• Nenhum resultado encontrado

Frank Schimmelfennig & Ulrich Sedelmeier, 2009:

O “CONSTAT D'ACCORD”

Garret Fitzgerald, então presidente do Conselho, esteve em Lisboa (24-25 Setembro 1984), para conversações com Mário Soares e equipas de trabalho, durante as quais se manifestou confiante em relação às negociações portuguesas403, numa altura em que o PSD havia defendido que as negociações deviam ser suspensas temporariamente, para se avaliar o estado das mesmas.

Na reunião dos ministros dos Negócios Estrangeiros (3 de Outubro), de novo os ministros não se entenderam quanto a uma posição comum404: as questões orçamentais continuavam a dominar o debate interno; de alargamento pouco se ouvia falar, o que levará o ministro Ernâni Lopes a referir que “as reuniões ministeriais de negociações eram concebidas para decidir, e não para trocar somente documentos”405.

Depois de três reuniões mal sucedidas, no Conselho de Ministros no Luxemburgo (12-13 Outubro) foram, finalmente, aprovadas posições comuns (azeite, disposições sociais, e direitos aduaneiros industriais de Espanha), o que constitui, para Ernâni Lopes “elementos formais de progresso”406

das negociações. Deste encontro saiu uma declaração, na qual se reafirma a irreversibilidade da adesão portuguesa, sem referência a Espanha407. Não se chegou a entendimento quanto ao vinho, cujas negociações estavam completamente bloqueadas, e às pescas, o que arrefeceu, logo, os ânimos.

402

ANAPCE, CONF-P/61/84, “21st meeting of the conference at ministerial level, Statement made by Mr. E. Rodrigues Lopes, Minister for Finance and the Plan of Portugal, on the progress of the conference”

403

HAEU, CPPE-001656, “Fitzgerald Optimistic on Portugal”, The Irish Times, 26 de Setembro de 1984

404

HAEU, CPPE-001656, “Failure of EEC to Agree Stalls Enlargement Talks”, Financial Times, 4 de Outubro de 1984

405

HAEU, CPPE-001656, “Pseudo-Réunion sur l'Élargissement: Le Désinvolture des Dix à l'Égard de l'Espagne et du Portugal”, Le Monde, 5 de Outubro de 1984

406

HAEU, CPPE-001656, “L'Élargissement de la CEE: Des «Progrès”, Der Nouv. D'Alsace, 24 de Outubro de 1984

407

HAEU, CPPE-001656, “EC Backs Portugal, Ignores Spain”, International Herald Tribune, 23 de Outubro de 1984

163

Perante mais este bloqueio, mas também perante a perspectiva de impulsionar a sua própria candidatura às eleições presidenciais408 do ano seguinte, o Primeiro-ministro português convocou os embaixadores da CEE10 em Lisboa, para lhes entregar uma carta dirigida aos seus respectivos governos e para lhes manifestar o seu descontentamento em relação ao calendário das negociações409.

No seguimento dessa carta, bastante ambiciosa no conteúdo, compreendendo termos de adesão muito bem definidos, iria surgir, do lado comunitário, um outro documento, o “Constat d'Accord”, mais genérico e menos ambicioso, no qual se imprime, todavia, o “carácter irreversível do processo de integração de Portugal nas Comunidades Europeias”410

.

Oportunismos políticos à parte, esta iniciativa teve também o mérito de estabelecer uma data de adesão concreta, 1 de Janeiro de 1986, oficialmente subscrita pelo Conselho e pela Comissão. A partir de então, “Portugal está mais confiante quanto ao seu destino

europeu e a Comunidade mais segura quanto à importância do seu alargamento”411

, refere Mário Soares aquando da assinatura (Dublin, 24 de Outubro) deste documento claramente de índole política.

Aquando da assinatura do “Constat d'Accord”, existia em Lisboa um sentimento de que “os Dez estavam tão empenhados a protegerem-se a si próprios das possíveis consequências da concorrência da agricultura espanhola que Portugal não iria ter a atenção necessária”412, de modo que esta iniciativa foi considerada como sendo uma resposta da CEE à iniciativa do Primeiro-ministro português.

Assinado o documento, não havia sequer um acordo entre os Estados-membros quanto à abordagem a ter nalguns assuntos importantes413, continuava-se a protelar as

408

HAEU, CPPE-001656, “O'Keeffe says Progress near on Entry Talks”, The Irish Times, 20 de Outubro de 1984; HAEU, CPPE-001656, “Élargissement de la C.E.E.: Vers un Accord des Dix”, Le Figaro, 23 de Outubro de 1984

409

HAEU, CPPE-001656, “Une Déclaration Commune avec le Portugal”, The Republicain Lorrain, 23 de Outubro de 1984

410

AAVV (2001), Adesão de Portugal às Comunidades Europeias – História e Documentos, Lisboa, Parlamento Europeu/Assembleia da República/Comissão Europeia, documento 76, p. 290

411

AMS, Pasta 00880.007, imagem 4

412

HAEU, CPPE-001655, “Unease in Portugal”, The Times, 26 de Outubro de 1984

413

HAEU, CPPE-001655, “Spain, Portugal Expected to Entre EC by '86 Target but some Sticky Problems still won't Be Resolved”, Wall Street Journal, 26 de Outubro de 1984

164

decisões, mas agora conscientes de que até Fevereiro do ano seguinte as negociações deviam encerrar sob o risco de não se manter a data estipulada.

As negociações voltavam a avançar, embora mantendo-se o mesmo ritmo lento. Na agenda do CE Dublin (3-4 Dezembro) figuravam dois dossiers difíceis de negociar: alargamento, sobretudo a questão do vinho, e a disciplina orçamental. Em relação ao primeiro, foi conseguido acordo sobre a reforma do mercado vitivinícola, o que permitia desbloquear outros dossiers e prosseguir as negociações. Neste CE destaca-se um Estado- membro recente, a Grécia, que manteve uma reserva geral sobre o alargamento, enquanto não obtivesse um acordo satisfatório em relação aos Programas Mediterrânicos Integrados (PIM), que ainda não haviam sido adoptados pelo Conselho e que eram essenciais para a Grécia, dadas as consequências para a sua economia resultantes do alargamento414.

Gaston Thorn despediu-se, no decorrer desta cimeira conturbada, das negociações, tendo sido nomeada uma nova Comissão e respectivo presidente, Jacques Delors, para os anos seguintes. Para Jacques Delors, a iniciar funções como presidente da Comissão, o alargamento era uma ilustração dos problemas da CEE: “as reservas dos 10 Estados- membros sobre a próxima fase das negociações são não mais do que um reflexo das dificuldades que estavam a ser experienciadas por eles próprios”, e continua referindo que o alargamento “tem revelado uma tensão na Europa que é uma tensão entre o Norte e o Sul”, que “advém não somente de problemas financeiros, mas de uma falta de compreensão, de um conflito de culturas”415

e, no essencial, de falta de solidariedade.

414

COMISSÃO (1984), Boletim das Comunidades Europeias, n.º 12, Bruxelas, Comissão das Comunidades Europeias, p. 17

415

COMMISSION (1985), “Programme of the Commission for 1985”, in Bulletin of the European

Communities, Supplement 4/85, Luxembourg, European Communities [“Statement by Jacques Delors,

President of the Commission, to the European Parliament and his reply to the ensuing debate, a 12 March 1985”], p. 6

165