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Estratégias narrativas de legitimação do porfirismo: um olhar através dos Discursos do presidente ao Congresso Nacional

Mapa 1 Estados do México século

4. O México silenciado: os indígenas vistos como a face do atraso

4.1. O discurso (seletivo) da cidadania e da homogeneidade nacional

O governo de Porfirio Díaz foi marcado por um projeto nacional fundado, dentre outras características, na imagem de união do povo. O objetivo era consolidar a ideia de que o país, a partir de 1876, estava integrado, nos trilhos do progresso e a caminho da felicidade, como vimos nos itens anteriores. Para criar e legitimar essa representação, também foi importante conceber uma memória histórica comum. A pluralidade de memórias étnicas da população perdeu, oficialmente, espaço diante dos objetivos do Estado105. No século XIX mexicano vários setores sociais possuíam ideias divergentes de nação. Segundo Enrique Florescano, o discurso de unidade nacional construído alijou uma multiplicidade de memórias históricas dos discursos oficiais.

105 “El Estado-nación, en lugar de aceptar la diversidad de la sociedad real, tiende a uniformarla mediante una legislación general, una administración central y un poder único. La primera exigencia del Estado- nación es entonces desaparecer la sociedad heterogénea y destruir los ‘cuerpos’, ‘culturas diferenciadas’, ‘etnias’ y ‘nacionalidades.’” (FLORESCANO, 2001, p. 561).

Para Díaz e a intelectualidade política que gravitava ao seu redor, dever-se-ia incentivar a “unidade” e a “homogeneidade nacional”, elementos que davam sustentação e validade ao Estado liberal. Estes dois conceitos também nortearam as políticas públicas do período. A celebração de uma memória histórica nacional e singular, uma educação universal e a eleição de uma língua comum, no caso, o espanhol, corroboravam com a cristalização desse discurso de homogeneidade106. Em discurso de 1887, durante a inauguração da Escola Normal para Professores do Ensino Primário, Joaquin Baranda afirmou que a educação iria garantir a unidade nacional. Para ele, era preciso “hacer de la instrucción el factor originario de la unidad nacional que los constituyentes de 57 estimaban como base de toda prosperidad y todo engrandecimiento.” (BARANDA, ed. 1985, p. 18). A nação tornou-se um dos principais sujeitos da história oitocentista e foi convertida em valor político central. Como reiterou Florescano,

Los gobiernos de fines del siglo XIX imprimieron en la población la imagen de un México integrado, la idea de un país sustentado en un pasado antiguo y glorioso, próspero en el presente y proyectado hacia el futuro. El nuevo canon de esta interpretación de la historia tenía como centro el Estado-nación, y como postulados el patriotismo, la defensa de la integridad de la nación y el culto a los principios de la república y a sus héroes fundadores. Era una concepción de historia cívica y laica cuyo objetivo principal era fortalecer la unidad política de la nación. (FLORESCANO, 2001, p. 563).

Vemos, a partir da citação supracitada, conceitos caros para o final do século XIX: o México deveria ser integrado e fortalecer essa imagem tanto para a população em geral, quanto para os outros países do continente e da Europa. Patriotismo também foi destacado e era considerado peça importante na garantia dessa integridade. Fortalecer esta unidade política foi um dos pontos nevrálgicos do discurso porfirista. O que problematizaremos um pouco mais abaixo será como essa proposta de unidade política e integração social foi excludente, seletiva. Daremos ênfase especificamente à questão indígena, tema regular em todos os discursos proferidos pelo primeiro magistrado ao Congresso. Se o México estava prenhe de futuro, o que deveria ser feito com o indígena, entendido à época como excesso de passado no presente?

Também é importante explicitar que a ideia de nação para os liberais significava, dentre outras características, a integração de indivíduos iguais perante as leis (e,

106 Sobre esse assunto ver QUIJADA, Mónica; BERNAND, Carmen; SCHNEIDER, Arnol. Homogeneidad

y Nación con un estudio de caso: Argentina siglos XIX y XX, Capítulo I, CSIC, Madrid, 2000, pp. 15-55, p.

