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O acoplamento estrutural entre os sistemas político, jurídico e econômico: a

3 A CONSTITUIÇÃO COMO ACOPLAMENTO ESTRUTURAL ENTRE OS

3.2 O acoplamento estrutural entre os sistemas político, jurídico e econômico: a

Do ponto de vista sistêmico, a Constituição Federal é o acoplamento estrutural por meio do qual se comunicam os sistemas político, jurídico e econômico. Isso significa ser ela o instrumento de seleção das informações enviadas por um sistema a outro. É ela o parâmetro na identificação de inputs, dentre as várias irritações recebidas por cada sistema.

A Constituição Federal, o acoplamento estrutural (strukturelle kopplung) entre os sistemas político e jurídico, age como mecanismo de interpenetração permanente e concentrada entre os mencionados sistemas sociais. Possibilita, pois, a constante

troca de influências recíprocas entre os subsistemas, filtrando-as. Ao mesmo tempo em que incluiu, exclui. Por assim dizer, promove uma solução jurídica à autorreferência do sistema político, ao mesmo tempo em que se fornece resposta política à autorreferência do sistema jurídico. (LIMA, 2009, p. 31).

Como acoplamento estrutural, unindo o sistema jurídico ao político, a Constituição também funciona como fator de exclusão e inclusão. “Acaba por incluir novos valores e excluir outros, anteriormente impostos ao Direito; por outro lado, é tida como mecanismos de irritação do sistema, por trazer nova comunicação.” (LIMA, 2009, p. 30).

Por assegurar a propriedade como bem juridicamente protegido e por traçar as normas gerais para o exercício da atividade econômica, a Constituição é o acoplamento estrutural que liga o Direito à Economia. A propriedade é a base sobre a qual o sistema econômico se diferencia, o que se manifesta no seu código binário ter/não-ter (ou pagar/não-pagar). Mas a propriedade não faz parte do sistema jurídico, pois não se resolvem problemas jurídicos com a Economia. No sistema jurídico a propriedade é somente um objeto, como tantos outros, enfrentado por suas decisões, tal como os contratos, que, quando processados pelo Direito, não o são pelo código pagamento/não-pagamento, mas sob a operação do sistema jurídico, identificada pelo código válido/não-válido (LIMA, 2009).

Em linguagem jurídica, considerando esses três subsistemas sociais estudados, a Constituição é o fundamento maior de validade das atividades políticas, jurídicas e econômicas.

Sendo, assim, ainda que haja outros, a Constituição Federal é o principal acoplamento estrutural do Direito com os sistemas político e econômico. É ela o primeiro e primordial canal de seleção de informações do ambiente no interior do sistema jurídico, de tal sorte que todos os subsistemas nele gerados operam conforme essas seleções primeiras pela Constituição realizadas.

O Direito é um sistema social que se diferencia do seu entorno, selecionando, por meio da Constituição, informações ressonantes advinda do ambiente. Tudo aquilo que é submetido ao código válido/não-válido do Direito, a partir do seu acoplamento estrutural, passa a ser observado sob o código compatível com a Constituição/ não-compatível com a Constituição. A nomenclatura jurídica para este código, que analisa a compatibilidade com a Constituição de todos os atos a ela posteriores, é constitucional/inconstitucional. O que é inconstitucional é informação descartada. O que é constitucional é transformado em outputs a serem devolvidos para o ambiente. O retorno de novas informações do ambiente, geradas a partir dos outputs anteriores (prestações), produzidos pela observação do que é selecionado como

constitucional, gera o feedback necessário para mais informações selecionáveis sob o código constitucional/inconstitucional. A recursividade dessas operações irá gerar, portanto, mais operações dessa natureza. É a autopoiese do Direito.

A produção contínua dessas operações recursivas leva ao aumento da complexidade no interior do próprio sistema do Direito. Para reduzir essa complexidade, o sistema evolui, gerando subsistemas. Cada subsistema do Direito tem no próprio sistema do Direito e nos demais subsistemas jurídicos o seu ambiente, diferenciando-se deles pelas suas comunicações específicas, realizadas por seu próprio código interno. Assim o é, por exemplo, o Direito Penal, que se diferencia do sistema geral do Direito e dos outros subsistemas do Direito, por receber informações e observá-las sob o seu código delito/não-delito.

Uma vez que a Constituição é o principal acoplamento estrutural do Direito, ou seja, o seu primeiro mecanismo de seleção de inputs, toda a informação que ressoa para os subsistemas jurídicos também se submete à observação do que é constitucional/inconstitucional, pois o que é inconstitucional não pode ser transformado em prestações, quer pelo Direito, considerado como sistema geral, quer por cada um de seus subsistemas. A concepção do que é delito/não-delito, no caso do subsistema do Direito Penal, não pode contrariar o que é constitucional/não-constitucional.

Tomando-se como exemplo o direito de greve, assegurando pela Constituição, não pode o sistema político editar uma lei penal considerando delito o exercício desse direito. E se o fizer, o sistema jurídico a rejeita, pois contraria a Constituição. Se o sistema do Direito identifica como inconstitucional uma lei que criminalize o direito de greve, não pode o subsistema do Direito Penal julgar criminoso o exercício desse direito, pois toda a estrutura do subsistema Direito Penal foi construída a partir de informações selecionadas primeiramente sob o código constitucional/inconstitucional.

É importante ressaltar não ser cronológica essa análise sistêmica, mas, sim, funcional. Não se está dizendo que o Direito Constitucional precedeu, no tempo, o Direito Penal, ou o Direito Civil, ou qualquer outro. Nas operações do sistema Direito, todos os subsistemas funcionam a partir do código constitucional/inconstitucional. Só assim se compreende os fenômenos da inconstitucionalidade e da não-recepção. A partir de uma nova Constituição, todas as leis editadas após a vigência da nova Lei Maior e que a ela forem contrárias, serão inconstitucionais. As leis a ela preexistentes – estruturas de subsistemas já formados – ainda que compatíveis com a Constituição da época em que foram editadas - serão submetidas ao código compatível com a [nova] Constituição/não-compatível com a [nova] Constituição, que na linguagem jurídica assume a denominação recepcionado/não-recepcionado pela

Constituição, e se forem com ela incompatíveis, serão descartadas por não terem sido recepcionadas pela Nova Carta Política, que orienta todo o sistema jurídico. Assim, toda a estrutura do sistema Direito é refeita a partir de uma nova Constituição, pois esta é o acoplamento estrutural, por meio do qual o Direito se comunica com o seu ambiente, especialmente com o sistema político, de onde provêm as leis, alocadas no interior do sistema jurídico como estruturas para a observação (seleção) e transformação das informações que recebe.

Produzindo novas comunicações sob o código constitucional/inconstitucional, o Direito gera novos subsistemas, que aumentam sua própria complexidade e reduzem a complexidade do sistema geral do Direito, podendo cada um deles, a depender da complexidade em seu interior, gerar novos subsistemas, sem nunca construir novas estruturas que fujam da análise do código constitucional/inconstitucional. A autopoiese do Direito moderno tem como condição operativa a supremacia da Constituição.

Cada subsistema do Direito, ainda que possua estruturas próprias, não pode operar gerando prestações inconstitucionais, pois isto contrariaria as operações em razão das quais ele foi gerado. Atuar em contradição com a Constituição, do ponto de vista sistêmico, é contrariar a recursividade do sistema e, portanto, pôr em risco a sua autopoiese e até mesmo sua diferenciação funcional, expondo o sistema ao risco da destruição.