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O importante papel da Educação de Jovens e Adultos

No documento Valmir Almeida Passos.pdf (páginas 59-64)

Capítulo II Educação de jovens e adultos: contexto histórico

2.12. O importante papel da Educação de Jovens e Adultos

Em 1990, a Conferência Mundial sobre Educação para Todos, realizada na cidade de Jomtien, na Tailândia, em 1990, propunha assegurar que todas as crianças e adolescentes tivessem acesso a um ensino de qualidade, com equidade de gênero. Para a Educação de Jovens e Adultos, durante a chamada “Década da Educação”, colocava o seguinte objetivo: “... oferecer também acesso ao ensino de qualidade, com equidade e também a reduzir pela metade os índices de analfabetismo e proporcionar aos jovens e adultos as oportunidades para satisfação de suas múltiplas necessidades de aprendizagem.” (GADOTTI, 2000. p. 27)

A V CONFITEA25 (Fifth International Conference on Adult Education) ou a (V Conferência Internacional de Educação de Adultos), realizada em 1997, na cidade de Hamburgo na Alemanha, apresentou o documento conhecido como a Declaração de Hamburgo (1997, p.20) na qual prevê que

os objetivos da educação de jovens e adultos, vistos como um processo de longo prazo, [...] deverão desenvolver [...] a autonomia e o senso de responsabilidade das pessoas e das comunidades, fortalecendo a capacidade de lidar com as transformações que ocorrem na economia, na cultura e na sociedade como um todo; promovendo a coexistência, a tolerância e a participação criativa e crítica dos cidadãos em suas comunidades, permitindo assim que as pessoas controlem seus destinos e enfrentem os desafios que encontram à frente.

No relatório final da VI CONFINTEA, que foi realizada em 2009, em Belém do Pará, estão apontadas outras questões e desafios atuais na educação brasileira. Necessidades como tratar a EJA como um campo de direitos; enfrentar a desigualdade que marca a diversidade do povo brasileiro; e instituir:

... tempos e espaços outros, de forma a atender a diversidade de modos pelos quais jovens e adultos podem estar na escola, sem acelerar/aligeirar processos de aprendizagem dos educandos, mas ampliando e socializando saberes. E também nesse os desafios de melhorar o fluxo escolar; repensar o currículo; investir em formação inicial e continuada de professores e gestores; e reconhecer a intersetorialidade da EJA potencializando-a em seus diversos campos como o do trabalho, saúde, cultura, meio ambiente, segurança pública e assistência social. (BRASIL, 2009a, p. 18).

25 A Declaração de Hamburgo foi o nome dado ao relatório da VI CONFITEA ( International Council For Adult

Education ou Conferencia Internacional de Educação de Adultos), promovida pela UNESCO e UNICEF realizada em Hamburgo, na Alemanha em 1997; em Belém do Pará, em dezembro de 2009, primeira vez em um país latino-americano.

O Fórum Nacional de Educação de Jovens e Adultos que, através da divulgação do relatório síntese do X Encontro Nacional de Educação de Jovens e Adultos realizado em 2008, em Rio das Ostras, Rio de Janeiro, reconhece os avanços das políticas públicas, considera que ainda são longos e duros os caminhos a serem percorridos no sentido de um projeto histórico orientado à emancipação das classes populares. O mesmo relatório destaca as necessidades de avançar na efetivação de uma agenda política, de se “resgatar o sentido de trabalho na dimensão ontológica, como processo de constituição dos seres humanos, de se garantir o direito ao acesso e permanência à educação com qualidade e de levar ao processo de constituição dos seres humanos” (RELATÓRIO FINAL..., 2008, p. 3).

Além do Fórum, realizou-se a Conferência Nacional de Educação, cujo tema foi “Construindo um Sistema Nacional Articulado de Educação: Plano Nacional de Educação, suas Diretrizes e Estratégias de Ação”. Em ambos, a expectativa gerada na comunidade educacional é que se definissem políticas que contribuíssem para o avanço no sentido de uma educação de qualidade que atendesse às necessidades de um país que, desde o seu início, foi bastante injusto com os que, com seu trabalho, construíram as riquezas da nação e que não viram distribuídas as suas riquezas acumuladas de modo a que todos pudessem ter acesso aos bens sociais, necessários a uma participação política consciente. (CURY, 2002, p. 308).

A Lei n. 9.394 de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (L.D.B.E.N.), de 1996, reiterou os direitos educativos dos jovens e adultos ao ensino adequado às suas necessidades e condições de aprendizagem e estabeleceu as responsabilidades dos poderes públicos na identificação e mobilização da demanda e na provisão de ensino fundamental gratuito e apropriado.

