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O NOVO MUNDO EM PIXELS: OS JOGOS ELETRÔNICOS PARA COMPUTADOR COM TEMÁTICA DE COLONIZAÇÃO

No ano de 1989, é lançado para PC o jogo Gold of the Americas: a conquest of new world (Strategic Studies Group, 1989) [Ouro das Américas: A conquista do novo mundo], um jogo de estratégia por turnos, em que o jogador deve colonizar o continente americano escolhendo controlar uma das potências europeias disponíveis: Espanha, Portugal, França e Inglaterra.

No ano seguinte, 1990, outro jogo com um título também sugestivo é lançado, trata-se de Galleons of Glory: the secret Voyage of Magellan (1990) [Galeões da Glória: a viagem secreta de Magalhães], um jogo de aventura, no qual é possível controlar um marinheiro que embarca na aventura do novo mundo. Ao longo da viagem, tarefas deverão ser realizadas, como ajudar o cozinheiro com os vegetais, provar o valor de liderança para o capitão ou, até mesmo, ajudar o padre com sermões para os marujos.

Em Galleons of Glory, cujo objetivo é tentar reproduzir as condições das ex- pedições marítimas, alguns personagens históricos, além do próprio Magalhães que já é apresentado no título, são retratados, como é o caso do Capitão Gaspar de Quesada, que foi acusado de traição. Neste, de uma forma didática, através dos diálogos e situações propostas, percebe-se como a ideologia da coloniza- ção aparece implícita, adquirindo um caráter de necessidade, o que significa dizer que para o jogo é importante que a colonização ocorra de modo efetivo. Sendo assim, o jogo só é vencido caso o jogador assuma a postura do coloniza- dor, contribuindo com o bem maior, ou seja, embarcar na expedição marítima, provar o valor durante a travessia e auxiliar no aparato ideológico colonial.

Dois anos se passam e outros dois títulos somam a produção de jogos com a temática da expansão ultramarina europeia. O ano de 1992 é emblemático porque remete aos 500 anos da chegada de Cristóvão Colombo ao continente americano.7 Em meio a esse contexto é lançado Columbus Discovery (Gamos,

1992) [Descobrimento de Colombo].

7 Sobre a relação entre história e memória, são imprescindíveis os apontamentos de Le Goff (2013, p. 387-492), sobretudo aqueles presentes na Quarta Parte – A Ordem da Memória.

Figura 1 – Contato entre colonizadores e colonizados em Columbus Discovery

Fonte: Columbus Discovery (1992).

O jogo foi lançado para o PC e se encaixa no estilo puzzle (enigma/que- bra-cabeças). O objetivo é desembaralhar peças para formar imagens que remetem à conquista e colonização do continente americano. Conforme a imagem acima demonstra, bem como outras que estão presentes no jogo, a colonização da América é entendida como um evento que só fora possível graças ao ímpeto de Colombo, bem como as imagens remetem a uma cultura visual sobre o “descobrimento” que retratam os colonizadores em posições heroicas e os nativos como curiosos e encantados por estarem em contato com os europeus.

Também no ano de 1992 é lançado Discovery: in the steps of Columbus (1992). Mais uma vez o nome de Cristóvão Colombo é rememorado, fazen- do alusão à celebração ao momento histórico no qual o jogo fora produzido. O jogo conta com um total de seis nações europeias jogáveis, portugueses, ingleses, holandeses, espanhóis, franceses, genoveses e prussianos. Porém, apesar do número considerável de potências europeias controláveis, o jogo não possibilita que sejam comandadas as nações ameríndias.

Três títulos lançados no ano de 1994 enfatizam a questão da coloniza- ção da América. O primeiro deles, Discovering America: the adventure of

Spanish exploration (1994) [Descobrindo a América: a aventura da explo- ração espanhola], o segundo é Exploration: Voyages of Discovery (1994) [Exploração: Viagens do Descobrimento] e o terceiro, que será analisado de forma mais detalhada a seguir, foi Sid Meier’s Colonization (1994) [Sid Meier Colonização].

Sobre o primeiro, Discovering America, o estilo do jogo também é point

and click, em que a trama do jogo é demonstrada através de diálogos e ima-

gens e o jogador deve tomar decisões que afetam o caminhar da história. O desenrolar do jogo segue o enredo de uma caveira mágica que é trazida por Colombo após sua terceira viagem. O jogador se encaixa no perfil de um aventureiro do século XVI que deve seguir essas pistas em busca de fama e fortuna, viajando em naus e enfrentando perigos, como cavernas e nativos selvagens e cruéis.

O segundo título, Exploration, é um jogo de estratégia que se concentra no desenvolvimento colonial, sob a ótica do colonizador europeu, onde são abordados aspectos que vão desde a partida da Metrópole e as situações que podem ocorrer durante a navegação até a chegada em terra firme e o conta- to com os nativos.

