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O que os fez voltar, permanecer e obter sucesso escolar: o capital

No documento Valmir Almeida Passos.pdf (páginas 118-167)

Capítulo IV- Sucesso escolar

4.4. O que os fez voltar, permanecer e obter sucesso escolar: o capital

Um conceito-chave na teoria de Pierre Bourdieu é o de capital cultural. Elaborado na década de 1960, esse conceito impôs-se como uma forma de explicar as diferenças de rendimento escolar obtido por crianças de classes sociais distintas; e, em consequência, opor- se às explicações provenientes da teoria do capital humano e da crença na existência de "aptidões" (BOURDIEU, 1998). Contrariamente às afirmações de que as desigualdades no desempenho escolar seriam devidas a fatores econômicos ou a "dom", Bourdieu (idem, p. 74) afirmou que essas desigualdades são frutos da distribuição, também desigual, do capital cultural entre as classes e as frações de classes: "O rendimento escolar da ação escolar depende do capital cultural previamente investido pela família".

Bourdieu (1998) afirma que a maioria das propriedades do capital cultural pressupõe sua incorporação, estando, portanto, ligada ao corpo e à subjetividade. Assim, esse capital é algo que, apesar de herdado, se torna parte inerente ao próprio indivíduo. O capital cultural é um “ter” que se tornou “ser”, uma propriedade que se fez corpo e tornou-se parte integrante da “pessoa”, um habitus. Aquele que o possui “pagou com sua própria pessoa” e com aquilo que tem de mais pessoal, seu tempo. Esse capital “pessoal” não pode ser transmitido instantaneamente; não pode ser acumulado para além das capacidades de apropriação de um agente singular; depaupera e morre com seu portador. (NOGUEIRA, 1998, p.75).

É o capital cultural incorporado pelo conjunto da família que a levará à apropriação do capital cultural objetivado, que só acontece sem atraso e sem perda de tempo em membros de famílias dotados de forte capital cultural. As classes e/ou grupos sociais detentores de um fraco capital cultural terão, assim, um distanciamento significativo do capital cultural objetivado, exigindo a superação de um tempo perdido, uma vez que será necessário gastar tempo para corrigir os efeitos desta carência, isto é, corrigir seus efeitos em relação às exigências do mercado escolar. É o nível cultural global do grupo familiar que mantém a relação mais estreita com o êxito escolar da criança (NOGUEIRA, 1998, p.42) .

O capital cultural objetivado, além de uma apropriação material, que pressupõe a posse de capital econômico, visto que passa por suportes materiais como escritos, pinturas, acesso a espaços culturais, traz uma apropriação simbólica que só existe e subsiste a partir do capital incorporado dos agentes que, no campo das classes sociais, em lutas no campo cultural, obtêm benefícios proporcionais à apropriação que possuem.

No caso dos sujeitos desta pesquisa, a noção de capital cultural vem dar conta da desigualdade do desempenho escolar destes jovens e adultos que, em suas histórias de vida, não tiveram essa possibilidade em sua família e na escola, um habitus próximo àquele das classes dominantes. Esses jovens e adultos descobriram, em suas práticas sociais, o valor da cultura como forma de ascensão profissional, social e de realização pessoal. Através deles, inicia-se uma nova geração, pois, a sua volta aos bancos escolares já os fazem valorizar o processo de escolarização de seus filhos. Esses sujeitos e seus filhos, certamente, tiveram que empreender esforços redobrados em relação aos seus filhos e filhas, para superar a dominação e exclusão a que a falta da cultura legitimamente reconhecida submete. O depoimento de Daniel exemplifica como o capital cultural adquirido com a escolarização mudou a sua vida:

(...) “Foi uma grande experiência voltar a estudar, e isto mudou minha vida, porque saí do meu mundinho e agora eu quero saber mais, ter mais informação e entender a história do mundo”. (Daniel)

Mas, é na consecução de diplomas que o capital cultural assume sua institucionalização através do certificado escolar, que confere ao seu portador um valor convencional, constante e juridicamente garantido no que diz respeito à cultura. A alquimia social produz uma forma de

capital cultural que tem uma autonomia relativa em relação ao seu portador e, até mesmo, em relação ao capital cultural que ele possui, efetivamente, em um dado momento histórico (BOURDIEU, 2007, p.78).

