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7 AS RAZÕES PARA PROBLEMATIZAR E REFUTAR A VERSÃO UNILATERAL

7.2 O cenário de exclusão de pessoas transgêneras

Inicialmente, esclarece-se que não foram encontradas estatísticas voltadas a delimitar o mercado de trabalho de pessoas transgêneras no Brasil. Há informações

309

MARKMAN, Luma. Parada Gay do Recife aborda acesso de transexuais ao mercado de trabalho.

G1 PE. 21/09/2014. Disponível em: <http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2014/09/parada-gay-do-

recife-aborda-acesso-de-transexuais-ao-mercado-de-trabalho.html>. Acesso em: 22 de setembro de 2014.

310 Idem.

311 ‘MINHA conquista serve de exemplo’, diz primeira travesti doutora do Brasil. G1 Ceará. Disponível em: <http://g1.globo.com/ceara/noticia/2012/08/minha-conquista-serve-de-exemplo-diz-1- travesti-doutora-do-brasil.html>. Acesso em: 08 de agosto de 2014.

prestadas, principalmente, por movimentos sociais ligados à causa, mas que não resultam em dados oriundos de pesquisas seriamente realizadas.312

Embora não existam dados sobre a seara laboral, a Secretaria de Direitos Humanos elaborou, em 2012, relatório sobre a violência homofóbica no Brasil.

Antes de apresentar os dados, é esclarecido que a homofobia não se reduz à rejeição irracional ou ódio em relação aos homossexuais, eis que também abrange a manifestação arbitrária que qualificaria o outro como contrário, inferior ou anormal. O próprio termo ―homofobia‖ é questionado, uma vez que a diversidade de sujeitos que pretende abarcar, torna invisíveis violências e discriminações cometidas contra lésbicas e transgêneros. Nesse sentido, optam por nominá‐las, respectivamente, como lesbofobia e como transfobia - preconceito relativo ao inominável que não se encaixa em uma estrutura binária.313

Os dados coletados sobre a violência em face dessa população foram provenientes essencialmente do Disque Direitos Humanos (Disque 100) da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e pelos da Central de Atendimento à Mulher, da Ouvidoria do SUS e de denúncias efetuadas diretamente aos órgãos LGBT da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República.314

Apesar da subnotificação, os números revelam um grave quadro de violências homofóbicas no Brasil. No ano de 2012, foram registradas 3.084 denúncias de 9.982 violações relacionadas à população LGBT, envolvendo 4.851 vítimas e 4.784 suspeitos. Por dia, no ano de 2012, 13,29 pessoas foram vítimas de violência homofóbica no país. Esses números revelaram um aumento de 166,09% de denúncias e 46,6% de violações em relação ao ano de 2011.315

Em 2012, foram divulgadas, por meio dos principais canais midiáticos brasileiros, 511 casos de violações contra a população LGBT, compreendendo 511

312

A título exemplificativo desse cenário de informações, remete-se a nota de rodapé n. 306. 313

Contudo, para efeitos da pesquisa, o relatório optou por enquadrar todos os casos contra a população LGBT como violência homofóbica (BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos. Relatório

sobre violência homofóbica no Brasil: ano de 2012. Brasília: SDH, 2012, p. 10).

314

O relatório retrata os problemas em pesquisar nessa área, entre eles: 1) inexistem dados/perguntas do IBGE relacionadas à identidade de gênero ou orientação sexual no Censo Demográfico ou na Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílios; 2) ausência de campo relativo a orientação sexual, identidade de gênero ou outro motivo homofóbico em boletins de ocorrência; 3) ausência de repasse de dados confiáveis pelos poderes públicos estaduais e municipais e escassez de da dados demográficos em relação à população LGBT.

315

vítimas e 474 suspeitos. Dentre o número de violações noticiadas, foram registrados 310 homicídios.316

Ao avaliar os dados hemerográficos, examina-se que travestis e transexuais seguem como as maiores vítimas de violências homofóbicas, inclusive, aquelas com maior gravidade, tais como homicídios e lesões corporais.317

Sobre a violência perpetrada em face de pessoas LGBTs, Berenice Bento reflete:

A categoria humanidade está assentada no pressuposto de uma natureza dimórfica dos corpos, na diferença sexual. Essa matriz de reconhecimento exclui dos seus marcos aquelas/es que deslocam as definições de feminismo e masculino. Dessa forma, matar uma travesti, transexual ou um gay feminino não provoca a mesma ira ou a mesma indignação se comparada ao assassinato de uma mulher biológica, pois tal violência estaria mais identificada com um trabalho de assepsia da humanidade do que propriamente com a violência cruenta.318

Em relação aos tipos de violações denunciadas durante o ano de 2012, as violências psicológicas foram as mais reportadas, com 83,2% do total, seguida da discriminação, com 74,01%, e violências físicas, com 32,68%. Registre-se que, entre as violações discriminatórias, as mais denunciadas são: a discriminação por orientação sexual, com 76,37% das denúncias, e a discriminação por identidade de gênero, com 15,21% das respostas.319

No âmbito internacional, destaca-se a pesquisa realizada nos Estados Unidos, com 6.456 pessoas transgêneras e de gênero não conformes320, a qual retrata, em relação ao panorama do mercado de trabalho, que: 1) há o dobro da taxa de desemprego dos entrevistados em relação à população geral; 2) 90% dos entrevistados relataram ter vivido casos de assédio moral, maus-tratos e discriminação no meio ambiente do trabalho, necessitando esconder sua identidade de gênero para evitar as referidas situações; 3) 47% disseram encontrar uma rejeição no mercado de trabalho, expressada pela demissão, não contratação e ausência de promoção pelo fato de serem pessoas transgêneras; 4) 26% afirmaram

316

BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos. Relatório sobre violência homofóbica no Brasil: ano

de 2012. Brasília: SDH, 2012, p. 39. 317

Ibidem, p. 93. 318

BENTO, Berenice, op. cit., p. 99. 319

BRASIL. Secretaria de Direitos Humanos, op. cit., pp. 32-34.

320 Para fins da pesquisa, ―pessoas não conformes‖ são os indivíduos que não se indetificaram ou se identificaram com mais de uma das identidades de gênero apresentadas no questionário elaborado.

ter perdido o emprego por causa da sua identidade de gênero; 5) 71% dos pesquisados preferiram ocultar sua identidade de gênero e a transição de gênero e 57% simplesmente atrasaram a transição, a fim de evitar a discriminação nas relações de trabalho; 6) 78% dos entrevistas consideraram que, após terem se submetido à transição de gênero, sentiram-se mais cômodos no trabalho e seus desempenhos melhoraram – apesar dos altos níveis de assédio321

.

Além de outros aspectos relacionados às pessoas transgêneras, o estudo identificou que 41% dos entrevistados tentaram suicídio.

Desse modo, o quadro de violência, rejeição, discriminação e exclusão que ronda as pessoas que fogem ao sistema binário e heteronormativo, culminando com cenários de horror, que beiram ao extermínio, não se limita ao contexto brasileiro e, por isso, clamam por uma atuação global.