principalmente, diante da Carta Magna). Como afirmamos, era um postulado básico do liberalismo clássico. No interior dessa concepção oficial, a sociedade não era entendida como conformada por grupos heterogêneos, marcados por diferenças estamentais, culturas plurais e divergentes, bem como tradições particulares – como, por exemplo, foi perceptível durante o período colonial –, mas por um conjunto de indivíduos que foram assumidos pelo Estado, a partir, principalmente, das esferas constitucional, narrativa e discursiva, como sujeitos iguais. A ênfase na modernidade pretendia consolidar o princípio de uma sociedade igualitária, homogênea, formada por indivíduos voluntariamente associados e respaldados pela soberania popular107. Como afirmou Fernando Escalante, prezava-se a “lealtad individual hacia las instituciones políticas, bajo la forma del Estado: sin mediaciones de linajes, vasallajes, gremios, comunidades o corporaciones. Fundamentación basada en alguna idea del Bien Común o del Interés público y la conciencia de un vínculo de solidaridad con el resto de los ciudadanos mediado por la Ley.” (ESCALANTE, 1992, p. 51). A heterogeneidade desafiava os projetos do Estado.

Existiu à época um esforço de se construir nações homogêneas simbolicamente unificadas, seja pela delimitação territorial, língua oficial, história nacional linear/progressiva, eleição de um arquétipo de sujeito nacional (o mestiço), cultura, cidadanização dos indivíduos, dentre vários outros elementos. Este fenômeno foi percebido e perseguido pelas elites de vários países nos séculos XIX e início do XX, tornando-se um imperativo irrenunciável108. Não podemos deixar de mencionar que uma das grandes preocupações neste momento não foi com Deus ou alguma figura metafísica,

107 Sobre o assunto ver: GUERRA, François-Xavier. Modernidad e independencias: ensayos sobre las revoluciones hispánicas. Madrid: Ediciones Encuentro, 2009.

Quijada também expressou o que entendia por modernidade em seus trabalhos, partindo, principalmente, das reflexões de Koselleck em Futuro Passado. A definição também nos ajuda a pensar o caso mexicano e as políticas de governo: “la visión actual de la modernidad, y la que más interesa a los fines de este trabajo, tiende a identificarla no tanto con el proceso secular así descrito, como con la precipitación de sus resultados en la última fase abarcada por dicha periodización. Desde esta perspectiva suele describirse a la modernidad como el producto de tres movimientos: la revolución del hombre ilustrado contra la tradición, la sujeción de la razón a la ley natural —es decir, la idea de que los seres humanos pertenecen a un mundo gobernado por leyes naturales que la razón descubre y a las que ella también está sometida—, y la secularización, que implica la sustitución de Dios por la sociedad como principio de juicio moral. Y abre el camino al pueblo, la nación, en tanto cuerpo social que funciona también según leyes naturales y que debe desprenderse de formas de organización y de dominio irracionales, como las defensas corporativas o la legitimación del poder por revelación divina. (QUIJADA, 2008, p. 22)

108 Os trabalhos de Quijada focam, principalmente, o caso argentino, mas suas ideias e propostas textuais nos ajudam a pensar a conjuntura mexicana, especialmente suas discussões teóricas sobre o tema cidadania e o paradigma da homogeneidade nacional. Respeitamos as especificidades do México. Consultar: QUIJADA, Mónica; BERNAND, Carmen; SCHNEIDER, Arnol. Homogeneidad y Nación con un estudio

mas com a nação, com o povo, que deveria ser civilizado, ilustrado, dotado de razão e juízo moral – princípios do evolucionismo spenceriano, amplamente lido à época. Como sintetizou Luiz Estevam de Oliveira Fernandes,

Ao tentar construir uma nação homogênea, em moldes europeus, nos quais um povo, uma raça única, habitava um território delimitado, compartilhando tradições, História e costumes, o liberalismo mexicano precisou forjar um consenso coletivo do qual a sobrevivência do país dependeria. (FERNANDES, 2012, p. 286).

Construir essa memória histórica comum da nação tornou-se um programa complexo e não foi uma tarefa específica do Porfiriato. Os vários grupos existentes no território estabeleceram diferentes relações com o passado, ressignificando-o e elaborando diversas maneiras de contar sua história. Foram criadas díspares representações narrativas e muitas vezes antagônicas. A partir, principalmente, da obra México a través de los siglos, publicada em 1884 sob a direção de Vicente Riva Palacio – também presidente do Congresso –, que se consolidou uma história oficial do país. Este projeto conseguiu abarcar pontos de vista e interpretações dos setores liberais e conservadores109. Os polígrafos e o governo se valiam da história e de mitos fundadores para construir a identidade nacional mexicana. Os eventos históricos e os discursos díspares foram integrados em uma narrativa nacional linear, progressiva e etapista, que atestava a evolução do México110.