No âmbito da educação escolar, a E.J.A. apresenta-se como modalidade destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio, conforme o Art. 37 da nova L.D.B. (Lei nº 9394/96), cabendo aos sistemas de ensino assegurar aos jovens e aos adultos, gratuitamente, oportunidades apropriadas mediante cursos e exames. Como tal, não se deve, entretanto, equiparar-se a uma educação compensatória ou de segunda chance, que alia alfabetização às demais etapas de ensino.

1º. Os sistemas de ensino assegurarão gratuitamente aos jovens e aos adultos, que não puderam efetuar os estudos na idade regular, oportunidades educacionais apropriadas, consideradas as características do alunado, seus interesses, condições de vida e de trabalho, mediante cursos e exames.

2º. O Poder Público viabilizará e estimulará o acesso e a permanência do trabalhador na escola, mediante ações integradas e complementares entre si.

Art. 38º. Os sistemas de ensino manterão cursos e exames supletivos, que compreenderão a base nacional comum do currículo, habilitando ao prosseguimento de estudos em caráter regular.

1º. Os exames a que se refere este artigo realizar-se-ão:

I - no nível de conclusão do ensino fundamental, para os maiores de quinze anos; II - no nível de conclusão do ensino médio, para os maiores de dezoito anos.

2º. Os conhecimentos e habilidades adquiridos pelos educandos por meios informais ou aferidos e reconhecidos mediante exames.

Os artigos tratam da E.J.A. como uma modalidade da educação básica e asseguram o direito aos trabalhadores que não realizaram Alfabetização, Ensino Fundamental e Médio de retornarem à escola. Em 1996, com a Emenda Constitucional 14, feita no Governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, passou a ser obrigatório ao Poder Público oferecer o Ensino Fundamental aos Jovens e Adultos que não tiveram acesso à educação escolar.

O Parecer nº 11/2000 e a Resolução nº 11/2000, ambos da Câmara de Educação Básica (C.E.B.) do Conselho Nacional de Educação (C.N.E.), regulamenta a E.J.A. entendendo que o/a seu/sua aluno/a possui um perfil diferenciado dos alunos do ensino regular.

A E.J.A. passa a ser uma modalidade da rede pública de ensino do Brasil, com objetivos diferentes do ensino regular, pois atende a um público específico, que não concluiu a educação básica na infância e adolescência. Em virtude disso, a E.J.A. apresenta-se como uma linha de política educacional.

O Parecer C.N.E./C.E.B. 11/2000, relatado por Carlos Roberto Jamil Cury, trata das Diretrizes Nacionais Curriculares para a Educação de Jovens e Adultos. O texto completo consta de duas partes, na primeira das quais o relator estabelece as funções da EJA: a função reparadora, a função equalizadora e a função qualificadora, esta última apontada como o próprio sentido da E.J.A.

A função reparadora da EJA é justificada, no Parecer C.N.E./C.E.B. 11/2000, pelo alto número de analfabetos existentes no Brasil e apresentada como propiciadora do ingresso no mercado de trabalho. No referido Parecer, defende-se a tese de que a EJA constitui-se em uma oportunidade de atender à atual exigência das competências requeridas pela vida cidadã e pelo mercado de trabalho. Enfatiza-se que o desemprego, o subemprego, o desemprego estrutural e

o trabalho informal, decorrentes de mudanças nos atuais processos de produção, podem produzir, nos indivíduos, a sensação de instabilidade, sendo muito mais atingidos aqueles que são desprovidos da capacidade de ler e escrever (BRASIL, 2000, p. 36).

Ao elaborar o Parecer C.N.E./C.E.B. 11/2000, Cury (2000, p. 27) atenta para a necessidade de

(...) se considerar que os alunos da EJA são diferentes dos alunos presentes nos anos adequados à faixa etária. São jovens e adultos, muitos deles trabalhadores, maduros, com larga experiência profissional ou com expectativa de (re)inserção no mercado de trabalho e com um olhar diferenciado sobre as coisas da existência, que não tiveram diante de si a exceção posta pelo art. 24,II,c. Para eles, foi a ausência de uma escola ou a evasão da mesma que os dirigiu para retorno nem sempre tardio à busca do direito ao saber. (...) Logo, aos limites já postos pela vida, não se pode acrescentar outros que signifiquem uma nova discriminação destes estudantes (...).

Deve-se pretender, dentre tantas habilidades, o desenvolvimento da participação comunitária; a vivência cidadã; a inclusão cultural; a ação pró-ativa, atuante e participativa nos processos do trabalho, e a adoção de uma postura de paz, tolerância e repúdio aos preconceitos e discriminações.

