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O procedimento orçamental

No documento uniao europeia (páginas 82-87)

Os procedimentos decisórios

3. O procedimento orçamental

No quadro do procedimento orçamental desencadeado para cada ano financeiro, é fundamental a distinção entre despesas obrigatórias e despesas não obrigatórias. A aprovação definitiva das primeiras é da competência exclusiva do Conselho e a das segundas, da competência exclusiva do PE, embora no respeito dos limites máximos do quadro financeiro plurianual em vigor, para toda a duração dos mesmo (acordo interinstitucional de 17-5-2006, ponto 13).

Nos termos do ponto 34 deste acordo são consideradas despesas obrigatórias as “que decorrem obrigatoriamente dos Tratados ou dos actos aprovados por força destes”.

O Anexo III (“Classificação das Despesas”) qualifica genericamente como

despesas não obrigatórias as relativas a cinco das seis rubricas que compõem o Quadro

Financeiro 2007-2013, constante do Anexo I do acordo interinstitucional em análise, a saber: (1) crescimento sustentável (382.139 milhões de euros); (2) preservação e gestão dos recursos naturais (371.344 milhões de euros); (3) cidadania, liberdade, segurança e justiça (10.770 milhões de euros); (4) a UE enquanto agente mundial (49.463 milhões de euros) e (5) administração (49.800 milhões de euros).

São classificadas como despesas obrigatórias, para além das compensações (rubrica 6, no montante de 800 milhões de euros), (1) as despesas da política agrícola comum relativas às medidas de mercado e às ajudas directas, incluindo as medidas de mercado para a pesca e os acordos de pesca celebrados com terceiros (incluídas na rubrica 2); (2) as despesas resultantes de acordos internacionais celebrados pela UE com países terceiros, as contribuições para organizações ou instituições internacionais e as contribuições de aprovisionamento para o fundo de garantia dos empréstimos (incluídas na rubrica 4); (3) as despesas com pensões e subsídios de cessação de funções na UE, com indemnizações por danos e as despesas de contencioso (incluídas na rubrica 5).

As divergências entre o Conselho e o PE – os “dois ramos da autoridade orçamental” da UE – quanto à delimitação das despesas não obrigatórias relativamente às despesas obrigatórias são objecto de um processo interinstitucional de concertação, em que também participa a Comissão Europeia, devendo ser resolvidas nesse âmbito (acórdão de 3-7-1986, Conselho/Parlamento, 34/86). Actualmente, tal processo vem previsto na Parte C. do Anexo II do acordo interinstitucional de 17-5-2006.

3.2.1. O procedimento orçamental previsto no artigo 272.º do TCE, repousa essencialmente sobre o diálogo interinstitucional. No quadro deste diálogo, prevalecem os mesmos deveres recíprocos de cooperação leal que regem as relações entre os Estados-Membros e as instituições comunitárias (acórdão de 27-9-1988, Grécia/Conselho, 204/86).

O procedimento orçamental inicia-se com a fixação, pela Comissão, de uma taxa máxima de aumento das despesas não obrigatórias, no respeito pelo quadro financeiro plurianual em vigor, antes de 1 de Maio de cada ano financeiro, e com a sua transmissão a todas as instituições da União. Essa “taxa máxima” constituirá o limite para o aumento das despesas não obrigatórias em relação às despesas da mesma natureza constantes do orçamento anterior.

Quando o PE, o Conselho ou a Comissão entenderem que as actividades da União exigem que se ultrapasse a taxa máxima, poderá ser estabelecida uma nova, por acordo entre o Conselho, deliberando por maioria qualificada, e o PE, deliberando por maioria dos membros que o compõem e três quintos dos votos expressos. Não está estabelecido qualquer critério para a fixação da nova taxa. Basta que o Conselho e o Parlamento cheguem a acordo quanto a ela, acordo esse que não pode ser inferido com base na vontade presumida de uma ou outra destas instituições.

Só pode existir acordo sobre a taxa máxima de aumento se o PE e o Conselho tiverem chegado a acordo sobre o montante global das despesas que devem ser qualificadas como não obrigatórias. Com efeito, é este montante que constitui a base do cálculo da taxa máxima de aumento das despesas não obrigatórias (acórdão de 7-12- 1995, Conselho/Parlamento, C-41/95).

3.2.2. Na sequência da fixação da taxa máxima, cada uma das instituições elabora, antes de 1 de Julho, uma previsão das suas despesas. A Comissão reúne essas previsões num anteprojecto de orçamento a apresentar antes de 1 de Setembro. Este não constitui uma proposta na acepção do artigo 250.º do Tratado, o que tem por consequência que (a) o Conselho pode alterar o anteprojecto por maioria qualificada e (b) a aprovação do projecto de orçamento pelo Conselho carece, no mínimo de 255, votos que exprimam a votação favorável de, pelo menos, dois terços dos seus membros (dezoito), por força do artigo 205.º, n.º 2, segundo travessão, do TCE, na redacção que lhe foi dada pelo Acto de Adesão de 2005.

O Conselho apresenta o seu projecto de orçamento ao PE antes de 5 de Outubro. Em primeira leitura, o PE, no prazo de 45 dias, pode: (a) aprovar o projecto, por maioria dos votos expressos, ou simplesmente não votar qualquer alteração, casos em que o orçamento se terá por definitivamente aprovado; (b) alterar, por maioria dos membros que o compõem, as despesas não obrigatórias dentro do limite máximo fixado, e/ou propor, por maioria dos votos expressos, modificações às despesas obrigatórias, voltando nesses casos o projecto ao Conselho.

