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Norman Davies, 1996:

NOVA TENTATIVA – O SEGUNDO PEDIDO DE ADESÃO

A vida da CEE não se desenrolava exclusivamente em redor da questão de um hipotético alargamento. Entre 1963 e 1967-69, são assinados o Acordo de Associação entre a CEE e 18 países africanos em Iaundé; e o Tratado de Fusão, através do qual passa a existir apenas uma Comissão e um Conselho comum às três comunidades europeias; e, por fim, são suprimidos os direitos aduaneiros entre os Estados-membros da CEE6, com a conclusão da união aduaneira, o que cria condições para o comércio livre.

54 AHD/EOI M. 210

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Fundo “Gabinete do Ministro das Finanças”, Maço 1, Ofício n.º 206/66, Proc. 4,6.1.4

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BRITO, José Maria Brandão de, AMARAL, João Ferreira do e ROLLO, Maria Fernanda (2011), Portugal

e a Europa – Testemunhos dos Protagonistas, Lisboa, Tinta da China, testemunho de José da Silva Lopes, p.

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Resolvida a “crise da cadeira vazia”57

, que pôs em confronto duas visões distintas de orientação da CEE (a supra-estadual e a intergovernamental) e vencidos dois anos (1963-65) de crise na CEE, o Reino Unido, através do governo trabalhista de Harold Wilson, submete um novo pedido de adesão, a 11 de Maio de 1967. Mais uma vez este

pedido é acompanhado pelos da Dinamarca, Irlanda, Noruega e também da Suécia58. Mais

uma vez, o pedido britânico é vetado pela França59.

De novo, e embora políticos e intelectuais portugueses nunca tenham “mostrado grande interesse em relação ao movimento europeu” nem participado nos “diversos encontros a favor da união europeia realizados no pós-guerra” (MAGALHÃES, 1987/88: 33-34), Portugal vai no encalço do Reino Unido. Nas palavras de José Medeiros Ferreira “o Estado português seguirá o tropismo do comportamento do Reino Unido nos assuntos europeus até ao Acordo com a CEE em 1972, inclusive” (FERREIRA, 1999: 31), do mesmo modo que “europeísmo e antieuropeísmo se foram intercambiando no ideal e na prática de Salazar e na política do Estado Novo” (RIBEIRO, 2000: 369). À parte o entendimento próprio de Salazar acerca das questões europeias, alguns manifestam a impressão, como é o caso de Raquel de Bethencourt Ferreira, que “Salazar achava que a Europa era um brinquedo do Correia de Oliveira”, acrescentando ainda que “a Europa era uma coutada do embaixador Teixeira Guerra e dum grupo”60 restrito.

Entretanto, com a demissão do presidente francês, a França passa a estar liderada por Georges Pompidou, que convoca uma conferência dos chefes de Estado e de Governo a realizar-se entre 1 e 2 de Dezembro de 1969, em Haia, cujo objectivo principal era o de

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A França, ao longo de sete meses, praticou a política da “cadeira vaziaˮ no Conselho, retomando, em Janeiro de 1966, o seu lugar, em troca da manutenção da votação por unanimidade sempre que estejam em causa interesses vitais, através do Compromisso do Luxemburgo.

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A Irlanda e Reino Unido a 11 de Maio de 1967; Dinamarca no dia seguinte; Noruega a 21 de Julho de 1967. Um novo Estado surge nesta segunda ronda de pedidos, a Suécia, que entrega o seu pedido a 28 de Julho de 1967.

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Conférence de presse du général de Gaulle - Paris: Pathé Journal [Prod.], 27.11.1967. Pathé Archives, Saint-Ouen. - FILM (00:03:08, Black and White, Original Sound Track), disponível em http://www.ena.lu/ De Gaulle rejeitou a segunda candidatura britânica essencialmente pelas mesmas razões da primeira vez: relacionamento anterior do Reino Unido com a CEE; tentativa de submergir a CEE numa área aduaneira livre alargada; a relação privilegiada do Reino Unido com os EUA.

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BRITO, José Maria Brandão de, AMARAL, João Ferreira do e ROLLO, Maria Fernanda (2011), Portugal

e a Europa – Testemunhos dos Protagonistas, Lisboa, Tinta da China, testemunho de Raquel de Bethencourt

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relançar o processo de integração europeu. A Cimeira de Haia marca a história da CEE, com a adopção do tríptico acabamento, alargamento, aprofundamento, “três objectivos que nessa reunião se pensou definirem o caminho da Europa. Três objectivos que a Europa seguiria” (DAHRENDORF, 1978: 18).

Para o nosso trabalho interessa-nos sobretudo o segundo desses objectivos, o do alargamento. Nesse âmbito, houve acordo quanto ao ingresso de novos membros, tendo sido retirado, pelo Presidente Georges Pompidou, o veto francês à candidatura britânica61, o que permitiu retomar as negociações, entretanto interrompidas. São, assim, oficialmente quatro os candidatos ao primeiro alargamento da CEE: a Dinamarca, a Irlanda, a Noruega e o Reino Unido.

No ponto 14. do comunicado final, a Comunidade afirmava estar disposta a encetar negociações com os países da EFTA que não eram candidatos à adesão à CEE, o que era o caso de Portugal.