Embora tenha realçado o respeito à soberania popular e à república democrática, o Porfiriato projetou essa imagem de um centro forte e solar, que irradiava poder para as outras localidades. Ao ler os discursos presidenciais, e nos fundamentando nas reflexões de Carlos Monsiváis, foi imaginada a ideia de que, no território, só havia duas regiões: a capital e as províncias. Díaz pretendia (assunto que desenvolveremos no Capítulo 2) que a Cidade do México fosse o lugar, por excelência, que concentrasse a vitalidade intelectual, política e administrativa de todo o México. Ela se tornaria o micromodelo do que se pretendia exibir da nação – moderna, progressista, pacífica. Além disto, existia

109 Sobre este assunto ver: FERNANDES, L. E. O. Patria mestiza: a invenção do passado nacional mexicano (séculos XVIII e XIX). Jundiaí: Editorial Paco, 2012.

110 Também lembramos aqui que, em 1983, Ernest Gellner estabeleceu em seu livro “Nação e nacionalismo” uma correlação entre os conceitos “homogeneidade” e “nacionalismo”. O primeiro foi uma das preocupações centrais dos Estados-nação, chave importante para se efetivar políticas de Estado que buscavam o desenvolvimento da identidade nacional. O regime de Díaz, cada vez mais personalista e com o poder centralizado na figura solar de Díaz, colocava-se como o regime legitimado e autorizado a construir essa representação homogênea, integrada e coerente do México.

outra figura solar, como vimos no tópico 2, a do presidente. Representado por escritores porfiristas como um herói nacional e hombre fuerte, para eles a nação necessitava de um grande líder que a guiasse pelo sendeiro do progresso, felicidade e civilização111. Citamos um trecho do discurso de Ramón Rodríguez Rivera, presidente do Congresso em 1887, que comprova nossas afirmações:

Señor Presidente: Diez años han transcurrido desde que, acatando la voluntad nacional, entrasteis por primera vez a regir los destinos de la Nación, y en este lapso de tiempo, cortísimo para la vida de los pueblos, la República se ha transformado por completo, como aparece del cuadro que habéis trazado al dar cuenta del estado actual de nuestro país. Reinan la paz, la seguridad y la confianza en el interior; las fuentes de riqueza pública, estancadas y paralizadas por la desconfianza y el temor, toman un vuelo extraordinario, removidas por el comercio, la agricultura, la industria y la minería, que han merecido de vos amparo y protección; despierta nuestra patria á nueva vida social, mercantil e intelectual, y no es ya México el punto obscuro, desconocido o despreciado en el mapa de la civilización. Continuad, pues, vuestra obra de patriotismo, y sabed que la Representación Nacional no perdonará esfuerzo alguno para coadyuvar en vuestros nobles propósitos, concurriendo con todos sus elementos al engrandecimiento y la felicidad de la República, bajo la influencia protectora de la paz, la libertad y del progreso.112

A citação de Rodríguez Rivera reitera a ideia de que o México se transformou por completo sob o governo de Díaz, discutido nos tópicos anteriores. Novamente vemos a criação de uma interpretação sobre o passado, o presente e o futuro de base linear, progressiva e processual, relacionando a revolução de Tuxtepec, a elevação de Díaz à primeira magistratura, a pacificação do país e a completa modernização/civilização deste. A harmonia entre os tempos, partindo da correlação entre “revolução”, “pacificação” e

111 Sobre polígrafos considerados porfiristas ver: REYES, Bernardo. El General Porfirio Díaz. Cidade do México: Editora Nacional, ed. 1960; SIERRA, Justo. México: su evolución social. Cidade do México: La Casa de España en México, ed. 1940; TWEEDIE, Alec. Mexico as I saw it. Michigan: Michigan University Library, ed. 2011; CREELMAN, James. Díaz, master of Mexico. Lexington: Cornell University Library, 2011, entre muitos outros. Falaremos sobre o assunto no Capítulo 2 da tese.

