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O contexto específico da formação do gestor escolar: tendências e práticas

CAPÍTULO I A FORMAÇÃO DE GESTORES ESCOLARES NO BRASIL: DOS

1.6 O contexto específico da formação do gestor escolar: tendências e práticas

A formação de gestores escolares, tanto inicial como continuada, como já mencionado, insere-se no contexto maior da formação de professores para a educação básica e dessa forma reflete nos campos epistemológico, científico e profissional as contradições, tensões e embates em torno de projetos e concepções de formação.

As políticas de formação de professores, gestores e demais profissionais da educação, principalmente após a aprovação da LDB, vem-se caracterizando pela oferta de cursos de formação em serviço, também chamados de treinamento, capacitações, atualizações e certificações. Nesses cursos ou programas de formação é cada vez mais presente a utilização dos recursos e tecnologias da educação a distância.

A formação em serviço vem sendo utilizada pelos sistemas de ensino como a principal estratégia de formação de professores, tanto na formação inicial como continuada, principalmente nos cursos de formação de professores leigos. Veiga (2003), relaciona à formação em serviço a idéia de praticidade, podendo ser compreendida como formação de executores do ensino efetivo, correndo-se o risco de substituir a sólida fundamentação teórica pelo ativismo em sala de aula e outras atividades não- docentes.

Segundo Brzezinski (2008), nos dez anos da atual LDB e no contexto da política de universalização do acesso ao ensino fundamental, “o Ministério da Educação tornou- se ‘pedagogo’ do ‘treinamento em serviço’ de professores”. Esta afirmação é confirmada pela autora pelo incentivo e implementação por parte do MEC a programas de capacitação em serviço para leigos atuantes na educação básica, organização e distribuição de Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN) e a estratégia do MEC de

capacitação dos professores para o uso desses documentos oficiais, via programas como os Parâmetros em Ação e Rede de Formação.

Para efeitos desta pesquisa, a formação do gestor escolar precisa ser analisada e discutida no contexto maior das discussões e lutas que têm sido travadas pelos movimentos de educadores na defesa de uma formação global, unitária e de caráter sócio-histórico para todos os profissionais da educação, como já discutido, considerando-se também a forma como o Estado brasileiro reponde a essas demandas, formulando e implementando políticas de formação.

Nesse contexto a Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), que tem aglutinado as lutas do movimento dos educadores em defesa de uma formação para os profissionais da educação, sob bases sólidas e consistentes e numa perspectiva histórico-social destes profissionais, defende a docência como base de formação para todos os profissionais da educação. A entidade defende também uma Base Comum Nacional na formação dos profissionais da educação, integrada a uma formação específica para as diversas áreas de atuação. A ANFOPE ressalta que:

A base comum nacional dos Cursos de Formação de Educadores não deve ser concebida como um currículo mínimo ou um elenco de disciplinas e sim como uma concepção básica de formação do educador e a definição de um corpo de conhecimento fundamental. Todas as licenciaturas (pedagogia e demais licenciaturas) deverão ter uma base comum: são todos professores. A docência constitui a base da identidade profissional de todo educador. (ANFOPE, 2004, p. 10).

No que tange aos contornos e desdobramentos específicos das políticas e programas direcionados à formação do gestor escolar nos últimos anos, além dos problemas e desafios que caracterizam a formação de professores, temos as mudanças e transformações que vem ocorrendo no âmbito da gestão.

A gestão educacional encontra-se na ordem do dia na agenda das políticas e ações governamentais para a educação, especialmente no nível básico, sendo prioritária nas reformas educacionais empreendidas nos últimos anos, num movimento de âmbito mundial. Ao analisar esse movimento mundial que prioriza a gestão educacional, especialmente na educação básica, Fonseca; Oliveira e Toschi (2004) traçam um cenário em que:

São recorrentes os apelos à eficiência e à eficácia do sistema educacional e, particularmente, da escola; as instituições públicas são exortadas a trilhar

novos caminhos organizacionais, na linha da “autogestão” e que as aproximem das suas congêneres do setor privado; multiplicam-se as propostas de avaliação do desempenho escolar, medido pelo rendimento dos alunos em testes padronizados; professores são estimulados a participar de atividades que não se limitem à sala de aula, mas que se destinem à própria organização da escola como um todo (FONSECA; OLIVEIRA e TOSCHI, 2004, p. 53).

Os autores acima referidos também asseguram que “a gestão educacional pode incorporar diferentes sentidos ideológicos, que induzem a diferentes práticas, dependendo da matriz teórica que a fundamenta”. Nessa linha de pensamento, Dourado (2007) situa a gestão da educação como uma temática com várias perspectivas, concepções e cenários complexos em disputa. O autor analisa a formação docente no contexto da gestão educacional afirmando que:

[...] a problematização das condições de formação e profissionalização docentes coloca-se como questão interligada à gestão educacional e, nesse sentido, deve considerar os diferentes fatores que interferem na atuação dos profissionais da educação, bem como possibilitar o acesso a processos formativos que não descurem de uma base sólida de formação, não se reduzindo à disseminação de metodologias e estratégias de aprendizagem (DOURADO, 2007, p. 924).

