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Trajetória da Educação de Jovens e Adultos do Período Colonial até

No documento Valmir Almeida Passos.pdf (páginas 35-38)

Capítulo II Educação de jovens e adultos: contexto histórico

2.1. Trajetória da Educação de Jovens e Adultos do Período Colonial até

Toda a história das ideias em torno da Educação de Adultos no Brasil acompanha a história da educação brasileira que, por sua vez, acompanha a história dos modelos econômicos e políticos e, consequentemente, a história das relações de poder, dos grupos que estão no exercício do poder. A mobilização brasileira em favor da educação do povo, ao longo de nossa história, parece realmente ligar-se às tentativas de sedimentação ou de recomposição do poder político e das estruturas socioeconômicas, fora e dentro da ordem vigente.

A ideia de adotar uma política colonizadora, através da conversão dos indígenas no Brasil colonial, permitiu aos jesuítas17 (1549-1759) desempenharem o papel de principais promotores e organizadores do sistema de educação. A sua autonomia, porém, e consequentemente a influência na colônia, fez com que a coroa portuguesa não só combatesse a ampliação desse controle, como também os expulsasse das terras brasileiras, provocando, dessa forma, a regressão do sistema educativo implantado. Quem mais sofrera com sua expulsão, na verdade, fora a elite, pois a educação popular era quase inexistente.

Paiva (1973, p.165) ressalta que a educação dos adultos indígenas tornou-se irrelevante. O domínio das técnicas da leitura e escrita não era necessária para os membros da sociedade colonial, já que se baseava, principalmente, na exportação da matéria-prima. Assim, não havia preocupação em expandir a educação a todos os setores sociais. Com a vinda da família Real Portuguesa para o Brasil (1808), modificou-se o panorama educacional brasileiro, uma vez que se tornara necessária a organização de sistema de ensino para atender a demanda

17 Os jesuítas permaneceram como mentores da educação brasileira durante duzentos e dez anos, até 1759,

quando foram expulsos de todas as colônias portuguesas por decisão de Sebastião José de Carvalho, o Marquês de Pombal, primeiro-ministro de Portugal de 1750 a 1777. No momento da expulsão, os jesuítas tinham 25 residências, 36 missões e 17 colégios e seminários, além de seminários menores e escolas de primeiras letras instaladas em todas as cidades onde havia casas da Companhia de Jesus. A educação brasileira, com isso, vivenciou uma grande ruptura histórica num processo já implantado e consolidado como modelo educacional. A Companhia de Jesus estava presente como fator de empecilho às reformas econômicas e educacionais de Pombal, o que explica a sua expulsão e proscrição. (1982).

educacional da aristocracia portuguesa e preparar quadros para as novas ocupações técnico- burocráticas.

Normalmente, entendia-se por educação de adultos apenas a transmissão de alguns poucos conhecimentos da cultura letrada – leitura e escrita – para os analfabetos. Essa visão estreita da educação estava ligada aos interesses políticos e econômicos das elites que entendiam que bastava o domínio superficial da leitura e da escrita, pois assim seria possível manter a “ordem social” instituída.

Politicamente, era conveniente às elites que a grande maioria da população não tivesse acesso à educação e soubesse ler e escrever para poder votar, pois, com a reforma do sistema eleitoral (Lei Saraiva de 188518), os analfabetos eram excluídos do contingente eleitoral. Além disso, as elites entendiam que os votos do recém-alfabetizados seriam presas fáceis para alimentar o curral eleitoral local. A reforma eleitoral acabou reforçando a “ideia de que a educação concorria para o progresso. Além disso, a eleição direta com restrição ao voto do analfabeto provocara a valorização daqueles que dominavam as técnicas da leitura e da escrita” (PAIVA, 1987, p. 168).

Do ponto de vista econômico, era necessário alfabetizar os iletrados, pois o processo de industrialização do país exigia mão-de-obra pré-qualificada. As elites não poderiam mais contar com a mão-de-obra escrava – embora se falasse em fim da escravidão –, acostumada com o trabalho agropecuário que não exigia esforços intelectuais. Era preciso suprir as demandas do mercado industrial emergente que requeria dos trabalhadores o mínimo de exercício intelectual, ou seja, o domínio, ainda que precariamente, da arte da leitura e da escrita.

Com o desenvolvimento da sociedade – predominantemente rural e agrícola no início e depois passou a ser industrial e urbana – e com o fortalecimento das cidades, surgiu a

18 A Lei nº 3.270, também conhecida como Lei dos Sexagenários ou Lei Saraiva-Cotejipe, foi promulgada a 28

de Setembro de 1885 e garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos de idade. Mesmo tendo pouco efeito prático, pois libertava somente escravos que, por sua idade, eram menos valorizados, houve grande resistência por parte dos senhores de escravos e de seus representantes na Assembléia Nacional. A pressão sobre o Parlamento se intensificou a partir de sua proposta, em 1884. Ao projeto, vindo do liberal ministério Sousa Dantas, os escravocratas reagiram com tanto rigor, que a lei só foi aprovada em 1885, após aumentar o limite de idade do cativo de sessenta para sessenta e cinco anos. As maiorias dos sexagenários estavam nas províncias cafeeiras, o que explica a resistência na Câmara e no Senado. BRASIL. Departamento Nacional de Educação. Histórico da educação de adultos no Brasil. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, Rio de Janeiro, v. 13, n.37, p.140-158, set./dez. 1949.

necessidade de se ter certo domínio de conhecimento e a apresentação de algumas habilidades de trabalho.

