• Nenhum resultado encontrado

O conceito de Ação Social

No documento Download/Open (páginas 43-46)

2 O METODISMO EM POÇOS DE CALDAS E SUAS PRÁXIS SOCIAIS E

2.3 Trajetória da ação social

2.3.1 O conceito de Ação Social

O termo ação social foi utilizado por Marx Weber (1984) em “Economia e Sociedade”, onde o autor classifica em quatro tipos de ações, são elas:

ação racional com relação a fins: determinada por expectativas no

comportamento tanto de objetos do mundo exterior como de outros homens, e utilizando essas expectativas como ‘condições’ ou ‘meios’ para o alcance de fins próprios racionalmente avaliados e perseguidos;[...] racional com

relação a valores: determinada pela crença consciente no valor –

interpretável como ético, estético, religioso ou de qualquer outra forma - próprio e absoluto de uma determinada conduta, considerada de per si e independente de êxito; [...] afetiva, especialmente emotiva, determinada por afetos e estados sentimentais atuais; e [...] tradicional : determinada por um costume arraigado” (WEBER, 1984, p.141 grifo nosso).

Nesta definição, a ação enquanto “ação social” é um comportamento onde o sujeito ou sujeitos da ação atribui a ela um sentido ou intencionalidade, seja de forma racional ou irracional, que sempre irá na direção de outro ou outros. Assim, o sentido manifesta seu caráter político, econômico ou religioso na ação concreta. Desta forma a discussão sociológica da ação social não é algo novo, mas algo essencial para entender o comportamento humano (LIMA, 2013).

Dentro desse entendimento de ação em direção ao outro se fundamenta a solidariedade social. O público alvo desse tipo de ação solidária sempre foram os pobres, doentes, viajantes, deficientes e incapazes, portanto, criou-se ao longo da história da assistência a compreensão de que na humanidade haverá sempre os mais frágeis que não conseguirão reverter sua condição, carecendo de forma continua de ajuda (SPOSATI, 2003). Por isso a ação social toma uma expressão de caridade e benemerência, algo que vem desde a civilização judaico- cristã, intensificado com a expansão do cristianismo na Idade Média, e por fim vai se concretizar em aberturas de instituições de caridade ou grupos filantrópicos com práticas paternalistas e clientelistas.

Com a situação da pobreza intensificando, com a expansão do capital e a precarização do trabalho, essa situação passa a gerar um incômodo na sociedade e passa ser vista como um risco social. Com essa mudança de percepção, a ação social de ato, de solidariedade e benemerência torna-se uma estratégia de dominação e controle. Um exemplo desse período é “Poor Laws” ou Leis dos Pobres, uma política de natureza pública que impunha um “código

coercitivo do trabalho” (BOSCHETTI, 2003, p. 53), pois a pobreza neste momento era encarada como uma questão individual daquele que não queria superá-la.

Sposati (2007) afirma que, no Brasil até 1930 a pobreza também tinha esse caráter de problema individualizado, era compreendida como doença ou disfunção pessoal, e o tratamento podia ser até a internação. Veja seu relato:

(...) os pobres eram considerados como grupos especiais, párias da sociedade, frágeis ou doentes. A assistência se mesclava com as necessidades de saúde, caracterizando o que se poderia chamar de binômio de ajuda médico-social. Isto irá se refletir na própria constituição dos organismos prestadores de serviços assistenciais, que manifestarão as duas faces: a assistência à saúde e a assistência social. O resgate da história dos órgãos estatais de promoção, bem-estar, assistência social, traz, via de regra, esta trajetória inicial unificada (SPOSATI et al., 2007, p. 42).

Neste contexto, o Estado incorpora a assistência social sob duas perspectivas “uma que se insinua como privilegiada para enfrentar politicamente a questão social; outra, para dar conta de condições agudizadas de pauperização da força de trabalho” (Sposati Et al, 2007, p.41). Desta maneira, a assistência permanecia enquanto benemerência e o Estado transferia essa responsabilidade as instituições sociais, principalmente as de cunho religioso.

Segundo Behring & Boschetti (2006) a mudança no desenvolvimento das políticas sociais só vem após a crise mundial do capitalismo em 1929, momento que exigiu a intervenção estatal na relação capital-trabalho. Deste modo, o Estado brasileiro passa a adquirir progressivamente a consciência da pobreza enquanto questão social11.

Esse processo de regularização das relações de trabalho iniciou na era Vargas, mas o objetivo ainda era o controle social, pois os benefícios sociais, como saúde e previdência foram garantidos apenas aos trabalhadores com carteira de trabalho assinada. Nesse sentido o “pensamento idealizado liberal permanecia a ideia moral pela qual atribuir benefícios ao trabalhador formal era um modo de disciplinar e incentivar a trabalhar o trabalhador informal, tido por vadio” (SPOSATI, 2007, p.12). Aos desempregados ou aos que necessitassem suprir as necessidades básicas restavam-lhe apenas a caridade das instituições filantrópicas.

