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O Conselho da União Europeia (artigos 202.º a 210.º do TCE)

No documento uniao europeia (páginas 41-47)

O sistema político da União Europeia

3. O Conselho da União Europeia (artigos 202.º a 210.º do TCE)

3.1. Composição

O Conselho é composto por um representante de cada Estado-Membro a nível ministerial, com poderes para vincular o respectivo governo. O Conselho caracteriza-se pela ausência de uma composição fixa e única. O seu regulamento interno (Decisão 2006/683/CE, de 15-9-2006, JO L 285/47, de 16.10.2006, na redacção que lhe foi dada pela Decisão 2007/881/CE, de 20-12-2007, JO L 346/17, de 29-12-2007) enumera nove formações do Conselho, a saber: (1) assuntos gerais e relações externas, (2) questões económicas e financeiras (Ecofin), (3) justiça e assuntos internos (JAI), (4) emprego, política social, saúde e consumidores, (5) concorrência, (6) transportes, telecomunicações e energia, (7) agricultura e pesca, (8) ambiente, (9) educação, juventude e cultura.

A responsabilidade pela coordenação dos trabalhos das diversas formações do Conselho cabe à formação “Assuntos Gerais e Relações Externas”. É também a esta formação que compete decidir sobre a lista das restantes formações (artigo 2.º n.º 1, do regulamento interno).

O TUE e o TCE referem-se ainda à formação “Conselho reunido a nível de chefes de Estado ou de Governo” à qual atribuem competências de grande significado, como (a) verificar a existência de uma “violação grave e persistente”, por parte de um Estado-Membro, do princípio democrático, do respeito pelos direitos fundamentais ou do Estado de Direito (artigo 7.º, n.º 2, do TUE), (b) determinar se os Estados-Membros satisfazem as condições necessárias para a adopção da moeda única (artigo 121.º do TCE), ou (c) designar a personalidade que tenciona nomear presidente da Comissão (artigo 214.º, n.º 2, do TCE). O Conselho da UE reunido a nível de chefes de Estado ou

de governo não se confunde com o Conselho Europeu, não só porque não inclui entre os seus membros o presidente da Comissão, mas também porque pode adoptar actos jurídicos tipificados pelos dois Tratados da União.

3.2. Competência

O Conselho dispõe das seguintes competências:

(a) competência de auto-organização, traduzida nomeadamente na aprovação do seu regimento, inderrogável singularmente (acórdão de 23-2-1988, Reino Unido/Conselho, 68/86);

(b) competência em matéria de formação da Comissão Europeia, juntamente com o PE (ver infra, 4.1.);

(c) competência legislativa, normalmente exercida sob proposta da Comissão, individualmente ou com a participação do PE, em diversos graus de intensidade, que vão da consulta prévia à co-decisão (ver infra, § 3.º, 1.3.);

(d) competência orçamental, que se traduz na apresentação do projecto de orçamento ao PE e na decisão final quanto à parte mais substancial das despesas nele inscritas, ou seja, as despesas obrigatórias (ver infra, § 3.º 3.);

(e) competência para adoptar normas de execução da legislação comunitária, em princípio obrigatoriamente delegável na Comissão para ser exercida por esta nas condições fixadas pelo próprio Conselho (ver infra, § 3.º, 2.);

(f) competência de coordenação das políticas económicas gerais dos Estados- Membros;

(g) competência jurídico-internacional, que lhe dá um papel-chave no respeitante às relações externas da União e à conclusão de acordos internacionais em que esta seja parte (ver infra, § 3.º, 4.).

3.3. Funcionamento

3.3.1. O Conselho reúne-se por convocação do seu presidente, por iniciativa deste, de um dos seus membros ou da Comissão. Esta é convidada a participar nas reuniões do Conselho, que pode, contudo, deliberar sem a presença dela (artigo 5.º n.º 2, do regulamento interno).

A ordem do dia das reuniões divide-se em duas partes, A e B. Na parte A são inscritos os pontos susceptíveis de aprovação pelo Conselho sem debate, designadamente por o consenso ou a maioria requeridos para tal aprovação já terem sido alcançados a nível do Coreper, instância preparatória dos trabalhos do Conselho (ver infra, 3.3.4.). Tal não exclui a possibilidade de cada um dos membros do Conselho ou a Comissão exprimirem a sua opinião na altura da aprovação desses pontos e de fazerem exarar declarações em acta.

Além disso, se de uma tomada de posição a respeito de um ponto A puder decorrer um novo debate, ou se um membro do Conselho ou a Comissão o solicitarem, esse ponto será retirado da ordem do dia, salvo decisão em contrário do Conselho (artigo 3.º, n.º 6 e n.º 8). Estas disposições destinam-se a garantir a efectividade do poder decisório do Conselho e a sua não transferência de facto para as instâncias preparatórias dos seus trabalhos.

