas - o adulto - como o caráter difuso do objeto da educação de adultos.

Desde a sua institucionalização no século XX, é possível distinguir vários modelos de educação de adultos, na Europa por exemplo, realça-se a opinião de que a educação de adultos, desenvolvida

27A Commonwealth of Nations (em português: Comunidade das Nações), normalmente referida como Commonwealth e anteriormente

conhecida como a Commonwealth britânica, é uma organização intergovernamental composta por 54 países membros independentes. Todas as nações membros da organização, com exceção de Moçambique (antiga colónia do Império Português) e Ruanda, faziam parte do Império Britânico, do qual se desenvolveram. (http://pt.wikipedia.org/wiki/Commonwealth, consultado em 27 de fevereiro de 2012)

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nos moldes da educação popular, através do associativismo ou de campanhas de alfabetização é um assunto que atualmente se encontra à margem da agenda das políticas nacionais e, em sua substituição, ganhou centralidade a aprendizagem ao longo da vida caraterizada por uma multiplicidade de práticas educacionais que assentam na empregabilidade, na competitividade, na adaptação e no espírito empresarial.

Grupo 4: outras necessidades da aprendizagem - diferentemente das respostas enquadradas nos grupos anteriores, houve um outro grupo de respostas que citam necessidades de aprendizagens diversas como mostram os exemplos abaixo:

“Gostaria de aprender aquilo que é necessário, por exemplo eletricidade auto (…)” S3 “Gostaria de aprender a mecânica e carpintaria” S36

Analisando estas situações, podemos verificar que as necessidades de aprendizagem invocadas pelos educandos estão relacionadas com diversos fatores inerentes à realidade ou ao contexto em que vivem e à sua própria história de vida. O quadro abaixo procura dar evidência a esse facto:

Quadro 9: Outras necessidades de aprendizagem dos educandos em função de fatores socioeducativos Necessidades

da

aprendizagem

Zona da

entrevista Ocupação dos entrevistados Razões do reingresso escolar

Urb. Suburb. Dom. Pequenos

negócios atividades Outras Vontade de aprender Evitar o ócio Progressão académica Outras razões

Não tem 8 5 11 2 0 2 1 9 0 Línguas intern. 3 3 5 1 0 1 0 5 1 Ofícios 2 5 4 3 0 3 0 3 0 Outras neces. 5 5 5 2 3 1 2 4 3 Total 18 18 25 8 3 7 3 21 5

O quadro 9 permite-nos constatar que, quando analisámos as necessidades da aprendizagem tendo em vista a zona da entrevista, observámos que há grandes variações; na zona urbana a maior parte dos entrevistados contenta-se com a oferta educativa da alfabetização em relação à zona suburbana. Esta situação pode estar relacionada com o facto de os educandos da zona urbana serem basicamente senhoras já com relativa posse, mas que apresentam algum défice em relação às noções básicas de leitura e escrita, habilidades que constituem a sua grande preocupação e motivo de procura dos programas de alfabetização.

Porém, se tomarmos em consideração a necessidade de conciliar a alfabetização com ofícios, verificamos que os educandos do centro da alfabetização da zona suburbana estão mais preocupados em aprender trabalhos manuais feitos em contextos domésticos incluindo a culinária, pois é nas zonas

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suburbanas ou rurais onde, muitas vezes, observamos dificuldades de vária ordem, onde as populações produzem, por exemplo, muita comida, mas estão desprovidas de conhecimentos básicos de preparação e transformação dos alimentos para o melhor consumo quer através da culinária ou por meio de outros processos que possam ajudar na alimentação equilibrada e na saúde das comunidades.

Ainda observando o quadro acima, verificámos que, se estabelecermos uma relação entre necessidades da aprendizagem e ocupação dos entrevistados, os que se dedicam a atividades domésticas e a pequenos negócios, apesar da necessidade da aprendizagem da leitura e da escrita, eles procuram também aprender línguas estrangeiras e dominar determinadas atividades relacionas com ofícios, isto porque sentem a pressão ou necessidades de comunicação e as habilidades de leitura, de escrita e de cálculo constituem as ferramentas que necessitam para a sua atividade e para as suas relações quotidianas.

Por último, ainda o quadro 9 mostra também que, se conjugarmos as necessidades da aprendizagem com as razões do reingresso escolar dos entrevistados os educandos que voltaram aos bancos da escola com o objetivo de obter uma progressão académica constituem a maioria dos que estão interessados em todo o tipo de aprendizagem, isto é, a leitura e a escrita (providenciadas pelos programas da alfabetização), línguas estrangeiras, ofícios e outras necessidades da aprendizagem que não fazem parte dos conteúdos programáticos das disciplinas lecionadas nos centros de alfabetização. Podemos inferir que estes educandos sentem um relativo atraso académico, por isso têm o horizonte projetado para a certificação e não efetivamente para a aquisição e o domínio das habilidades que constituem a oferta educativa da alfabetização.