Di Pierro & Haddad (2000, p. 127)) apontam necessidades prementes à Educação de Jovens e Adultos: a universalização da alfabetização; a superação do “modelo dominante nas campanhas emergenciais e iniciativas de curto prazo, que recorrem à mão-de-obra voluntária e recursos humanos não especializados” (p.126); o aprender a lidar com a juvenilização da EJA que transforma o ambiente anteriormente predominantemente adulto e de trabalhadores em um espaço com “universos muito distintos nos planos etários, culturais e das expectativas em relação à escola.”

No início de século XXI, o paradigma da educação continuada ao longo da vida, que lentamente vai se tornando consenso, constitui-se também em um enorme desafio. As rápidas mudanças nos modos de produção, o aumento da expectativa de vida, a constituição de novos direitos para a condição humana são fatores que nos impelem a abandonar uma educação voltada para as carências do passado e perguntar aos jovens e adultos “quais são suas necessidades de aprendizagem no presente, para que possam transformá-lo no presente.” (DI PIERRO, 2005, p. 1120).

Di Pierro, Jóia & Masagão (2001, p. 2), acentuando que o campo da E.J. A é terreno fértil para a inovação prática e teórica, reiteram que essa modalidade transborda os limites da escolarização no sentido estrito, contemplando iniciativas situadas em diferentes espaços e voltadas à qualificação profissional, ao desenvolvimento comunitário e à formação política. Assinalam, ainda, que “... mesmo quando se focalizam os processos de escolarização de jovens e adultos, o cânone da escola regular, com seus tempos e espaços rigidamente delimitados, imediatamente se apresenta como problemático”.

2.12.1. Os Sujeitos da E.J.A.

Conforme Oliveira (2009), a compreensão de quem é esse sujeito jovem e adulto brasileiro mais especificamente daquele que frequenta a E.J.A. é importante. Geralmente, ele é um sujeito que, em uma época biológica, foi criança e adolescente, cujas condições e situações de vida, que acompanham historicamente as camadas populares, o fizeram se afastar dos ambientes escolares.

O adulto, para a educação de jovens e adultos, não é o estudante universitário, o profissional qualificado que frequenta cursos de formação continuada ou de especialização, ou a pessoa adulta interessada em aperfeiçoar seus conhecimentos em áreas como artes, línguas estrangeiras ou música, por exemplo. Ele é, geralmente, o migrante proveniente de áreas rurais empobrecidas que chega às grandes metrópoles, filho de trabalhadores rurais não qualificados e com baixo nível de instrução escolar (muito frequentemente analfabetos). Em seu histórico, apresenta uma passagem curta e não sistemática pela escola e trabalha em ocupações urbanas que exigem pouca qualificação, após experiência no trabalho rural na infância e na adolescência. Esse quadro o leva a buscar a escola tardiamente para alfabetizar-se ou cursar algumas séries do ensino supletivo.

O jovem, recentemente incorporado ao território da antiga educação de adultos, não é aquele com uma história de escolaridade regular, o vestibulando ou o aluno de cursos extra- curriculares em busca de enriquecimento pessoal. Como o adulto anteriormente descrito, ele é também um excluído da escola, porém geralmente incorporado aos cursos supletivos em fases mais adiantadas da escolaridade, com maiores chances, portanto, de concluir o ensino

fundamental, ou mesmo, o ensino médio. É bem mais ligado ao mundo urbano, envolvido em atividades de trabalho e lazer mais relacionadas com a sociedade letrada, escolarizada e urbana. Refletir sobre como esses jovens e adultos pensam e aprendem envolve, portanto, transitar, pelo menos, por três campos que contribuem para a definição de seu lugar social: a condição de "não-crianças", a condição de excluídos da escola e a condição de membros de determinados grupos culturais.

Traz consigo uma história mais longa (e provavelmente mais complexa) de experiências, conhecimentos acumulados e reflexões sobre o mundo externo, sobre si mesmo e sobre as outras pessoas. Com relação à inserção em situações de aprendizagem, essas peculiaridades da etapa de vida em que se encontra o adulto fazem com que ele traga consigo diferentes habilidades e dificuldades (em comparação com a criança) e, provavelmente, maior capacidade de reflexão sobre o conhecimento e sobre seus próprios processos de aprendizagem.

Para além dessas características gerais, entretanto, tratar o adulto de forma abstrata, universal, remete a certo estereótipo de adulto, muito provavelmente correspondente ao homem ocidental, urbano, branco, pertencente a camadas médias da população, com um nível instrucional relativamente elevado e com uma inserção no mundo do trabalho em uma ocupação razoavelmente qualificada.

No documento Valmir Almeida Passos.pdf (páginas 59-64)