A comparação entre os diferentes tipos de diplomas e de diplomados estabelece a relação entre o capital cultural e o capital econômico e sua consequente valorização material e simbólica, correlacionada às avaliações que lhe forem imputadas pelo meio social.

Os sujeitos aqui analisados conseguiram, através do certificado de conclusão do Ensino Fundamental e do Ensino Médio, legitimar a posse de sua cidadania, sua capacidade de atuar social e profissionalmente. É verdade também que, para muitos brasileiros pertencentes às classes populares e com pouca escolaridade, ter esse certificado representa um avanço social muito grande. Eles foram ainda mais longe, pois conseguiram também a conquista do reconhecimento pessoal, social, familiar e no mercado de trabalho.

A conclusão desse processo de escolarização marca o início de uma nova história da qual querem ser protagonistas. Eles investiram suas esperanças e esforços pessoais e familiares e até mesmo físicos, para entrar no mundo dos letrados, no mundo culto, por reconhecerem os benefícios culturais que obtiveram e que poderão obter. Aumentaram suas expectativas, pois agora enxergam as possibilidades reais que têm em face do capital cultural de que são dotados. E reconhecem que, para continuar com os estudos, terão um esforço redobrado, porque eles querem fazer cursos técnico-profissionalizantes e alguns querem cursar faculdades e,por isso, precisarão despender um maior tempo devido à competitividade que aumenta com os outros estudantes para entrar nesses cursos.

Bourdieu (1998) alertou para as diferenças nas condições de acesso a uma cultura geral e, como decorrência, apontou para as condições diferenciadas de aquisição de uma cultura escolar. Em outras palavras, distinguiu dois tipos de aprendizado: de um lado, o aprendizado precoce e insensível, efetuado desde a primeira infância, no ambiente familiar, podendo, ou não, ser prolongado por um aprendizado escolar que o pressupõe e o complementa; de outro lado, o aprendizado tardio, metódico, adquirido fora da família, nas instituições de ensino ou em outras esferas informais da educação. A distinção entre esses dois tipos de aprendizado refere-se, pois, a duas maneiras de adquirir a cultura e de ter acesso a ela, e com ela se familiarizar.

Nesse sentido, para Bourdieu (idem), capital cultural é um conceito que explicita um novo tipo de capital, um novo recurso social, fonte de distinção e poder em sociedades em que a posse desse recurso é privilégio de poucos. Refere-se a um conjunto de estratégias, valores e disposições promovidos, principalmente, pela família, pela escola e pelos demais agentes da educação, que predispõem os indivíduos a uma atitude dócil e de reconhecimento ante as práticas educativas.

O grupo analisado possui histórias similares de exclusão social e escolar. Eles são trabalhadores que tiveram pouco acesso aos meios de comunicação e bens culturais, mas, com o acesso à escola, tornaram-se capazes de produzir social e culturalmente. Alguns, em seus relatos, esboçaram preocupações quanto à formação cultural da família, apontando para certo grau de reconhecimento de que existe uma cultura universal, legítima e de que existe outra cultura vista como ilegítima, que é a sua cultura de origem.

O grupo de sujeitos pesquisados teve a oportunidade de ampliar seu capital cultural na escola e por meio dela, porque foi através da escolarização que eles tiveram acesso, pela primeira vez, ao teatro, ao museu e a livros, revistas ou jornais.

As dificuldades econômicas presentes no meio familiar desses jovens dificultam essa inserção cultural, pois o acesso às obras culturais permanece como privilégio das classes cultivadas, uma vez que depende, quase estritamente, do nível de instrução das famílias, do acesso a esses bens culturais. Por isso, caberia à escola, como instituição social, transmitir ao maior número de pessoas, pelo aprendizado e pelo exercício, as atitudes e aptidões que fazem o homem culto “compensar – pelo menos, parcialmente – as desvantagens daqueles que não encontram em seu meio familiar a incitação à prática cultural” (BOURDIEU, 1998, p. 61). Dessa forma, a escola deveria desempenhar o papel que lhe cabe, que é o "de desenvolver em todos os membros da sociedade, sem distinção, a aptidão para as práticas culturais". (idem, p. 62).

