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II. Revisão da literatura

2. Do espaço

2.4. O espaço desportivo

O desporto é, hoje, um espaço de coabitação de uma multiplicidade de práticas, conjugando-se no plural, e nesta circunstância, ultrapassa, em larga medida, a perspetiva reducionista da massa/elite ou do lazer/rendimento. Tornou-se, assim, uma oferta atraente, associada à cultura e ao tempo livre, à sua força simbólica tradicional e acrescentou outros sentidos (Bento, 1995).

Uma nova relação deve processar-se à luz da preocupação de uma qualificação humana e libertadora do tempo livre, tendo em atenção a dimensão que o desporto pode assumir neste domínio, num tempo de transição progressiva da sociedade do trabalho para a sociedade do trabalho, da cultura e do tempo livre (Bento, 1991).

Assim, a prática desportiva deve ser entendida como um benefício civilizacional, o que em grande medida se deve à democratização das

sociedades modernas. Permitindo, assim, criar condições para uma prática ao alcance de todos e não apenas como um privilégio reservado só a alguns. A democracia impõe que a igualdade de oportunidades de acesso ao desporto seja universal. E para o ser, é necessário que este cumpra a sua função eminentemente social, desenvolvendo um esforço de aproximação e de atração de todos os setores da população, principalmente os mais carenciados. (Ferreira, 2003).

Perante o que foi dito, pode concluir-se que é no contexto do urbanismo que devem ser criadas as condições e as oportunidades para um exercício pleno do direito ao desporto (Cunha, 2012; Ferreira, 2003).

Os equipamentos desportivos, especialmente os informais, têm de ser encarados como bens urbanos. Os vários agentes formadores devem garantir, no âmbito do equipamento social ou espaço exigido pela prática efetiva das atividades desportivas, que tanto o sistema educativo quanto o desportivo devem proporcionar aos jovens, de modo a que estes tenham acesso fácil e convidativo, numa prática habitual e frequente.

Desta forma, a definição de equipamento e espaço desportivo é passível de diferentes interpretações e tem sido utilizado de forma diversa. O mais comum é considerar que equipamento desportivo é uma instalação destinada à prática de desporto.

O desporto define e produz um espaço próprio, o local onde as práticas e as competições desportivas se desenvolvem (Cunha, 2007). As instalações desportivas sistematizam, assim, as práticas específicas num determinado espaço. Este caracteriza-se ainda pela construção concreta de um local para o desporto, cujo espaço é facilmente identificado, correspondendo a modelos mais ou menos bem definidos que se repetem de forma idêntica e uniforme, desde os mais convencionais (campos de futebol, piscinas, polidesportivos) aos mais singulares (campos de golf, canais de águas bravas, pistas de esqui).

Há autores que diferenciam claramente a existência de dois tipos de espaços desportivos: (i) espaço desportivo formal - vocacionado ou de utilização apenas desportiva: com áreas de competição bem definidas, espaço organizado, codificado, em que se encontram também definidos os espaços de trajeto e acessibilidades a manifestações e práticas desportivas em ambiente urbano. Nesta perspetiva a Lei n.º 16/2004, de 11 de Maio – Prevenção da Violência no

Desporto – Segurança das Instalações Desportivas, define tipologias de instalações desportivas: complexo desportivo – conjunto de terrenos, construções e instalações destinadas à prática desportiva de uma ou mais modalidades, pertencente ou explorada por uma só entidade, compreendendo os espaços reservados ao público e ao parque de viaturas, bem como os arruamentos principais; recinto desportivo – espaço criado exclusivamente para a prática desportiva, com carácter fixo e com estruturas de construção que lhe garantam essa afetação e funcionalidade, dotado de lugares permanentes e reservados a assistentes, sob controlo de entrada e; área de competição – superfície onde se desenrola a competição, incluindo as zonas de proteção definidas de acordo com os regulamentos internacionais da respetiva modalidade. (ii) espaço desportivo informal - grande espaço descodificado onde, em contacto com a natureza, o praticante procura novas possibilidades de prática. Os espaços naturais ou ao ar livre, também podem ser incluídos dentro deste conceito de espaço desportivo fundamentalmente quando se assiste, previamente ou durante as atividades que se desenrolam em espaço natural e o consomem ou adaptaram, a uma codificação que impõe o respetivo código, realizando o respetivo processo de apropriação (I.D.P, 2008; Cunha, 2007; Calléde, 1993; Castells, 1975).

Assim, o fraco grau de codificação dos seus elementos faz com que os espaços naturais se constituam como espaço de amplas possibilidades de realização variada de atividades, como espaços de estimulação criativa muito típica das atividades de recreação e lazer. Aqui existe um aproveitamento do meio envolvente natural, urbano e outras infra-estruturas mais gerais, que com uma adaptação ou mesmo dotação de espaços complementares, permitem a prática de uma determinada atividade desportiva. De acordo com o local da prática desportiva podem ser classificadas em áreas terrestres, áreas aéreas e áreas aquáticas.

As áreas terrestres podem localizar-se nas montanhas, no meio rural ou urbano, e podem acolher atividades como a escalada e o montanhismo, a patinagem e o pedestrianismo. Por outro lado, os lagos, albufeiras, os próprios rios e o mar, acolhem com frequência provas de vela, windsurf, surf, bodyboard, esqui aquático, motonáutica. Como áreas aéreas há a considerar as zonas de voo onde se pratica asa delta, parapente e o voo acrobático.