Este, no prazo de 15 dias, pode: (a) aceitar todas as alterações e propostas do Parlamento, hipótese em que o orçamento se terá por definitivamente aprovado, (b) rejeitar, por maioria qualificada, as propostas de alteração do Parlamento em matéria de despesas obrigatórias, caso em que se considera terminado o processo no que respeita a tais despesas, (c) modificar, por maioria qualificada, as alterações aprovadas pelo Parlamento em matéria de despesas não obrigatórias, hipótese em que o projecto deverá voltar a esta última instituição.

Neste caso, o PE pode, no prazo de 15 dias: (a) nada decidir, hipótese em que o orçamento se considera definitivamente aprovado; (b) rejeitar ou alterar as propostas do Conselho em matéria de despesas não obrigatórias, por maioria do seus membros e três quintos dos votos expressos, aprovando definitivamente o orçamento; (c) “por motivo importante”, rejeitar o projecto de orçamento, por maioria dos membros que o compõem e de dois terços dos votos expressos, requerendo que lhe seja submetido um novo. Nos dois primeiros casos, “o Presidente do Parlamento Europeu declarará verificado que o orçamento se encontra definitivamente aprovado” (artigo 272.º, n.º 7).

Tal como o precisa a jurisprudência do TJ, resulta do segundo parágrafo do n.º 4 e dos n.ºs 5 e 6 do artigo 272.º que o Parlamento Europeu pode alterar o orçamento no que respeita às despesas não obrigatórias, que o Conselho pode modificar cada uma dessas alterações, mas que o Parlamento pode, no decurso da segunda leitura do projecto de orçamento modificado pelo Conselho, alterar ou rejeitar as modificações introduzidas pelo Conselho relativamente às primeiras alterações, desde que não ultrapasse unilateralmente a taxa máxima de aumento das despesas não obrigatórias sem ter chegado a acordo com o Conselho quanto ao valor da nova taxa máxima. Enquanto tal acordo essencial não for expressamente firmado, o procedimento orçamental não pode considerar-se concluído. Ao invés, no que respeita às despesas obrigatórias, o Parlamento já não pode, na segunda leitura, pôr em causa a posição que o Conselho

tenha tomado em relação às propostas de alteração feitas pelo Parlamento no decorrer da primeira leitura (acórdão do TJ de 3-7-1986, Conselho/Parlamento, 34/86).

3.2.3. O Tratado de Lisboa vem qualificar como procedimento legislativo especial o procedimento de elaboração do orçamento anual da UE, cujas particularidades são as seguintes: (a) a distinção entre despesas obrigatórias e despesas não obrigatórias e suprimida; (b) o poder de alteração do PE fica limitado pelo quadro financeiro plurianual; (c) há lugar à intervenção de um comité de conciliação, à semelhança do procedimento legislativo ordinário, em caso de desacordo do Conselho relativamente às alterações do PE; (d) se no prazo de vinte e um dias o comité de conciliação não chegar a acordo, a Comissão deve apresentar um novo projecto de orçamento (novo artigo 314.º do TCE).

A qualificação do procedimento orçamental como um “processo legislativo especial” não se afigura coerente com o disposto no novo artigo 14.º n.º 1, do TUE, que distingue expressamente entre função legislativa e função orçamental.

3.4. A execução do orçamento comunitário. ─ A Comissão é o órgão

responsável pela execução orçamental. A sua competência para executar o orçamento da União não é susceptível de alterar a repartição de poderes que resulta do artigo 202.º, terceiro travessão, e 211.º, último travessão.

O Conselho pode, ao abrigo da primeira disposição, delegar na Comissão a competência, de que é titular, para adoptar actos executivos de alcance individual, que normalmente implicam autorização de despesas – que é da competência da Comissão. Mas tais actos executivos deve distinguir-se desta autorização. O facto de a Comissão ter competência para autorizar a despesa implicada por um determinado acto administrativo não significa que possa praticar este acto sem o enquadramento constituído pelo procedimento da comitologia (acórdão de 24-10-1989, Comissão/Conselho, 16/88).

Por força do acordo interinstitucional de 17 de Maio de 2006, a execução das dotações inscritas no orçamento para qualquer acção comunitária requer em princípio a adopção prévia de um acto de base, isto é, de um acto legislativo de direito derivado que cria a base jurídica para a acção comunitária e a execução da despesa correspondente inscrita no orçamento. Esse acto deve revestir a forma de regulamento, directiva ou

destinadas ao funcionamento de cada instituição, ao abrigo da sua autonomia administrativa.

Por outro lado, por imposição do artigo 270.º é vedado à Comissão apresentar propostas de actos comunitários, alterar as suas propostas ou adoptar medidas de execução susceptíveis de ter uma incidência sensível no orçamento, sem dar a garantia de que essas propostas ou medidas podem ser financiadas nos limites dos recursos próprios da União.

Finalmente, a quitação (aprovação da conta de gestão apresentada pela Comissão) compete ao PE, com a assistência do Tribunal de Contas, e deve ser dada até 30 de Abril do ano seguinte ao da execução orçamental.

No documento uniao europeia (páginas 82-87)