No depoimento a seguir, podemos entender que, somente através da escola, esses indivíduos poderiam ampliar seu capital cultural:

(...) “Aqui não aprendemos somente a ler e escrever. Fomos pela primeira vez ao teatro, ao cinema, a Bienal, etc”. (Ariovaldo)

(...) “e agora eu quero saber mais, ter mais informação e entender a história do mundo”. (Daniel)

(...) “Agora leio o jornal, a revista e sei até trabalhar com o computador”.

(Queli)

(...) “questionava os professores nas aulas, para que eles explicassem vários assuntos que eu via na televisão ou lia nos jornais e nas revistas.

(Leandro)”.

Esses estudantes parecem ter sido despertados pela aspiração à cultura escolar, que poderá, a partir de uma prática, transmitir pelo aprendizado e pelo exercício, as atitudes e as aptidões que fazem o homem culto, compensando as desvantagens daqueles que não encontram, em seu meio familiar, a incitação à prática cultural. (NOGUEIRA, 1998, p.61)

Os enriquecimentos culturais são obtidos através da experiência escolar, conceito articulador entre as esferas da estrutura social e aquelas nas quais o ator social exerce sua ação, ou seja, “(...) as relações entre os temas das condições e padrões de vida, das tradições culturais e políticas, das representações simbólicas e praticas de resistência, com possibilidades de transformações políticas”. (THOMPSOM, 1998, p. 13)

E, é por meio dos sujeitos e de suas experiências que a história se realiza: “Exploramos, tanto na teoria como na prática, os conceitos de junção (como “necessidade”, “classe” e “determinação”), pelos quais, através do termo ausente “experiência”, a estrutura é transmutada em processo, e o sujeito é reinserido na história”. (idem)

É importante entender a visão espacial da sociedade. Para Bourdieu, “espaço social” é hierarquizado pela desigual distribuição de diferentes capitais, e a descrição da sociedade em termos de espaço social permite enfatizar a dimensão relacional das posições sociais. Desse modo, as diferentes formas de capital que permitem estruturar o espaço social e que definem as oportunidades na vida são o capital econômico, o capital cultural, o capital social e o capital simbólico.

O conceito de capital social é definido como

o agregado dos recursos efetivos ou potenciais ligados à posse de uma rede durável de relações mais ou menos institucionalizadas de conhecimento ou reconhecimento mútuo. O Volume do capital social que um agente individual possui depende da extensão da rede de

relações que pode ou consegue mobilizar e do volume do capital (econômico, cultural ou simbólico) que é posse exclusiva de cada um daqueles a quem está ligado. E a reprodução do capital social é tributária de instituições que visam favorecer as trocas legitimas e a excluir as trocas ilegítimas como a escola. (BOURDIEU, 2007, p. 10).

O espaço que cada indivíduo irá ocupar na sociedade pode ser analisado a partir de três eixos: o volume de capital, a composição do capital e as conversões de capital. O volume de capital (econômico e cultural) diferencia as localizações no sistema ocupacional de acordo como o volume de total de capital econômico e cultural possuído pelos indivíduos. A composição do capital diferencia posições no interior das situações de classes, enquanto que as conversões de capital diferencia as posições de acordo com as trajetórias, ou seja, de acordo com a mudança, ou estabilidade, que eles tenham experimentado ao longo do tempo no volume e na composição do seu capital.

Em outras palavras, indivíduos com equivalentes capitais econômicos e culturais obteriam resultados diferentes em função de diferenças potenciais de recursos mobilizados a partir de relações pessoais realizadas direta, ou indiretamente. Agregam-se às explicações de rendimento, portanto, não apenas aspectos culturais e econômicos, mas também aspectos referentes à qualidade e quantidade de relações que se pode mobilizar e efetivamente fazer influenciar no resultado.

4.5. Os jovens e a E.J.A.

A Educação de Jovens e Adultos no Brasil tem passado por profundas modificações ao longo do tempo, dentre elas, a crescente juvenilização de seu alunado, sinalizando para a necessidade de novas formas de atuação metodológica e de conteúdos com base em necessidades formativas. A inserção do jovem nesta modalidade de ensino tem se configurado como um fator desafiador para uma nova forma de fazer a EJA.

Um elemento que vem complicar a construção de uma identidade pedagógica do ensino e de sua adequação as característica específicas da população a que destina é o processo notado em todas as regiões do país, assim como em outros países da América Latina, de juvenilização da clientela (MASAGÃO, 2001, p.5).