A história deste segundo “pedido de adesão” português começa a 4 de Fevereiro de 1969, com a entrega, pelo embaixador Albano Nogueira, do pedido português – “aide-

mémoire”62

– para participar desde o início nas negociações, tendo esta diligência sido reproduzida, no dia seguinte, a nível diplomático nas capitais dos Estados-membros63. À semelhança do pedido anterior, não é expresso o regime pretendido, sendo a fórmula utilizada “suficientemente ampla para comportar qualquer dos regimes convencionais abrangidos no «treaty making power» da Comunidade e para abranger situações simplesmente provisórias de colaboração – acordos comerciais (Tratado de Roma, art. 114º), acordos tarifários (art. III 2º) e acordos de associação (art. 238º)” (XAVIER, 1970: 109).

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A este respeito, Desmond Dinan assegura que “independentemente das suas preferências pessoais, havia mudanças objectivas das circunstâncias francesas nos finais dos anos 60 que compeliram Pompidou a aceitar o alargamento”, como eram a inflação alta e a deterioração da balança comercial, salientando que “Pompidou estava numa posição mais fraca do que De Gaulle para vetar a adesão britânica” (DINAN, 2005: 57).

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AHD/EOI, M. 682, Pasta 1 a). Neste “aide memoire” entregue à Comissão, ao Conselho, e às representações diplomáticas, o Governo português exprime o desejo de participar, desde o início, em qualquer negociação com vista a um arranjo no domínio comercial e no da cooperação tecnológica e científica.

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Fundo “Gabinete do Ministro das Finanças”, Série_78_Comunidade Económica Europeia, Maço 2, Boletim

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A entrega deste pedido, na linha da frieza sentida aquando do primeiro pedido, “não provocou nenhum comentário ostensivo ou implícito”64

, tendo sido também manifestado que não se previam então nem “o início das conversas e muito menos a abertura de negociações”65

.

As negociações de adesão tendentes ao primeiro alargamento começam a meio do ano seguinte e são igualmente encetadas negociações, a partir de 10 de Novembro de 1970, com os restantes países da EFTA, estes não-candidatos à adesão, nos quais se inclui Portugal. Anteriormente, já o Estado português tinha entregue um memorando, a 28 de Maio de 1970, no qual se manifestava a vontade de encetar negociações “com o objectivo de estabelecer os laços considerados mais adequados aos interesses de ambas as partes” (CASTILHO: 2000: 107). Deste pedido não resultará a adesão, opção desde logo excluída devido ao carácter não-democrático do regime político vigente em Portugal. A este respeito, desde cedo que foi assente que a democracia é um requisito essencial para um aprofundamento dos laços políticos com a CEE.

O Relatório Birkelbach66, de 1961, estabelece como condições prévias da adesão factores: (1) geográficos – só Estados europeus podem aspirar a ser membros; (2) económicos – capacidade para prosseguir os objectivos económicos da CEE; e (3) políticos – existência de uma forma de Estado democrático. Além do factor geográfico, Portugal não preenchia os restantes. Já o Relatório Davignon67, de 1970, no seu ponto 5., preconiza uma Europa baseada no respeito pela liberdade e pelos direitos humanos, que una Estados democráticos com parlamentos eleitos.

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Fundo “Gabinete do Ministro das Finanças”, Série_78_Comunidade Económica Europeia, Maço 2, Ofício n.º 1073 da CTCEE, datado de 20/02/1969

65

Fundo “Gabinete do Ministro das Finanças”, Série_78_Comunidade Económica Europeia, Maço 2, Ofício n.º 936 da CTCEE, datado de 14/02/1969

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Rapport fait au nom de la commission politique sur les aspects politiques et institutionnels de l'adhésion ou

de l'association à la Communauté par M. Willi Birkelbach Rapporteur, Services des publications des

Communautés européennes, s. l., 1962, disponível em http://www.ena.lu/

67

“Davignon Report”, in Bulletin of the European Communities, 1970, No 11, pp. 9-14, disponível em http://www.ena.lu/

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Tabela II: primeiros pedidos de adesão

Estado- candidato Data do pedido de adesão Data de início das negociações Data da adesão Dinamarca 10/08/1961 12/05/1967 30/06/1970 01/01/1973 Irlanda 31/07/1961 11/05/1967 30/06/1970 01/01/1973 Noruega 30/04/1962 21/07/1967 30/06/1970 68 Reino Unido 09/08/1961 11/05/1967 30/06/1970 01/01/1973

Fonte: elaboração própria.

Condicionado assim na natureza de um desenvolvimento do relacionamento com a CEE, Portugal concentra os seus esforços, políticos e diplomáticos, em negociar o melhor acordo comercial possível. Como refere José Tavares Castilho, “em menos de seis meses [de Janeiro a Maio de 1970], o movimento de aproximação da economia portuguesa à

Europa do Mercado Comum, deu passos significativos69 e definiu um rumo que terá o seu

epílogo com a assinatura do Acordo entre Portugal e a CEE, em 22 de Julho de 1972” (CASTILHO: 2000: 107).