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Os estudos descritos neste ponto estão relacionados com um problema central: Como são integrados múltiplos determinantes para formar um julga- mento global do perdão? Há uma tendência desenvolvimental na forma como estes determinantes estão integrados? O trabalho revisto acima demonstrou que múltiplos/numerosos tipos de informação são tidos em conta quando as pessoas julgam o perdão. Mas nenhum desse trabalho considerou que regra determina esta integração.

No estudo de Girard e Mullet (1997), a amostra inclui adolescentes, jovens adultos, adultos de média idade e pessoas idosas (N=236). A razão para a in- clusão de um amplo leque de adultos de vários idades foi, como demonstrado por Subkoviak, Enright, Wu, Gassin, Freedman, Olson, e Sarinopoulos (1995), a probabilidade de cada um perdoar pode talvez desenvolver-se ao longo da vida, como uma função de maturidade e experiência.

O material usado consistia em 64 histórias. Uma história típica era a se- guinte:

“Marie-Noelle e Josiane são irmãs. Elas trabalhavam ambas na mesma firma. Josiane, que já trabalhava na firma há muitos anos, pediu uma promo- ção. Marie-Noelle, que era muito faladora mas que não era má, divulgou al- guma informação sobre a vida profissional de Josiane. O chefe da secção de Josiane ouviu esta informação e começou a duvidar das qualidades profissio- nais da Josiane por isso recusou-lhe a sua promoção. Marie-Noelle, com re- morsos, lamentou muito o que aconteceu e pediu a Josiane para a perdoar. A melhor amiga de Josiane, que conhecia bem Marie-Noelle, também pediu-lhe para perdoar a sua irmã. Josiane pediu, outra vez, uma promoção a um outro chefe de secção, que é a que ela tem no presente. Agora, se fosse Josiane acha que perdoaria Marie-Noelle?”

Como pode ser visto no exemplo, esta história contém seis factores reflec- tindo ambas as razões para perdoar e condições em que o perdão poderia ser mais fácil:

(a) o grau de proximidade para o alvo (irmão ou irmã versus colega), (b) o grau de intenção de um acto (intenção clara versus falta de inten-

ção),

(c) a severidade das consequências do acto (consequências moderadas

versus consequências sérias),

(d) desculpas/contrição do acto (desculpas versus ausência de desculpas), (e) atitudes dos outros (atitude favorável versus atitude desfavorável), (f) cancelamento de consequências (consequências que ainda afectam a

vítima versus consequências actualmente canceladas).

As 64 histórias foram construídas pelo cruzamento ortogonal de 6 facto- res: 2 x 2 x 2 x 2 x 2 x 2 = 64. A seguir a cada história estava uma escala de resposta de 12 cm com “Absolutamente não” à esquerda e “Definitivamente sim” à direita. Cada participante respondia individualmente, geralmente em casa (na escola para alguns participantes mais novos). Cada classificação de cada participante na fase experimental foi então convertida num valor numéri- co expressando a distância entre o ponto da resposta da escala e o ponto da esquerda, constituindo a origem. Emergiram deste estudo três resultados prin- cipais.

Tendências de Idade

Figura 1 - Efeito da idade no perdão no estudo de Girard e Mullet (1997).

Como se mostra na figura 1, as pessoas idosas eram claramente mais ca- pazes de perdoar do que os adolescentes e jovens adultos. Nos adolescentes, a média observada rondou os 5,80. Nos adultos de média idade, rondou os 6,60. Nas pessoas idosas, esteve perto de 7,90. A diferença (mais que 2 pon- tos numa escala de 12 pontos, p<0,0002) é impressionante. A tendência não foi, contudo, completamente monótona: a propensão para perdoar foi, global- mente, ligeiramente um pouco mais alta entre os jovens adultos e pessoas ido- sas do que entre os adultos de média idade. Este resultado estava em conso- nância com os de Enright, Santos e Al-Mabuk (1989),Vinsonneau e Mullet (2001), e Subkoviak et al. (1995).