No ano de 1854, surgiu a primeira escola noturna e, em 1876, já existiam 117 escolas por todo o país, como nas províncias do Pará e do Maranhão, que já estabeleciam fins específicos para sua educação. Segundo Paiva (1973, p.167), no Pará, visava-se dar instrução aos escravos como forma de contribuir para a sua educação; no Maranhão, a instrução serviria para que os homens do povo pudessem ter compreensão dos seus direitos e deveres. Sobre a experiência das escolas noturnas, Paiva afirma:

A crise do sistema escravocrata e a necessidade de uma nova forma de produção são alguns dos motivos para a difusão das escolas noturnas, entretanto, essas escolas tiveram um alto índice de evasão o que contribuiu consideravelmente para o seu fracasso. Ressurgindo novamente em 1880, com o estímulo dado pela reforma eleitoral – Lei Saraiva –, chegando- se a cogitar a extensão da obrigatoriedade escolar aos adolescentes e adultos nos lugares em que se comprovasse a inexistência de escolas noturnas (PAIVA, 1973, p. 168).

Os limites de idade nas escolas noturnas e dominicais eram de 16 e 40 anos. As escolas eram destinadas ao sexo masculino e poderiam ser instaladas desde que pudessem contar com a frequência mínima de 30 alunos. As lições eram dadas apenas em três horas, todas as noites, com exceção dos domingos. As matérias ensinadas eram: língua pátria, aritmética, geometria e desenho, e lições de coisas. Segundo MOURÃO (1962, p.211),

Destinadas a adolescentes, ou mesmo a adultos, as escolas noturnas apresentavam inestimáveis benefícios aos alunos que trabalhavam durante o dia, não podendo frequentar os grupos escolares ou as escolas isoladas que funcionavam de manhã ou à tarde. Os seus programas aprovados conjuntamente com os dos grupos escolares e das escolas singulares nada tinham, talvez, de específico para a finalidade. O regime desses cursos noturnos era o das escolas singulares com quatro classes, que estudavam ao mesmo tempo, cabendo ao professor, pela divisão de tarefas, mantê-las todas em atividades ao mesmo tempo.

Até a Primeira Guerra Mundial, mais particularmente na década de 1910, a maior parte das discussões sobre o problema da educação popular foi travada no Parlamento, por meio do debate dos projetos de reforma do Município Neutro19. A reforma do Distrito Federal, em 1928, merece destaque, pois reorganizou os cursos elementares noturnos e moralizou o seu funcionamento. Sob a designação de Cursos Populares Noturnos, eles deveriam ministrar o

ensino primário elementar em dois anos a adultos analfabetos, depois o ensino técnico elementar, cultura geral, práticas de higiene, demonstrações práticas e palestras populares.

Esses cursos tiveram grande resposta junto à população e houve um grande aumento das matrículas. Não teve continuidade após a Revolução de Trinta, mas deixou bases para a renovação do ensino de adultos na segunda metade da década de 1930.

A mobilização iniciada com a Primeira Guerra, entretanto, ao trazer à tona a necessidade de expandir a rede de ensino elementar, levantou também o problema da educação dos adultos. A abordagem do problema, contudo, se faz em conjunto: o tema é a educação popular, ou seja, a difusão de ensino elementar. As reformas da década de 20 tratam da educação dos adultos ao mesmo tempo em que cuidam da renovação dos sistemas de um modo geral. Somente na reforma de 28 do Distrito Federal, ela recebe mais ênfase, renovando-se o ensino dos adultos na primeira metade dos anos 30. (PAIVA, 1973, p. 168).

Após a Primeira Guerra Mundial, com a industrialização e urbanização, formou-se a nova burguesia urbana. Estratos emergentes de uma pequena burguesia exigiam o acesso à educação – esses segmentos aspiraram a uma educação acadêmica, elitista ou tecnicista, enquanto que o restante da população continuou analfabeta e inferiorizada.

Nos anos 20 aparecem os primeiros profissionais da educação que tentaram sustentar a crença em seu descompromisso com idéias políticas defendendo o tecnicismo em educação e trazendo implícita a aceitação das idéias políticas dos que governam, a educação popular vinculada pelo entusiasmo na educação que nada mais foi do que uma expansão das bases eleitorais, pois a preocupação maior estava vinculada ao aumento do poder da classe burguesa (PAIVA, 1973, p.28).

Diferentes discussões e definições em torno da alfabetização e/ou escolarização de adultos acompanham lutas ideológicas e políticas de cada período, trazendo consequências pedagógicas sérias ao processo educativo de sujeitos que buscam tardiamente sua escolarização.

No documento Valmir Almeida Passos.pdf (páginas 35-38)