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O desenvolvimento dos sistemas de acreditação e a educação ao longo da vida na

CAPÍTULO 1 O CONTEXTO INTERNACIONAL ACERCA DA AVALIAÇÃO E

1.2 O desenvolvimento de propostas e metodologias de avaliação para a educação de adultos

1.2.5 O desenvolvimento dos sistemas de acreditação e a educação ao longo da vida na

Além das formas convencionais de certificação por meio de exames, a partir das últimas duas décadas do século XX, tem-se a possibilidade de certificar saberes de jovens e adultos que foram adquiridos por meio da experiência pessoal ou profissional, de modo que se possam reconhecer socialmente as competências dos sujeitos para realizar várias tarefas. Ainda que o nosso foco seja a análise das propostas de certificação por meio de exames padronizados, faremos menção a essa estratégia de certificação, que recebeu especial atenção no continente europeu e pode configurar-se como uma via paralela ou mesmo complementar àquela dos exames.

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Nas recomendações da Declaração de Hamburgo, documento produzido pela V CONFINTEA, em 1997, colocou-se a demanda de fortalecer e desenvolver os processos de validação e certificação de todas as formas de aprendizagem, quer dizer, também daquelas que não foram adquiridas no âmbito do sistema escolar (UNESCO, 2013, p. 268).

Essa preocupação e urgência em avançar na criação de metodologias que possibilitem certificar saberes está em consonância com o princípio de educação ao longo de toda a vida, também consolidado durante a V CONFINTEA.

Em 2000, a reunião da Comissão das Comunidades Europeias, ocorrida em Bruxelas, divulgou o documento Memorando sobre Aprendizagem ao Longo da Vida, que mais uma vez apresentou a necessidade de qualificação da mão de obra, contudo, dessa vez, fazendo referência à necessidade de revisão das formas de certificação do trabalhador.

Na economia do conhecimento, desenvolver e utilizar plenamente os recursos humanos constituem factores decisivos para manter a competitividade. Neste contexto, os diplomas, os certificados e as qualificações são um importante ponto de referência para empregadores e indivíduos no mercado de trabalho e nas empresas. A crescente procura de mão-de-obra qualificada por parte dos empregadores e a concorrência cada vez mais acentuada entre indivíduos para conseguir e manter um emprego estão a induzir uma procura muito mais acentuada de formação reconhecida. Como modernizar mais eficazmente os sistemas e as práticas de certificação nacionais face às novas condições económicas e sociais tornou-se uma questão política e profissional importante no conjunto da União. (COMISSÃO, 2000, 17).

A UNESCO, por meio do Instituto de Aprendizagem ao Longo da Vida (UIL) incorporou esta demanda, propondo-se a fomentar a criação de metodologias de acreditação e certificação de conhecimentos obtidos por meios não escolares. Escritórios da UNESCO de diversos países europeus passaram a se dedicar a estudos sobre processos de acreditação e certificação, dentre eles a Suécia, a Espanha, a Dinamarca e a Grécia.

Neste contexto, vale mencionar, em especial, o caso de Portugal, que durante o governo socialista de Jorge Sampaio (1996-2006) criou o sistema de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências (RVCC) no âmbito do qual foram organizados os cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), os quais eram oferecidos em centros públicos ou privados de educação, cooperativas ou centros de formação profissional. A partir de 2005 foi criada uma rede de cerca de 500 Centros de Novas Oportunidades, onde pessoas maiores de 18 anos com uma mínima experiência profissional de três anos podiam realizar a acreditação de suas aprendizagens prévias e

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frequentar os cursos de formação e receber orientação profissional. A perspectiva portuguesa estava dentro dos marcos estabelecidos pela União Europeia desde 2000, que pretendia aliar a elevação de escolaridade à qualificação profissional.

Quando um jovem ou adulto se encaminhava para um Centro de Novas Oportunidades, ocorria, primeiramente, uma etapa de acolhimento, sendo-lhe proporcionado um leque de possibilidades como percurso formativo. Em seguida, era realizado um diagnóstico do perfil do candidato, análise curricular e identificação das suas expectativas. Em seguida,

o encaminhamento concretiza a resposta formativa ou educativa que se coaduna com o perfil traçado. Existem várias hipóteses de encaminhamento, procedendo-se à ponderação e negociação entre as partes intervenientes – o adulto e a equipe técnico pedagógica do CNO, estando sob a responsabilidade do primeiro a tomada de decisão. A opção de encaminhamento para ofertas externas ao CNO subentende a emissão do Plano Pessoal de Qualificação (PPQ) operacionalizando-se a oferta escolhida, designadamente Cursos de Educação e Formação de Adultos (EFA), Cursos de Educação e Formação (CEF), Cursos Profissionais, Ensino Recorrente, entre outras. O encaminhamento para processo RVCC implica a definição de um percurso assente nos três eixos de actuação: Reconhecimento, Validação e Certificação. (INÁCIO, 2009, p. 9).