Para Soares (2002), a Lei de Diretrizes e Bases, Lei nº 9394/96, no Art. 38, ao reduzir a idade para a realização de exames de 18 anos para 15 anos, no Ensino Fundamental, e de 21 para 18, no Ensino Médio, contribuiu para o aumento significativo do número de jovens que passou a incorporar o quadro de alunos da E.J.A.

A juvenilização, intensificada na contemporaneidade, decorre das deficiências do sistema escolar, como a evasão e a repetência, que ocasionam a defasagem entre a idade e série; da busca pela certificação escolar oriunda da necessidade de trabalhar; da dificuldade de acesso aos bens culturais; da ausência de motivação para o retorno a escola, entre outras.

O ingresso cada vez mais antecipado dos jovens no mercado de trabalho, principalmente, das camadas de baixa renda, tem provocado uma grande demanda nos programas de educação, inicialmente, destinados a adultos. Para esse contingente de jovens, a educação está articulada ao ingresso e a intenção de ingressar no mundo do trabalho, cujas expectativas estão direcionadas às novas exigências do mundo moderno, à ascensão e à mobilidade social.

O processo de juvenilização também foi considerado nesta pesquisa, porque dos trinta e dois sujeitos que retomaram seus estudos no Centro de Educação de Jovens e Adultos

Professora Elimara Santos e depois concluíram o Ensino Médio na Escola Estadual Lenita

Camargo, oito deles (Aline, Carla, Carlos, Érica, Leandro, Maicon, Marcelo e Sandro) não tinham completado a maioridade, e a idade dos mesmos variavam entre quinze e dezessete anos de idade.

Para Paiva (2000), com a entrada desses jovens, temos um grupo diferenciado na EJA, que não participa mais da conceituação atribuída a essa modalidade anos atrás, quando os estudantes dessa modalidade eram vistos como os “[...] que não tiveram oportunidades educacionais em idade própria ou que a tiveram de forma insuficiente, não logrando alfabetizar-se e obter conhecimentos básicos correspondentes aos primeiros anos do curso elementar” (PAIVA, 1972, p. 26). Essa explicação já tem se tornado insuficiente pelo momento histórico, político, social e econômico que temos vivenciado nos últimos anos. Esse grupo diferenciado na EJA, constituído por jovens, cada vez mais, cresce devido à exclusão da escola e na escola, aos problemas familiares e à entrada precoce no mundo do trabalho.

Dos oito sujeitos analisados (três mulheres e cinco homens), cinco são oriundos da zona urbana e três da zona rural, que antes de virem morar em São Paulo entre os doze e treze anos para trabalhar, moravam em outros estados.

Concordando com Paiva (2000), Haddad e Di Pierro (2000), acrescenta que o perfil dos estudantes da EJA assumiu uma nova identidade a partir do final século XX. Com isso, emerge um novo desafio para a Educação de Jovens e Adultos, sobretudo com a entrada dos jovens no seu programa, diferentemente das décadas anteriores, que atendiam adultos oriundos de origem rural. Há mais de duas décadas, os jovens atendidos na escolarização da EJA são de origem urbana cuja trajetória escolar anterior foi mal sucedida.

Conforme Sposito (1999), qualquer tentativa de caracterização da juventude brasileira requer, preliminarmente, o reconhecimento da diversidade social e cultural que define esse segmento. O conceito de juventude, entretanto, é impreciso, tanto teoricamente quanto sob o ponto de vista dos dados estatísticos. Nessa direção, Dayrell (2005) acredita que, no interior da sociedade brasileira, a análise dessa categoria se dá em torno do conceito de juventudes demarcadas por especificidade socioeconômicas, culturais, étnico-raciais, históricas e de gênero. Assim, Dayrell nos diz que:

(...) a juventude é, ao mesmo tempo, uma condição social e um tipo de representação. Se há um caráter universal dado pelas transformações do indivíduo numa determinada faixa etária, nas quais completa o seu desenvolvimento físico e enfrenta mudanças psicológicas, é muito variada a forma como cada sociedade, em um tempo histórico determinado e, no seu interior, cada grupo social vai lidar e representar esse momento. Essa diversidade se concretiza nas condições sociais (classes sociais), culturais (etnias, identidades, religiosas, valores), de gênero e também das regiões geográficas, dentre outros aspectos. (DAYRELL, 2005, p. 51)