Não podemos esquecer dos periódicos porfiristas que circularam no período, não citados nesse capítulo. É importante deixar claro que não pretendemos afirmar que os autores supracitados possuíam obras e projetos políticos semelhantes; o escopo é informar como a mobilização e a apropriação do passado, para se posicionar no presente, ganhou dimensão e lugar de destaque também em seus escritos. Essa matriz interpretativa ficou conhecida como “porfirista”. Como sintetizou Garner: “El porfirismo pone de relieve, sobre todo, la longevidad del régimen, particularmente en contraste con sus predecesores en el México del siglo XIX, y su éxito al lograr una estabilidad y una paz políticas por un periodo de casi 35 años. El Porfirismo también enfatiza las cualidades personales que justifican que Díaz haya monopolizado el oficio de gobernar durante más de 30 años: inter alia, su patriotismo, su heroísmo, su dedicación, su sacrificio personal, su tenacidad y su valentía.” (GARNER, 2003, p. 14).

112 Respuesta del Presidente del Congreso, C. Ramón Rodríguez Rivera, abril de 1887, pp. 235-236. Rodríguez Rivera (1850-1889) foi médico e político mexicano. Foi várias vezes deputado local e federal pelo estado de Veracruz.

“modernização”, fortalecia o Porfiriato. Ao compararmos os documentos, percebemos que o conceito “pacificação” e “modernidade” ganharam destaque e maior proeminência ao longo dos anos. De fato, “revolução” desapareceu da linguagem política a partir, principalmente, de 1888, já que o porfirismo se considerava consolidado no poder (a revolução não mais condizia com a ordem e a paz que há todo o momento se buscava afirmar). Resgatando a querela entre passado e presente nacional, se antes as fontes de riqueza estavam paralisadas por causa do temor de tantos conflitos políticos, o presente era marcado pela paz, segurança, fiabilidade, liberdade e felicidade113. Juntamente com este progresso, a vida social também despertava e seu desenvolvimento intelectual engrandecera. Os câmbios foram tão significativos que a República já não estava mais desconhecida no mapa da civilização. A vontade nacional era a de que Díaz permanecesse no poder e, com tom imperativo, o Congresso reafirmou seu apoio, confiança e o mandou continuar sua obra de grande patriotismo.

Segundo Quijada, os processos de construção da identidade nacional na América hispânica foram caracterizados por dois fenômenos relacionados: a tentativa de sua homogeneização – o que a autora intitulou de “paradigma da homogeneidade”114 – e o entendimento da nação como sendo a união de cidadãos, identificados a partir de referências comuns. Ou seja, um aglomerado de indivíduos em um corpo coletivo coeso. O Estado-nação buscou uniformizar a sociedade sob uma história comum e integrada, bem como um corpo legislativo nacional. Entretanto, este processo de cidadanização não foi assimilacionista, operando como um fator de discriminação ao selecionar quem fazia ou não parte de sua esfera. Embora a implementação da cidadania tentasse eliminar a

113Para Tenorio Trillo, a liberdade mencionada nos discursos funcionou como sinônimo de paz: “los intelectuales mexicanos seguían los debates legales y filosóficos de la Tercera República francesa y proponían limitaciones constitucionales a un gobierno fuerte. La paz, sin embargo, era el mayor logro de México, como también la suprema libertad alcanzada: estar libre de la violencia e incertidumbre.” (TENORIO TRILLO, 1998, p. 18). Para estar livre dessa violência e incerteza que caracterizaram os governos anteriores ao Porfiriato, era preciso colaborar com o porfirismo, sendo um bom cidadão e não desacatando as medidas constitucionais. Como afirmou Díaz em 1887, “continúa libre y desembarazada la marcha de nuestras instituciones, a las que el pueblo mexicano demuestra cada día mayor apego, prestando al Gobierno su concurso eficaz para el sostenimiento de la Libertad y de la Reforma, que son ya la firme base de nuestro modo de ser político.”. Também percebemos nos discursos dos presidentes do Congresso em 1888 e 1889, Alfredo Chavero e Pedro Rincón Gallardo, já mencionados acima, a correlação de ideias entre pacificação e liberdade. Estes conceitos se tornavam cada vez mais recorrentes na documentação analisada e criavam a ideia de que o país não tinha conturbações: tudo caminhava bem rumo ao futuro idealizado.