Seja como for, na prática, cerca de 85% dos actos do Conselho alcançam o necessário acordo no âmbito do Coreper e apenas são submetidos a uma das formações daquele órgão para efeitos de mera ratificação.

3.3.2. A presidência do Conselho é exercida sucessivamente por cada Estado- Membro, durante um período de seis meses, pela ordem fixada pelo Conselho (Decisão de 1-1-2007). O primeiro dos novos Estados-Membros a exercer a presidência do Conselho é a Eslovénia, no primeiro semestre de 2008, logo a seguir a Portugal. À presidência cabe a responsabilidade política geral pela gestão das actividades do Conselho.

A acção de cada presidência é enquadrada por um programa estratégico trienal, aprovado pelo Conselho Europeu. Relativamente a cada período de dezoito meses, as três presidências que irão exercer funções, em estreita cooperação com a Comissão e depois de efectuadas as consultas adequadas, elaboram um projecto de programa das actividades do Conselho para esse período, a avalizar pelo Conselho “Assuntos Gerais e

Relações Externas” (artigo 2.º, n.º 4, do regulamento interno). Isto significa que actualmente as presidências semestrais deixaram de poder determinar autonomamente o seu próprio programa.

3.3.3. Em princípio, as reuniões do Conselho não são públicas. O artigo 8.º, n.º 1, do regulamento interno estabelece, todavia, o princípio da abertura ao público das deliberações do Conselho sobre actos legislativos a aprovar em procedimento de co-

decisão (ver infra, § 2.º, 1.5.), através (a) da transmissão pública por meios audiovisuais

(nomeadamente numa sala de escuta) e (b) da difusão em todas as línguas oficiais da instituições da União por videofluxo.

Para além de tais deliberações, são igualmente públicos, em princípio: (a) a primeira deliberação do Conselho sobre novas proposta legislativas importantes a aprovar, não em procedimento de co-decisão, mas, por exemplo, em procedimento de consulta prévia ao PE (ver infra, § 2.º, 1.4.); (b) os debates do Conselho sobre assuntos importantes de interesse para a União e os seus cidadãos; (c) os debates do Conselho subsequentes à apresentação, pela Comissão, do seu programa quinquenal, dos seus programas de trabalho anuais e da sua estratégia política anual (artigo 8.º, n.ºs 2, 3 e 4, do regulamento interno).

Por outro lado, sempre que o Conselho actuar no exercício da sua competência legislativa (adoptando regulamentos, directivas, decisões-quadro ou decisões), os resultados das votações e as declarações de voto dos seus membros, bem como as declarações exaradas na acta e os pontos dessa acta relativos à aprovação de actos legislativos, são tornados públicos. Em contrapartida, quando o Conselho actua no âmbito do II Pilar, os resultados das votações só são tornados públicos mediante decisão unânime nesse sentido (artigo 9.º do regulamento interno).

3.3.4. Entre as instâncias preparatórias dos trabalhos do Conselho pontifica, como já se referiu, o Coreper, comité composto pelos representantes permanentes (embaixadores) dos Estados-Membros junto da União. O Coreper exerce os mandatos que o Conselho lhe confia, podendo adoptar decisões de natureza processual, mas nunca actos jurídicos com eficácia externa (acórdão de 19-3-1996, Comissão/Conselho, C- 25/94). Cabe ao Coreper a missão de zelar pela coerência da acção dos cerca de 250 comités e grupos de trabalho especializados, criados para exercerem funções de

peritos das administrações nacionais. Através destes grupos de trabalho, cujo funcionamento assenta na negociação entre os seus membros, as administrações públicas dos Estados-Membros acabam por desempenhar um papel de relevo no sistema político da UE.

Nos termos do Anexo V, n.º 1, do regulamento interno, a presidência do Conselho “certifica-se de que os grupos ou comités só transmitem dossiês ao Coreper quando existam perspectivas razoáveis de progresso ou de clarificação das posições a esse nível. Por outro lado, os dossiês só são reenviados a um grupo de trabalho ou a um comité quando necessário e, em todo o caso, apenas se forem acompanhados de um mandato no sentido de serem tratados problemas precisos e bem definidos”.

O Conselho é assistido pelo Secretariado-Geral, instância colocada na dependência de um Secretário-Geral, Alto Representante para a política externa e de segurança comum, nomeado pelo Conselho. É ao Secretário-Geral Adjunto que cabe a gestão do Secretariado-Geral, associado estreitamente e de forma permanente à organização, à coordenação e ao controlo da coerência dos trabalhos do Conselho e à execução do seu programa anual.