Assim a Carta Europeia do Desporto (1992) refere que a prática do desporto depende, em parte, da diversidade e da sua acessibilidade e cabe aos poderes públicos fazer a sua planificação global, tendo em conta as exigências, nacionais, regionais e locais, assim como as instalações públicas, privadas e comerciais. Desta forma, os responsáveis tomarão medidas para permitir uma boa gestão e a plena utilização das instalações, para que estas estejam sempre ao dispor das pessoas.

Nesta perspetiva, podemos encontrar (i) instalações desportivas em espaços artificiais – que são os locais específicos para desportos em espaços delimitados. Pela função que desempenham e pela sua utilização, assumem-se, cada vez mais, como um espaço próprio dentro das cidades e dos seus espaços de influência. Uma instalação desportiva integra as características da prática normalmente originada ou originária de espaços naturais, dentro de um espaço artificial, com uma linguagem codificada (Cunha, 2007). Assim, a função fundamental da instalação desportiva é a de oferecer, de uma forma continuada, a possibilidade de realização de uma prática desportiva num determinado local. Desta forma, teremos um recinto apetrechado permitindo o aumento da prática e ultrapassar os condicionalismos que possam ser impostos pelos rigores do clima.

Nesta perspetiva, a identificação e o registo das instalações desportivas contribuem para o reconhecimento do nível de equipamento urbano das populações e da sua qualidade de vida em matéria de formação global e desportiva. (ii) instalações desportivas em espaços naturais – estes espaços são cada vez mais procurados para as práticas desportivas, principalmente dos jovens. Efetivamente, verifica-se, cada vez mais, que as instalações desportivas tradicionais incluídas dentro do perímetro urbano, não esgotam as possibilidades de pática desportiva. A cada vez maior diversidade de desportos e a procura de novos espaços, tem permitido a conversão e a utilização dos espaços abertos na natureza, como equipamento desportivo. Estes espaços naturais, oferecem uma possibilidade de usufruir de um espaço que implica atividades de lazer na esperança de produzirem uma experiência de aventura recompensadora, num contexto de estímulos que irá suscitar uma série de emoções, que acarretará riscos e desafios intelectuais, físicos ou emocionais e que serão,

intrinsecamente, recompensadores, fornecendo oportunidades para a diversão, aprendizagem e aperfeiçoamento pessoal.

Assim, o espaço natural é um local de criatividade e fonte de inspiração para novas práticas desportivas, aproveitando aqui, os rigores do tempo para aumentar o desafio e a adrenalina.

O espaço lúdico-desportivo, é, sem dúvida alguma, um dos aspetos mais importantes para o encontro salutar e de convívio das populações, bem como para o desenvolvimento e manutenção de uma boa saúde física, mental e maior disponibilidade social (Cabaço, 1992).

O espaço natural é o palco, por excelência, para a realização de atividades que ao invés das características dos desportos ditos tradicionais, se submetem a outra lógica de organização intrínseca (Cunha, 2007). Aqui, o consumo do espaço e do tempo estruturam-se segundo formas e decorrências que as diferenciam dos desportos de pavilhão.

A prática livre e a utilização do espaço, para a prática desportiva ou atividades de recreio não organizadas, são fundamentais, por isso será importante que as nossas cidades tenham espaços públicos, jardins, praças ruas, espaços naturais que possibilitem a organização de práticas desportivas livres. Por isso, segundo Cunha (2007) a utilização dos bens públicos impõem a mobilização dos recursos individuais e coletivos, estando, assim, sempre ao serviço das pessoas e não deve perverter, por apropriação, a respetiva vocação fundamental que é a de ser um espaço disponível ao livre e fortuito pulsar social das comunidades residentes ou de qualquer utilizador, principalmente daqueles que mais precisam deles.

Nesta perspetiva, tem vindo a ser desvalorizada a importância dos espaços lúdicos destinados aos jogos livres, característicos das práticas de lazer auto-organizadas pelas crianças e jovens, seja nos terrenos intramuros das escolas, seja nos terrenos comunitários de administração direta das autarquias.

Quanto à análise do estado atual dos espaços de jogo para crianças e jovens ao ar livre (parques infantis e desportos alternativos), considerando a complexidade do fenómeno e as características históricas de um ponto de vista social, político e económico, faz-nos pensar que estamos num período de transição e reestruturação.

As tendências que se registam para fazer proliferar as instalações destinadas ao treino e à competição, com uma direção muito grande para a modalidade de futebol, pode excluir a criança e o jovem ao direito ao jogo e aos desportos de natureza.

É nos espaços lúdicos que, na nossa perspetiva, se desenvolve o gosto pela atividade física, pela valorização das nossas práticas e pelas práticas ancestrais e também pela iniciação desportiva e gosto pelo desporto (Lima, 2001).

No caso de Portugal, em geral, e da região do Douro, em particular, deu- se o aparecimento de novos projetos relativos à conceção do espaço, estrutura e desenho de materiais e equipamentos, gestão e manutenção, animação, treino de especialistas e supervisão técnica e pedagógica, por exemplo nas atividades de desporto de natureza (Neto, 1997).

Desta forma, é necessário termos uma visão aberta do desporto proporcionando práticas que tenham a justa medida de prazer e divertimento, de desafio e confronto, de esforço e de movimento, de formalização e padronização em conformidade com as diferentes situações, em função das necessidades prementes.