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O FOCO NOS PROGRAMAS

No documento Tese D António Franco P. Silva (páginas 43-47)

REFLEXÕES E INTERROGAÇÕES INICIAIS

1. O FOCO NOS PROGRAMAS

Perante o quadro geral já traçado da EF no EP, a questão primordial pode ser formulada deste modo:

Independentemente da sua natureza e dos seus conteúdos, sendo esta uma área educativa importante para a formação das crianças, e como tal reconhecida cultural, social e politicamente, por que razão, ou razões, ela é sistematicamente ignorada pelos próprios

docentes27, não obstante a sua obrigatoriedade estar consignada legalmente, há mais de século e meio?

Por razões de bom senso, não aceitamos que exista uma atitude deliberada dos professores em marginalizarem esta área, seja por não lhe reconhecerem o valor formativo, seja por simplesmente se julgarem incapazes de organizar jogos para os seus alunos, seja, ainda, por lhes parecer que dar concretas oportunidades às crianças de expressarem os seus impulsos lúdicos vai contra as rotinas didácticas e em prejuízo de outras áreas curriculares consideradas mais importantes. Efectivamente, pela sua formação geral inicial, os professores devem adquirir, como nos recorda Carreiro da Costa (1993: 1-26), “os conhecimentos científicos e pedagógicos e as

competências necessárias para enfrentar adequadamente a carreira docente”, em todas as áreas que a compõem e, naturalmente, em

EF28. Por isso, eles sabem que a educação básica no EP não pode

realizar-se correctamente senão pelo corpo, com a diversidade dos seus movimentos, para satisfação das suas permanentes e exigentes necessidades biológicas, psicológicas e sociais (mais críticas nos escalões etários deste nível de escolaridade), sob a forma de comportamentos humanos que, numa visão global, são sempre, e ao mesmo tempo, expressões cognitivas, motoras e afectivas, comparticipantes na contínua construção da pessoa, em cada estádio de desenvolvimento, particularmente visíveis nas aprendizagens escolares. O elenco das áreas curriculares que figuram nos

programas escolares são, como sabemos, opções administrativas

tomadas num certo momento, sob determinadas pressões político-

27 Nas últimas duas ou três décadas, segundo alguns dados oficiais, referidos por

Rocha (1998), uma décima parte dos professores de meios urbanos já lecciona esta área. Porém, este dado é tomado como uma excepção à atitude docente geral perante a EF/EEFM.

28 Sempre existiram nas Escolas Normais, nas EMP e nas actuais ESE ou nos CIFOP,

áreas relacionadas com a Psicologia e com a Pedagogia, cujos conteúdos compreendiam a abordagem do exercício físico e do ludismo no desenvolvimento humano e na optimização das diversas aprendizagens escolares.

sociais mais ou menos apoiadas nos conhecimentos científicos disponíveis, com o propósito de responder às necessidades educativas visadas, e a EF tem sido sempre incluída nessas intenções.

Ao colocarmos de parte os próprios docentes como explicação pela não leccionação da EF no EP, temos de procurar nos programas uma primeira causa hipotética deste problema. E em torno deles podemos fazer variadas interrogações, numa atitude maiêutica que vamos manter, quanto possível, ao longo deste capítulo, no sentido de gerarem ideias orientadoras para o nosso trabalho:

Os programas do EP, tal como se apresentam, secundarizam ou marginalizam a EF considerando-a destinada apenas a preencher os intervalos lectivos sob a forma de recreios mais ou menos institucionalizados?

Os programas de EF para o EP inserem-se no todo programático concorrendo com os seus objectivos específicos para os objectivos gerais deste nível de ensino?

Os programas de EF para o EP revelam evoluções dos conceitos desta área curricular e participam nas mudanças e renovações programáticas gerais?

Os programas de EF para o EP filiam-se em determinadas correntes que privilegiam certas formas de actividade motora em detrimento de outras, sem prejuízo da sua resposta aos objectivos gerais de ensino?29

29 Formas como: a atitude corporal marcial; o treino físico de tipo militar; o

exercício físico de índole higiénica; os jogos tradicionais e espontâneos; os desportos individuais e colectivos; a actividade para a condição física, a expressão corporal, o exercício psicomotor...

Os mesmos conteúdos dos programas de EF para o EP propõem-se responder às tão diversas necessidades do desenvolvimento das crianças às quais se dirigem, com idades tão variadas e tão críticas

compreendidas entre os 6/7 anos e os 9/14 anos? 30

Os conteúdos dos programas de EF para o EP distribuem-se por graus de dificuldade ao longo da escolaridade e numa progressão técnica em cada ano ou fase de aprendizagem?

Os programas de EF para o EP, tendo os mesmos níveis de exigência especifico, técnico e metodológico das restantes áreas, devem ser leccionados pelo mesmo professor, em regime de monodocência, desde que a aplicação dos conteúdos sejam adaptados às realidades concretas?

Para o melhor cumprimento dos programas de EF para o EP os professores dispõem de manuais ou textos de apoio ou, ainda, de formação complementar?

Os programas de EF, por causa da sua particular especificidade e elevado grau técnico, só podem ser leccionados pelos professores do EP mediante um regular apoio, directo ou indirecto, dado por especialistas?

30 O nosso estudo abrange toda a época em que a escolaridade é obrigatória até à

conclusão da 4ª classe, e até aos 12 anos, ou até aos 14, facultativamente - neste caso, desde que no acto da matrícula tenham 13 anos e as escolas não sejam mistas - (DL nº 42 994, de 28 de Maio de 1960) e, depois, até à conclusão da 5ª ou 6ª, ou até aos 14 anos (DL nº 45 810, de 9 de Julho de 1964).

A especificidade e as exigências técnicas dos conteúdos dos programas de EF determinam que esta área apenas possa ser leccionada por especialistas e nunca pelos

próprios docentes do EP?

Os conteúdos dos programas de EF para o EP são especialmente tecnicistas, exigindo meios, materiais e equipamentos muito específicos que as escolas não possuem?

Os programas de EF para o EP são mero adorno curricular e o seu incumprimento por parte dos docentes vai de encontro aos interesses de clubes, de autarquias e dos órgãos centrais de administração desportiva para justificarem a sua intervenção directa no EP?

Com vista a ampliar as questões postas, vamos seleccionar outros focos de convergência problemática da EF no EP segundo ópticas habitualmente oriundas do senso comum, tomado na perspectiva de Sousa Santos (1998: 55-56)31.

No documento Tese D António Franco P. Silva (páginas 43-47)