3.4. Em especial, o sistema de votação no Conselho

As votações no Conselho conhecem três modalidades: (a) por maioria dos seus membros (excepcional), (b) por unanimidade, não prejudicada pela abstenção dos membros presentes ou representados, (c) por maioria qualificada, a partir dos votos diferentemente ponderados dos Estados-Membros.

No I Pilar, a votação por maioria qualificada tende a tornar-se a regra, ficando a unanimidade reservada para questões de natureza constitucional (ver, por exemplo, artigos 202.º, 222.º, 279.º e 290.º do TCE), ou para matérias em que os Estados- Membros se reservam um direito de veto, dada a sensibilidade política das mesmas (ver, por exemplo, artigos 42.º, 93.º e 269.º do TCE). Em contrapartida, no âmbito do II e do III Pilares a regra é, antes, a votação por unanimidade no Conselho, sendo a excepção as decisões tomadas por maioria qualificada.

Nos termos do artigo 205.º, n.º 2, do TCE, a ponderação de votos no Conselho a 27 é a seguinte: à Alemanha, ao Reino Unido, à França e à Itália cabem 29 votos, à Espanha e à Polónia 27, à Roménia 14, aos Países Baixos 13, à Grécia, à República Checa, à Bélgica, à Hungria e a Portugal 12, à Suécia, à Áustria e à Bulgária 10, à

Dinamarca, à Eslováquia, à Finlândia, à Irlanda e à Lituânia 7, à Letónia, à Eslovénia, à Estónia, a Chipre e ao Luxemburgo 4, e a Malta 3 votos (num total de 345).

Os actos sobre que o Conselho deva deliberar mediante proposta da Comissão carecem de 255 votos (73,9% do total) a favor por parte da maioria dos seus membros para serem aprovados. A minoria de bloqueio forma-se com 91 votos contra. Os actos que o Conselho pode aprovar sem proposta da Comissão carecem do mesmo número de votos a favor por parte de, pelo menos, dois terços dos seus membros. Sempre que uma decisão deva ser aprovada pelo Conselho por maioria qualificada, qualquer dos seus membros pode solicitar a verificação de que tal maioria é constituída pelos votos dos Estados-Membros cujas populações representem, pelo menos, 62% da população total da União. Não sendo esse o caso, a decisão não é aprovada.

Esta percentagem é calculada de acordo com os números de população constantes do artigo 1.º do anexo III do Regulamento Interno, adaptados pelo Conselho, com efeitos a contar de 1 de Janeiro de cada ano, de acordo com os dados disponíveis no Serviço de Estatística da UE em 30 de Setembro do ano anterior. Em 2008, o limiar de 62% corresponde a uma população de 306 964,4 num total de 495 103,9.

Os quatro Estados-Membros grandes (Alemanha: 82 314,9; França: 63 392,1; Reino Unido: 60 823,8; Itália: 59 131,3) vêem assim reforçado o seu peso em termos de votos no procedimento de decisão por maioria qualificada no Conselho, invertendo a anterior evolução no sentido da perda de peso relativo face ao número de votos necessário para aprovar ou bloquear uma tal decisão. Juntos poderão bloquear a tomada de qualquer decisão por maioria qualificada, assim como o poderão três deles, juntamente com qualquer outro Estado-Membro, excepto o que dispõe de menos votos (Malta). Em contrapartida, já serão necessários os votos em contrário de pelo menos oito Estados-Membros de média dimensão (entre 14 e 10 votos) para se formar uma minoria de bloqueio.

Actualmente, os votos atribuídos a cada Estado-Membro no Conselho procuram exprimir mais fielmente o respectivo peso demográfico, de acordo com um princípio geral de representatividade tendencialmente orientado pelo princípio “one man, one

vote”. Todavia, tal só fará pleno sentido se a União se puder caracterizar menos como

uma associação de Estados do que como uma nova comunidade política cuja legitimidade de base provenha directamente dos seus cidadãos. Como é a primeira caracterização que continua a ajustar-se indubitavelmente à UE, não é de estranhar que

vezes “melhor representado” no Conselho do que o mais populoso (Alemanha: 29 votos e 82 314,9 habitantes), nem que Portugal, com 12 votos e 10 599,1 habitantes, esteja três vezes “melhor representado”, naquela acepção, do que o Reino Unido, com 29 votos e 60 823,8 habitantes.

Neste contexto, é ainda de salientar que, mesmo nos domínios em que o TCE prevê que o Conselho pode deliberar por maioria qualificada, entre 75% e 85% dos diplomas neles aprovados são-no por unanimidade. Isto comprova que uma das características políticas fundamentais do Conselho continua a ser a propensão para evitar confrontos entre os seus membros, sendo as oposições insuperáveis no seu seio bastante raras até à data.

No documento uniao europeia (páginas 41-47)