Então, até aqui não havia ações de assistência social do governo. A primeira iniciativa só se deu em 1938 por meio do Decreto-lei que criou o Conselho Nacional de Serviço Social- CNSS, que tinha a função elaboração de inquéritos sociais, fiscalização das entidades e

11 O termo “questão social” configura-se como expressão das desigualdades sociais provenientes do modo de

analise de pedidos de isenções e subvenções, além das demandas dos necessitados. Mas o usuário12 ainda era silenciado pelas práticas assistenciais. De acordo com Sposati (2007):

A moral republicana liberal – mesclada à ditadura varguista – entende que os notáveis é que dialogariam com entidades sociais sobre os mais pobres. Nem pensar em relações democráticas ou na presença da voz dos usuários para dizer de si. Eles precisavam ser vocalizados por outros. É a grande e persistente desconfiança com o que dizem os usuários da assistência social que precisa ser rompida (SPOSATI, 2007, p. 17).

Todavia, apesar da criação do CNSS e depois da Legião Brasileira de Assistência13 LBA, a assistência social permanecia com traços conservadores, mantendo-se no campo assistencialista, clientelistas e operacionalizados por entidades desarticuladas. Assim o único meio para acessar a maioria dos direitos sociais continuava sendo o trabalho formal.

Mas, no que diz respeito às políticas sociais, o grande divisor de águas foi a década de 1980. Esse período é historicamente conhecido pelo forte engajamento social e pressão política por parte da sociedade civil. Os movimentos sociais contribuíram de tal forma para os novos arranjos das políticas sociais brasileiras que influenciaram o modo de gestão e controle social.

Então, só a partir da Constituição Federal em 1988 houve realmente um avanço significativo no reconhecimento dos diretos humanos sociais. Segundo Yasbeck (1997):

Nesse sentido a Seguridade Social implica que todo cidadão tenha acesso a um conjunto de certezas e seguranças que venham cobrir, diminuir ou precaver os riscos e as vulnerabilidades sociais. A partir dessa nova concepção foi instituído o reconhecimento do direito universal, independente se o cidadão contribuísse com o sistema previdenciário ou não. (YASBECK, 1997, p.13).

Deste modo, a assistência social passa a integrar o tripé de seguridade social, juntamente com saúde e previdência social, conforme descrito nos artigos 203 da Constituição Federal:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I - a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

12 Esse é o termo utilizado na Lei nº 8.662, 07 de junho de 1993 – Lei de Regulamentação da Profissão do

assistente social, para denominar o público alvo da assistência social.

13 A LBA foi criada em 1942 e coordenada pela primeira dama Darcy Vargas e tinha por intenção organizar as

entidades assistenciais de boa vontade, implantar serviços, buscar legitimação do Estado com os pobres e trabalhar para o progresso do serviço social no Brasil.

II - o amparo às crianças e adolescentes carentes; III - a promoção da integração ao mercado de trabalho;

IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária;V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei (BRASIL, 2012, p. 120).

Esse aparato legal conferiu a assistência social o caráter de política pública que deve atender a todos, configurando-se desta forma enquanto direito do cidadão e dever do Estado, conforme ratificado no artigo primeiro da Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS), n° 8.742 de 7 de dezembro de 1993, que dispõe sobre a organização da assistência social no Brasil;

A Assistência Social, direito do cidadão e dever do Estado, é política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e da sociedade, para garantir o atendimento as necessidades básicas. (BRASIL, Lei n° 8.742, 1993).

É importante destacar que a LOAS foi atualizada pela Lei 12.435/2011. Este aparato legal trouxe maturidade aos serviços socioassistenciais, por ter em seu conteúdo definições e traçar os objetivos da assistência social, além das diretrizes de atendimento, da organização e gestão. Esta lei instituiu o Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), o qual é instância máxima de deliberação, que por sua vez tem a competência de aprovar a Política Nacional de Assistência Social (PNAS), além de normatizar e regular a prestação de serviço, sejam eles de caráter público ou privado, no campo da política em questão.

Portanto, todo este aparato legal demonstra a evolução histórica na construção da política de assistência social, além de instituir a responsabilidade do Estado e das instituições assistenciais em consolidarem um trabalho em rede de uma política de direito, que rompa com as práticas conservadoras, de benemerência e filantrópicas.

2.3.2 Ação social na perspectiva missionária cristã

Em primeiro lugar, a intenção não é definir ação social como única forma de cumprir a missão. Segundo o missiólogo David Bosch (2014) não há como definir algo que é infinito, mas ele compreende que “missão constitui um ministério multifacetado em termos de

No documento Download/Open (páginas 43-46)