Em um estudo realizado por Licinio Lima e Paula Guimarães (2012) sobre a experiência portuguesa, foram realizadas entrevistas com egressos de um Centro de Novas Oportunidades, no qual foi possível identificar que esta estratégia poderia ser adequada para aqueles que deixaram a escola por diferentes razões e não tinham mais o desejo de retornar a uma escola convencional.

O RVCC [Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências] implicava, desta forma, uma mudança significativa nas representações dos sujeitos relativamente à educação e, em particular, ao ensino, nomeadamente “à escola de quando era crianças”. Exemplificativa desta motivação pela educação, formação e aprendizagem, já identificado noutros estudos, era o facto de muitos inquiridos, como foi afirmado, terem expressado o interesse em “continuar a estudar”, designadamente no caso daqueles que concluíam o 12º ano de escolaridade. Se alguns inquiridos ambicionavam um percurso escolar mais longo, muitos outros, em particular aqueles que só tinham concluído o 9º ano de escolaridade (ou um nível escolar inferior) revelavam eles também um maior interesse pelo conhecimento. Ora, relativamente ao impacto do RVCC na educação ao longo da vida, a maioria dos inquiridos (73,9%) referiu que, depois de concluído o processo, não se inscreveu em organizações de educação formal, como escolas, centros de formação ou em entidades do ensino superior. (LIMA; GUIMARÃES, 2012, p. 44).

Ainda com relação ao RVCC, foi realizada uma avaliação do programa entre 2009 e 2010 sob a coordenação do professor Roberto Carneiro, que indicou que o programa foi uma alternativa aos jovens e adultos que não podiam ou não desejavam frequentar uma escola regular convencional. No RVCC não se prevê aulas formais nem

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horários rígidos, sendo esse um atrativo para o público que procura a instituição. (PEREZ, 2011, p. 13).

Apesar de a iniciativa ter obtido uma avaliação positiva dos que participaram dos cursos e buscaram a certificação, constatou-se que o objetivo de ampliar a qualificação profissional de jovens e adultos dificilmente se realizava por meio dessa proposta. A pesquisa de Lima e Guimarães (2012) constatou que o sistema RVCC não contribuiu efetivamente para a mudança da situação profissional dos entrevistados.

Quando concluído o RVCC, 27,6% (110 sujeitos) dos inquiridos estavam na situação de desempregado. Destes, mais de metade (74 sujeitos) manteve-se nessa situação depois de concluir o processo, havendo contudo alguns inquiridos (32 sujeitos) que se empregaram. Circunstância idêntica leva Cavaco a afirmar que por esta via “registra-se um efeito de aproximação ao mercado de trabalho junto dos adultos desempregados e inativos” (CAVACO, 2009: 310). De notar que 63,6% (253 sujeitos) mantiveram o emprego que tinham quando iniciaram o processo, enquanto um pequeno número (9 sujeitos) mudou de emprego. (LIMA; GUIMARÃES, 2012, p. 50).

Coloca-se, assim, a fragilidade do programa, que inova na relação do sujeito adulto com a aprendizagem, melhorando a autoestima daqueles que frequentam os cursos, entretanto, não conseguiu ganhar força e legitimidade para alavancar os indivíduos do ponto de vista profissional.

As propostas de criação de sistemas de acreditação e certificação de saberes caminham na perspectiva da construção de um sistema flexível, em que os conhecimentos adquiridos por via formal, informal e não-formal são legitimados pelo Estado, apoiado na defesa de uma educação ao longo de toda a vida, isto é, em qualquer tempo e de qualquer forma, seja no âmbito acadêmico, pessoal ou profissional.

Esta forma de encarar o processo de certificação de adultos dialoga com a proposta de realização de exames nacionais para jovens e adultos, na medida em que reconhece que a escolaridade formal não é necessariamente o único caminho para se obter conhecimentos, e também no sentido de que ambas as formas reconhecem a necessidade de se constituir modelos flexíveis e apropriados para os adultos.

Entretanto, o sistema de acreditação de saberes, tal qual se organizou em Portugal, nas Ilhas Canárias e outras partes da Europa, é mais do que um processo de certificação, pois tem a intenção de oferecer um tipo de atendimento que possa redirecionar a formação acadêmica e profissional daqueles que procuram um caminho para alcançar uma certificação.

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CAPÍTULO 2 - O PROGRAMA CHILECALIFICA E A