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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.2 O Ambiente Interorganizacional

Como indicativos do desenvolvimento do relacionamento interorganizacional, pode-se citar a crescente consciência de como as empresas interagem umas com as outras, a grande variedade de formas com que elas se relacionam, o surgimento de novas formas de interação e a popularidade e o uso de ferramentas gerenciais específicas que são relacionadas ao desenvolvimento do arranjo interorganizacional de empresas. (HÅKANSSON; LIND, 2007).

Uma abordagem que tem sido adotada nas pesquisas organizacionais é assumir que organizações econômicas são sempre caracterizadas pela existência de relacionamentos, ou seja, é assumido que a empresa não é uma ilha isolada (não é uma unidade livre e independente), mas parte da ilha principal (HÅKANSSON; SNEHOTA, 1989). Assim, nessa abordagem, relacionamentos de negócios são tão fundamentais quanto as próprias organizações e, consequentemente, devem ser percebidos como uma parte integrada do plano de tornar organizações individuais parte de algo maior (JOHANSON; MATTSSON, 1985).

Vários estudos tem aparecido com descrições de formas mais organizadas de interação entre empresas que aquelas existentes previamente. Estas pesquisas têm coberto diversas indústrias e diferentes países e regiões, como, por exemplo, os estudos de Van Der Meer-Kooistra (1994) que analisa quatro empresas multinacionais na Holanda; de Boland Jr. et al. (2008) que usa casos de projetos de arquitetura, engenharia e construção, bem como de join ventures na indústria de gás e petróleo; de Håkansson e Lind (2004) que estuda o relacionamento da Ericsson e da Telia Mobile, ambas do setor de telecomunicações; de Dekker (2004) que apresenta um estudo de caso de uma aliança estratégica entre um comprador e um fornecedor de equipamentos de segurança para rodovias; e de Mahama (2006) que investiga dados do setor australiano de mineração no estudo de relacionamentos estratégicos da cadeia de suprimento deste setor.

Em resumo, para Håkansson e Lind (2007), existem amplas observações empíricas indicando mudanças importantes no ambiente interorganizacional das empresas. Não há um consenso sobre quais são os principais direcionadores por trás deste desenvolvimento de estruturas interorganizacionais. Alguns autores, segundo Castells (2000), apontam a globalização e o desenvolvimento de informações tecnológicas mais avançadas como direcionadores. Outros

pesquisadores, contudo, apontam direcionares mais complexos, como as mudanças no uso das tecnologias, que estariam relacionadas ao aumento da especialização e internacionalização de empresas (HÅKANSSON; LIND, 2007).

Independentemente das razões para o desenvolvimento, introdução de redes tem se acentuado e mudado alguns assuntos específicos que são importantes em relação à contabilidade (HÅKANSSON; LIND, 2007). Essas mudanças afetam o que deveria ser incluído na contabilidade (tipos de dados) e por quem e de que forma a contabilidade será usada (OTLEY, 1994). A fim de contribuir com a eficiência e eficácia das operações, os gerentes dentro da empresa precisam não apenas de dados concernentes ao desempenho e uso de atividades e recursos dentro da empresa, mas também como o desempenho e uso estão relacionados às atividades e recursos situados dentro de outras empresas, por exemplo, além das fronteiras das empresas (HOPWOOD, 1996).

Em uma estrutura de rede, todas as atividades e recursos se tornam mais relacionados uns com os outros e, portanto, eles têm que ser acessados de forma a levar esta interconectividade em consideração (TOMKINS, 2001). Uma importante consequência disso é o fato de que qualquer um que queira acessar qualquer das empresas envolvidas necessita do mesmo tipo de informação (HÅKANSSON; LIND, 2007).

2.2.1 Tipos de relacionamentos inter-empresas existentes

Pode-se identificar duas tendências nos relacionamentos inter-empresas estabelecidos: (1) o desenvolvimento de relacionamentos de negócios mais próximos entre empresas que compram e vendem umas das outras e (2) o desdobramento de empresas amplamente controladas hierarquicamente em unidades independentes por meio de terceirização (SEAL et

al., 2004).

Embora no segundo tipo de relacionamento – a terceirização – também haja o desenvolvimento de relacionamentos mais próximos do que a simples compra e venda de produtos e serviços, no primeiro tipo de relacionamento, os relacionamentos existentes estão sendo desenvolvidos, segundo Kraus e Lind (2007), para formar relacionamentos interorganizacionais ainda mais próximos e de longo prazo. Nestes relacionamentos são

desenvolvidas relações de negócios mais extensivas entre empresas que compram ou vendem uma para a outra, ou que cooperam de qualquer outra forma. Este tipo de relacionamento provavelmente sempre existiu, mas tem se tornado mais acentuado nas últimas décadas, ou, como coloca Freeman (1991) apud Håkansson e Lind (2007), networking para inovação é em si mesmo um velho fenômeno e redes de fornecedores são tão antigas quanto economias industrializadas. São relacionamentos iniciados tanto pelos desejos dos vendedores de criar mais valor para seus clientes ou mais lealdade dos mesmos, como pelos desejos dos compradores de criarem eficiência e cadeias de suprimentos inovativas (WYNSTRA, 2003).

