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O Estado moderno: um produto lógico de uma obra temporal

(DA METMÍSICA WEÇELIA!m

SEGUNDA NATUREZA

4.1. A articulaçao lógica do espírito objetivo

4.1.3. O Estado moderno: um produto lógico de uma obra temporal

A eticidade é, portanto, a identidade concreta do Bem e da vontade subjetiva (RPh § 141), pois nem o Bem sem a subjetividade, nem a subjetividade sem uma existência na vida ética de um povo, podem-se constituir numa verdadeira realização da Idéia de liberdade. A vida ética é a plena objetivação do espírito, ela é algo objetivo que se materializa, sem deixar de ser o produto de uma pluralidade de autoconsciências, necessitanto do assentimento dos indivíduos e do reconhecimento de que, o que assim se dá uma existência, é a racionalidade de uma vontade livre.

A eticidade, assim como o espírito objetivo, apresenta uma tripartição: a família, momento ainda natural do espírito ético; a sociedade civil, na qual os indivíduos associam-se para garantir o suprimento de seus carecimentos, bem como a segurança de sua pessoa e propriedade, constituindo a esfera do regramento das necessidades particulares e coletivas e, por fim, o Estado.

Deve-se fazer uma distinção entre Estado enquanto existência imediata, como Estado individual, e a idéia de Estado como o que se realiza através da relação dos Estados concretos entre si, seja num mesmo momento histórico, seja como uma progressiva adequação dos Estados individuais à idéia da liberdade.

A idéia de Estado constitui-se na plena realização do espírito objetivo; todavia, ela não é idêntica a nenhum Estado particular, tratam-se de princípios a serem seguidos e não de im\a descrição empírica- ainda que Hegel, em alguns momentos, vislumbre a realização destes no Estado prussiano de seu tempo. Como ressalta

D. Rosenfíeld, ao refletir sobre o conceito hegeliano de Estado: "O conceito de Estado não se vincula automaticamente a uma realidade empírica qualquer que, pela sua simples existência, merece esse tipo de atribuição. Pelo contrário, um mero conjunto de relações político- estatais informe ou desarticulado, que procure elevar-se à forma estatal, deve passar por um processo social e uma ordenação política capazes de conferir-lhe tal figura da realidade efetiva"^^. Do fato de que não podemos identificar um conjunto de relações político- estatais ã idéia de Estado, nos é apresentada a forma mediante a qual esse conceito é gerado, apresentação essa que segue, tanto nos Princípios

Fundamentais da Filosofia do Direito, quanto na Enciclopédia, duas vias distintas.

Num primeiro momento, Hegel expõe os princípios do Estado moderno, cuja forma de governo- a forma mais perfeita, obra do penoso trabalho do espírito na história- é a monarquia constitucional; é nela que o filósofo vislumbra a plena realização do universal e a correta administração da coisa pública, ao mesmo tempo que possibüita o desenvolvimento da subjetividade moderna. Os direitos individuais e o exercício da moralidade, não só não são tolhidos pela potência do Estado, como só podem-se recilizar plenamente nesse: " O princípio dos Estados modernos tem essa força e essa profundeza de deixar o princípio da subjetividade realizar-se ao extremo da particularidade pessoal autônoma e, ao mesmo tempo, de reconduzi-la à unidade substancial e assim, de manter essa unidade em si mesmo" (RPh § 260).

Fica claro nesse comentário dos Princípios Fundamentais da

Filosofia do Direito que a articulação lógica dos momentos do espírito objetivo dependem de um desenvolvimento temporal do espírito, ou seja, só o Estado moderno, produto do amadurecimento temporal de um princípio político, pode conter em si o princípio da autonomia individual, sem deixar-se destruir por esse. O Estado, enquanto realização plena da vida ética pode conter em si o princípio da subjetividade moderna, sem ser destruído por essa; ao contrário, sua potência alimenta-se do exercício individual da autonomia, do julgamento e da participação ativa dos cidadãos.

Se os Princípios Fundamentais da Filosofia do Direito expõe os momentos lógicos da vontade, estes momentos não podem ser tomados como atemporais. A obra em questão apresenta os princípios que foram amadurecidos na própria Weltgeschichte e que emergem ao final dessa como a culminação do trabalho conceituai do espírito, enquanto aperfeiçoamento da idéia de liberdade. Ao fínal dos

Princípios Fundamentais da Filosofia do Direito, Hegel apresenta-nos a história mundial e seus impérios, apresentação essa que se mantem na

Enciclopédia. Esse locus da Weltgeschichte no sistema demanda uma certa reflexão: Por que a história mundial nos é apresentada na estrutura sistêmica como um último momento do espírito objetivo? Qual a razão de sua localização na exposição enciclopédica, qual seja, como ponto de inflexão entre o espírito objetivo e o espírito absoluto?

Uma possível explicação, cuja justificativa pretendemos analisar, é que o locus da Weltgeschichte no sistema visa mostrar que as categorias anteriores são produto de um determinado amadurecimento

temporal e que só são possíveis através desse. Por outro lado, essa breve apresentação dos momentos centrais desse desenvolvimento- representado pelos quatro impérios históricos- aparecem ao final do espírito objetivo, porque só a realização completa dos princípios do espírito objetivo possibilita essa passagem ao espírito absoluto. O espírito absoluto nada mais é do que a consciência de si do espírito e, como tal, necessita que o desenvolvimento de seu objeto já tenha sido dado no tempo. A consciência de si do espírito depende, portanto, do desenvolvimento da idéia da liberdade

Nosso próximo objetivo será mostrar o que denominamos

de articulação temporal do espírito, ou seja, analisar o

amadurecimento racional dos aspectos culturais desse percurso.