Durante esse processo, o jogador deve financiar viagens, recrutar a tripu- lação para os navios, enviar exploradores por terra e por mar, fundar colônias e disputar com as demais potências europeias a posse do novo mundo. Aqui, como os demais títulos, a ótica da colonização é unilateral, impossibilitando que o jogador possa controlar as populações ameríndias ou que obtenham êxito no jogo caso a empreitada colonial seja infrutífera.

Em 1996 é lançado Conquest of the New World (1996) [Conquista do Novo Mundo], trata-se de um jogo de estratégia por turnos. O diferencial deste em relação aos outros diz respeito tanto ao estilo de jogo, como tam- bém à forma de batalha utilizada, que acontece em um campo de batalha de 3x5 quadrados, no qual as unidades são posicionadas e podem se mover.

Figura 2 – Batalha entre franceses e iroqueses em Conquest of the New World

Fonte: Conquest of the New World (1996).

A vitória pode ser obtida de dois modos, nas batalhas após derrotar o exército inimigo ou capturando a bandeira do adversário. Destacam-se os modelos utilizados para as tropas dos colonizadores e também para a popu- lação nativa, pois até o lançamento deste jogo, com exceção de Sid Meier’s Colonization, nenhum outro jogo tinha demonstrado em aspectos visuais, um contingente tão diferenciado em relação aos povos nativos. As transfor- mações às quais me refiro são aquelas decorrentes do contato com o coloni- zador como unidades montadas e índios armados com rifles e até elementos da cultura nativa, como totens e pinturas de guerra. Destaco esses elementos porque em se tratando de um jogo, os aspectos visuais são essenciais para as representações presentes no jogo, e como nos outros estavam ausentes eram traduzidos em uma invisibilidade do protagonismo indígena.

As partidas são iniciadas com a tripulação dentro de um barco, o qual deve navegar pelo oceano atlântico até encontrar terra. Após essa primeira etapa ser vencida, a aventura colonial tem início, uma vez que esta terra não

é desabitada e a população nativa não aceitará passivamente a incursão de estrangeiros em suas terras ancestrais.

Vale salientar que a colônia passa a se desenvolver mediante as atitudes que são tomadas pelo administrador colonial, que é controlado pelo jogador. A partir de suas decisões, os recursos são administrados e podem ser utili- zados para comprar mantimentos e produzir unidades, como soldados que comporão o exército, ampliando o poder de fogo do jogador e tornando a empreitada colonial mais fácil.

Somado a isso, estruturas físicas podem ser produzidas para gerar recur- sos, como fazendas para produção de alimentos, fortes que auxiliam na defesa da colônia, a qual será constantemente atacada tanto por nativos quanto por outras potências europeias.

Quatro anos se passam até outro título com a temática de colonização ser lançado, trata-se da expansão de Age of Empires II: The Age of Kings (1999) [Era dos Impérios II: A Era dos Reis]. Este fora lançado originalmente em 1999, enfocando o período medieval. Já a sua expansão, lançada um ano depois, é intitulada Age of Empires II: The Conquerors (2000) [Era dos Impérios II: Os Conquistadores] e amplia o período histórico retratado no jogo para a época das grandes navegações, incluindo como nações jogáveis os astecas, maias e espanhóis, além dos coreanos e hunos que não se encaixam na nossa análise.

Em 2003, inspirado no jogo Sid Meier’s Colonization, é lançado FreeCol (2003), um jogo em código aberto que pretende ser uma versão mais moder- na do Colonization original, com melhorias gráficas e mecânica de jogo mais próximas do contexto atual. Como é um jogo de código aberto, o mesmo é distribuído de forma gratuita e qualquer usuário pode contribuir para a sua melhoria, seja nos aspectos de tradução, mecânica, conteúdo histórico ou na parte de programação. Atualmente, está na sua versão 0.11.6, lançada em 17 de outubro de 2005.

O contexto da colonização da América foi retomado pela série Age of Empires cinco anos após o lançamento daquela expansão. Em 2005 é publi- cado o terceiro jogo da série, Age of Empires III (2005), tomando como ponto

de partida o período da expansão ultramarina europeia, enfocando o período aproximado de 1492 até 1876, a perspectiva do jogo remodela os gráficos e mecanismos de jogo da própria série.

Por fim, em 2008 é publicado um remake do Sid Meier’s Colonization original, trata-se de Sid Meier’s Civilization IV: Colonization (2008), basica- mente o jogo é uma releitura utilizando a engine do Civilization IV. As mo- dificações ocorridas dizem respeito à identidade visual, como a parte gráfica e mecânica do jogo, aproximando o jogo dos modelos de jogos de estratégia condizentes com o século XXI. Os 12 títulos apresentados colocam a coloni- zação e todas as implicações contidas nesse processo como algo passível ser vivenciado, transformando o passado em uma condição jogável. Entretanto, algumas questões, como a visão acerca dos colonizadores e dos colonizados, devem ser analisadas.

O ELOGIO DA COLONIZAÇÃO EM GOLD OF THE AMERICAS,