No contexto da educação brasileira a gestão da educação básica encontra-se atualmente fortemente marcada por novos marcos regulatórios, pelo estabelecimento de parâmetros, diretrizes e formulação centralizada de políticas, projetos e programas sob a responsabilidade da União e execução descentralizada por estados e municípios. Nesse cenário temos ainda as diretrizes e orientações das secretarias estaduais e municipais de educação voltadas para a gestão escolar, com grandes repercussões no trabalho e na formação dos gestores escolares.

A formação do gestor escolar, considerada como estratégica para materializar no chão da escola as novas propostas e paradigmas de organização e de gestão escolar, de modo geral, expressa às tendências e concepções hegemônicas no campo da gestão. Destaca-se que principalmente a formação continuada é vista como uma das estratégias para a disseminação dos novos modelos e paradigmas de gestão.

Importante destacar também que a formação do dirigente escolar não é um tema pacificado nos meios educacionais, existindo uma grande polêmica sobre o mesmo. De um lado aqueles que defendem a necessidade de formação específica em gestão, que proporcione uma base de conhecimentos teórico-práticos sobre o campo da gestão educacional e escolar e de outro, aqueles que relativizam a necessidade de formação específica para a gestão escolar. Souza (2008) confirma o exposto acima, afirmando que

“ainda há uma grande controvérsia sobre a formação inicial e continuada dos profissionais que atuam na função de dirigente escolar e educacional”.

Muitas têm sido as experiências de formação de gestores escolares oferecidas pelos sistemas de ensino, porém estas formações caracterizam-se na maioria das vezes por programas de formação aligeirada, ações pontuais e específicas, com poucos impactos na melhoria das práticas de gestão e conseqüentemente do ensino oferecido nas escolas. Isto pode levar a conclusões como afirma Lück (2000), de que:

[...] a formação básica dos dirigentes escolares não se assenta sobre essa área específica de atuação e que, mesmo quando estes profissionais a têm, ela tende a ser livresca e conceitual, uma vez que esta é, em geral, a característica dos cursos superiores na área social. (LÜCK, 2000, p. 29)

As práticas de formação de gestores escolares ainda são caracterizadas pela falta de articulação com as políticas de gestão num contexto em que “as políticas e as práticas nem sempre caminham de mãos dadas” como afirma Vieira (2008). Para esta autora:

O problema [...] em questão é a cisão entre as políticas, as práticas de gestão escolar e a formação de educadores. Muitas vezes esses são mundos que não se encontram, gerando descompassos com graves repercussões sobre a qualidade da escola (VIEIRA, 2008, p. 02).

Aragão (2009), em pesquisa sobre os resultados obtidos pela rede pública de ensino do estado da Bahia na formação continuada e em serviço de gestores escolares, afirma que:

Nesta seara pública como em outras, os modelos de formação quanto às práticas administrativas dos gestores da rede pública estadual e municipal de educação básica, pautaram-se mais pela improvisação teórica e o empirismo burocrático daqueles profissionais mais identificados com os interesses políticos dos grupos que detêm o poder regional e local.

A transformação do diretor de escola em gestor de unidade de ensino vem sendo realizada por pacotes ou kits de formação e de aperfeiçoamento desses profissionais, com aporte financeiro do MEC mediante alguns projetos e programas, como o PDDE, PDE – Escola e outros, que têm se transformados em autênticos mecanismos de sedução nacional e regional (ARAGÃO, 2009, p. 6).

De acordo com Aragão (2009), nos programas de formação de gestores escolares aspectos pedagógicos e de qualificação acadêmica foram e são relegados a planos

secundários pelas autoridades dos sistemas de ensino (em quaisquer das três esferas do poder público), num flagrante desrespeito ao que apregoam as leis acerca da organização dos diversos sistemas educativos.

Para Medeiros (2007), muitas dessas políticas de formação estão sendo construídas na perspectiva da Qualidade Total, referenciada na competição, no individualismo e na classificação, lógica imperativa do neoliberalismo. Para a autora faz-se necessário e urgente a formulação e implementação de políticas públicas de formação continuada para diretores escolares, tendo a qualidade social como eixo norteador das ações de formação e a escola como espaço público de formação para a cidadania.

Dessa forma, com base no referencial teórico analisado, tem-se um quadro com as principais tendências e práticas que vem assumindo as propostas/cursos de formação de gestores escolares. O contexto esboçado evidencia uma grande centralidade da formação continuada em serviço por meio da educação a distância. Esse cenário ainda é permeado pela a complexidade e diversidade de contextos políticos e institucionais, loci formativos diversos e as características do Pacto Federativo, com a autonomia dos entes federados. Dessa forma, com as diferentes formas de provimento ao cargo de diretor em vigência no Brasil, a realidade da formação desses profissionais constitui-se num grande desafio e também um imperativo para as políticas públicas e os sistemas de ensino.

É nesse quadro sócio-político complexo e diversificado que foi lançado em 2005 o Programa Nacional Escola de Gestores da Educação Básica, que será explorado na cessão seguinte.

1.7 O PROGRAMA ESCOLA DE GESTORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA COMO