114 Mónica Quijada utilizou a expressão “paradigma da homogeneidade” em QUIJADA, Mónica, BERNAND; Carmen; SCHNEIDER, Arnol. Homogeneidad y Nación con un estudio de caso: Argentina

siglos XIX y XX, Capítulo I, CSIC, Madrid, 2000. pp. 15-55. Falaremos ao longo do capítulo sobre suas

heterogeneidade cultural, nem todos os indivíduos foram reconhecidos como cidadãos. Nesse sentido, a homogeneidade também operou a partir da chave inclusão/exclusão, alijando seguimentos sociais que foram considerados inferiores do ponto de vista civilizacional. Como afirmou Moya, “liberales y conservadores, imperialistas y republicanos, monárquicos y detractores de todos los anteriores se convertirán, durante el Porfiriato, en ciudadanos. Estos ciudadanos, letrados o no, van a compartir una historia que al fin se ha unificado bajo la versión liberal de un proyecto de nación y que – en lo esencial – se deslinda de la versión predilecta de los conservadores.” (MOYA, 2007a, p. 160).

Se unidade, ordem, pacificação, integração e homogeneidade foram conceitos caros ao governo de Díaz, importantes para o progresso do país, sua antítese, ou seja, a heterogeneidade, anarquia, diversidade, desordem e desintegração passaram a ser sinônimos de atraso e, desta forma, excesso de passado nacional que deveria ser combatido. Por conseguinte, como mencionado no parágrafo acima, muitos elementos foram relevantes na construção dessa política de homogeneização, como a cidadania e o pensamento racialista (sobre o qual falaremos no subtópico 4.2). No interior dessa pretendida modernidade e construção da nacionalidade, a questão da cidadania foi uma preocupação central e os indígenas não se enquadravam nesse projeto moderno de México. O índio era a face do atraso. A cidadania era restringida e se limitava a certos setores sociais. Como afirmou Graciela Velázquez Delgado,

Este proceso de formación del Estado-nación dio pie al surgimiento o construcción de la ciudadanía, fundada esta última en la figura del ciudadano como único agente político habilitado para ejercer la soberanía al margen de las corporaciones de todo tipo, con lo cual se intentaba eliminar la diversidad cultural para homogeneizar a todos los individuos. (VELÁZQUEZ DELGADO, 2008, p. 44).

Falar em cidadania não é tarefa fácil. O conceito é polissêmico e pode, por exemplo, ser entendido como um conceito legal/constitucional, como um ideal político de igualdade, entre outros fatores. Além disso, ele é dinâmico e consegue assumir conotações diferentes de acordo com cada constituição. Se pensarmos, por exemplo, a Constitución de Apatzingan – que possuiu este nome, mas não teve a qualidade de Constituição propriamente, e sim de um decreto –, proferida por José María Morelos em 22 de outubro de 1814, percebemos que o objetivo explicitado no documento foi idealizar o princípio de ampla igualdade entre os cidadãos, sem distinções étnicas. A via de acesso

a este status foi o investimento do indivíduo para com a sua pátria, ou seja, ele deveria se esforçar e ser merecedor desta condição de cidadão mexicano. Como veremos abaixo, destacaram-se princípios de uma cidadania universal e igualitária, que foram perdendo sentido ao longo das décadas e nas constituições subsequentes. Citamos trechos da Constitución de Apatzingán,

Capitulo III - De los ciudadanos:

Art.13. Se reputan ciudadanos de esta América todos los nacidos en ella.

Art. 14. Los extranjeros radicados en este suelo que profesaren la religión católica, apostólica, romana, y no se opongan á la libertad de la nación, se reputarán también ciudadanos de ella, en virtud de carta de naturaleza que se les otorgará, y gozarán de los beneficios de la ley. Capítulo V - De la igualdad, seguridad, propiedad y libertad de los ciudadanos:

Art. 24. La felicidad del pueblo y de cada uno de los ciudadanos, consiste en el goce de la igualdad, seguridad, propiedad y libertad. La íntegra conservación de estos derechos es el objeto de la institución de los gobiernos y el único fin de las asociaciones políticas.

Art. 25. Ningún ciudadano podrá obtener más ventajas que las que haya merecido por servicios hechos al Estado. Estos no son títulos comunicables ni hereditarios; y así es contraria a la razón la idea de un hombre nacido legislador ó magistrado. (Constitución de Apatzingan, 1814, p. 48).115

Partindo das categorias usadas por Marta Irurozqui, observamos, a partir do trecho supracitado, um modelo de “cidadania cívica” – diferente do modelo que se concretizou

115 Felipe Tena Ramírez e Velázquez fizeram análises sobre o acesso à cidadania em cada Constituição do