Efeitos dos determinantes

Como nos mostram as figuras 2 e 3, quatro factores têm um forte impacto: cancelamento das consequências, intenção, desculpas e proximidade. O pri- meiro painel da figura 2 foi composto da seguinte forma. Os três grupos etá- rios (adolescentes, adultos, e pessoas idosas) estão representados no eixo ho- rizontal. Cada curva corresponde a um nível do factor proximidade (irmã versus colega), e as respostas dos participantes estão representadas no eixo vertical. As duas curvas são ascendentes: as pessoas idosas estavam mais pro- pensas a perdoar que os adultos e os adultos estavam mas propensos a per- doar que os adolescentes, um fenómeno que foi já colocado em evidência na figura 1. As duas curvas estavam claramente separadas: quando o ofensor era próximo da vítima (irmã, nível favorável), os participantes estavam mais propensos a perdoar do que quando o ofensor não era próximo da vítima (colega, nível desfavorável). Finalmente, as duas curvas estão a convergir pa- ra a direita: o factor proximidade teve mais efeito entre adolescentes do que entre adultos, e mais efeito entre adultos do que entre pessoas idosas.

Globalmente, havia ligeiras variações desde a adolescência até idade adulta no impacto de alguns dos seis factores: (a) o factor “atitude dos outros” teve impacto apenas nos adolescentes, (b) o factor “proximidade” pareceu ter um maior impacto nos adolescentes do que nas pessoas adultas e idosas, (c) o factor “desculpas” teve mais impacto nos adolescentes e adultos do que nas pessoas idosas, e em certa medida o cancelamento do factor consequências teve menor impacto entre os adultos do que nos adolescentes e nas pessoas idosas. Estas três observações estão em consonância com os resultados de En- right, Santos, e Al-Mabuk(1989).

Figura 2 - Efeitos da idade no impacto dos factores proximidade, intenção e severidade na

propensão para perdoar no estudo de Girard e Mullet (1997).

Figura 3 - Efeitos da idade nos factores impacto das desculpas, atitude dos outros e cancelamento

Agrupamento de diferenças individuais

Uma análise em agrupamentos levada a cabo com os dados brutos pôs em evidência pelo menos oito agrupamentos diferentes. O primeiro agrupa- mento pode ser denominado por Perdoar Sempre. Era composto essencial- mente por pessoas idosas e por pessoas entre os 25-39 anos de idade (N=33). Nestes sujeitos, a informação dada não fez a diferença, e a resposta média era sempre próxima do máximo. Para cada história, os participantes declararam que perdoariam independentemente das circunstâncias da ofensa. Após a experiência, os participantes foram convidados a expressar a sua filosofia do perdão; todos eles insistiram no facto de ser sempre melhor per- doar do que permanecer ressentido. Todavia, declararam-se muito interessa- dos na experiência, apesar do facto de responderem da mesma forma. Esta- vam interessados porque a experiência permitiu-lhes, até certo ponto, testar a sua filosofia.

O segundo agrupamento pode ser designado Quase nunca perdoar, agrupamento composto principalmente por jovens adultos e adultos de meia idade (N=11). Nestes sujeitos a média da resposta esteve perto do mínimo e a única informação que fez a diferença foi o factor respeitante à intenção. O efeito deste factor contudo foi muito fraco. Estes sujeitos expressaram uma filo- sofia exactamente oposta àquela que foi expressa pelos membros do primeiro agrupamento.

Os seis restantes agrupamentos são caracterizados pela relativo predo- mínio do impacto de um ou outro factor na probabilidade de perdoar. Seis meses depois do fim do estudo principal, aos 32 dos 33 membros do agrupa- mento Perdoar Sempre foram apresentados com um novo conjunto de oito cenários que incluíram os mesmos seis factores como previamente, mas os va- lores destes três factores, “Proximidade”, “Outros” e “Severidade”, mantive- ram-se constantes. O peso da informação foi deste modo consideravelmente reduzido. Todos os 32 participantes defenderam que iriam perdoar incondi- cionalmente cada um dos oito casos e avaliaram os cenários de acordo, isto é, usando apenas o lado direito da escala de resposta.