Abramo (2005), em relação ao termo juventudes, afirma que é importante pensar que essa construção não somente é diferente nos diversos contextos como também se realiza de forma diferenciada. Diferentes identidades juvenis são possíveis, assim como formas diversas da condição juvenil, ou seja :

Hoje o alerta inicial é o de que precisamos falar de juventudes, no plural, e não de juventude, no singular, para não esquecer as diferenças e desigualdades que atravessam esta condição. Esta mudança de alerta revela uma transformação importante na própria noção social: a juventude, mesmo que não explicitamente, é reconhecida como condição válida, que faz sentido, para todos os grupos sociais, embora apoiadas sobre situações e

significações diferentes. Agora a pergunta é menos sobre a possibilidade ou impossibilidade de viver a juventude, e mais sobre os diferentes modos como tal condição é ou pode ser vivida (ABRAMO, 2005, p.43-44).

Segundo Abramo (idem), os que retomaram seus estudos ainda muito jovens na E.J.A., e uma grande parcela dos jovens das classes populares, não passaram pela etapa por ele denominada de “a juventude como período preparatório” – concepção aproximada do que se conhece como a transição entre a infância e a idade adulta –, na qual seriam direcionadas as políticas para prepararem o jovem para se inserir no mundo adulto. Tem como eixo norteador o futuro, deixando de visualizar os jovens como sujeitos sociais do presente, e também como etapa de vida heterogênea, tratando sua preparação como se todos ainda não tivessem assumido papéis que correspondem à responsabilidade da vida adulta, como trabalhar e constituir família. Podemos confirmar as afirmações de Abramo (2005), através dos depoimentos a seguir:

(...) Nunca tinha ido à escola, porque no sertão do Ceará primeiro a gente precisa sobreviver e depois as outras coisas. Comecei a trabalhar ainda menino. E Aqui em São Paulo, para trabalhar em construção não precisava ter estudo. (Carlos).

(...) Reprovei dois anos porque morava em uma favela e sofria discriminação das outras crianças que não eram da favela. Mudei para Francisco Morato e não consegui vaga na escola. (Aline).

(...) Precisei trabalhar muito cedo e tive que parar de estudar. E não tive mais como voltar a estudar. (Sandro).

Segundo Andrade & Neto (2007), o processo de escolarização constitui hoje um espaço importante de sentido que explicita, de forma incisiva, desigualdades e oportunidades limitadas que marcam expressivos grupos de jovens brasileiros. Essas desigualdades podem se expressar de várias formas e em vários momentos, principalmente quando os jovens percebem estar perdendo esse ‘jogo escolar’. Nesse caso, ao perceberem que, efetivamente, não são iguais, eles criam algumas estratégias – como a própria retirada do jogo, reconhecidas como evasão, abandono e repetência. É o fracasso escolar que tem marcado o processo de

escolarização desses jovens, comprometendo a sua condição juvenil por uma situação social de poucas oportunidades e que representa um problema muito maior, denominado exclusão social.

Os processos vivenciados pela maioria dos jovens brasileiros e suas estratégias de escolarização ainda expressam as enormes desigualdades a que está submetida esta faixa da população. As trajetórias escolares irregulares, marcadas pelo abandono precoce, as idas e vindas, as saídas e os retornos, podem ser assumidas como importantes sinais de que diferentes grupos de jovens vivem e percorrem o sistema de ensino. Tal processo é o indicador mais visível da diversidade do acesso, da permanência e do arco de oportunidades. O que parece estar dado, como direito, instituído e instituinte – o direito a educação para todos -, não reflete, necessariamente, a realidade vivenciada por parcela significativa dos jovens brasileiros. (ANDRADE e NETO, 2007, p. 27)

O comportamento escolar inadequado, ou de indisciplina, apresentado por esses jovens, é reconhecido como uma característica sempre presente no espaço escolar e interpretado como reação contrária às atividades didático-pedagógicas que estão sendo propostas. Esses sujeitos não estão adaptados às regras ou leis do jogo escolar. O comportamento inadequado levou, por exemplo, Marcelo a abandonar os estudos:

(...) Na escola eu dei muito trabalho e eu acho que me passavam de ano porque tinham medo de mim. Eu era terrível e quando mudamos de

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