Relacionamentos de negócios mais próximos entre compradores e vendedores indicam que estes estão trabalhando juntos de forma mais próxima e por períodos de tempo mais longo do que antes. Nesse tipo de relacionamento, além de aspectos tangíveis de integração, como, por exemplo, especificação de produtos em conjunto, desenvolvimento de processos em conjunto etc., o compartilhamento de informações constitui uma questão central dentro do relacionamento (KRAUS; LIND, 2007). Talvez estas sejam justamente a diferença entre relacionamentos mais próximos e a terceirização, que por mais que possa englobar relacionamentos próximos e de longo prazo, não cria espaço para o desenvolvimento de processos, nem de produtos em conjunto, nem tão pouco promove a elaboração conjunta de estratégias ou o compartilhamento de informações estratégicas.

Embora como dito anteriormente, esse tipo de relacionamento entre fornecedores e compradores sempre tenha existido, tem se tornado mais aparente nas últimas décadas. Ferramentas gerenciais como CRM (Custumer Relationship Management) e KAR (Key

Account Management) foram desenvolvidas para apoiar os desejos do vendedor de criar mais

valor para seus clientes e também de ganhar a lealdade deles. Da mesma forma, ferramentas gerenciais podem operar no sentido contrário, ou seja, para apoiar o comprador em criar uma cadeia de suprimentos eficiente e inovativa (KRAUS; LIND, 2007).

A introdução de outras ferramentas gerenciais mais genéricas, tais como JIT (Just In Time), TBM (Time-based Management), TQM (Total Quality Management), TOC (Total Quality

Control) e CRM (Custumer Relationship Management), estão fortemente relacionadas ao

desenvolvimento de relacionamentos próximos entre empresas (HÅKANSSON; LIND, 2007; KRAUS; LIND, 2007). Estas ferramentas, conforme Kraus e Lind (2007), melhoraram itens

como estoque, tempo ocioso e ineficiência produtiva, permitindo à empresa lidar com o aumento de interdependência.

No segundo caso, novos relacionamentos interorganizacionais com fornecedores estão se formando por meio da terceirização das atividades que eram anteriormente feitas pela própria empresa (KRAUS; LIND, 2007). Neste caso, ocorre praticamente o contrário do primeiro caso, ao invés da agregação de novas empresas, há um desdobramento de empresas amplamente hierarquizadas em constelações de unidades mais independentes que devem buscar formas eficientes de se relacionar umas com as outras (HÅKANSSON; LIND, 2007).

Este tipo de relacionamento, a terceirização, corresponde ao tipo de relacionamento interorganizacional estudado nesta tese e consiste na contratação de qualquer serviço ou atividade por uma terceira parte (DRTINA apud LANGFIELD-SMITH; SMITH, 2003). Na medida em que as empresas crescentemente focam sua atenção em suas competências centrais, elas terceirizam tanto um maior percentual dos custos totais de seus produtos como um número substancial de itens que não fazem parte de suas competências centrais (KRAUS; LIND, 2007; COOPER; SLAGMULDER, 2004). É bastante comum, segundo Kraus e Lind (2007), terceirizar não apenas funções produtivas, mas também funções como tecnologia, desenvolvimento e auditoria interna, por exemplo.

A razão para se terceirizar tais funções para um fornecedor externo inclui, para Cooper e Slagmulder (2004), a eficiência de custos superior do fornecedor, a funcionalidade, a qualidade e a habilidade do fornecedor em incorporar novas tecnologias tempestivamente. A terceirização é, na visão de Kraus e Lind (2007), frequentemente tida como forma de reduzir custos e melhorar o desenvolvimento de novos produtos por meio da colaboração com fornecedores. Mais do que isso, a terceirização, como mostra Mouritsen et al. (2001), é necessária para que a empresa mantenha sua competitividade por meio da vantagem estratégica obtida pelo know-how técnico do fornecedor.

Outra aclamada vantagem da terceirização, como aponta Baiman e Rajan (2002), é que a empresa pode se concentrar em fazer o que ela faz melhor (sua competência central). A desvantagem é que qualquer divergência entre as atividades internas e aquelas terceirizadas, que eram previamente internalizadas, devem ser agora negociadas entre empresas

independentes, o que termina por ser um incentivo para que as empresas trabalhem relacionamentos mais elaborados com seus fornecedores.

Ambas as tendências apresentadas aqui constituem formas de relacionamentos interorganizacionais. Estes relacionamentos podem ser classificados de diversas formas, mas aqui consideraremos a classificação mais citada entre os autores pesquisados (GIETZMANN, 1996; ITTNER et al., 1999; LANGFIELD-SMITH, 2003; HÅKANSSON; LIND, 2004; KAJUTER; KULMALA, 2005; MOURITSEN; THRANE, 2006), a que distingue relacionamentos interorganizacionais em dois tipos (1) dyaidc e (2) networks.

O primeiro tipo de relacionamento consiste de relações entre duas empresas colaboradoras (GIETZMANN, 1996; ITTNER et al., 1999; LANGFIELD-SMITH, 2003). O segundo envolve a manipulação sumultânea de um conjunto de relacionamentos, por exemplo, cadeias de unidades organizacionais (HÅKANSSON; LIND, 2004; KAJUTER; KULMALA, 2005; MOURITSEN; THRANE, 2006). Nesta tese iremos tratar da terceirização em uma empresa do setor elétrico que se encaixa no primeiro tipo de relacionamento.